terça-feira, 30 de janeiro de 2018

O SERTÃO VAI VIRAR MAR

ESTA DIVERSIDADE DE SERTÃO EM FOTOS E PAISAGENS, VAMOS INICIAR UMA CAMINHADA PELO NOSSO SEMIÁRIDO:
NA FOTO UM CRIATÓRIO DE ABELHA JANDAÍRA,  TÃO IDENTIFICADA COM A NOSSA CAATINGA, COM O NOSSO SEMIÁRIDO DO RN, COM SUA BRAVURA DE RESISTÊNCIA, MESMO NESTES TEMPOS DE BRUTALIDADE DE TODOS OS LADOS.
ESTA FOTO DE UMA CRUZ, LEMBRA A PASSAGEM DA BIXIGA QUE ATERRORIZOU NOSSOS SERTÕES COM BASTANTES MORTES E ENTERROS EM TERRAS SEPARADAS, ESTE MARCO DE RESISTÊNCIA DE UM POVO.
SIMBOLOGIA DE UMA REGIÃO DE CRIADORES/AS DE GADO BOVINO, EM MOMENTOS DE AFIAMENTO DOS CHIFRES E PREPARANDO POR UMA SUPOSTA DISPUTA POR UM ESPAÇO NESTE SERTÃO DE MUITAS VEREDAS E CAMINHOS QUENTES.
O VELAME NAS PRIMEIRAS CHUVAS COM SEUS BOTÕES DE FLORES TÃO APRECIADAS PELAS ABELHAS JANDAIRAS E POR NÃO DIZER A ABELHA ITALIANA, DAS SUAS FOLHAS MURCHAS, SÃO FEITOS CHÁS DE MELHORA DA INDIGESTÃO.
EITA BRAVO XIQUE-XIQUE, TÃO MAJESTOSO COM SEUS GALHOS QUE SALVAM TANTAS VIDAS DE ANIMAIS NOS PIORES MOMENTOS DE CRISE DE ALIMENTO, ESTÃO ELES LÁ PARA ALIMENTAR, PÓS RETIRADA DOS SEUS ESPINHOS QUE FURAM E INCHAM COM UMA SUBSTÂNCIA MUITO FORTE, QUE MERECE UM ESTUDO APURADO SOBRE PODER DA FURADA DOS SEUS ESPINHOS, PRINCIPALMENTE NOS LOCAIS DE JUNTA.
MAIS UMA FOTO DESTA BRAVA PLANTA QUE ACOMPANHA O/A SERTANEJO/A, MOSTRANDO ESTE MOSAICO INTERESSANTE DESTE NOSSO SEMIÁRIDO.
FECHANDO COM CHAVE DE OURO ESTAS FLORES DO XIQUE-XIQUE QUE DESPONTAM Á NOITE COLORINDO E ENEBRIANDO AS NOITADAS DO NOSSO SERTÃO.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Ministros pela metade 
Heitor Scalambrini Costa
Professor aposentado da Universidade Federal de Pernambuco

O forte de Pernambuco não é oferecer bons ministros ao Ministério de Minas e Energia (para outros ministérios deixo voce decidir). Nos últimos 20 anos dois políticos do Estado figuraram como ministros desta pasta, tão estratégica e importante para o país . Este ministério, como outros, tem sido usado como “moeda de troca” na politicagem da chamada “governança”. Já foi feudo do PFL/DEM, depois do PMDB, e com passagem do PT. Pessoas sem nenhum vínculo com a área, e sem conhecimento de causa tem sido nomeadas.

Ministro, entre março de 2001 e março de 2002, em plena crise do desabastecimento de energia, quem não se lembra de José Jorge (DEM-PE). Um verdadeiro fantoche. Em pleno gozo, na cadeira de ministro, se sujeitou a que uma outra pessoa, comandasse as ações do Ministério, o então Chefe da Casa Civil da época (atual presidente da Petrobrás), Pedro Parente. Virou chacota para a grande imprensa do país. Além de imporem, com o apagão elétrico da era FHC, um prejuízo de R$ 45,2 bilhões, segundo relatório aprovado pelo  Tribunal de Contas da União (TCU).

Agora no cargo, um outro personagem completamente desconhecido do setor energético, e mesmo da política nacional, o deputado federal do PSB, Fernando Bezerra Coelho Filho. Sem entrar no mérito de como se deu sua indicação, em pleno processo de angariar votos pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff, caiu em seu colo um Ministério no (des)governo Temer. Diga-se de passagem, contestado por amplos setores da sociedade brasileira.

De tradicional família sertaneja, os Coelhos do município de Petrolina (Pernambuco), é filho de um senador da república. Esta família por décadas domina a região, com mão de ferro, com seus descendentes sempre ocupando cargos em governos, não importando o viés ideológico. Transitam no amplo espectro politico da direita, a esquerda. Sem nenhum constrangimento, a frase “Hay gobierno, soy gobierno” cai muito bem a esta família.

O atual ministro do MME é um títere de empresas, e de setores organizados do empresariado nacional e internacional, cumprindo um papel de mero coadjuvante, um borbônico no meio energético. Todavia tem amplo respaldo do chamado “mercado”. E age, e governa, em função dos interesses do capital.

Diante dos energúmenos personagens atuais, Pernambuco se ressente de figuras ícones como Frei Caneca, Paulo Freire, Dom Helder Câmara, Josué de Castro, Francisco Julião, Miguel Arraes, Pelópidas da Silveira, entre outros.


domingo, 28 de janeiro de 2018

Entrevista - Jonas Rafael Rossatto

"O estigma que a maconha carrega é fruto de propaganda e não dos fatos"

por Tory Oliveira publicado 28/01/2018 00h11, última modificação 28/01/2018 10h36
Baseado no Uruguai, dono do serviço de assinaturas 'Canabista' critica guerras às drogas e preconceito com empreendedores

Nanda Godim
O empresário Jonas Rafael Rossatto
'Não trabalhamos com aditivos, nem com produtos ilícitos', explica Rossatto sobre os kits comercializados
É de Montevidéu, no Uruguai, que o empresário Jonas Rafael Rossatto, de 29 anos, comanda o Canabista, serviço por assinatura que entrega no Brasil kits mensais com produtos (legais) selecionados por influenciadores do universo de consumidores de maconha.
Após escolher pacotes que variam entre 9,90 reais e 98 reais, os assinantes recebem em casa discretas caixas com sedas, manuais e acessórios. Com três meses de vida, o serviço tocado por Rossatto e outros dois sócios conta com 150 assinantes, com idades entre 18 e 58 anos.
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"Sempre explicamos que não trabalhamos com aditivos, nem com produtos ilícitos. Tudo tem nota e  está nos conformes da lei", explica ele, que também é ativista pela descriminalização da maconha no Brasil e já participou de debates no Senado defendendo este ponto de vista.
"De um lado temos pessoas com pouca argumentação que estão cheias de certezas vazias, que são os proibicionistas. Do outro, pessoas cheias de argumentação e que continuam se questionando, mas não se manifestam", critica.
Confira a entrevista:
CartaCapital: Como surgiu a ideia de criar o Canabista? Quem é o público que assina os kits?
Jonas Rafael Rossatto: Eu trabalho com o universo canábico há um bom tempo e, nesses últimos anos, apareceu muita gente explorando o mercado. É o caso da "seda" (papel para enrolar). Muita gente importa/produz na China e em outros países. No entanto, esses produtos são mais nocivos à saúde por causa do tratamento com cloro.
Além do fato de o usuário não dar a devida atenção à qualidade do papel, o alto custo nos quiosques, postos de conveniência e headshops também gera um problema para bastante gente. Isso fez surgir no Brasil uma gama de produtos falsificados. Foi então que surgiu o Canabista: para dar uma opção fácil para quem quer qualidade e custo benefício.
A ideia inicial do Canabista era levar seda de qualidade, redinhas para dar manutenção no bong/pipe e uma cartilha de redução de danos. Afinal, queríamos que as pessoas entendessem as vantagens do produto que estão recebendo. Logo depois de fazermos o piloto, descobrimos que poderíamos incluir mais novidades sobre o mercado canábico, fazer uma curadoria com influenciadores e muitas outras coisas, até jogos.
CC: Quem são esses influenciadores?
JRR: Nas edições passadas contamos com a participação do "THC Procê" (Youtuber que fala sobre cultivo, com 54 mil seguidores) e Paulo Dubmastor (do Cidade Verde Sounds, com mais de 1 milhão de seguidores). Na edição do mês de janeiro será a Camila Fudissaku (designer, que colabora com revistas Trip, TPM, entre outras).
CC: Hoje você mora no Uruguai, que costuma ser considerado um exemplo de modelo de legalização para muitos defensores do tema no Brasil. Como é a vida de um empreendedor canábico onde a maconha é legal? Que diferenças você vê entre a realidade lá e a brasileira?
JRR: As diferenças começam na rotina. Aqui no Uruguai dá pra levar uma vida mais tranquila, não preciso me preocupar se a concorrência ou os conservadores vão me denunciar por plantar cannabis, já que eu posso ter registro como cultivador.
Sobre o mercado canábico daqui do Uruguai, estou no processo de entendê-lo, fazendo levantamento dos dados científicos sobre como a legalização e a lei estão sendo reguladas, sobre o consumo, registro e a demanda para trazer o Canabista para cá. E também estou trabalhando em outro empreendimento legal, destinado a turistas brasileiros.

Kit Canabista
Kits distribuídos pelo Canabista: planos variam entre R$ 9,90 e R$98
Sobre diferença prática, eu diria que é a lei. Mudar de país implica entender outras leis. É o caso das aplicações de leis tabagistas ou de acessórios fumígenos por exemplo, que após a legalização passam a valer para esse mercado. A principal diferença do Uruguai é a cultura, você percebe que as pessoas sempre foram razoáveis com diversos temas polêmicos ao longo da história.
Um bom exemplo de decisão excepcional foi quando a Phillip Morris perdeu um processo por tentar derrubar a lei antitabaco, visto que o Uruguai não permite propagandas de cigarros em lugar algum, nem mesmo de "seda" para enrolar.
Já no Brasil, temos um governo que quer proibir a maconha e não tem nem planos pra vetar comerciais de cerveja ou outras bebidas alcoólicas, que são a causa de aproximadamente 80 mil mortes por ano na América, segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e da Organização Mundial da Saúde (OMS). Com o agravante de que o Brasil é o quinto país com maior número de óbitos ligados ao consumo de bebidas.
CC: Estima-se que no Brasil o comércio formal da maconha movimentaria cerca de 5,7 bilhões de reais por ano. No entanto, estamos vivendo um momento mais conservador nesta questão, com ministros do STF que se declaram abertamente contra a legalização e com o ministro do Desenvolvimento Social e Agrário criticando os processos de legalização no Uruguai e no Colorado. Como você vê o horizonte para um mercado legal de cannabis no Brasil?
JRR: Em 2012, os pesquisadores da Unifesp apontaram que no Brasil há 1,5 milhões de pessoas que usam maconha diariamente. Em uma pesquisa do portal canábico SmokeBud com mais de 15 mil usuários, descobrimos que em média as pessoas consomem 25 gramas (aproximadamente 100 reais) a cada duas semanas.
Fazendo um cálculo básico, percebemos que circulam no mercado ilegal mais de 3 bilhões de reais por mês: dinheiro que o Brasil não vê. Isso sem levar em conta o fato de os dados serem um "falso-positivo". Ou seja, tem muita gente que fuma, mas que diante da lei que criminaliza, responde que não fuma. E sem contar que o comércio de produtos legais relacionados a cannabis já gera muito dinheiro.
No entanto, para muitos isso [o comércio de produtos legais] é apologia e não uma oportunidade para empregar brasileiros e gerar impostos para saúde, educação e cidadania.
Falar da descriminalização, legalização e regulamentação ainda é complicado no Brasil, principalmente porque muitos não acreditam no próprio País e não aceitam mudanças.
Nosso governo vai de mal a pior, temos tantos ministros e deputados cassados, a maioria que compõe o cenário político é investigada por corrupção e não inspira confiança. E nesse cenário de incertezas o conservadorismo prospera.
O povo ainda tem uma visão muito errada do que é ser conservador, e muitas vezes confunde valores e tradições que vêm de casa, da família, com tomar decisões que inibem liberdades individuais. O conservadorismo é o principal inimigo do progresso.
Pouco a pouco, as pessoas vão percebendo que o estigma que a maconha carrega é fruto de propaganda e não dos fatos, mas a falta de debate sobre o tema faz com que as mudanças demorem muito mais.
Deveríamos pensar mais no bem estar social como um todo, e parar de tentar controlar o que só diz respeito a pessoa, mas encontramos resistência em todas as instâncias, inclusive de pessoas que, na teoria, estão posicionadas para melhorar nosso convívio, mas acabam criando ainda mais dificuldades.
É o caso do atual ministro do desenvolvimento agrário, Osmar Terra (PMDB-RS), que quando era deputado chegou a ir até o Uruguai e tentou frear a legalização na sessão da Comissão de Saúde Pública do Senado uruguaio. Esse mesmo senhor já apresentou um projeto de lei que endurece a pena para traficantes, seguindo o círculo vicioso das medidas paliativas, e propôs também a regulamentação das internações voluntárias, involuntárias e compulsórias (junto com Ronaldo Laranjeira).
CC: Você participou de uma audiência pública no Congresso sobre os impactos da legalização. No início de sua fala, você aponta a importância dos defensores da legalização participarem do debate público. Qual é a importância de usuários e defensores da cannabis se posicionarem pública e politicamente?
JRR: A importância é extrema, de um lado temos pessoas com pouca argumentação que estão cheias de certezas vazias, que são os proibicionistas. Do outro, temos pessoas cheias de argumentação e que continuam se questionando e que não se manifestam.
Está na hora destas pessoas amparadas por argumentos serem mais participativas nas nossas políticas sociais. Puxar a fila, participar da mudança. A essência da democracia é acatar a decisão da maioria, então tem que haver participação, por que não vai cair um anjo do céu e mudar as coisas como um milagre. Quem faz a política é a parte da sociedade que participa.
CC: Na sua opinião, os canabistas estão saindo mais do armário? Isto é, há mais pessoas dispostas a dizer que fumam?
JRR: Sim, com certeza os usuários estão dando mais as caras. Com esse "green rush" [corrida verde] vemos usuários encontrando mais argumentações relacionadas a cannabis, de forma medicinal, social, sócio-econômica e até mesmo religiosa. Temos usuários usando roupas, acessórios, e escutando músicas sobre o tema.
As redes sociais foram um grande passo para mostrar que ninguém estava sozinho. Também há o fato de que a violência contra os usuários de maconha segue agravando-se. Muitas pessoas cansaram de ficar sem saída, e essa repressão as levou a expor esse problema que deveria ser questão de saúde pública, não criminal.
CC: Ao mesmo tempo, ainda há muita resistência a respeito do tema: Dois em cada três brasileiros adultos (66%) declararam que fumar maconha deveria continuar sendo proibido por lei segundo o Datafolha. Apesar do número ser alto, é o menor da série histórica. Na sua visão, quais são os entraves para um melhor debate sobre a legalização no Brasil? Por que fumar maconha ainda é um tabu para a maioria?
JRR: Acho que para compreender melhor esse problema precisamos olhar para a herança do Brasil colônia, que se estendeu até 1800. Somos um país jovem, com uma democracia mais jovem ainda, é natural que o progressismo encontre muitas barreiras, sobretudo pela falta de debate.
A maior parte do Brasil ainda é muito mal informada, somando a isso a falta de engajamento e a resistência contra mudanças, o panorama é de um conservadorismo velado que não se altera com fatos. É uma tarefa árdua mudar a cabeça da população, sobretudo de pessoas mais velhas.
Os problemas que enfrentamos com política hoje são reflexos da falta de diálogo, de levar decisões públicas no "piloto automático" e votar em candidatos mais pela pressão midiática do que pelas propostas.
Com a legalização é a mesma história, ninguém procura saber quais são os benefícios e malefícios da maconha, seguem um modelo de pensamento de décadas atrás, e muitos sequer fazem comparações imediatas, com o álcool, por exemplo.
Se o álcool fosse alvo da mesma cruzada moralista que persegue a maconha, o alcoolismo sofreria um duro golpe. Mas o brasileiro não exercita o senso crítico, a maioria prefere informação mastigada e opiniões prontas.
CC: Na sua opinião, ainda há preconceito contra negócios como o Canabista? Que tipo de crítica você costuma receber? Como responde a elas?
JRR: Há um enorme preconceito não só no Brasil, mas no mundo todo. Já fomos expulsos de bancos americanos por não poder ter absolutamente nada relacionado a cannabis, mesmo que acessórios não seja ilegal. Também já conversei com muitos canabistas famosos, como músicos, comediantes e atores, que não querem participar e nem mesmo dar uma entrevista para não perder 50% da fatia do mercado.
O contratante não vai chamar pro comercial quem participa desse meio. Você pode até cantar sobre, fazer piada sobre, mas falar de maconha é falar do lado particular da celebridade, e há muita gente que não está disposta a abrir esse diálogo.
Do outro lado existem grandes players tabagistas que atuam no mercado canábico, mas não querem ser notados no segmento canábico - o que faz com que o segmento seja fraco e quase não exista.
No Canabista tem muita gente que fica com receio de assinar achando que um policial vai levar o kit em casa. Mas sempre explicamos que não trabalhamos com aditivos, nem com produtos ilícitos. Tudo tem nota e está nos conformes da lei.
Sempre haverão críticas, mas sempre tentamos resolver da melhor forma e traduzir isso de forma a provar o potencial econômico para quem está assinando, para quem está participando e para quem está aparecendo na curadoria. Tentamos criar o cenário que se esse mercado empregar mais gente, a proibição e a lei vão mudar.
CC: Quais são as consequências, na sua opinião, do modelo de “guerras às drogas” ainda vigente no Brasil?
JRR: Já fazem 47 anos desde que o presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, declarou guerra às drogas e o mundo seguiu o exemplo. De lá pra cá, muitos já apresentaram dados para mudar essa política falha, mas continuamos adotando o mesmo modelo paliativo.
Isso faz com que seja desperdiçado dinheiro, tempo e treinamento para prender pessoas que estão exercendo sua liberdade de escolha. Se usar drogas faz mal, isso é uma questão de tratamento, não de encarceramento, visto que não há dano nenhum a terceiros.
Isso também contribui para a superlotação das cadeiras. Deveríamos colocar na cadeia quem realmente deveria estar lá, como corruptos, bandidos e criminosos de alta-periculosidade. Sempre tivemos uma grande lavagem de dinheiro para controlar a nossa administração pública, que só enxuga o gelo.Devíamos olhar para países como os Estados Unidos, que tem a maior população carcerária do planeta, e aprender com os erros deles.
No fundo, toda a questão de segurança pública depende do mesmo remédio: educação e distribuição de renda. O sistema penitenciário hoje no Brasil só contribui para que o detento mergulhe ainda mais no crime. É um sistema puramente punitivo, que ao invés de reabilitar, acaba com a vida do cidadão.

O julgamento de Lula e os espectros de Porto Alegre

por Thomas Bustamante — publicado 26/01/2018 13h49, última modificação 26/01/2018 16h23
O que vemos nesse processo é uma espécie de “justiça fast-food”, onde as conclusões já vêm prontas

Sylvio Sirangelo / TRF4
Thomas Bustamante
A opção dos desembargadores do TRF4 pelo corporativismo coloca em xeque o Estado de Direito.
Na primeira instância, o PT era apontado como beneficiário de atos indeterminados decorrentes de uma espécie de “conta corrente” de propina que mantinha com a OAS. Mas culpa de Lula não era de gerir esse esquema, autorizar e chefiar as fraudes em licitações etc. Lula foi condenado por Moro em razão de supostamente ter recebido um apartamento da OAS, ou melhor, recebido um apartamento melhor e mais valioso do que aquele que havia sido por ele adquirido de uma incorporadora posteriormente adquirida pela OAS.

Como não se comprovou nenhum “ato de ofício” de Lula conferindo qualquer vantagem à OAS, Moro sustenta que esses “atos de ofício” são dispensáveis e que a responsabilidade de Lula deriva do fato de ele ter aceito o apartamento em troca da quitação de dívidas espúrias que a OAS tinha com o seu partido.
Essa narrativa é frágil por várias razões. Primeiramente, Lula não era Presidente da República desde 2010 e, por isso, não poderia ter praticado qualquer ato de governo capaz de conferir à OAS um benefício que justificasse essa benesse. Em segundo lugar, a própria “conta de propina” não estava provada no processo, uma vez que foi indeferida perícia contábil e inexiste prova do denominado “caminho do dinheiro”, ou seja, a origem e o destino dos recursos oferecidos pela OAS.
Finalmente, ainda que houvesse uma prova de que a OAS “reservou” o apartamento tríplex para Lula, não estava provado que Lula tivesse aceito o apartamento e definitivamente não estava provado que o ex-presidente recebeu o apartamento ou tenha qualquer outro tipo de acréscimo patrimonial. Pelo contrário, a prova que se tem é de que o apartamento permanece até os dias atuais na propriedade da OAS.
O acórdão do TRF, no entanto, aprofunda a violação ao princípio do Estado de Direito. Na nova narrativa, Lula seria responsável não apenas por ter recebido para si uma vantagem – o apartamento no Guarujá – mas por ser o “grande gerente do esquema de propina” montado na Petrobrás. Gibran, Paulsen e Laus consideram Lula responsável por todos os malfeitos de todos os diretores da Petrobrás, simplesmente por tê-los nomeado ou mantido nos seus cargos depois de iniciado o esquema de propina para favorecimento em licitações. O apartamento no Guarujá passa a ser apenas um detalhe, uma espécie de sobra que Lula pega para si após ter se beneficiado do esquema por mais de uma década.
Qual o problema dessa segunda narrativa?
O mais grave problema, provavelmente, está no fato de que essa mirabolante narrativa não tem lastro probatório nos autos. Mesmo se tomarmos como incontroverso que houve um esquema criminoso entre os diretores da Petrobrás e as empresas participantes dos consórcios vencedores, teria que estar provado que Lula participou desse esquema, nele interveio ou deixou propositalmente de atuar para terminar com ele depois que tomou ciência de sua existência.
O TRF-4 adota, dessa vez de maneira muito mais expressa do que Moro, a denominada “teoria do domínio do fato”. Lula é pessoalmente responsável, do ponto de vista criminal, por tudo o que Paulo Roberto Costa, por exemplo, fez de errado na direção da Petrobrás.
O problema dessa narrativa é que ela pressupõe essa conclusão como uma verdade dada, não se preocupando em provar a veracidade dessa história “mais além de qualquer dúvida razoável” (beyond reasonable doubt).
Raras vezes, no Brasil, se leu uma decisão tão preocupada em discorrer considerações teóricas sobre a prova, mas raras vezes se viu também uma decisão tão pouco preocupada em manter-se fiel aos rigorosos standards de prova que ela prometeu aplicar.
A decisão afirma estar aplicando o critério da prova inequívoca, que não admite qualquer dúvida razoável, mas se contenta apenas em estabelecer uma versão que seja coerente com os indícios encontrados nos depoimentos de co-réus e em notícias de jornal citadas na sentença de primeiro grau.  
Ao tentar se justificar para o público externo, a corte enfaticamente sustenta: “estamos julgando fatos, não pessoas”; ou então: “uma convicção há que estar provada mais além de qualquer dúvida”, não sendo lícito ao juiz decidir apenas com base nas suas impressões.
No entanto, contenta-se com uma espécie de “reconstrução coerentista” que é aceita como suficiente para oferecer a prova para suas convicções. Nessa perspectiva, basta ao juiz apresentar uma versão dos denominados “fatos primários” (aqueles capazes de levar à tipificação da conduta na norma) que seja coerente com os “fatos secundários” (aqueles de fato verificados no processo com base em parâmetros objetivos).
O standard da “prova mais além de qualquer dúvida” não se sustenta com a possibilidade (ou mesmo uma probabilidade!) da versão narrada na denúncia estar correta. Ele exige muito mais. Só se cumpre esse critério probatório se não for possível imaginar nenhum “mundo possível” (possible world) em que os fatos secundários sejam verdadeiros, mas os fatos primários sejam falsos.
Traduzido em termos concretos, o tribunal deveria ter formulado a seguinte pergunta: “é possível imaginar, diante da prova apresentada, uma explicação da realidade em que sejam verdadeiros os fatos secundários, mas não os primários?” Ou ainda: “é possível imaginar um cenário em que as propinas pagas à Petrobrás tenham existido, mas não tenham beneficiado a Lula ou este não tivesse conhecimento e controle sobre elas?”
Repare que aqui não basta que seja possível, ou coerente, ou até mesmo provável que Lula soubesse dos acertos de propina e tivesse controle sobre eles. Exige-se mais: que não seja possível uma explicação alternativa para os fatos, na qual Lula não configure como o grande gerente desse esquema de propinas.
No processo, não há nada que leve a essa conclusão. Aliás, uma análise cuidadosa deixa perguntas que dificilmente um defensor da tese do Tribunal conseguiria responder: “por que, então, Paulo Roberto Costa recebeu para si centenas de milhões de dólares de propina, enquanto Lula ficaria apenas com uma reforma em um apartamento de classe média?” Ou então: “por que Lula só receberia sua fração em 2014, quatro anos depois de seu mandato ter acabado?”
Se Lula era o grande articulista, talvez fosse possível imaginar duas hipóteses: 1) ou Lula queria beneficiar a si próprio e a seus parceiros com essa propina, ou 2) Lula queria manter o seu partido no poder e financiar campanhas eleitorais.
Na primeira hipótese, a pergunta seria então: “por que Lula não recebeu mais nada durante o mandato?” “Se ele era o grande chefe, por que Paulo Roberto Costa, que seria o seu subordinado, recebeu centenas de milhões de dólares?
Na segunda hipótese, a pergunta seria: “por que Lula deixou Paulo Roberto Costa receber centenas de milhões de dólares enquanto o seu partido político ficava com menos do que isso?”
Se estivéssemos diante de um pragmatismo absurdo, de alguém que coloca o seu partido político acima do Estado de Direito e da lei, que é tão instrumentalista a ponto de achar que a sua permanência no poder é mais importante do que a preservação do patrimônio do povo que ele pretende governar, “por que deixar alguém que estaria roubando os recursos que seriam do próprio partido político que ele resolve proteger mesmo à custa de tanto risco e tanta ilegalidade”?
Essas perguntas poderiam ser feitas, mas em nenhum momento são sequer cogitadas. E pior, a hipótese de que Lula seria o “grande gerente” que comandaria o esquema de propinas é tão coerente com os fatos provados nos autos quanto a hipótese de que os diretores da Petrobrás, líderes partidários e gerentes de empresas beneficiadas com o esquema estariam enganando a Lula e colhendo benefícios para si próprios sem o seu consentimento. O que leva, então, o tribunal a optar pela primeira hipótese?
Não se poderia dizer, por exemplo, que Lula simplesmente perdeu o controle  sobre seus aliados, como é típico no “presidencialismo de coalizão”? Não foi exatamente isso (perder o controle sobre seus aliados) que fez com que Dilma Rousseff fosse cassada por um impeachment questionável? Ora, a prática ensina que no presidencialismo de coalizão é fácil perder o controle sobre uma enorme base aliada. Lula não poderia ter simplesmente perdido o controle moral e jurídico sobre essa base, da mesma forma que Dilma perdeu o controle político sobre sua base, levando a uma insurgência contra ela? Por que pressupor, a priori, que essa hipótese é impossível? Lula não poderia simplesmente estar sendo enganado pelas pessoas que ele indicou?
De modo semelhante, no que concerne ao apartamento no Guarujá, a hipótese do primeiro depoimento de Léo Pinheiro é de que o apartamento não era de Lula (apesar de ter sido montado para tentar seduzi-lo com a possibilidade de compra) e este não sabia da existência de qualquer esquema de propinas em sua empresa, enquanto a hipótese do segundo depoimento de Léo Pinheiro é de que o apartamento seria de Lula e a ele teria sido dado como uma forma de pagamento pelos créditos que o PT adquiriu junto à OAS em vista dos alegados esquemas espúrios de corrupção.
A pergunta que se faz é: por que acreditar no segundo depoimento de Léo Pinheiro, mas não no primeiro depoimento?
Seguramente, o segundo depoimento é coerente com a tese que o MP adota (de que Lula era o grande gerente do esquema de corrupção), mas será mesmo que existe prova “acima de qualquer dúvida razoável disso”? É realmente impossível a existência de qualquer outra explicação para o fato de a OAS ter reservado esse apartamento para Lula?
Lembre-se que o custo total das obras de reforma do apartamento foi um valor absolutamente ínfimo e insignificante, quando comparado aos valores bilionários dos contratos ou às centenas de milhões de dólares recebidas de propina pelos diretores da Petrobrás. Como acreditar então que Lula comprometeria tantos recursos do seu povo, correria tantos riscos, com tantos benefícios para pessoas que não exerciam funções-chave em seu projeto de governo, para ganhar tão pouco?
O que vemos nesse processo é uma espécie de “justiça fast-food”, onde as conclusões já vêm prontas e o juiz se comporta como um roteirista que pretende criar uma história bonita que agrade a imprensa, ou acalme os mercados e os seus colegas quando a Justiça é acusada de politizar-se. É uma opção por um corporativismo que coloca em xeque o Estado de Direito e vende nossas garantias constitucionais a preço de banana.
O que mais me escandaliza na decisão é que eu tive a impressão de que esses Desembargadores são completamente diferentes de Sérgio Moro. Moro é um juiz que declara seu ódio ao PT, aparece em foto se confraternizando com réu do PSDB, manda fazer condução coercitiva espalhafatosa contra Lula, manda conduzir coercitivamente blogueiros e jornalistas de esquerda, enquanto tolera que audiências protegidas pelo segredo de justiça sejam transmitidas ao vivo para sites de direita, faz interceptações telefônicas ilegais e depois manda para a imprensa, na véspera do julgamento de um impeachment de Presidente da República, com o objetivo de desestabilizar o país.
Mas assistindo ao julgamento, não me passou pela cabeça em nenhum momento que os desembargadores estivessem em um complô malévolo para destruir o PT ou inviabilizar eleitoralmente a esquerda brasileira, como muitos estão alegando por aí. A impressão que eu tive é mais grave: é de que eles agem assim de forma natural, agem com base no arbítrio, na discricionariedade livre, no “achismo” e na narrativa mais coerente com as verdades ditadas pela grande imprensa e pela onda malévola de punitivismo mesmo quando pensam não estar agindo por preconceitos políticos. Ou seja, o espectro que nos ronda depois desse julgamento é o medo de que a forma como julgaram Lula seja a única maneira pela qual podemos esperar que eles julguem qualquer outra pessoa, como eu e você.
*Thomas Bustamante é doutor em Direito (PUC/RJ) e Mestre (UERJ), com período de investigação na University of Edinburgh, Reino Unido. É Professor de Filosofia do Direito da UFMG, onde é membro do corpo docente permanente do Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito. Autor da obra Teoria do precedente judicial: a justificação e aplicação de regras jurisprudenciais.

ESPERANDO AS CHUVAS

ESTAMOS NO FINAL DO MÊS DE JANEIRO E NA EXPECTATIVA DAS CHUVAS PARA FEVEREIRO E MARÇO COMO UM ANO PROMISSOR SEGUNDO OS ESTUDOS DOS TÉCNICOS DA TEMATICA DA CHUVA, ENTRE OS AGRICULTORES TEMOS ALGUMAS CONTROVÉRSIAS, ALGUNS ESTÃO ESPERANÇOSOS COM FORMAÇÃO DE BARRAS NO ALTO E RELÂMPAGOS NOS ARREDORES, PARA OUTROS OS RELAMPAGOS PARA OS LADOS DO MAR NÃO É UMA BOA EXPERIÊNCIA PARA UM ANO DE CHUVA. MAS, VAMOS NAS EXPECTATIVAS POR UM ANO BOM DE INVERNO, POIS, DESDE 2012 NÃO TEMOS UM ANO BOM, E AO MESMO TEMPO O ABANDONO DO RURAL POR POLITICAS DE ESTRUTURANTES OU DE REMEDIAÇÃO.
LEMBRANDO QUE ESTAMOS DESDE 2012 SEM CHUVAS E SEM UMA AÇÃO CONCRETA POR PARTE DOS GOVERNOS FEDERAL E ESTADUAL E NO MUNICIPIO NEM SE FALA.

Economia solidária: a história de resistência de Lourdes Marchi

Liderança ajudou a fortalecer clubes de troca e feiras no Paraná: “A economia solidária parte do povo. A economia capitalista é do patrão, que manda em tudo, vai pegando tudo para si, e o povo fica a ver navios” 
 
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Foto: Carolina Goetten
 
 
 
Por Carolina Goetten
 
Aposentada, mas ativa, Lourdes Marchi ajudou a fortalecer a economia solidária no Paraná
 
Em Curitiba, uma das grandes lideranças da economia solidária é dona Lourdes Marchi. Com 73 anos de idade e uma excelente memória, ela se lembra de todas as datas marcantes de sua vida. E também preserva o significado da economia solidária: para ela, os clubes de trocas são uma forma de resistir à ditadura do dinheiro. Nesses clubes e feiras, cada um leva o que tem ou o que produz para vender ou trocar por outros itens. 
 
Ela define a sociedade capitalista como um modelo que se opõe à solidariedade. “A economia solidária parte do povo. A economia capitalista é do patrão, que manda em tudo, vai pegando tudo para si, e o povo fica a ver navios”. Foi na Colômbia que ela viveu a primeira experiência com as trocas. “Fizemos assim: aquilo que a gente tinha, fomos trocando uns com os outros. Sem moeda, sem nada”. Em Curitiba, atualmente, há cinco desses clubes de troca em plena atividade.
 
Lar de memórias  
 
Na casa de dona Lourdes, as prateleiras conservam os artesanatos e as lembranças que ela reuniu em  sua caminhada ao lado da economia solidária. Há flores de tecido, pássaros esculpidos a mão, pequenas esculturas cristãs. Até mesmo as contas de água, luz e telefone são guardadas dentro de artesanatos reciclados. Com tecidos, tesouras e e criatividade, caixas de leite se tornam objetos decorativos e garantem renda a famílias carentes. 
 
Dona Lourdes já viajou por todo o Brasil levando a bandeira de uma economia mais justa, que alcance e proteja o povo. Hoje, aposentada, continua acompanhando os movimentos solidários, mas se preocupa com as dificuldades colocadas pelo governo de Michel Temer. “Essas reformas vão agravar a crise e o desemprego. Esse presidente tirou todas as políticas da economia solidária. Eu fico muito triste em ver isso tudo que está acontecendo”, lamenta. 
 
Para ficar por dentro
 
Em Curitiba, A Feira Permanente de Economia Popular Solidária acontece das às quartas e sábado, às 8h às 17h, ao lado do terminal do Portão.
 

Edição: Ednubia Ghisi

O dia da consagração de Lula e o fim da história para FHC, por Luis Nassif


Um paiá de Monai,  bonzo  bramá
Primaz da cafraria do Pegu,
Quem sem ser do Pequim, por ser do Açu,
Quer ser filho do sol, nascendo cá.

Tenha embora um avô nascido lá,
Cá tem três pela costa do Cairu,
E o principal se diz Paraguaçu,
Descendente este tal de um Guinamá.

Que é fidalgo nos ossos cremos nós,
Pois nisso consistia o mor brasão
Daqueles que comiam seus avós.

E como isso lhe vem por geração
Tem tomado por timbre em seus teirós
Morder os que provêm de outra Nação.
Gregório de Mattos

Gregório de Mattos criou a figura do “fidalgo caramuru”, descendente de português com índia, que pretenderia origens nobre, como fruto do encontro da aristocracia europeia com a aristocracia selvagem.
Há muito tempo, Fernando Henrique Cardoso é nosso “fidalgo caramuru”, o filho de generais, com um pé na cozinha e um olhar no primeiro mundo. Como Pedro Malasartes, outro herói miscigenado, há muito tempo FHC se desprendeu da ambição vã de liderar partidos, conduzir povos, mudar nações, porque dá trabalho. Deve ter desistido lá pela adolescência, depois que largou as Marchas do Petróleo é Nosso que traziam muito orgulho para a família e pouco poder aos seus – além de serem muito trabalhosas.
Sempre contou com a mão do destino para fazer história. Na adolescência, filho de família histórica; na idade adulta, beneficiado por um golpe que lhe permitiu voltar para o país com fama de herói. O poder lhe caiu no colo de graça, assim como o Plano Real.
Mas, como um autêntico Malasartes, sua sopa de pedra visa conquistar a eternidade sem precisar se esfalfar muito com as coisas terrenas. O seu partido se esfacela. E o máximo que ele ousa são platitudes em forma de artigos para velhos jornalões.
Quando se trata de biografia, porém, FHC luta como um leão, esbraveja, tenta encontrar interpretações para seu reinado.
Quando terminou seu mandato, leu a biografia de Franklin Delano Roosevelt. E enxergou-se do outro lado do espelho de Roosevelt. A biografia mostrava como Roosevelt tinha a capacidade de iludir políticos, juízes, dizendo uma coisa e fazendo outra. E FHC se viu um Roosevelt brasileiro. Sem New Deal, um detalhe.
Nos seus tempos de glória, mandava vir do Rio de Janeiro o superlobista Jorge Serpa, o homem que atravessou todos os governos desde o Marechal Dutra. E apenas para a pergunta que a Bruxa fez para o espelho:
- Diga, Jorge, quem foi maior: Juscelino ou eu?
E Jorge, naturalmente, respondia:
- Claro que é você, Fernando!
E voltava para o Rio de Janeiro com mais um causo do príncipe, que fazia as delícias dos frequentadores do restaurante Mosteiro.
Digo tudo isso para enfatizar que a luta maior de FHC é para encontrar um significado para sua história, uma interpretação, uma teoria a posteriori que o possa colocar no panteão dos grandes nomes da pátria, em patamar mais alto que o metalúrgico abominável, que ele aprecia com os olhos de Salieri, e amaldiçoa com o pior dos sentimentos: a inveja histórica.
Assim como Salieri, FHC tem mais discernimento que a média dos seus seguidores, para entender a grandeza do mito Lula. O pior é isso: ele entende. E sabe que, independentemente do julgamento de amanhã no TRF4, a perseguição implacável da Justiça, da mídia, do Ministério Público a Lula, trouxe mais um capítulo épico à lenda do metalúrgico desbocado, orgulhoso da sua origem, que soube encarnar como nenhum outro, nem Garrincha, a verdadeira alma nacional, e com uma postura de estadista que nenhum outro, nem Getúlio, conseguiu igualar.
Essa é a tragédia de Salieri.
Absolvido, Lula tem o caminho pronto para voltar ao Planalto. Condenado, exporá ao mundo a perseguição de quem foi vítima, e a pequena dimensão política daquele que, fosse um pouco maior, teria iniciado o grande pacto nacional, ou, na pior das hipóteses, o desprendimento de se colocar contra o arbítrio.
Se FHC tivesse tido a grandeza de montar o pacto de salvação nacional com Lula, a esta altura estaria se ombreando com ele, dois gigantes empenhados em passar por cima de diferenças, pelo bem maior do país.

Não tendo a dimensão política exigida para os grandes gestos, a glória ou o martírio de Lula será o epitáfio para FHC, um estadista incompleto, vazio, fútil.

Advogado inglês de Lula desmoraliza a Justissa do TRF-4

Janio: o Léo Pinheiro que valeu foi só o último...
publicado 28/01/2018
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Por Janio de Freitas, na Fel-lha:

TRF-4 e Moro atribuíram a indícios o valor e as consequências de provas


Espectador do julgamento de Lula, o jurista britânico Geoffrey Robertson deixou algumas observações que, embora originárias dos procedimentos adotados na sessão, não dizem respeito só a esse caso, mas até ao próprio sistema judiciário brasileiro. Observações que têm, para a nossa Justiça, a importância esperável de um jurista de fama internacional e conselheiro da rainha Elizabeth 2ª. Ainda assim, fique dito desde logo, é improvável que a alta magistratura e o Ministério Público concedam atenção às observações de Robertson.

O interesse mais geral recai na prática de acusação e defesa. A tão comum diferença de tempo para uma e outra, em favor dos acusadores, é um desequilíbrio que, comprometendo o direito de defesa, compromete o próprio julgamento. O direito pleno de defesa, sem qualquer prejuízo ou diferença protocolar se comparada à acusação, não é apenas um princípio fundamental da Constituição. É também uma exigência da Carta Universal dos Direitos Humanos.

Entre acusação e defesa há uma ordem óbvia. A defesa só pode ser plena se, entre outras condições, conhecer toda a acusação. Essa ordem de exposições é também indispensável para a formação de votos conscientes e seguros dos magistrados, logo, para a qualidade da decisão mesma do tribunal. Como disse Robertson, o juiz precisa ouvir a acusação e, depois, o que a ela oponha a defesa, para ponderá-las e só assim formar o seu voto. A prática observada por Robertson, como poderia encontrar em outros julgamentos, foi a de julgadores chegarem com seus votos longos, semelhantes, autorreferentes -por escrito. Prontos, portanto. Mais uma vez, o jurista se sentiu "estarrecido" com isso "que é impossível acontecer na Europa".

De fato, onde fica o pleno direito de defesa? Aliás, fala da defesa para quê, se não importa nem que venha com novos dados e argumentos, porque os magistrados já chegam com suas decisões até escritas. Seus rostos podem voltar-se para o orador da defesa, mas suas fisionomias são as de quem vê um filme entediante. Com votos (e mesmo sentença) preparados antes do balanço acusação/defesa, a defesa fica, à revelia, como uma farsa judicial.

O pleno direito de defesa é vital no regime democrático. A redução de um nega a existência do outro. E o Judiciário deve ser o guardião do regime democrático prescrito pela Constituição.

No plano das observações domésticas, o desembargador João Pedro Gebran Neto foi prolífico em fornecimento de material. Ao fim de mais de três horas de confusa leitura do seu relatório, pareceu-lhe ainda haver tempo para repelir as críticas a práticas problemáticas da Lava Jato. Por exemplo, as decisões de Sergio Moro de manter presos, até capitularem, os resistentes às delações como esperadas. Marcelo Odebrecht ficou preso mais de meio ano sem ser ouvido. Até delatar, sua prisão foi esticada por mais de ano.

Léo Pinheiro, preso em novembro de 2014, conseguiu ser libertado, mas foi preso outra vez em setembro de 2016 e preso ficou. Assim sendo, não é estranho que o negócio de Lula com o apartamento, como é descrito por Moro e pelos três desembargadores, se baseie na delação afinal aceita pelo ex-presidente da OAS. Ao qual os desembargadores Gebran Neto e Leandro Paulsen até elogiaram.

O relator Gebran disse não ser verdadeira a prática de prisão extorsiva. Sim, os numerosos presos da Lava Jato até se renderem são indícios, só. Mas os desembargadores Gebran, Paulsen e Victor Laus, o juiz Sergio Moro, o procurador Deltan Dallagnol e seus colegas atribuíram explicitamente a indícios, até aos mais duvidosos, o valor e as consequências de provas.