segunda-feira, 23 de outubro de 2017


Turma de Dallagnol não entrega originais de documentos questionados por Lula


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Foto: Reprodução
 
 
Jornal GGN - Os procuradores de Curitiba não possuem os originais de documentos que a defesa de Lula questionou em um incidente de falsidade. A informação consta em uma resposta oficial [em anexo] encaminhada por Deltan Dallagnol ao juiz Sergio Moro no último dia 20. Segundo o líder da força-tarefa da Lava Jato, os originais estão em um banco de dados na Suécia, onde supostamente a Odebrecht mantém registros de pagamentos de propina.
 
"(...)  informa o Ministério Público Federal que os documentos constantes do evento 999 da Ação Penal, como já exposto por diversas vezes, foram extraídos diretamente de cópia dos discos rígidos relacionados ao sistema 'Drousys', fornecidos pela Odebrecht S/A. que se encontravam armazenados em servidor localizado na Suécia - cf. Relatório Técnico n' O11/2017-SPEA/PGR (evento lO, OUT2, destes autos) e Relatório de Análise n' 7/2017 (evento 999. ANEX02)", escreveu Dallagnol.
 
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Os documentos questionados pela defesa de Lula são dois recidos bancários idênticos, porém, assinados de maneiras diferentes - um dos papéis, apresentado pelo Ministério Público, tem duas assinaturas, ao passo em que a outra versão, de Marcelo Odebrecht, possui apenas rúbrica.
 
Moro determinou que a turma de Dallagnol informasse "se ainda existem os documentos originais, antes da digitalização e inserção no sistema de contabilidade paralela da Odebrecht. Ee, se positivo, para que os apresentem na Secretaria do Juízo em cinco dias."
 
O incidente de falsidade de Lula contra a Lava Jato foi apresentado antes de um pedido formal, por parte de Dallagnoil, para que a defesa do ex-presidente entregasse as versões originais de comprovantes de pagamento de aluguel devido a Glaucos da Costamarques. A defesa informou a Moro que possui os originais e pediu algumas providências para entregá-las. Moro negou e determinou a apresentação no prazo de 48 horas, que já expirou.


O terrorismo midiático do TCU e da PF, por Luis Nassif

Os indiciamentos da PF

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Opinião

Temer quer garantir seu mandato em troca de trabalho escravo

por Orlando Silva — publicado 19/10/2017 12h11
Em que momento a sociedade brasileira deu aval ao governo para tamanho retrocesso?

Alan Santos/PR
Michel Temer
Temer faz de tudo para se manter no cargo.
Michel Temer ultrapassou os limites na tentativa de salvar seu mandato e não ser investigado pelos crimes de corrupção. Ele flexibilizou as regras para combate ao trabalho escravo com a finalidade de garantir votos de deputados a seu favor e se safar das denúncias. Atendendo a um antigo pedido da bancada ruralista no Congresso Nacional, Temer reduziu o conceito de trabalho escravo através de portaria publicada, na segunda-feira 16, no Diário Oficial da União. 
Agora, os quatro elementos que podem definir escravidão contemporânea: trabalho forçado, servidão por dívida, condições degradantes ou jornada exaustiva foram, no frigir dos ovos, reduzidos a dois. A nova portaria estabelece a necessidade de cerceamento de liberdade como condicionante para a caracterização de ”condições degradantes” e de ”jornada exaustiva”, ao contrário do que está no artigo 149 do Código Penal e a Lei 10.803 de 2003.
Por isto e por tudo que este governo tem feito contra o trabalhador apresentarei à OIT (Organização Internacional do Trabalho), junto a outros parlamentares da Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados (CTASP), um relato das medidas que vem sendo tomadas no parlamento e que vão de encontro ao anseio da sociedade brasileira de correção de rumo no que diz respeito à normatização e execução de políticas públicas de combate ao trabalho escravo no Brasil, como o PDC 792/17 (Projeto de Decreto Legislativo) de autoria do Deputado Daniel Almeida que propõe sustar a portaria 1129 do Ministério do Trabalho, o Ciclo de Debates sobre o tema proposto pela Deputada Gorete Pereira na CTASP e outras iniciativas.
Leia mais:
A escravidão não acabouReforma trabalhista dificulta combate ao trabalho escravo
Os ataques aos trabalhadores neste governo corrupto têm sido diários. A exoneração, no último 10 de outubro, de André Esposito Roston, chefe da Divisão de Fiscalização para a Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) do Ministério do Trabalho, acendeu o sinal vermelho para a situação e logo se percebeu que não se tratava de uma questão administrativa, como chegaram a alegar membros do Governo. As atitudes reiteradas demonstram que a falta de compromisso do governo com a erradicação do trabalho escravo não é apenas flerte com o passado, mas uma volta às raízes de um Brasil fundado na ignomínia da escravidão.
Roston já havia denunciado o total corte de verbas que atingia especialmente os grupos móveis de fiscalização, o coração do programa de erradicação de trabalho escravo no Brasil. Ação que motivou o Ministério Público do Trabalho a entrar na Justiça para pedir a manutenção das fiscalizações. Uma das alegações do MPT foi de que o Grupo Especial de Fiscalização Móvel que faz as fiscalizações in loco corria o risco de ser paralisado pela primeira vez em 22 anos. O trabalho do grupo móvel, que ao longo de sua história resgatou 50 mil pessoas, sendo mais de 1000 só em 2015, do trabalho análogo ao escravo e que atuou intensamente nos governos Lula e Dilma, entre outras ações, havia colocado o Brasil como referência internacional. Referência desde já perdida pelo Brasil, de acordo com pronunciamento da OIT.
Agora, com a nova portaria, passa a valer a máxima de que para ser caracterizado crime de trabalho escravo o trabalhador deverá estar impedido no seu direito de ir e vir, independente das condições de trabalho às quais a pessoa está subordinada. Além disso, os auditores fiscais do trabalho perdem autonomia do seu trabalho e o fruto de suas observações in loco só terá validade com o aval do Ministro. Um descalabro completo.
O próprio Ministério do Trabalho sinaliza que a maior parte dos casos de trabalho forçado no Brasil está no campo e a maioria das vítimas são homens entre 18 e 44 anos. Entre 1995 e 2015, 29% dos trabalhadores libertados atuavam na pecuária e 25% na cana de açúcar. Longe de ser uma coincidência, é justamente a bancada ruralista do congresso uma das que mais pressionou o governo em período recente não só para o descumprimento de ordem judicial de divulgação da “lista suja do trabalho escravo” como para colocar em inoperância as ações de fiscalização.
Seria oportuno o governo explicitar as reais razões do retrocesso nestas políticas. Em que momento a sociedade brasileira deu aval ao governo para tamanho retrocesso? De um país que avançava em sua legislação protetiva aos trabalhadores, com progressos na sua Justiça do Trabalho, tornando-se referência internacional, passamos a figurar como um dos países que ruma à degradação dos direitos humanos mais essenciais.
A situação me fez lembrar que há poucos dias o sociólogo e ex-presidente do Ipea, Jessé Souza, lançou o livro A Elite do Atraso – da Escravidão à Lava Jato. No livro, Jessé localiza na escravidão a matriz de uma sociedade brasileira que “sem culpa e remorso, humilha e mata pobres”.
O autor lança luz sobre a urgência de resgatarmos o Brasil interrompido por uma narrativa que atribui somente a política e ao Estado, ambos corruptos nesta visão, todos os nossos males e deixa passar em brancas nuvens os oligopólios e a elite financeira que, ao dominar as peças do jogo, nos atira a um retrocesso civilizacional contra o qual tanto havíamos avançado.
*Orlando Silva é presidente da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados e deputado federal pelo PCdoB/SP

quarta-feira, 18 de outubro de 2017


O dia em que o Senado virou Supremo, por Luis Nassi




Foto: Agência Brasil

É um exercício curioso acompanhar as justificativas dos votos dos Senadores que votaram pelo “não” no caso Aécio Neves. Isto é, por não dar autorização para o STF (Supremo Tribunal Federal) investigá-lo.
Alguns foram mais sinceros e alegaram que, se o próprio STF passou a batata quente para o Senado, agora o Senado devolveria a batata quente ao Supremo.
​Muito se falou nas prerrogativas do Senado, nas suas atribuições de fazer as leis e, exagerando, de ser o verdadeiro guardião da Constituição, de ser compostos por pessoas eleitas pelo voto popular. Falou-se do risco da ditadura do Judiciário, dos diversos casos em que a Procuradoria Geral da República se precipitou, com as trapalhadas de Rodrigo Janot, e depois o próprio Supremo corrigiu.
Muitos votaram em tese, não pelo Aécio ou contra o Aécio, mas pelas prerrogativas da casa.
Tudo muito bom, tudo muito bem, não fossem dois detalhes: as conversas escrachadas de Aécio com Joesley Batista; e os 500 mil reais que o primo de Aécio levou em uma maleta. Sem contar a conversa de bêbado de Joesley com seu advogado, gravada inadvertidamente, em que diz que Aécio “é muito bandido”.
Não foram episódios soltos, mas indícios em cima de um personagem sobre o qual campeiam suspeitas muito mais graves, desde as caixinhas de Furnas até as estripulias de seu aliado e suplente com o helicoca.
Desde o início da Lava Jato, Aécio Neves, ao lado de José Serra, eram os exemplos máximos da impunidade, a prova de que o Ministério Público Federal (MPF) tinha viés ideológico, assim como o Supremo e o Judiciário em geral. A consagração da Lava Jato viria na punição – ainda que extremamente tardia – deles dois.
Agora se tem um Aécio blindado e um Serra tão à vontade que até pensa em se candidatar ao governo de São Paulo.

A democracia ameaçada, segundo Pedro Serrano


Nos últimos anos, o jurista Pedro Serrano se converteu em um dos mais competentes analistas sociais do país. Através do estudo aprofundado das mudanças nas leis e nas constituições, Serrano entra no terreno da formação das ideias e princípios, das mutações na opinião pública, refletindo-se em um neoconstitucionalismo que visa erradicar os princípios humanistas que regeram as Constituições no pós-guerra.
Na segunda-feira passada, Serrano proferiu brilhante palestra na Escola de Governo.
Abaixo, uma síntese do que foi dito.
A crise política atual não é apenas do modelo de Estado, mas do modelo de vida pós 2a Guerra.
No direito constitucional se confunde República com Democracia. República significa a periodicidade do mandato. É um conceito que explica toda a estrutura do Estado, das instituições, da estabilidade do funcionário público aos cargos de confiança, subordinando tudo ao grupo que foi eleito. Toda a estrutura foi pensada a partir dessa conceito.
Outra noção é da República a partir do conceito de bem público.
Ressurge, então, a ideia de democracia e da soberania popular, que refunda a ideia da República, a noção de bem público.
O primeiro ciclo democrático, logo depois das Revoluções francesa e americana definiam um contrato social anterior ao Estado, que precedia os governantes.
A idéia central do liberalismo político é que as pessoas têm o direito de se levantar contra o governante que não respeitem o contrato social.
Até então, a democracia significava o voto da burguesia, os que detinham a propriedade e a renda.
Por isso, as primeiras constituições do mundo visavam conter os ímpetos das revoluções populares. Foi assim com a Constituição francesa, limitando o coto censitário à burguesia; e a Constituição americana, visando conter as leis dos estados, muitas delas beneficiando os pequenos produtores.
Ao longo dos séculos houve transformações intensas através dos mecanismos de resistência, que levaram gradativamente as mulheres, os trabalhadores, os negros a conquistar espaço, marcadamente no final do século 19, criando a ideia da democracia universal e do bem público no sentido amplo.
Nesse período, as teorias política e jurídica democráticas tendiam a fortalecer a ideia da soberania popular: democracia é a decisão tomada pela autoridade investida para tal, que seguem determinados procedimentos, respeitando direitos das minorias etc. É um sistema que pressupõe a ideia de conflito social e político e visa compor os conflitos através de ideias regradas.
O bem público é tido como bem do Estado, titularizados pelas autoridades democráticas e guiados por determinados procedimentos e pelos limites de autoridade que a Constituição estabelece.
Até então, a Constituição ficava no mesmo patamar das leis comuns.

A era do humanismo

As tragédias da 1ª e 2ª guerra geraram grandes problemas para a humanidade. A 1ª Guerra Mundial foi causada pela democracia. A 2ª Guerra demonstrou o grande problema simbólico, de regimes totalitários que ascenderam pela via democrática. E irão se transformar em regimes autoritários pela via das leis aprovadas pelo Congresso e convalidadas pelo Judiciário.
Na Itália, várias leis produzidas na década de 20 levaram ao fascismo. Na Alemanha, três meses depois de eleito, Adolf Hitler promulgou a Constituição de Weimar que, no artigo 48 abria a possibilidade de decretação do estado de exceção. O Parlamento aprovou e o Judiciário aceitou.
Assim como no episódio do impeachment brasileiro, foi golpe no sentido material, mas não no sentido formal. O nazismo e o fascismo eram doenças da razão, movidos por ideias tidas como científicas e valendo-se dos instrumentos democráticos.
O pós-guerra trouxe para o homem ocidental a perda do sentido tanto da razão como da democracia, mostrando-se formas vazias que não necessariamente significavam melhorias éticas e sociais.
Toda história do pensamento político e humano no pós-guerra, foi uma busca de resgatar esse sentido. No Direito, as Constituições do pós-guerra tentaram a recuperação dos princípios democráticos e republicanos.
A Constituição deixou de ser vista apenas como conjunto de normas que estipula autoridades e procedimentos e passa a ser conjunto de normas que estabelecem conteúdos, opções morais e políticas que não são colocadas à disposição das maiorias eventuais. E esses valores são os chamados direitos humanos, negativos e positivos: os negativos, de liberdades respeitadas e os positivos, das obrigações de realizar direitos sociais.
O bem deixa de ser visto como elemento material. Bem púbico passa a ser visto como elemento imaterial, de obediência aos direitos fundamentais. Deixa de ser público, no sentido Estatal, mas do bem comum.
No Ocidente desenvolve-se uma visão humanista da democracia como sendo a convivência comum. As pessoas passam a assimilar a subjetividade democrática, a tolerância, voltada para encontrar o senso comum, uma forma de vida compartilhada; por isso os direitos sociais.
Não existe bem comum em uma sociedade com modos de vida diferentes, que não partilham das mesmas formas de vida.
E esses valores vão se espalhando nas relações pessoais, no respeito à divergência, na solidariedade com a dor, na benevolência com o adversário caído.

A truculência dos novos tempos

Agora, as novas formas do capitalismo levam a um divórcio entre liberalismo econômico e político. O Capital passa a ter outra conformação: capital financeiro-tecnológico-militar.
Necessita muito mais do Estado para poder se reproduzir. O Estado é o grande garantidor de todas as operações do mundo.
Esse modelo produz grandes desigualdades sociais e passa a exigir um Estado mais autoritário, com maior repressão. Coloca em crise todo o modelo de Estado do pós-guerra.
Introduz-se, então, o neoconstitucionalismo. Ingressa-se em um novo período no qual entra em crise a ideia da Constituição, da República como bem comum, de direitos sociais como fundamentais para a democracia.
É só conferir a ampliação do número de presos, de mortos. Aqui no Brasil se tem a polícia que mais Mara e morre no mundo, 3.500 assassinatos por ano, 60 mil mortos pela violência, 60% dos presos sem direito de defesa.
Não estamos mais na época dos governos de exceção, mas da nova forma, de medidas na democracia com viés autoritário. Leis e procedimentos democráticos são utilizadas para ampliar o estado de exceção. Aqui, o sistema de justiça é o autor soberano das medidas de exceção, tendo como base social de apoio a ralé que busca a ordem e os órgãos de mídia que reproduzem esse espírito.
Adota-se o direito anglo-saxão, que parte da ideia de nação única, que favorece o domínio da elite branca sobre o restante da Nação. Os demais grupos acabam não tendo representação no sistema de justiça, no sistema político.
Mudam-se os valores. Passa a imperar a força bruta, a intolerância, o preconceito.
Volta-se à Constituição de 1934 que, no artigo 139, estipulava a eugenia como mecanismo de criação da educação, estimulando o veto aos casamentos interraciais e inter-sociais, só integrando os brancos que vieram da Europa.
É o caso do Supremo, hoje, votando a favor do casamento homoafetivo, do aborto. Mas votando a prisão em segunda instância, justamente aquela que pega a periferia, em um momento em que o desenvolvimento da defensoria pública permite um mínimo de defesa jurídica para os de baixo.

A Constituição corrompida

Por ser extensa, a Constituição brasileira amplia brutalmente o poder do Judiciário para avançar em todos os temas. Ela exige um Judiciário que se ligasse ao comum, que encontrasse no interesse público o significado da Constituição.
Mas ocorre uma corrupção do sentido da Constituição, como garantidora dos direitos fundamentais. Há um esvaziamento do sentido que levou à sua votação, o sentido do que é público: direitos sociais amplos, penal restritivo.
O Judiciário é o lugar da política interpretativa; o Supremo toma a decisão política institutiva, de instituir novas leis sem nunca ter sido votado.
Ou, então, de combater o crime. Nos sistemas democráticos, nunca foi papel do Supemo de combater o crime. Esse é papel do Ministério Público, da polícia. O papel do Judiciário é garantir que as decisões do campo penal obedeçam aos direitos constitucionais fundamentais.
Com isso, a ideia do bem comum como constituinte da República vai se esvaindo. É uma nova modelagem de Estado que esvazia a democracia.
A democracia é um estado de guerra, mas permeado por movimentos de diplomacia. É diálogo e é conflito.
Vivemos longo período de diálogo. Agora, estamos na guerra. E tenta-se consolidar o Estado de Exceção com teorias pretensamente científicas, similares ao do racionalismo alemão que levou ao nazismo.
No campo do direito, surge a teoria da bandidocracia, o direito penal do inimigo. São teorias fraudulentas do direito, que visam transformar a Constituição.
A democracia é um sistema vivo, no qual ora os direitos estão em expansão, ora em refluxo.
A efetividade da Constituição depende da lealdade de seus aplicadores aos princípios definidos. Em relação ao direito à moradia, quem interpreta melhor a Constituição? Os movimentos de direitos à moradia ou o Judiciário que ordena a retomada da posse? Os movimentos, óbvio. Quem é o titular da interpretação da Constituição éa população, não a autoridade. O centro do direito é o povo no exercício amplo de seus direitos.
Por isso, a única forma de defender e ampliar os direitos é através do confronto (não o confronto violento ou armado), da transgressão. Não há democracia sem que se permita certas formas de transgressão. No mundo anglo-saxão permite-se a transgressão como forma de assimilar conflitos.

NOVA VITÓRIA DOS CANALHAS

TIVEMOS HOJE MAIS UMA VITÓRIA DOS CANALHAS NA CCJ, PARA REJEITAR O PEDIDO DE INVESTIGAÇÃO CONTRA TEMER, TODA A SUA TROPA COMANDADA POR MARUN, O FAMOSO BORRA BOTAS DE TEMER, ALÉM DE UM TAL DE DARCISIO DO PMDB DO RS, QUE ESTAVA NA COMISSÃO QUE FOI FAZER TURISMO NA CHINA A CUSTA DO ERÁRIO. PARA ESTE TIPO DE TURISMO NÃO TEMOS CORTE DE GASTO, MAS PARA A CLASSE TRABALHADORA TEMOS TODO TIPO DE CORTE.

Direitos

Medida do governo Temer coloca em risco combate ao trabalho escravo

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Agência Brasil
Ronaldo Nogueira
Ronaldo Nogueira: pressão do agronegócio, do setor têxtil e da construção civil sobre o governo.
A Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), que coordena a atividade dos auditores fiscais, circulou um memorando interno afirmando que não foi consultada na elaboração da portaria. “A SIT orienta seus auditores a manter, por ora, as práticas conduzidas pelos normativos que até então regularam a fiscalização para a erradicação do trabalho em condições análogas à de escravo”, diz o texto assinado pelo secretário de inspeção do trabalho substituto, João Paulo Ferreira Machado.
Outras entidades também afirmaram terem sido surpreendidas. “A portaria acaba com o conceito de trabalho escravo contemporâneo, reconhecido pela Organização Internacional do Trabalho como um avanço por reconhecer a moderna escravidão,” diz Antônio Carlos de Mello, coordenador do programa de combate ao trabalho forçado da Organização Internacional do Trabalho no Brasil.
As fontes ouvidas pela reportagem atribuem a publicação da portaria à pressão histórica de entidades ligadas ao agronegócio, ao setor têxtil e à construção civil. O fato de a medida ter sido tomada sem uma discussão prévia também tem sido duramente criticado.
Leia mais:
"A burguesia brasileira jamais admitiu a CLT"“Na escravidão o trabalhador era vendido. Na terceirização, é alugado”
“Eles tentaram fazer isso através de lei no Congresso Nacional e não conseguiram, porque a sociedade não permitiu. Agora, estão tentando isso por outras formas,” diz a procuradora da República Ana Carolina Roman.
Segundo ela, o Ministério Público estuda a possibilidade de entrar na Justiça contra a portaria, mesma possibilidade levantada pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). “A portaria invade áreas que não são de competência do ministério. As ‘inovações’ são altamente questionáveis”, diz Guilherme Feliciano, presidente da associação.
Caio Magri, diretor executivo do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, também critica a falta de discussão. “Não se altera um artigo do Código Penal através de uma maracutaia”, diz Magri, referindo-se ao conceito de trabalho escravo previsto no artigo 149 do código.
Já o deputado estadual Carlos Bezerra Jr. (PSDB-SP), autor da lei paulista de combate à escravidão, aponta que a portaria “é uma gravíssima violação democrática e a expressão clara do espírito autoritário e descompromissado com o direitos humanos desse governo”.
Publicada nesta segunda, a medida foi decidida na última sexta (13), ou seja, na mesma semana em que o coordenador nacional de fiscalização do trabalho escravo, André Roston, foi exonerado pelo ministro. Em reunião com críticos da sua medida na última quarta-feira (11), Nogueira disse que “teria planos mais ousados” e que queria discutir o próprio conceito de trabalho escravo.
Em nota enviada por email à Repórter Brasil, o Ministério do Trabalho afirma que “o combate ao trabalho escravo é uma política pública permanente de Estado e que vem recebendo todo o apoio administrativo desta pasta, com resultados positivos concretos relativamente ao número de resgatados, e na inibição de práticas delituosas dessa natureza, que ofendem os mais básicos princípios da dignidade da pessoa humana”.
No final da tarde de segunda, após receber duras críticas pelas mudanças, o Ministério do Trabalho atualizou sua nota oficial, acrescentando que, em decorrência da portaria, processos criminais seriam abertos simultaneamente à emissão do auto de infração. Além disso, policiais federais estarão em todas as operações e as multas terão um aumento de até 500%. (Leia a íntegra)
Em nota, a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), também conhecida como bancada ruralista, nega que tenha interferido junto ao Ministério do Trabalho para a publicação da portaria, já que sua atuação se concentra no Congresso. “A portaria vem ao encontro de algumas pautas da FPA e diminui a subjetividade da análise. No entanto, não participamos de nenhuma tratativa com o Poder Executivo sobre o assunto”.
Condições degradantes
A portaria anula “condições degradantes” como um dos quatro elementos que configuram trabalho análogo ao de escravo ao afirmar que essa situação só existe com cerceamento da liberdade.
“Com a nova portaria, só podemos considerar trabalho em condições degradantes se houver restrição de liberdade, com pessoas armadas ou isolamento geográfico que impeçam o trabalhador de ir e vir,” diz Antonio Mello.
De acordo com o representante da OIT, empregadores que deixavam de fornecer água potável, alimentação e descanso adequado antes podiam ser acusados de submeter pessoas a condição degradante. Isso era suficiente para caracterizar trabalho escravo. Mas, com a nova regra, essa configuração fica mais difícil.

Trabalho escravo
Fiscalização de trabalho escravo (Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil)
“A portaria traz a ideia reducionista que escravo é a pessoa amarrada sem possibilidade de fugir. Essa é a ideia falsa utilizada no imaginário para tentar convencer que a legislação atual é exagerada,” diz Xavier Plassat, coordenador da Campanha contra o Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra.
Para Rafael Garcia Rodrigues, procurador do trabalho e ex-coordenador nacional de erradicação ao trabalho escravo do Ministério Público do Trabalho, o objetivo dessa medida também é aniquilar o conceito de servidão por dívida, um dos que podem caracterizar o crime. “Só seria escravidão análoga se também tiver exceção no direito de ir e vir por pessoas armadas. É um retrocesso inacreditável.”
A portaria também estabelece que escravo só será aquele trabalho sem consentimento por parte do trabalhador.
“Vincular o trabalho escravo ao consentimento do trabalhador é um retrocesso de no mínimo 50 anos,” diz Magno Riga, auditor fiscal do trabalho e membro do grupo especial de fiscalização móvel, responsável por checar denúncias e resgatar trabalhadores.
Para o auditor, o fato de um trabalhador ter aceitado trabalhar em um determinado local não significa que ele acatou previamente as condições de trabalho em que ele se encontra. Dessa forma, a ação estatal para retirá-lo daquele trabalho é necessária porque é pouco provável que ela saia da situação por si mesmo.
Assim, a medida restringe o próprio conceito de trabalho forçado, outro elemento que caracteriza o crime.
Lista suja
Outro ponto criticado na portaria é a necessidade de que veiculação do cadastro de empregadores flagrados por esse crime, a chamada “lista suja” do trabalho escravo, seja autorizada pelo próprio ministro.
Hoje, a inclusão de empresas e pessoas na lista suja não depende de seu aval e é responsabilidade da área técnica do Ministério do Trabalho. “Transformar uma decisão técnica em política é escancarar que o governo vai retirar quem interessar da lista. É um absurdo. É inadmissível”, diz Caio Magri, do Instituto Ethos.
A “lista suja” tem sido usada pela iniciativa privada para gerenciamento de risco, tanto para balizar negócios, quando guiar investimentos e conceder empréstimos. Para Magri, a mudança inviabiliza a sua utilização: “Quem vai confiar nessa lista? Os investidores vão ficar seguros de que está na lista quem deveria estar? Isso vai acabar com a credibilidade do instrumento mais importante no combate ao trabalho escravo no Brasil”.
Leia também:
Reforma trabalhista dificulta combate ao trabalho escravoO combate ao trabalho escravo está em declínio no Brasil
Para o deputado Bezerra, o novo critério é completamente político. “Aos amigos tudo e aos inimigos a lei. A depender dos amigos desse governo, o critério será de proteção e impunidade para quem pratica esse crime,” diz o parlamentar.
Em sua nota, o ministério não comentou a possibilidade de ingerência política. A pasta afirma que a lista “é um valioso instrumento de coerção estatal, e deve coexistir com os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.”
A portaria também estabelece a obrigatoriedade de um boletim de ocorrência para validar a fiscalização que resultou no resgate de trabalhadores e, portanto, incluir, posteriormente, o nome de um empregador na “lista suja”. Com a medida, haverá a necessidade de que, além do auditor fiscal do trabalho, um policial valide a operação.
“Trazer essa responsabilidade para um policial militar é absurdo,” diz Magri. “Só se for para darem voz de prisão flagrante ao infrator, mas isso não vai acontecer. O policial estará lá para protelar o processo, para retirar a caracterização objetiva do crime.”
Para o representante da OIT no Brasil, essa mudança mina o trabalho de fiscalização e repressão porque presume que o fiscal não está falando a verdade. “O reconhecimento não é mais da fiscalização do trabalho, mas da polícia”, conclui.
*Publicado originalmente na Repórter Brasil

Corrupção

Mais uma vez, CCJ da Câmara rejeita denúncia contra Temer

por Redação — publicado 18/10/2017 19h47
O presidente da República foi acusado de organização criminosa e obstrução de Justiça. A decisão final será do plenário

Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Bonifácio de Andrada
Bonifácio de Andrada na reunião desta quarta-feira 18: relator tucano fez firme defesa de Temer
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou nesta quarta-feira 18 o relatório do deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) e rejeitou a segunda denúncia contra o presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP), que desta vez incluía também os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral). Foram 39 votos a favor do relatório - e contra o prosseguimento da denúncia - e 26 contra, com uma abstenção.
O resultado é uma sinalização de como os deputados estão encarando a questão. A palavra final sobre o prosseguimento ou não da denúncia caberá ao plenário da Câmara. Lá, a ação aberta pela Procuradoria-Geral da República ainda sob o comando de Rodrigo Janot precisaria de ao menos 342 votos, o que corresponde a dois terços dos 513 deputados, quórum exigido pela Constituição para que denúncias contra um presidente da República sejam encaminhadas ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A previsão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é de que a votação da denúncia se encerre até o fim de outubro. Se for aprovada e aceita pelo STF, Temer é afastado da Presidência por até 180 dias. Ninguém considera este cenário possível, no entanto.
Leia mais:
Relator tucano da CCJ rejeita segunda denúncia contra Temer
Temer é acusado de liderar organização que desviou 587 milhões
O relatório de Andrada foi apresentado na terça-feira 10 e defendia a rejeição da denúncia contra Temer. A recomendação vale também para as denúncias contra Eliseu Padilha e Moreira Franco. Na ação, Temer é acusado de liderar uma quadrilha que desviou 537 milhões de reais dos cofres públicos. A base da acusação, que também envolve o crime de obstrução de justiça, são as delações da JBS e de Lúcio Funaro. A defesa de Temer foi entregue à comissão na semana passada.
Relatório e defesa
No texto, Andrada fez uma forte defesa do presidente, inclusive alinhada aos argumentos já apresentados pelos advogados de Temer, que desqualificaram os delatores e afirmam que as gravações, que se tornaram provas, foram obtidas de maneira ilícita.
Em seu relatório, Andrada criticou a atuação do Ministério Público (MP), da Polícia Federal (PF) e da imprensa. Afirmou que o MP tem "uma força sob certo aspecto até maior do que o próprio juiz". Criticou, ainda o comportamento da imprensa, que "fortalece" as ações "espetacularizadas" do MP.
Em nova fala, nesta quarta-feira 18, Andrada afirmou que é contra a admissibilidade do processo exclusivamente por razões jurídicas. "As razões políticas não me cabem". Para ele, a denúncia não pode ser admitida por falta de elementos. "É o que está na Constituição".
Na mesma linha, o advogado de Temer, Eduardo Carnelós, afirmou que a denúncia foi construída com base "em uma atuação lamentável, deplorável, pelo ex-procurador-geral da República" e reafirmou sua posição contra o instituto da delação premiada. "A delação de Lúcio Funaro é devastadora, pois deixa muito evidente os métodos sórdidos usados pelo ex-procurador da República" para a obtenção da delação.
Já na conclusão de sua fala, Carnelós afirmou que o Brasil tem vivido uma era de arbítrio, que atinge a todos. "O arbítrio não escolhe coloração, não escolhe partido político. Ele age como arbítrio", concluiu. 

Câmara dos Deputados

Temer salvo na CCJ: saiba como votaram os deputados

por Redação — publicado 18/10/2017 20h09, última modificação 18/10/2017 20h14
Por 39 votos a 26, membros da Comissão rejeitaram o prosseguimento da segunda denúncia contra Temer. Decisão definitiva ainda depende do Plenário

Cleia Viana / Câmara dos Deputados
Rodrigo Pacheco
Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), presidente da CCJ, observa deputada nesta quarta-feira 18.
Leia mais:
Mais uma vez, CCJ da Câmara rejeita denúncia contra Temer
Temer é acusado de liderar organização que desviou 587 milhões
O resultado é uma sinalização de como os deputados estão encarando a questão. A palavra final sobre o prosseguimento ou não da denúncia caberá ao plenário da Câmara. Lá, a ação aberta pela Procuradoria-Geral da República ainda sob o comando de Rodrigo Janot precisaria de ao menos 342 votos, o que corresponde a dois terços dos 513 deputados, quórum exigido pela Constituição para que denúncias contra um presidente da República sejam encaminhadas ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A previsão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é de que a votação definitiva da denúncia aconteça até o fim de outubro.
Confira abaixo como votaram os membros da CCJ:
Votaram sim, a favor do relatório que barra a denúncia contra Temer:
Alceu Moreira (PMDB-RS)
Antonio Bulhões (PRB-SP)
Arthur Lira (PP-AL)
Beto Mansur (PRB-SP)
Bilac Pinto (PR-MG)
Bonifácio Andrada (PSDB-MG)
Carlos Bezerra (PMDB-MT)
Carlos Marun (PMDB-MS)
Cleber Verde (PRB-MA)
Cristiane Brasil (PTB-RJ)
Daniel Vilela (PMDB-GO)
Darcísio Perondi (PMDB-RS)
Del. Edson Moreira (PR-MG)
Domingos Neto (PSD-CE)
Edio Lopes (PR-RR)
Edmar Arruda (PSD-PR)
Evandro Gussi (PV-SP)
Evandro Roman (PSD-PR)
Fausto Pinato (PP-SP)
Francisco Floriano (DEM-RJ)
Genecias Noronha (SD-CE)
Hildo Rocha (PMDB-MA)
José CarloAleluia (DEM-BA)
Juscelino Filho (DEM-MA)
Luis Tibé (AVANTE-MG)
Luiz Fernando (PP-MG)
Magda Mofatto (PR-GO)
Maia Filho (PP-PI)
Marcelo Aro (PHS-MG)
Milton Monti (PR-SP)
N. Marquezelli (PTB-SP)
Osmar Serraglio (PMDB-PR)
Paes Landim (PTB-PI)
Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG)
Paulo Maluf (PP-SP)
Rodrigo de Castro (PSDB-MG)
Rogério Rosso (PSD-DF)
Ronaldo Fonseca (PROS-DF)
Thiago Peixoto (PSD-GO)
Votaram não, contra o relatório que barra a denúncia contra Temer:
Alessandro Molon (Rede-RJ)
Betinho Gomes (PSDB-PE)
Chico Alencar (Psol-RJ)
Daniel Almeida (PCdoB-BA)
Danilo Cabral (PSB-PE)
Fábio Sousa (PSDB-GO)
Félix Mendonça Jr
Gonzaga Patriota (PSB-PE)
Hugo Leal (PSB-RJ)
João Gualberto (PSDB-BA)
José Mentor (PT-SP)
Júlio Delgado (PSB-MG)
Luiz Couto (PT-PB)
Major Olimpio (SD-SP)
Marco Maia (PT-RS)
Marcos Rogério (DEM-RO)
Maria do Rosário (PT-RS)
Patrus Ananias (PT-MG)
Paulo Teixeira (PT-SP)
Pompeo de Mattos
Rocha (PSDB-AC)
Rubens Bueno (PPS-PR)
Sergio Zveiter (PODE-RJ)
Silvio Torres (PSDB-SP)
Valmir Prascidelli (PT-SP)
Wadih Damous (PT-RJ)

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Retrocesso

A desigualdade aumenta no Brasil pós-austeridade

por Fabrício Pitombo Leite* — publicado 17/10/2017 17h42
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua e do índice de Gini mostram alta do abismo social a partir do terceiro trimestre de 2015

José Cruz/Agência Brasil
Desigualdade aumentou no país pós austeridade

Esta pequena nota complementa análise anterior, que contemplava os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) até 2015, herdando sua metodologia, e, ainda, algumas atualizações realizadas posteriormente, que nos trazem até o 2º trimestre de 2017 (1). Originalmente, a intenção era de observar a ligação entre o mercado de trabalho e a desigualdade, visto que a PNADC nos possibilitou, pela primeira vez, a mensuração da desigualdade em bases trimestrais. Assim, partiu-se da tentativa de calcular uma Renda Domiciliar Per Capita (RDPC) e a desigualdade, medida pelo índice de Gini, associada a esses rendimentos.
Já naquela ocasião, foi identificada a elevação da desigualdade para o 4º trimestre de 2015, na comparação com igual trimestre do ano anterior. Tal elevação, entretanto, longe de constituir um caso isolado, tornou-se a tendência desde então, ainda que nos limitemos à observação de uma pesquisa domiciliar, notadamente incapaz de captar os rendimentos do topo da pirâmide, como ilustram as conclusões qualitativamente diferentes acerca da trajetória da desigualdade desde o início dos anos 2000 quando levamos em conta dados para o imposto de renda (2).
A observação da série completa para os dados da PNADC (1º trimestre de 2012 ao 2º trimestre de 2017), apresentando o índice de Gini calculado e sua média móvel para o acumulado em 4 trimestres, não deixa dúvidas: encerrando uma tendência de queda, a partir do 3º trimestre de 2015 é possível notar uma elevação ininterrupta da desigualdade, sempre na comparação com iguais períodos do ano anterior para evitarmos efeitos sazonais.
Como veremos, essa elevação da desigualdade assume a forma mais radical possível a partir de 2017, com elevação da renda dos mais ricos concomitante à redução da renda dos mais pobres.

É importante tecermos algumas considerações sobre a seção mais plana da média móvel pós-2015, face à impressão de uma grande queda da desigualdade calculada entre o 1º e o 2º trimestres de 2016 (estabilidade na comparação com o 2º trimestre de 2015). Ao contrário do que ocorre tipicamente ao observarmos uma queda na desigualdade, quando a renda dos mais pobres cresce mais do que a renda dos mais ricos, o contexto observado a partir do 1º trimestre de 2016 é de queda da RDPC, com a peculiaridade de que, inicialmente, a renda dos mais ricos caiu mais intensamente que a renda dos mais pobres, reduzindo, portanto, a medida de desigualdade calculada. Tal comportamento, contudo, não se mostrou duradouro e a desigualdade voltou a crescer, como relatado a seguir.
Ao tomarmos os acumulados em quatro trimestres para a RDPC, já em termos reais, e separarmos os períodos em que se observou tendência de queda da desigualdade (até meados de 2015) e de elevação ininterrupta da desigualdade (3º trimestre de 2015 ao 2º de 2017), definindo a base para o início de cada período e dividindo a renda entre os relativamente ricos e os relativamente pobres (3), podemos notar que:
(i) a renda dos mais pobres cresce acima da média até o 2º trimestre de 2015, com ganhos da ordem de 9,6% para esses, ante ganhos de 6,2% para os mais ricos;
(ii) o crescimento da desigualdade, a partir do 3º trimestre de 2015, é explicado, inicialmente, por um crescimento da renda dos mais ricos concomitante à queda da renda dos mais pobres (no acumulado até o final de 2015), então por um crescimento da renda dos mais ricos superior ao crescimento da renda dos mais pobres (entre fins de 2015 e início de 2016), seguido por um período de queda generalizada da renda, ao longo do ano de 2016, com a redução da renda dos mais pobres superando a observada para a renda dos mais ricos;
e (iii) na passagem para 2017, há uma reversão da tendência de queda da renda dos mais ricos, não acompanhada do mesmo comportamento para a renda dos mais pobres, resultando em rendimentos, comparando-se o 2º trimestre de 2017 com o 3º de 2015, superiores em 1,3% para os mais ricos e inferiores em 3,4% para os mais pobres.



1     Uma mensuração para a desigualdade dos rendimentos do trabalho até o final de 2016, também utilizado dados da PNADC, pode ser encontrada em Hoffmann, R. (2017), Distribuição da renda na crise: dados trimestrais de 2012 a 2016, Texto para Discussão IEPE/Casa das Garças, 39.
2     Medeiros, M.; Souza, P. H. G. F.; Castro, F. A. (2015), O topo da distribuição de renda no Brasil: primeiras estimativas com dados tributários e comparação com pesquisas domiciliares (2006-2012), Dados, 58(1): 7-36.
        Medeiros, M.; Souza, P. H. G. F. (2016), A estabilidade da desigualdade no Brasil entre 2006 e 2012: resultados adicionais, Pesquisa e Planejamento Econômico, 46(3): 7-31.
        Gobetti, S.; Orair, R. O. (2015), Distribuição e tributação da renda no Brasil, In: 43º Encontro Nacional de Economia da Anpec.
        Morgan, M. (2017), Extreme and persistent inequality: new evidence for Brazil combining national accounts, surveys and fiscal data, 2001-2015. WID.world working paper series, 2017/12.
3     A delimitação entre os relativamente ricos e relativamente pobres leva em conta o nível de renda acima (abaixo) do qual um incremento de renda implicaria aumento (redução) da desigualdade. Vale ressaltar que esse limite é extremamente baixo para o Brasil, equivalendo a uma renda per capita de 1250 reais para o 2º trimestre de 2017. Sobre essa delimitação, ver Hoffmann, R. (2001), Effect of the rise of a person’s income on inequality, Brazilian Review of Eonometrics, 21(2): 237-262; e Hoffmann, R. (2006), Queda da desigualdade da distribuição de renda no Brasil, de 1995 a 2005, e delimitação dos relativamente ricos em 2005, In: Barros, R. P.; Foguel, M. N.; Ulyssea, G. (orgs.). Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente, v. 1. Brasília: Ipea.
*Fabrício Pitombo Leite é professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)