quarta-feira, 31 de agosto de 2022

POR QUE TANTA RAIVA DAS MULHERES?


No último debate presidencial, a candidata Simone Tebet perguntou a Bolsonaro: “Por que tanta raiva das mulheres?”

A resposta é simples: porque Bolsonaro odeia a democracia. Por mais que as mulheres brasileiras, e seus direitos, estejam sendo atacadas e ameaçadas, é preciso mais do que nunca reconhecer os seus esforços de resistência. É nelas que está a saída do Bolsonarismo.

Estudiosos da democracia muitas vezes enquadraram o empoderamento das mulheres como resultado da democratização ou mesmo como função da modernização e do desenvolvimento econômico. No entanto, como afirmam Chenoweth e Marks, as mulheres exigiram inclusão e lutaram por sua própria representação e interesses por meio de movimentos contenciosos de sufrágio e campanhas de direitos que, em última análise, fortaleceram a democracia em geral.

Alguns, como o movimento pró-democracia do Brasil em meados da década de 1980, tiveram ampla participação feminina: pelo menos metade dos participantes da linha de frente eram mulheres. Atualmente, as mulheres são 52,7% do eleitorado brasileiro e assim podem ser decisivas na derrota não só do Jair Bolsonaro mas na derrota do bolsonarismo como um todo.

Se a história servir de guia, as estratégias autoritárias falharão a longo prazo. Como explicam Chenoweth e Marks, as feministas sempre encontraram maneiras de exigir e expandir os direitos e liberdades das mulheres, potencializando o avanço democrático no processo.

Mas, no curto prazo, autoritários patriarcais descontrolados podem causar grandes danos, apagando conquistas que levaram gerações para serem alcançadas.

Colaboraram Natalia Viana, Yasodara Cordova e Laura Scofield

FAKES PARA DEMONSTRAR APOIO FEMININO

 por: David Nemer - Sentinela Eleitoral
O Bolsonarismo também usa as redes para demonstrar de forma artificial que as mulheres o apoiam. No dia seguinte ao debate presidencial (29/08), as hashtags #SouMulherEVotoBolsonaro e #MulheresComBolsonaro foram parar nos assuntos mais comentados do Twitter (Trending Topics).

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Porém, como apontado pela ferramenta Hoaxy, as duas hashtags tiveram uma forte participação de contas que se assemelha com comportamentos de robôs e contas inautênticas. Em torno de 25% das contas tweetando com as hashtags eram inautênticas, ajudando as hashtags a chegar nos Trending Topics do Twitter.

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(#SouMulherEVotoBolsonaro)
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(#MulheresComBolsonaro)
Na visão do autoritário patriarcal, os homens não são homens de verdade, a menos que tenham controle sobre as mulheres em suas vidas. Bolsonaro, após ter o apoio incondicional da deputada Joice Hasselman, ao sentir que ela seria uma ameaça à sua liderança, cortou relações e, junto com a sua base, focou em atacá-la com mensagens e memes misóginos com referências à sua condição física. Diversas vezes em que Carla Zambelli se manifestou em coletivas com Bolsonaro, foi avisada para ficar quieta. Bolsonaro também demonstra controle sobre a primeira dama, Michelle, ao fazer insinuações sobre a vida sexual do casal.

Por que tanta raiva das mulheres?

HISTÓRICO DE MISOGENIA

por: David Nemer - Sentinela Eleitoral
Jair Bolsonaro tem um histórico de falas machistas e de ataques às mulheres.

Em 1998, quando era deputado federal, Bolsonaro agrediu pelas costas Conceição Aparecida Aguiar, na época gerente da Planajur, empresa de consultoria jurídica e que atendia ao Exército;
Em 2011, Bolsonaro atacou Preta Gil quando ela o perguntou como ele reagiria se algum de seus filhos se envolvesse com uma mulher negra. “Eu não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Eu não corro esse risco. Meus filhos foram muito bem educados e não viveram em um ambiente como, lamentavelmente, é o seu”, respondeu;
Em 2012, Bolsonaro votou contra a PEC das Domésticas que visava lhes assegurar direitos trabalhistas;
Em 2014, disse que não estupraria a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) porque ela não merecia. Bolsonaro também já afirmou que mulheres que decidem ser mães deveriam ganhar menos e, caso não estejam contentes, que busquem outro emprego;
Em 2016, durante o impeachment de Dilma, ele celebrou um torturador que inseriu baratas nas vaginas de mulheres, para mostrar que ele era “o terror”;
Em 2017, Bolsonaro afirmou que a sua única filha “veio uma mulher” porque ele deu “uma fraquejada”;
Em 2019, Bolsonaro em uma fala sexista e homofóbica, afirmou que o Brasil não poderia ser um país de turismo gay, mas que “quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher fique à vontade”.
Por outro lado, Bolsonaro ataca constantemente a imprensa, um dos pilares da democracia, porém não é de se surpreender que jornalistas mulheres são o seu alvo preferido.

Em 2018, ao se pronunciar sobre um furo de reportagem da jornalista da Folha Patrícia Campos Mello, que revelou a contratação de disparos em massa com fake news na campanha de 2018, Bolsonaro disse que ela ” queria dar um furo a qualquer preço contra mim”. A declaração, com os tweets do seu filho Eduardo Bolsonaro amplificaram os ataques misóginos que já estavam acontecendo no Twitter e em grupos de WhatsApp.

No seu artigo, Chenoweth e Marks afirmam que, apesar da flagrante misoginia, autoritários e autocratas conseguem recrutar mulheres como protagonistas de seus movimentos políticos, como é o caso da Damares Alves e da primeira dama, Michelle Bolsonaro.

Damares Alves promove discursos em que valoriza a maternidade e a família tradicional para obscurecer políticas desiguais de gênero. Já a Michelle Bolsonaro tem sido instrumental para tentar diminuir a rejeição do seu marido no eleitorado feminino — ela tem participado de comícios e convenções partidárias para promover a percepção que Bolsonaro se importa com as mulheres, ela chegou a afirmar que ele “sancionou 70 novas leis de proteção à mulher”.

Porém, Bolsonaro sancionou 46 projetos, nenhum de autoria do seu governo, e vetou seis propostas que beneficiavam diretamente as mulheres, incluindo o trecho de uma lei que distribuiria absorventes de forma gratuita para pessoas em vulnerabilidade social.

MISOGENIA COMO PROJETO AUTORITÁRIO

 por: David Namer - Sentinela eleitoral
O Bolsonarismo tende a aumentar seus ataques quando o alvo é mulher. Outro exemplo é a postura das redes de apoio ao presidente sobre a cantora Anitta.

Ultimamente, devido ao posicionamento político da cantora, que declarou voto em Lula, os grupos bolsonaristas no Telegram têm se ocupado a deslegitimar o poder e a influência de Anitta, assim, como manchar a sua reputação. Desde o início de 2022, nos mesmos grupos bolsonaristas no Telegram monitorados pelo Sentinela Eleitoral, já foram proferidos mais de 1520 mensagens com tons misóginos e sexistas contra Anitta.

Durante o século 20, mulheres se organizaram e conquistaram diversos direitos ao redor do mundo, como o de votar, o acesso aos cuidados de saúde reprodutiva, inserção social, educação, entre outros. A jornada para a conquista da igualdade de gênero parecia não ter volta. Porém, nos últimos anos, a ascensão de líderes autoritários em diversos países – apoiados em estratégias de desinformação online – não só comprometeu a democracia, mas promoveu sérios retrocessos aos direitos das mulheres.

Segundo as pesquisadoras de Harvard Erica Chenoweth e Zoe Marks descreveram no artigo “A vingança dos Patriarcas – Por que os autocratas temem as mulheres” (aqui, em inglês), não é coincidência que a igualdade das mulheres esteja sendo revertida ao mesmo tempo em que o autoritarismo está em ascensão. Os direitos civis das mulheres e a democracia andam de mãos dadas, porém há uma geral dificuldade em reconhecer que o primeiro é uma pré-condição para o segundo.

De acordo com as pesquisadoras, autocratas e autoritários patriarcais têm boas razões para temer a participação política das mulheres: quando as mulheres participam de movimentos de massa, esses movimentos são mais propensos a ter sucesso e mais propensos a levar a uma democracia mais igualitária. Em outras palavras, mulheres totalmente livres e politicamente ativas são uma ameaça para líderes autoritários e de tendência autoritária – e, portanto, esses líderes têm uma razão estratégica para serem sexistas. Compreender a relação entre sexismo e retrocesso democrático é vital para aqueles que desejam lutar contra ambos.

Assim, nessa coluna, vale a pena dissecar pontos traduzidos do artigo de Erica Chenoweth e Zoe Marks para demonstrar como o bolsonarismo e seu líder Jair Bolsonaro atacam as mulheres como um meio para desmantelar a democracia brasileira.

CASO VERA MAGALHÃES: BOLSONARO ODEIA AS MULHERES PORQUE ODEIA A DEMOCRACIA

 Caso Vera Magalhães: Bolsonaro odeia as mulheres porque odeia a democracia
Segundo pesquisadoras de Harvard, mulheres totalmente livres e politicamente ativas são uma ameaça para líderes autoritários

30 de agosto de 2022
12:00
Ataques de Jair Bolsonaro à jornalista da TV foram complementados por campanha de assédio online no Twitter e Telegram
Robôs foram usados para inflar apoio feminino ao presidente
Relembramos o histórico de ataques às mulheres de Jair Bolsonaro
desinformação
eleição
Eleições 2022
Fake news
Jair Bolsonaro
machismo
Vera Magalhães
No último debate presidencial, no domingo (28/08), ao ser questionado pela jornalista Vera Magalhães sobre a queda da cobertura vacinal e desinformação difundida por ele, o presidente Jair Bolsonaro (PL), em mais uma demonstração de misoginia, respondeu: “Vera, não pude esperar outra coisa de você. Acho que você dorme pensando em mim. Você tem alguma paixão em mim. Não pode tomar partido num debate como esse. Fazer acusações mentirosas a meu respeito. Você é uma vergonha para o jornalismo brasileiro”.

Reprodução Redes Sociais
Ataque do presidente à jornalista aconteceu no último debate presidencial (28)
O ataque de Jair Bolsonaro em rede nacional foi o suficiente para que a sua base no Twitter e no Telegram dobrasse a aposta.

Nos 121 grupos bolsonaristas no Telegram que monitoramos no Sentinela Eleitoral, as menções negativas e ataques a Magalhães bateram recorde na segunda-feira (29/08), chegando a 90 mensagens. Nos últimos 30 dias, a jornalista havia sido mencionada apenas em 4 dias, entre 1 e 2 vezes por dia.

No Twitter, como mostra a coleta de tweets do projeto Nós e Conexões, os ataques também foram amplificados pela base Bolsonarista. A maioria dos trigramas – combinação das três palavras mais utilizadas em um tweet – mais populares trazia um ataque e/ou ofensa à jornalista.

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A maioria dos posts orgânicos mais retweetados pela base bolsonarista também amplificou os ataques proferidos por Jair Bolsonaro no debate.

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Na tarde de segunda-feira, o termo difamatório “Verba Magalães”, uma referência ao salário da jornalista na Tv Cultura, chegou aos Trending Topics do Twitter.

Porém Vera Magalhães não estava só. Uma corrente liderada por mulheres ocupou o Twitter para demonstrar o apoio e solidariedade à jornalista. As contas mais relevantes foram da Fátima Bernardes (@fbbreal), Simone Tebet (@simonetebetbr), Andreia Sadi (@andreiasadi), Natuza Nery (@natuzanery), Patrícia Campos Mello (@camposmello), e Miriam Leitão (@miriamleitao).

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O grafo acima mostra a análise de 54.090 contas e 192.712 conexões que mencionaram Vera Magalhães. O cluster verde é formado por veículos de imprensa e a base bolsonarista. Já o resto é formado por contas que a apoiaram — o que mostra que o apoio foi liderado por mulheres e foi, no final, maior que os ataques.

Seja aliado da Pública

Investigar as ameaças à democracia é nossa forma de protegê-la.
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Já o grafo abaixo ilustra os posts no Twitter com termos relacionados ao debate político eleitoral em geral, não necessariamente focados em Vera Magalhães. O grafo mostra que o ataque de Jair Bolsonaro à jornalista marcou não só o debate entre os candidatos, mas também pautou as conversas no Twitter.

No cluster azul à direita, temos a base bolsonarista a atacando. Já o cluster verde à esquerda, e todos os outros clusters, democratas e progressistas a apoiando. A conta de Vera Magalhães fica à centro direita.



terça-feira, 30 de agosto de 2022

 

Quase 20% dos jovens norte-americanos fumam cigarro eletrônico

por:outrasaúde

Novo relatório da OPAS reafirma a noção de que os dispositivos eletrônicos de fumar estão revertendo a tendência de queda no tabagismo. Isso acontece em especial com os jovens: nos Estados Unidos, onde o uso é mais disseminado, 19,6% dos adolescentes com idades entre 13 e 15 anos fizeram o uso dos cigarros eletrônicos nos 30 dias anteriores à pesquisa. Se a princípio acreditava-se que esses dispositivos poderiam ser úteis para pessoas que desejam parar de fumar, agora a percepção é de que os riscos são altos. Inclusive pelo fato de que é possível mascarar o mau gosto do cigarro com essências saborizadas. Sua venda é proibida no Brasil, e a interdição foi confirmada pela Anvisa em julho. Mas há estimativas de que o uso no país seja tão disseminado quanto nos EUA.

 

Fitoterápicos para emagrecer não podem ser vendidos pela internet

por:outrasaúde

Uma decisão do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) determinou que seis produtos fitoterápicos devem ter sua publicidade retirada de lojas online e redes sociais, e a venda deve ser interrompida. Mercado Livre, Americanas, Magazine Luiza, OLX, Google, Facebook e Twitter têm 30 dias para identificar e retirar os produtos do ar; as propagandas devem sair em 24 horas. Segundo laudo, esses medicamentos possuem substâncias químicas danosas à saúde, e só podem ser comercializados com receita médica. Mas plataformas digitais aproveitam-se da baixa regulamentação para fazer venda de produtos perigosos. Algo parecido acontece com fórmulas infantis que substituem o aleitamento materno – mas não são recomendadas pela OMS.

 

Varíola dos macacos: o que se sabe sobre o vírus em gestantes

por:outrasaúde

Ainda há muito o que se descobrir sobre a nova varíola que se tornou emergência de saúde pública de importância internacional, segundo a OMS. Seu efeito em mulheres grávidas e puérperas ainda carece de estudos mais aprofundados. No início de agosto, o ministério da Saúde lançou nota técnica de recomendações para esse público. E em entrevista ao Portal Fiocruz, Natalie Del Vecchio, infectologista da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) do IFF/Fiocruz, esclareceu alguns pontos importantes. Algumas das informações principais: o vírus pode atingir o feto; a administração do antiviral só deve ser feita se o caso for grave, pois não há estudos suficientes para verificar os riscos para o bebê; o parto de uma mãe contaminada deve ser feito em isolamento e com proteção aos profissionais de saúde; não se indica cesárea, a não ser que haja ferida genital. Cada caso deve ser acompanhado de perto para que seja feita a avaliação correta. Para se proteger do vírus, recomenda-se às grávidas o uso de máscaras e que busquem atendimento médico caso apareça algum sintoma.

 


Falta de leitos provoca crise no SAMU no Rio

por:outrasaúde

O Rio de Janeiro enfrenta uma crise com as ambulâncias do SAMU, registrou matéria do Brasil de Fato. Ela está sendo causada pelo fechamento de leitos para internação em hospitais federais, que sobrecarregam os estaduais e, com mais intensidade, a rede municipal. As ambulâncias e suas macas estão sendo retidas nos hospitais pois estes não possuem leitos para acolher os pacientes. Em 76% dos casos, os veículos demoram mais de uma hora para sair das unidades de saúde e voltar às ruas para atender à população. Isso atrasa o atendimento a chamados urgentes. Segundo Fernanda Adães, subsecretária geral da secretaria municipal de Saúde do Rio, “hoje temos mais de 600 pessoas internadas com questões de alta complexidade, que historicamente são de competência dos entes estadual e federal. Os pacientes ficam 40, 60 dias nos leitos aguardando o sistema estadual de regulação garantir uma vaga para que possam ser atendidos”.

 

Dengue: mudanças climáticas fazem doença circular o ano inteiro

por:outrasaúse

Estamos vivendo uma crise grave de dengue no Brasil, em especial em São Paulo. Se até recentemente o período de maior incidência acontecia entre novembro e maio, agora o mosquito sobrevive e contamina pessoas mesmo no período mais frio. Os números de 2022 já são preocupantes, por ultrapassarem o total de casos e mortes do ano passado. Até junho, foram confirmadas 585 mortes e quase 1,2 milhão de casos – ambos os números são mais que o dobro do registrado em 2021. E o clima é um grande responsável por isso: o Sul e o Sudeste estão enfrentando invernos chuvosos e quentes, condições perfeitas para a sobrevivência do aedes aegypti. Os números do estado de São Paulo, o mais afetado do país, são mais recentes: até agosto foram 292,1 mil casos de dengue e 250 mortes – em todo o ano de 2021, foram 145,8 mil e 71, respectivamente. Mas um estudo da Unesp constatou que a região do Cerrado também está sendo desproporcionalmente afetada – fato que está diretamente relacionado com a destruição do bioma.

 

Projeto contra rol taxativo é aprovado no Senado

POR: outrasaúde

O Poder Legislativo pode conseguir contornar uma injustiça aprovada pelo Judiciário: o Senado aprovou, ontem (29/8), projeto de lei que obriga os planos de saúde a cobrirem tratamentos que não estão listados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A decisão, que confirma votação na Câmara dos Deputados e vai à sanção presidencial, reverte o que foi decidido pelo STJ – que o chamado rol é taxativo. Agora, ele volta a ser apenas exemplificativo. Para ser custeadas pelos planos, as terapias precisam ser aprovadas por outras agências de renome internacional, pela Conitec ou ter comprovação científica. A vitória só foi possível graças à luta de mães de crianças autistas, encabeçada por Andrea Werner, do instituto Lagarta Vira Pupa. Ela acredita que, por se tratar de período eleitoral, Bolsonaro não vetará um projeto de lei que pode beneficiar pessoas com autismo e doenças raras. Segundo o senador Paulo Paim (PT), “O rol taxativo impacta negativamente a vida de 48 milhões de usuários de planos de saúde”.

 

COMO NASCE UMA CAMPANHA DE DESINFORMAÇÃO? A PÚBLICA MOSTRA

 


30 de agosto de 2022

Olá,

É preciso que a democracia brasileira sobreviva às eleições de outubro. E, para defender a democracia, precisamos que a verdade seja mais difundida do que as mentiras e a desinformação. 

É por isso que desde julho nossos repórteres têm investigado o caminho da mentira nas eleições de 2022 no projeto Sentinela Eleitoral. Em parceria com o pesquisador David Nemer e o Berkman Klein Center for Internet & Society da Universidade de Harvard, investigamos e analisamos conteúdos fabricados e disseminados com a intenção de manipular o debate público, de maneira coordenada e não orgânica.

Já mostramos que um grupo armamentista apontado como danoso no Facebook viralizou no Telegram bolsonarista com um vídeo convocando o público para o 7 de Setembro. Revelamos também que, na mesma rede, grupos bolsonaristas espalharam desinformação sobre Dom Phillips e Bruno Pereira. Explicamos como foi feita a construção do reinado de Michelle nas redes, comparando-a a uma personagem bíblica. Além disso, denunciamos os gastos milionários do governo com campanhas que elogiam a gestão de Jair Bolsonaro e parlamentares que viajam com dinheiro público a congressos conservadores. 

Todas essas investigações mostram como certos atores têm apostado na criação de um ambiente confuso e desorientador, no qual é difícil para um cidadão comum separar o que é verdade do que é mentira. No Sentinela Eleitoral nós investigamos as estratégias usadas para desestabilizar as eleições brasileiras. 

Além de ficar de olho em quem quer desestabilizar a democracia, você pode fortalecer quem a defende. Se você ainda não é Aliado ou Aliada da Pública, agora é a hora

Defenda quem revela como nasce a desinformação. Apoie a Pública hoje.

Quero apoiar a Pública!
Um abraço,

Marina Dias
Diretora de Comunicação da Agência Pública

segunda-feira, 29 de agosto de 2022

 

SUS e hospitais privados: como rever a relação

Crise no A. C. Camargo e fechamento de centenas de Santas Casas expõem um grande drama da Saúde Pública. José Carvalho de Noronha sustenta: solução é complexa, mas possível – desde que o desfinanciamento seja superado

Imagem: Santa Casa de Misericórdia de São Paulo
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A notícia alarmante de que o hospital A. C. Camargo, referência no tratamento de câncer em São Paulo, deixaria de atender o SUS, repercutiu. Tanto que a prefeitura, que a princípio havia minimizado a perda, voltou atrás três dias depois e ajustou os repasses financeiros para que a parceria não fosse desfeita. A crise foi contornada com os recursos da cidade, mas a questão central está longe de ser solucionada. Em entrevista ao Outra Saúde, o médico sanitarista e pesquisador do Laboratório de Informação em Saúde (Lis/Icict) da Fiocruz, José Carvalho de Noronha explicou e refletiu sobre aspectos cruciais para compreendê-la.

O ponto central do problema são os repasses de recursos públicos feitos aos hospitais e outros prestadores privados que atendem os usuários do SUS. Ele se dá por meio de dois mecanismos: renúncia fiscal e repasse de verbas, segundo uma tabela que remunera os procedimentos, consultas e cirurgias, estabelecendo valores para cada um.

A tabela SUS, cujos valores são estabelecidos pelo Estado, é alvo de debates e questionamentos. Foi por causa de sua suposta defasagem que o A. C. Camargo quase encerrou a parceria com a prefeitura. Ele já havia deixado de ser entidade filantrópica em 2017, e o número de pacientes atendidos pelo SUS está em queda. Problema semelhante acontece com a rede de diálise do país, a DeVita, que atende 14 mil pacientes pelo SUS e ameaça romper o contrato  em especial após a aprovação do piso salarial da Enfermagem.

Mas Noronha se detém ao problema das entidades filantrópicas. Elas são responsáveis por uma parcela bastante expressiva – cerca de 40% – das internações do SUS, e a isso precisam dedicar 60% de seus atendimentos. Estão em crise: nos últimos cinco anos, mais de 500 instituições fecharam as portas e há um déficit de R$ 10,9 bilhões no setor, segundo a Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB).

Noronha reconhece: há, de fato, uma diferença entre o que é pago aos prestadores privados pelo SUS e pelos planos de saúde. As bases são distintas. As operadoras pagam em média cinco vezes mais que o ministério da Saúde. Em contrapartida, o Estado oferece a renúncia fiscal, que está na casa de R$ 15 bilhões ao ano. Para o pesquisador, que já foi secretário de Atenção à Saúde no ministério da Saúde, a tabela SUS deve ser reavaliada em detalhes, para corrigir possíveis distorções e tornar-se mais equilibrada. A parceria com as Santas Casas – prestadores essenciais para o SUS, importantes para garantir sua universalidade – deve ser aperfeiçoada. Isso passa, é claro, por eliminar as “pilantrópicas”, que fazem mau uso do dinheiro público. Mas o essencial é uma maior coordenação do ministério da Saúde.

“Não podemos deixar que existam 5.668 sistemas de saúde” – um para cada município – sustenta Noronha. Metade do financiamento da atenção à saúde vem de recursos transferidos do ministério da Saúde a estados e municípios. Mas esta relação se dá, hoje, de maneira desordenada. Municípios como São Paulo têm condições de complementar a verba que a União repassa e estabelecer acordos como o que manteve o convênio com o A. C. Camargo. A maioria não pode fazê-lo. Algumas alterações poderiam resolver essas disparidades. Em primeiro lugar, é preciso rever os valores praticados pela tabela, porém de modo seletivo e criterioso. Alguns estão possivelmente defasados; outros, não.

Mas é possível ir além disso, tornando a relação mais complexa. Há várias maneiras de fazê-lo. A tabela pode ser condensada e reagrupada. A remuneração dos hospitais pode ser diferenciada segundo a complexidade do atendimento – o que incentivaria a permanência de instituições de excelência como o A. C. Camargo. Poderiam ser estabelecidas Santas Casas de referência em certas regiões. Incentivos financeiros deveriam contemplar hospitais que decidissem atender 100% pelo SUS.

Para tudo isso, porém, é preciso resolver a questão essencial, frisa Noronha: o desfinanciamento da Saúde Pública. Em penúria, o SUS não terá fôlego para estabelecer nova relação com seus prestadores. Viverá de crise em crise, como as atuais. E não basta dinheiro. Além de destinar uma porcentagem maior do PIB à saúde, é preciso uma gestão competente e comprometida do ministério, cujos desmandos na era Bolsonaro beiraram o bizarro.

Não há soluções mágicas, frisa Noronha. “Acabar com a tabela” resultaria em remunerar de modo igual instituições que oferecem volumes e qualidade de atendimento muito distintos. Resultaria em piora no atendimento da população, pois os hospitais logo perceberiam que é possível receber mais recursos com menos procedimentos.