domingo, 31 de agosto de 2014



ustiça

FHC, Gilmar Mendes e a tentativa de salvar Arruda

Nunca antes na história deste País um caso de corrupção foi tão fartamente documentado e provado como o contra José Roberto Arruda, o que o enquadra na Lei da Ficha Limpa.
por Redação — publicado 31/08/2014 09:36
Arte: CartaCapital
Arruda, FHC e Gilmar Mendes
Mendes: o TSE é um tribunal nazista. Pausa para as risadas
O ministro Gilmar Mendes é coerente até nas suas incoerências. Nunca fez questão de esconder sua atuação partidária e a partir dela adapta suas posições jurídicas e morais. Às vésperas do julgamento do chamado “mensalão do PT”, Mendes denunciou o que seria uma tentativa de o ex-presidente Lula interferir no processo. Segundo o ministro, Lula, em uma reunião no escritório de Nelson Jobim em Brasília, perguntou sobre o caso. Mendes interpretou a abordagem como uma ação para constrangê-lo.
O que foi descrito como um crime de Lula virou uma atitude normal, republicana até, de Fernando Henrique Cardoso, responsável pela nomeação de Mendes ao Supremo Tribunal Federal (STF). FHC procurou o ministro para assuntar sobre o julgamento de José Roberto Arruda, ex-governador do Distrito Federal, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Não só: de acordo com o próprio Arruda, o ex-presidente tucano tentava impedir que o TSE mantivesse a decisão de negar o registro de sua candidatura. Nada demais, concluiu o magistrado.
No julgamento do “mensalão” do PT, Mendes manifestou uma indignação patriótica, embora a falta de provas tenha levado a Corte Suprema a recorrer à tese do domínio do fato para condenar o ex-ministro José Dirceu. E transformado os pagamentos comprovados de serviços da Visanet, uma empresa privada, em prova de desvio de dinheiro público. O ministro vociferou contra a corrupção e os corruptos. E negou excessos do tribunal apontados por inúmeros advogados e juristas.
E Arruda? Nunca antes na história deste País um caso de corrupção foi tão fartamente documentado e provado. Vídeos mostram o ex-governador feliz ao receber volumosos maços de notas. Em outras cenas, secretários de governo e deputados aliados empurram pacotes de dinheiro para o interior de bolsas, meias e cuecas. Arruda viu-se obrigado a renunciar e acabou condenado por improbidade administrativa, o que o enquadra na Lei da Ficha Limpa.
Por essa razão, o Tribunal Regional Eleitoral impugnou a candidatura. O TSE manteve a decisão por 6 votos a 1. Quem divergiu? Mendes. Apesar de todas as provas contra Arruda, o ministro considerou o desfecho típico de um “tribunal nazista” (ele adora frases de efeito).
O norte jurídico de Mendes: aos amigos, tudo...

Eleições 2014

Direitos LGBT: "Marina, você brincou com a esperança de milhões de pessoas"

Jean Wyllys, que havia elogiado a primeira versão do programa de governo, critica a candidatada por ceder a pressão de evangélicos fundamentalistas
por Jean Wyllys — publicado 30/08/2014 14:48, última modificação 30/08/2014 16:06
Filipe Redondo/Band
Em "nota de esclarecimento", Marina Silva desmente seu próprio programa de governo e afirma que não apoia o casamento civil igualitário, mas uma lei segregacionista de "união civil". Vocês já imaginaram um candidato presidencial dizendo que é contra o direito dos negros ao casamento civil, mas apoiaria uma "lei de união de negros"? A nova política da Marina é tão velha que lembra os argumentos dos racistas americanos de meados do século XX. Contudo, o pior é que ela brincou com as esperanças de milhões de pessoas! E isso é cruel, Marina!
Bastaram quatro tuítes do pastor Malafaia para que, em apenas 24 horas, a candidata se esquecesse dos compromissos de ontem, anunciados em um ato público transmitido por televisão, e desmentisse seu próprio programa de governo, impresso em cores e divulgado pelas redes.
Marina também retirou do programa o compromisso com a aprovação da lei João Nery, a elaboração de materiais didáticos sobre diversidade sexual e outras propostas. Só deixou frases bonitas, mas deletou todas as propostas realmente importantes. E ela ainda nem se elegeu! O que esperar então dela se eleita presidenta quando a bancada fundamentalista, a bancada ruralista e outros grupos de pressão começarem a condicionar o apoio a seu governo? Tem políticos que renunciam a seus compromissos de campanha e descumprem suas promessas depois de eleitos. Marina já fez isso mais de um mês antes do primeiro turno. Que medo!
Como todos sabem, minha candidata presidencial é Luciana Genro. Ela SEMPRE defendeu todos os direitos da comunidade LGBT e foi a primeira candidata na história do Brasil que teve a coragem de pautar esses temas no debate presidencial da Band. Contudo, na sexta-feira, 29, quando consultado pela imprensa, apesar da minha desconfiança com relação à Marina, elogiei o programa apresentado pelo PSB (apenas no que dizia respeito aos direitos da população LGBT,  já que discordo profundamente de muitas outras propostas neoliberais e regressivas nele contidas). Fiz isso porque acho que os posicionamentos corretos devem ser reconhecidos, mesmo que provenham de um(a) adversário(a).
É com essa autoridade, de quem agiu de boa fé,  que agora digo: Marina, você não merece a confiança do povo brasileiro! Você mentiu a todos nós e brincou com a esperança de milhões de pessoas.

GT DA

Talvez nesta semana, ocorra uma importante reunião do GT de desertificação sobre a questão das sementes nativas, com a presença de Luciano da ASPTA, com uma especie de historico sobre todo o trabalho realizado na paraíba.
Estamos tentando reanimar este GT, pois temos muitas coisas para tratar, tipo: levantamento dos/as guardiões/ães das sementes nativas; situação dos bancos de semente e viveiros de muda financiados pela PETROBRÁS.

sábado, 30 de agosto de 2014

DYLAN

A quanto tempo não escutamos um som de dylan, será que perdemos todo o gosto de apuramento pela boa música? será que o lixo musical tomou todos os espaços de: rádio, show, apresentação em publico, parece que o gosto pela boa música sumiu do nosso repertório, ficaram os lixos e um principio de mediocridade musical de gosto. E é porque não somos medievais.

Pacino é dose... dupla

O ator acostumado a ser ele mesmo apresenta dois bons trabalhos, embora um possa anular o outro, em programa que também inclui diretor pouco inspirado com elenco estelar
por Orlando Margarido — publicado 30/08/2014 13:45
Al Pacino é.. Al Pacino. Quem viu seus últimos papéis no cinema sabe que ele se tornou uma espécie de caricatura de si mesmo. É da sua geração, ao menos parte dela, ter buscado a renovação ou ter se acomodado, e ele e De Niro, por exemplo, preferiram a segunda via. Há exceção, que mesmo Veneza mostrou há dois anos com a Salomé de Oscar Wilde, dirigido pelo ator e com ele no papel de Herodes. Antes Pacino também interpretou um bom Mercador de Veneza. Outra representação sua de Shakespeare comparece agora, mas embutida no filme de Barry Levinson, The Humbling. Não conheço o livro de Philip Roth, que saiu no Brasil como A Humilhação, e serve de inspiração aberta ao diretor. Digo aberta porque difícil imaginar o tom cômico, divertido e não ironico como costuma ser com este escritor, com que trata a história de ator em crise (Pacino claro) que tem um apagão no palco, machuca a coluna, e se recusa a voltar a carreira, isolando se no interior de Nova York. Isso até que encontra uma jovem com idade para ser sua filha (Greta Gerwig) e se envolve com ela, antes lésbica, num relacionamento que o tira da rota do suicídio e o devolve ao palco numa montagem de Rei Lear. A diferença de idade, as questões de sexualidade que se interpõem entre o casal geram situações de limite hilárias. Pacino está ótimo, mas não sem os trejeitos um tanto recorrentes de quem há quase duas décadas fez um Ricardo III memorável no pressuposto da deficiência física. Vale lembrar ainda que a trilha sonora, que gosto clássico, com variáveis do Bolero de Ravel, por exemplo, é de Marcelo Zarvos, brasileiro radicado nos Estados Unidos.
Acontece que ao filme de Levinson, fora da competição, veio se juntar nesta manhã Manglehorn, este sim da seção competitiva, com direção de David Gordon Green. E mais Pacino!  Há aproximações possíveis entre o ator decaído e o chaveiro que escreve cartas com obsessão a uma mulher por quem foi apaixonado no passado e perdeu a grande chance. Enquanto vê as cartas serem devolvidas uma a uma, com endereço não encontrado, toca mal sua solidão dedicando se a uma gata, tendo encontros ríspidos com o único filho e sendo rude com quem tenta se aproximar, como a atendente do banco (Holly Hunter). Aqui também a debacle física se apresenta, um pouco menos, e a vontade de se aproximar da morte é igualmente presente. Curioso aproximar os dois personagens, no entanto, pelo que os distingue. O premiado intérprete se dá conta que não é, afinal, um ser tão superior como o ofício muitas vezes leva a crer. Seu suposto respeito conquistado não o protege mais. No caso do homem mais ordinário, como prefere Gordon Green em seu cinema, o complicador está em conseguir lidar com a humanidade, já que com os animais, relatam alguns personagens, ele sempre teve uma magia especial. Há um toque do fantástico que agradava Green em Prince Avalance e Joe, o primeiro premiado em Berlim, o segundo também concorrente aqui no ano passado. Em ambos os filmes temos uma performance digna de Pacino. Mas se é difícil conte-lo em duas entrevistas no mesmo dia, quando tomou do microfone em longas explanações sobre carreira, Actors Studio, o quanto detesta usar da palavra depressão, pode-se imaginar o desafio de buscar um registro mais original, fora do automático, de interpretação. Assim funciona, mas poderia ser melhor.
Por outro lado, vimos por aqui esta manhã o que pode ser uma direção pouco inspirada, se tanto correta, num desperdício grave de elenco. Benoit Jacquot pode se considerar um realizador de grande sorte por reunir um elenco feminino com Catherine Deneuve, sua filha Chiara Mastroianni, e uma vedete do cinema cult do momento, Charlotte Gainsbourg, aqui também pela exibição do projeto completo de Lars Von Trier, Ninfomaníaca. Essas mulheres, em especial as duas jovens, gravitam em torno do protagonista masculino Benoit Poelvoorde, também no filme Le Rançon de la Gloire, um fiscal de tributos que se envolve ao acaso numa cidade da Provença com a personagem de Charlotte. Marcam um rendezvous em Paris para selar o comprometimento, mas ele, cardíaco, tem um colapso e não chega a tempo. Charlotte segue com o noivo para os Estados Unidos, e isso será a deixa para em outro acaso o fiscal conhecer a irmã daquela, papel de Chiara. O drama um tanto flácido, sem tempero, e por demais imaturo para tais personagens adultos, não escorrega de todo, até mesmo em parte pela personagem pequena, mas ao menos de sutilezas, de Deneuve, a mãe das jovens que trata da cozinha como um modo de saber o que se passa em volta. Filme banal para uma competição, que ainda não apresentou uma aposta segura para o final.

O jeito de ensinar

Fico pensando no drama daqueles meus velhos mestres, olhando uma horda selvagem como éramos nós (eu não!) aprontando sem parar
//Por Braulio Tavares
Quando fiz o ginásio, que é mais ou menos o que se chama hoje de 2º grau, a primeira coisa que me fascinou foi o fato de haver um professor para cada matéria. Antes disso, no curso primário (entre os 7 e os 10 anos, mais ou menos) era uma professora, sempre uma mulher, que cuidava da turma do primeiro ao último dia de aula. No 1º ano do ginásio, já não era mais assim: surgiram o professor de Matemática, a professora de Geografia, o professor de Ciências, a professora de História... Por alguma razão isso me pareceu uma coisa boa. Em cada assunto tinha alguém capaz de explicar especificamente aquilo. O mundo ficou mais nítido. Entre os mil prismas da vida, aqueles ali, polidos dia após dia, foram se tornando cada vez mais visíveis, mais diferenciados.
 
Fico pensando hoje no drama daqueles meus velhos mestres, olhando uma horda selvagem como éramos nós (eu não!) – uma galé de meliantes, um ateneu de doidinhos, aprontando sem parar. No tempo em que fiz o ginásio as turmas não tinham a mesma faixa etária, como hoje. Estudei em muitas classes que eram dominadas por grupos de alunos com 18 ou 20 anos, enquanto três quartos da turma (eu, entre eles) tinham 11 ou 12 anos.  Os mais velhos eram mais fortes, mais espertos, mais vividos. Sentavam na “carteira” ao lado da nossa, e tanto podiam se tornar amigos e protetores como podiam virar perseguidores sem quartel. 
 
Do ponto de vista de alguns dos professores (só percebo isso agora!) a tarefa consistia em ensinar os mais novos sem permitir que os mais velhos desviassem a nau da disciplina rumo aos rochedos da baderna. O que aprendíamos era quase um efeito colateral das polêmicas intermináveis contra o barulho de A ou a bagunça de B.  
 
Como eles conseguiam ensinar? Não sei. Tem professor que apela para a magia do “agora eu vou contar uma história”, e funciona. Tem professor que diz: “De agora em diante, atenção, tudo cai na prova”, e funciona. Tem professor que faz teatro, faz retórica, faz psicodrama, mas consegue passar em uma hora uma ideia do que foi a descoberta da América ou a Segunda Guerra Mundial, e funciona. Tem professor que cumpre a missão mais impossível no tempo mais precário e nas condições mais hostis, mas não pode subir a nenhum pódio porque não tinha máquina nenhuma acompanhando, entidade nenhuma registrando, patrocinador nenhum investindo para mostrar do que ele é capaz.
 
Publicado na edição 60, de agosto de 2014 

A Irmandade

Cerco à 'Máfia dos Transplantes' atinge deputado do PSDB

Justiça de Minas Gerais pede investigação de deputado Carlos Mosconi por suposta participação na quadrilha acusada de operar uma central clandestina de órgãos
por Renan Truffi — publicado 21/07/2014 04:25, última modificação 21/07/2014 19:26
Pedro Presotto
Santa Casa de Poços de Caldas
Médicos acusados de envolvimento no tráfico de órgãos trabalhavam na Santa Casa de Poços de Caldas (MG)
“São pessoas de bem e bons profissionais”, escreveu o médico e deputado estadual Carlos Mosconi (PSDB-MG) no Facebook, no último dia 7 de fevereiro, sobre seus colegas de profissão: Celso Scafi, Cláudio Fernandes e Sérgio Gaspar. Na mesma data em que ele postou a mensagem os três foram condenados à prisão pela Justiça de Minas Gerais. Os médicos retiraram os órgãos de um menino de 10 anos quando ele ainda estava vivo, em Poços de Caldas (MG), em abril de 2000. Segundo a Justiça mineira, a intenção dos réus era vender rins e córneas do garoto, em mais uma ação da ‘Máfia dos Transplantes’.
A solidariedade do deputado em seu perfil na rede social é só mais um indício da estreita ligação entre ele e os condenados. Mas somente agora, após 14 anos da divulgação do caso, a relação poderá ser esclarecida. Além de determinar a pena dos colegas de Mosconi, a sentença do juiz da 1ª Vara Criminal de Poços de Caldas, Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, determina que o deputado seja investigado o mais rápido possível por suas “supostas atividades ilícitas” ao lado dos réus. O escândalo foi divulgado por CartaCapital em três reportagens. Outro médico também citado nos processos, o nefrologista, Álvaro Ianhez, será levado a júri no próximo dia 31 de julho.
Há 14 anos, o menino Paulo Veronesi Pavesi, de 10 anos, deu entrada no Hospital Pedro Sanches, em Poços de Caldas, depois de cair de uma altura de 10 metros no playground de seu prédio. O garoto estava consciente e conversava, mas apresentava traumatismo craniano e teve que passar por uma cirurgia. No dia seguinte, o pai da criança, Paulo Pavesi, foi informado da morte do filho e da possibilidade de doar os órgãos. Ele autorizou a retirada.
Algum tempo depois, Pavesi recebeu uma conta de R$ 11 mil do hospital. A cobrança incluía, entre outras coisas, os gastos com o transplante feito no garoto. Intrigado, ele resolveu pesquisar e descobriu que a operação para retirada de órgãos é feita com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) e, portanto, não pode ser cobrada. O pai denunciou o hospital, então, ao programa Fantástico, da TV Globo. A reportagem levou o então ministro da Saúde José Serra (PSDB-SP) a pedir uma auditoria na unidade. O que se descobriu foi que a irregularidade era apenas parte de um esquema de venda de órgãos gerenciada por uma central clandestina, a MG Sul Transplantes. A central estava registrada como uma ONG e usava um nome similar ao do órgão estadual responsável por este tipo de procedimento, a MG Transplante.
O menino Paulinho foi atendido pelo médico nefrologista Álvaro Ianhez, coordenador do setor de transplantes do hospital e, ao mesmo tempo, um dos fundadores da ONG MG Sul Transplantes. Com a ajuda de Celso Scafi, Cláudio Fernandes e Sérgio Gaspar, Ianhez decretou a morte encefálica do garoto quando ele ainda estava sedado. O único exame feito pela equipe, contudo, atestou que não havia morte cerebral. Nada disso impediu que os médicos prosseguissem com a retirada dos órgãos.
A reportagem de CartaCapital teve acesso à integra da sentença do juiz Narciso Alvarenga. De acordo com o magistrado, as investigações revelaram outros oito casos semelhantes. “Tudo corria bem, achavam que era mais um paciente pobre, de família com baixa instrução, e ainda era feriado. Até que tentaram cobrar também pelo transplante, a ganância foi muita. A partir daí se descobriu um verdadeiro filme de horror”, resumiu Alvarenga.
E foi a apuração dessas denúncias que colocou em evidência o nome do deputado Mosconi. Na última sentença, ele é citado 70 vezes. Entre os indícios apontados pelo juiz do que seria sua participação no esquema estão provas que mostram que o tucano é um dos fundadores da MG Sul Transplantes, a ONG clandestina apontada como a agenciadora dos órgãos.
“Os órgãos não foram distribuídos pela CNCDO (Central de Notificação e Captação de Órgãos), a MG Transplantes, e sim pela central clandestina MG Sul Transplantes, coordenada por Álvaro Ianhez e idealizada por Carlos Mosconi”, conclui o juiz na sentença.
A prova de que ambos foram os criadores da instituição é um texto no Jornal Brasileiro dos Transplantes, que noticia a fundação da ONG. O documento que formaliza a criação e foi publicado pelo jornal é assinado por Mosconi e alguns dos médicos condenados, como Celso Scafi e Cláudio Rogério. “Tal entidade manipulava uma lista própria de receptores, interestadual, juntamente com outra entidade, a Pro Rim”. Ainda segundo o texto judicial a Pro Rim era dirigida por Lourival Batista, conhecido por ser o primeiro transplantado de Poços de Caldas. E quem fez a cirurgia em Batista? Justamente Carlos Mosconi.
“A Pro Rim gerenciava uma lista própria de receptores de órgãos. Sendo que a lei fala que tem que ser uma lista única, municipal, estadual ou nacional. Essa lista era interestadual, e tinha pacientes de cidades vizinhas, no estado de são Paulo. São irregularidades e ilegalidades sérias”, explica o juiz.
O pedido de investigação do tucano também se baseia em um depoimento do pai do menino Paulinho. No último mês de junho, a Justiça brasileira solicitou que Paulo Pavesi fosse ouvido por autoridades inglesas, pois o gerente de sistemas vive hoje em Londres sob proteção policial, após receber ameaças.
“As investigações feitas por autoridades brasileiras descobriram dezenas de crimes, em diversos casos semelhantes ao do meu filho. Em geral, os pacientes tiveram seus tratamentos terapêuticos suspensos ou negligenciados propositalmente e foram empurrados para a morte a fim de fornecer órgãos para transplantes. Álvaro Ianhez criou uma rede de captação e distribuição de órgãos completamente clandestina, com o auxílio e proteção política de Carlos Mosconi. [...]. Carlos Mosconi possui o controle política da cidade. Ele comanda a polícia, o Ministério Público, os órgãos de fiscalização municipal e até estadual”, afirmou Pavesi, em depoimento às autoridades inglesas.
O deputado tucano teria usado, por exemplo, sua influência para desaparecer com provas. O delegado Célio Jacinto, responsável pelas investigações da PF, revelou na época a existência de uma carta do parlamentar na qual ele solicita ao amigo Ianhez o fornecimento de um rim para atender ao pedido do prefeito de Campanha (MG). A carta, segundo o delegado, foi apreendida entre os documentos de Ianhez, mas desapareceu misteriosamente do inquérito sob custódia do Ministério Público Estadual de Minas Gerais.
Episódios como este levaram a Justiça e o Ministério Público a classificarem o esquema como uma “máfia”. Cerca de dois anos depois da morte do menino Paulinho, o diretor da Santa Casa de Misericórdia de Poços de Caldas, Claudio Marcondes, foi encontrado morto dentro do próprio carro com um tiro na boca. Com base em depoimentos que constam nos autos, o juiz afirma que Marcondes teria gravações de conversas comprometedoras dos médicos envolvidos no tráfico de órgãos.
A arma encontrada no local nunca foi periciada e sumiu. Além disso, as mãos de Marcondes foram lavadas, raspadas e enfaixadas, o que impossibilitou qualquer exame para saber se foi ele mesmo quem atirou contra si próprio. Segundo a Justiça, o carro da vítima ainda foi lavado duas vezes por Sérgio Roberto Lopes. Ex-PM, “Serjão” fecha o círculo em torno de Mosconi. Segundo o juiz Narciso Alvarenga, Sérgio era advogado da Santa Casa e foi levado para a política pelo deputado tucano. Ele seria ainda o responsável pelo estatuto da Pro Rim, a entidade parceira da MG Sul Transplantes.
A sentença ainda alerta para a possibilidade de que o deputado esteja por trás de outros negócios escusos. Uma das maiores fornecedoras de equipamentos hospitalares da Santa Casa de Poços é a empresa Mantiqueira Distribuidora de Produtos Hospitalares. A companhia está registrada nos nomes dos filhos de Mosconi, mas ele seria o dono. O deputado destinaria emendas ou recursos para o hospital que, por sua vez, usaria a verba para comprar equipamentos da Mantiqueira.
Se for mesmo investigado, Mosconi terá de conciliar sua defesa com mais uma campanha eleitoral. Ele é candidato a deputado federal pelo PSDB.
Outro lado
Os advogados de todos os acusados citados na reportagem negam que a MG Sul Transplantes tenha sido uma central clandestina. Eles se baseiam em uma decisão da Justiça Federal que desmente a existência tanto da “máfia” como afirma ainda que a ONG estava regularizada nos devidos órgãos.
Em entrevista à reportagem, o deputado estadual Carlos Mosconi também afirmou que nunca participou de nenhum esquema de tráfico de órgãos. Na opinião dele, os médicos estão sendo injustiçados. “Eu não tenho nenhum envolvimento nessa história. Tem uma denúncia caluniosa feita pelo pai da criança, pelo Pavesi, que sempre teve um grande ódio em relação a minha pessoa”, afirma. Ele explica que entrou com várias representações na Justiça contra o juiz Narciso Alvarenga Monteiro de Castro por conta de sua atuação e classifica as denúncias como “políticas”, ao citar que o caso também foi divulgado em blog do PT.
Sobre as denúncias relacionadas à empresa Mantiqueira, o tucano confirma que a companhia é de um de seus filhos, mas diz que não sabe com quais hospitais ele tem negócios. “Vendem para o Brasil inteiro. Meu filho é empresário”, se defende. Ele garante, no entanto, que na época em que a Santa Casa recebeu um empréstimo para quitar dívidas, a empresa Mantiqueira não tinha negócios com a unidade de saúde.
O defensor de Álvaro Ianhez, Leonardo Bandeira, nega que ele tenha participado, tanto do diagnóstico como do transplante do menino Paulinho. Bandeira também defende o médico João Alberto Góes, que é réu em outros casos relacionados à suposta máfia, mas critica a sentença do juiz por afirmar a existência do esquema de tráfico de órgãos. O advogado dos médicos Celso Scafi e Cláudio Fernandes, José Arthur Kalil, desmente a informação de que a criança não teria tido morte cerebral. Segundo ele, o exame confirmou que a criança teve morte encefálica. Ele ainda explica que seus clientes fizeram todos os exames.