segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Sérgio Sampaio, 70 anos: bloco na rua, samba-enredo no asfalto

por Miguel Martins publicado 25/02/2017 00h30, última modificação 25/02/2017 11h12
Homenageada por foliões, a obra do compositor capixaba é valorizada em projeto criado por seu filho para aproximar "sampaiófilos" pelo País

Arquivo Pessoal
Sergio Sampaio
Organizado pelo filho de Sérgio, o projeto Viva Sampaio reúne entrevistas, vídeos e belas fotos.
No ano em que o compositor capixaba, morto em 1994, comemoraria 70 anos, o conselho parece ter sido literalmente acolhido. O grande número de blocos registrados no País em 2017 confirma a vitalidade do carnaval de rua, especialmente em supostos “túmulos do samba”. Em São Paulo, estão programados quase 400 desfiles neste ano. No Distrito Federal, são perto de 200. Metáfora da angústia ante o silêncio imposto em tempos de repressão, o desejo de Sampaio parece tardiamente realizado: se não todo mundo, tem muita gente neste carnaval.
Coincidência ou não, diversas homenagens ao músico de Cachoeiro de Itapemirim (ES) marcam a folia deste ano. Na quarta-feira 22, o Bloco na Rua, uma reunião anual de "sampaiófilos", desfilou em Laranjeiras, no Rio de Janeiro, pelo quarto ano consecutivo.
Integrado por nomes como Jards Macalé e Luiz Melodia, o cordão apresentou neste ano um enredo em homenagem a duas das principais composições do cantor cachoeirense."O samba enredo é na escola/ Poesia é na calçada/ Durango Kid me prendeu/ Continua a batucada", diz o refrão, ao misturar os versos de Cada Lugar na Sua Coisa, do álbum Tem que Acontecer, de 1976, e de sua canção mais famosa.

Bloco na Rua
Criado em 2014, o Bloco na Rua volta a homenagear o compositor neste carnaval (Foto: Michelle Castilho)
Lançada como compacto em 1973, com 500 mil cópias vendidas, Eu quero é botar meu bloco na rua também foi repaginada e modernizada pelo grupo BaianaSystem e pela rapper Yzalú. Trilha de uma peça publicitária, a animada versão pouco lembra a interpretação melancólica e cortante de Sampaio.
Quando escreveu Eu quero é botar meu bloco na rua, o cantor vivia tempos de angústia. “Lembro que eu era muito sozinho, fiz a canção e sentia que ela tinha um poder”, relembrou na entrevista a Zeca Baleiro.
O compositor não negava, contudo, a força política daquele que seria um dos grandes hinos contra a censura e a perseguição do governo Médici, marcado pelo milagre econômico e pelo chamado “desbunde” da classe média. “A grande importância dessa canção é ter sido feita e lançada numa época em que as pessoas estavam muito amordaçadas e bastante medrosas de abrirem a boca para falar qualquer coisa”. O verso "(há quem diga) que eu morri de medo quando pau comeu" sintetiza o sentimento descrito.
A entrevista de 1989, concedida à revista Umdegrau, de Zeca Baleiro, é uma das preciosidades coletadas por João Sampaio, filho de Sérgio. Convencido da necessidade de preservar e divulgar a memória musical do pai, ele lançou o projeto Viva Sampaio, que reúne vídeos, documentários, entrevistas e belas fotos do compositor.

Sergio e Raul
Três Rauls foram fundamentais em sua trajetória, a começar por seu pai, Raul Sampaio, maestro de banda em Cachoeiro de Itapemirim (Foto: Arquivo Pessoal)
A reverência aos antecessores é uma postura comum à família Sampaio. Sérgio formou-se musicalmente ao acompanhar o pai e o primo, ambos de mesmo nome: Raul Sampaio. O primeiro era maestro da banda da cidade, o segundo compositor de belas canções, entre elas “Meu pequeno Cachoeiro”, um grande sucesso na voz de Roberto Carlos, conterrâneo da família.
Músico frustrado, como ele próprio define, João Sampaio sempre foi estimulado por amigos e por Zeca Baleiro, um grande entusiasta de Sergio, a organizar um memorial sobre o pai. “A grande dificuldade de sua trajetória sempre foi a falta de divulgação”, comenta. “Até porque a taxa de retorno de quem escuta Sérgio Sampaio é muito alta. Muitos viram ‘sampaiófilos’ depois de conhecerem sua música.”
Um dos mais destacados “sampaiófilos” foi Raul Seixas, principal responsável por abrir portas para a carreira musical do cantor. Antes de conhecer o roqueiro baiano, Sérgio trabalhou em rádios em Cachoeiro e no Rio, onde apaixonou-se pelas composições de Sílvio Caldas e Orestes Barbosa. A paixão por Beatles ganhou força no fim dos anos 1960. O movimento tropicalista, a bossa nova de João Gilberto e o samba de Paulinho da Viola também marcavam presença em seu toca-discos. Um ecletismo que atravessa a obra do compositor.
Em 1971, Sérgio foi convidado pelo amigo Odibar a acompanhá-lo no violão durante uma audição na gravadora CBS, onde Raul Seixas era produtor musical. Odibar apresentou algumas de suas composições, mas Raulzito não se impressionou. Foi a deixa para o violonista apresentar algumas canções de sua lavra. Sérgio foi contratado pelo roqueiro baiano no dia seguinte. “Meu pai e Raul se tornaram muito amigos”, diz João.
A amizade resultou na formação da Sociedade da Grã-Ordem Kavernista, um projeto musical anárquico inspirado nos Beatles e em Frank Zappa. Após gravar seu primeiro compacto pela CBS, Coco Verde, Sampaio juntou-se a Raul, Miriam Batucada e Edy Star e decidiram gravar um disco marcado pela liberdade criativa.
À época, o roqueiro baiano atravessava uma fase de ostracismo e compunha canções para outros intérpretes, mas Sérgio incentivava o amigo a ser protagonista. “Meu pai pedia para ele cantar, dizia 'você é artista', mas o Raul vinha com aquele papo de botar comida na mesa dos filhos”, diz João.
Assim como discos anárquicos contemporâneos como Paêbirú, de Lula Côrtes e Zé Ramalho, o álbum foi um fiasco de vendas. Sofreu ainda sucessivos cortes da CBS, conta João. “Naquela época, o disco da Grã-Ordem Kavernista não seria bem aceito nem mais revolucionária das gravadoras. Ele quebrava com tudo.”
Com Raul Seixas, Sérgio formou a anárquica Sociedade da Grã-Ordem Kavernista (Reprodução)
Após o fracasso do projeto, Sampaio e Raul despontariam com dois compactos de enorme sucesso: Eu quero é botar meu bloco na Rua e Ouro de Tolo, ambos de 1973. As canções resumiam com clareza e concisão poética o clima do milagre econômico, quando a classe média se acomodava com o enriquecimento pessoal e virava as costas para a repressão militar e a censura. “Meu pai nunca foi um cara politizado como o Chico Buarque ou o Gonzaguinha”, diz João. “mas ele acabou sendo político no desbunde.”
Apesar do sucesso de “Bloco na Rua”, Sérgio não conseguiu deslanchar comercialmente, ao contrário do amigo Raulzito. Não faltavam grandes canções e discos: Lançado em 1976, tem que Acontecer é uma obra-prima, na qual se destacam as faixas Que Loucura, Cada Lugar na Sua Coisa, Ninguém vive por mim e tantas outros clássicos obscuros da música popular brasileira.
“Ele era um cara mais preocupado em fazer do que em se promover”, diz João “Era também impulsivo. Após a gravação de Tem que acontecer, Roberto Moura, produtor do álbum, avisou que seria importante fazer ações para ‘colocar o disco na rua’. O Sergio simplesmente pegou o carro e se trancou em Cachoeiro. Um diretor de gravadora disse uma vez: 'Você pode me trazer tudo o que vier desse cara, só não quero ele na minha gravadora'."
Avesso à autopromoção, Sergio morreu em relativo esquecimento, mas o crescente número de “sampaiófilos” atesta a atemporalidade de suas composições. O Viva Sampaio tem funcionado como um ponto de encontro para iniciativas relacionadas à música do cachoeirense. Para comemorar os 70 anos de Sérgio, Aline Dias organizou, com apoio do projeto de João, o concurso literário “Sem a Loucura Não Dá”, que reúne uma série de crônicas e textos inspirados em canções do compositor.
Em tempos em que o povo brasileiro parece anestesiado frente aos desmandos na política, a poesia do desbunde de Sampaio volta a ser atual. “Quando você fala sobre o ser humano, a obra torna-se atemporal. O contexto muda, mas as angústias são as mesmas”, analisa João. Sérgio parecia buscar uma saída ao silencio de sua época. Com a promessa de ser barulhento, o carnaval de 2017 confirma uma das máximas de Cada Lugar na Sua Coisa:  “lugar de samba-enredo é no asfalto”. 

O uso de turbantes por pessoas brancas é apropriação cultural?

por Tory Oliveira publicado 18/02/2017 04h00, última modificação 17/02/2017 17h14
Uso sem reflexão de objetos e símbolos identificados com a cultura negra reacende o debate sobre o que significa a apropriação cultural

Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Mulher usa turbante na Marcha das Mulheres Negras
Manifestante na Marcha das Mulheres Negras, em Brasília, em 2015.
Identificado como um símbolo da população negra e da ancestralidade africana no Brasil, o adereço ganhou, nos últimos anos, destaque em editoriais de moda e passou a ser encontrado com facilidade em lojas, multiplicando seu uso por pessoas de diversas origens.
A produção em massa do objeto e o uso motivado apenas por interesses estéticos, inspira, porém, críticas e ressalvas feitas pela população negra, que aponta problemas com essa prática, se feita sem reflexão, como a invisibilização de quem produziu aquela cultura.
Por aqui, a discussão atingiu o ponto de ebulição no início de fevereiro, quando uma estudante de Curitiba escreveu em seu perfil no Facebook que teria sido criticada por mulheres negras por usar um turbante.
O post original foi compartilhado por 38 mil pessoas, um alcance galvanizado pelo fato de a autora justificar o uso do adereço por conta do tratamento que faz para leucemia e pelo uso da hashtag #VaiTerBrancaDeTurbanteSim.
O caso foi alvo de reportagens em diversos veículos e, seus desdobramentos, foco de vários comentários nas redes sociais.
Não é a primeira vez que o assunto ganha os holofotes. Em 2015, uma das estrelas do reality-show Keeping Up With the Kardashians, Kylie Jenner, foi criticada por uma foto em que aparecia com os cabelos trançados. No Brasil, a marca Farm também recebeu seu quinhão ao publicar um editorial em que apresentava uma modelo branca com um turbante e uma representação também pálida da entidade de matriz africana Iemanjá.

Farm
A marca Farm recebeu críticas por optar por modelos brancas para utilizar turbantes e representar Iemanjá
O debate sobre a apropriação cultural, porém, ultrapassa as fronteiras de uma discussão individual sobre se pessoas brancas podem ou não usar adereços como turbante, cabelos trançados ou dreads.
Trata-se, principalmente, de uma discussão sobre racismo, etnocentrismo, capitalismo e sobre o uso que instituições como a indústria da moda fazem de produções de grupos minorizados. Pesquisadora na área de representação do negro na mídia, a bacharel em História e educadora Suzane Jardim explica como se dá o processo de apropriação cultural.
O fenômeno acontece quando um estrato social historicamente dominante marginaliza uma etnia, religião ou cultura, tornando seus símbolos e práticas abomináveis aos olhos da sociedade. Com isso, o grupo marginalizado abandona tais práticas, como uma forma de se adequar, na tentativa de sofrer menos preconceito.
“Com esse processo concluído, o mesmo grupo responsável pela marginalização passa, então, a ressignificar essas práticas e símbolos antes condenados, tentando torná-los atrativos para a maioria da população e visando o lucro”, explica. “Nesse processo, toda a essência simbólica dos elementos é perdida. Eles passam a ser apenas objetos de desejo, cada vez mais caros e inacessíveis para os que foram primeiramente hostilizados”.
A filósofa Djamila Ribeiro, colunista de CartaCapital, dá o exemplo do axé music, nascido no Carnaval de Salvador, a cidade com a população mais negra fora da África. “O axé foi criado por pessoas negras, que hoje pulam o Carnaval segregadas, do outro lado da corda. As cantoras de axé que mais fazem sucesso hoje são brancas e loiras”, diz.
Além disso, o fato de cabelos trançados estarem na moda ou turbantes disponíveis em lojas de departamento e estampados em capas de revistas não se traduz em direitos e respeito aos negros e negras no Brasil. “Eu, quando uso turbante na rua, as pessoas me apontam e me discriminam. Ao mesmo tempo, uma pessoa branca com o mesmo acessório é vista como moderna”, conta Ribeiro.
"A mulher branca que não faz parte de religiões de matriz africana usa o turbante, as tranças ou os dreads porque viu em revistas de moda que aquilo a deixa bela, porque encontrou locais onde poderia comprar tudo aquilo e sabe que receberá elogios com o uso", afirma Suzane Jardim. Segundo ela, em geral esses elementos são vistos apenas como adereços estéticos.
Assim, explica ela, existe um aval sistêmico para o uso desses objetos, reforçado pela mídia e pela publicidade. Por outro lado, pondera, o mesmo não ocorre com uma mulher negra que toma as mesmas decisões. "É essa diferença de tratamento e de percepção na sociedade que causa o choque".
Para Rosane Borges, há um apagamento perverso e histórico das contribuições feitas pelas culturas negras e africanas.
"O Brasil é um país absolutamente apartado do ponto de vista das estruturas, mas que toma a cultura como um símbolo da ausência do racismo, porque somos todos juntos, todo mundo gosta de samba e de futebol", afirma a colunista de CartaCapital, lembrando que, por outro lado, as verbas destinadas à manutenção das casas de religiões de matriz africana não têm o mesmo vulto das destinadas às igrejas católicas, por exemplo.
Doutora em Antropologia pela USP, Marina Pereira de Almeida Mello reafirma que a apropriação cultural é um conceito que existe nas Ciências Sociais e Humanas. Ele, no entanto, refere-se muito mais às apropriações feitas pelas indústrias e pelo capitalismo em si do que a ações individuais.
"Essa proliferação do uso do turbante tem sido estimulada pela indústria, pelas confecções, pela indústria da moda, que tem investido em uma ideia de étnico totalmente descontextualizada", afirma a professora da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab).

Marcha das Mulheres Negras
Marcha das Mulheres Negras em Brasília, em 2015
Ela lamenta que o debate sobre um tema importante esteja sendo feito, de forma geral, de maneira tão polarizada e sem aprofundamento. "Para você respeitar, conhecer e reverenciar, é preciso um conhecimento. Como vivemos num mundo racista, isso acaba passando ao largo de todas as discussões"
As especialistas também apontam para a diferença que existe entre uma pessoa branca e uma negra ostentando turbante ou o cabelo trançado.
"Quando eu, mulher negra, afirmo no meu corpo elementos que são socialmente desprestigiados, o peso é diferente. No meu caso, estou resistindo a um movimento que pede a todo momento que eu alise meu cabelo e 'embranqueça'. Quando uma pessoa branca usa esses símbolos, ela não vai representar resistência ou ser excluída de nenhum espaço" , critica Mello.
Repórter especial de Estilo e Beleza na revista Azmina, Juliana Luna lembra que, há 10 anos, ostentar cabelos afro sendo negra era uma forma de resistência, que afrontava a sociedade. "As pessoas mandavam eu lavar o cabelo, me pentear, me chamavam de 'nega do cabelo duro'", conta.
Hoje, ela ministra oficinas de amarração de turbantes em que aceita também pessoas brancas. Segundo ela, é uma forma de construir pontes e de "furar a bolha" por meio do diálogo.
"A apropriação cultural não surgiu do nada, porque uma pessoa branca saiu na rua e colocou um turbante", afirma. "A repercussão aconteceu porque as pessoas se cansaram de ver certos elementos e símbolos culturais sendo utilizados dessa maneira, sem cuidado, sem nenhum interesse. É como se você pegasse uma coisa, utilizasse aquilo e jogasse no chão quando ficasse cansada. Não é assim, que a nossa cultura e a nossa sabedoria, as coisas consideradas dentro da cultura negra como sagradas, belas e importantes devem ser utilizadas", diz. "É como a questão do colonizador, de achar que aquilo lhe pertence, usar sem pedir licença e ainda invisibilizar o contexto histórico, social e cultural".

Futebol

Lições do “Atletiba” contra o monopólio da Globo

por Intervozes — publicado 20/02/2017 14h47
Postura das equipes demonstra a importância de resistir ao oligopólio midiático, cujo prejuízo para espectadores vai muito além do futebol

Atletiba
Os dois maiores clubes do Paraná, Atlético e Coritiba, negaram-se a obedecer a regra da Globo.
Com a torcida nas arquibancadas e os jogadores prontos para o jogo, o inacreditável aconteceu: a Federação Paranaense de Futebol, a pedido da Rede Globo, impediu a transmissão da partida online. Só haveria jogo sem transmissão, em recado da Globo aos clubes “rebeldes”. Como os clubes não recuaram, a federação impediu a partida de acontecer.
Acostumada a mandar no futebol nacional, a Globo não contava com a coragem das equipes. Com a ação, elas deram visibilidade aos prejuízos do monopólio da emissora ao esporte. Como discutimos há algumas semanas, os danos do monopólio de transmissões são muitos.
Desde o horário das partidas às dez da noite, péssimo para os torcedores trabalhadores e para os próprios jogadores, a campeonatos estaduais inteiros “escondidos” das torcidas. Do financiamento extremamente desigual dos direitos de imagem dos clubes, que inviabiliza o crescimento das equipes menores, à invisibilização do futebol feminino.
A frase “quem paga a banda, escolhe a música” tem sido usada há tempos pelos comentaristas submissos à Globo para justificar esses absurdos das decisões do monopólio. Nesse “Atletiba” ficou muito claro o quanto essa lógica é prejudicial a todos os envolvidos no esporte: não importavam os direitos dos jogadores, dos clubes, nem dos torcedores presentes na Arena da Baixada; não importava o futebol – só o interesse da emissora estava valendo.
Muitos torcedores brasileiros têm questionado o monopólio midiático no futebol, com campanhas como a “Jogo dez da noite, NÃO!”, que chegou a diversos estádios pelo País. No ano passado, a “Gaviões da Fiel” protestou com faixas “Rede Globo, o Corinthians não é seu quintal” e “Jogo às 22h também merece punição”. A novidade agora é o enfrentamento do monopólio pelos próprios clubes.
Combater o monopólio da mídia no futebol é possível, como comprova a experiência argentina. Lá, o programa “Futebol para Todos” e a regulação democrática da comunicação audiovisual (a famosa “Lei de Meios”) reconheceram o direito à audiência dos eventos esportivos pela população e o futebol como patrimônio cultural nacional.
As transmissões passaram a ser realizadas em diversos canais e horários, incluindo a televisão pública, com transmissões online gratuitas em alta qualidade. Além disso, as cotas de TV foram redistribuídas, melhorando a competitividade do campeonato nacional. Infelizmente, esses avanços estão sendo agora atacados pelo governo neoliberal de Maurício Macri.
Pode a internet abalar o poder da Globo?
Os clubes propuseram como alternativa à transmissão televisiva a exibição por suas contas nas plataformas Youtube e Facebook. Mas, se a intenção é fazer frente ao monopólio da Globo, é importante apontar alguns limites dessa transmissão online.
Em primeiro lugar, há uma disparidade de acesso: apenas metade (51%) das residências brasileiras possuem acesso à internet, segundo a pesquisa TIC Domicílios 2015/CGI. Entre os usuários de internet, 31% não possuem acesso à banda larga. A mesma pesquisa revela que 97% dos domicílios brasileiros possuem televisão – com acesso a canais abertos.
Portanto, ainda é muito desigual no Brasil o alcance e o acesso possibilitado pela televisão aberta e pela internet. Essa desigualdade de acesso também se reflete entre as regiões do território brasileiro e nas distintas condições presentes nas cidades.
Outro limite está dado pelas plataformas escolhidas. Youtube e Facebook estão longe de ser plataformas livres. Pertencem a grandes empresas estadunidenses que estão concentrando a produção e circulação de informações nas redes.
Eles são novos “porteiros” digitais, decidindo o que desejam censurar, o que nós podemos visualizar, quais informações terão ou não destaque. Transferir a concentração do controle da informação dos conglomerados da radiodifusão para os conglomerados de internet seria apenas mudar os donos do monopólio.
É preciso pensar políticas que democratizem efetivamente a comunicação, considerando a realidade do território brasileiro. Vale lembrar que a televisão aberta – caso da Globo – é uma concessão pública, que deve atender ao interesse público e cumprir regras previstas em nossa Constituição.
Para além do futebol
A Globo segue agindo como a péssima “dona da bola” do futebol de rua**. A emissora mandou seu recado: ninguém poderia contrariar uma decisão do monopólio. Desta vez, no entanto, os clubes enfrentaram o canal e deram um exemplo de que é possível dizer não e lutar contra os danos do monopólio ao futebol nacional.
Aos que começaram a perceber os prejuízos do monopólio da Globo ao futebol, é preciso, também, fazer um alerta: os danos de uma mídia monopolizada vão muito além do esporte. Nossos direitos de cidadãos são ignorados ou atacados como os direitos dos torcedores no “Atletiba”.
O controle dos discursos em circulação tem permitido aos monopólios sustentar golpes de estado, invisibilizar e criminalizar movimentos sociais e pautas de direitos humanos, defender políticas danosas aos mais pobres, criminalizar a juventude negra das periferias, entre tantos outros problemas. A diversidade cultural, regional, étnica e sexual presentes em nosso país são tão prejudicadas pelo monopólio quanto o futebol.
Que o “Atletiba” seja o início de uma resistência em defesa do futebol e da comunicação como direitos de todos. Precisamos ampliar essa resistência e o combate ao monopólio midiático, dentro e fora do futebol.

**Em nota, o SporTV se isentou da responsabilidade no episódio de ontem, apesar de evidências de que a partida não ocorreu por conta da tentativa de transmissão via internet, segundo disse o 4º árbitro do jogo.

*André Pasti é doutorando em Geografia Humana na USP, professor do Cotuca/Unicamp e integrante do Coletivo Intervozes

A alta do café

por Marcio Alemão publicado 27/02/2017 00h11, última modificação 23/02/2017 11h13
O produto deveria ser a nossa maior riqueza, mas demoramos muito para abrir os olhos e investir na qualidade

Café
Minha filha adora café. Comprei para ela. Para mim, qualquer Pilão me satisfaz.
Citei esse e nem sei se é o mais caro. A loja onde vende se chama TEM, abreviação de torrado e moído, fica na Rua Alagoas, 563, no bairro de Higienópolis, em São Paulo. Minha filha adora café. Comprei para ela. Para mim, qualquer Pilão me satisfaz. 
Sou bem vira-lata para café e já confessei por aqui. Mas eu fico feliz quando vejo uma loja como essa vendendo um produto que deveria ser a nossa maior riqueza. Demoramos muito para abrir os olhos e investir na qualidade.
O mundo passou buzinando. Será que ainda dá tempo de alcançar, ultrapassar e ouvir a música do Airton e algum Galvão gritando que somos os melhores produtores de café do mundo? Acredito que sim. 
Mas o que fazer com um preço desse tamanho? Quantas pessoas neste país podem pagar esse valor para provar um café altamente diferenciado? E a diferença entre o diferenciado e os conhecidos e populares é tão assombrosa que só se justificaria se, ao provarmos o tal, tivéssemos uma iluminação. Não sei qual seja ou seria, mas os seis números da Mega Sena seriam bem-vindos para que pudéssemos comprar mais desses cafés. 
Não vai rolar. Palavras de minha filha: “É muito bom, mas eu, com meu dinheiro, não pago”. Que outros mais abonados possam pagar para que os que produzem com qualidade não desanimem. 
Assim tem sido com todos os bons produtos da gastronomia, com algumas raras exceções. Lembrei agora do vinho e o vinho conseguiu o que o café talvez consiga: os tais bons para o dia a dia. Aqueles de valor moderado e que nos deixam felizes. E que, a exemplo do café, também apresentam notas florais, cítricas, minerais etc. e tais. 
Também sonho com o dia no qual encontraremos produtos orgânicos a preços dos envenenados. Também faz parte do sonho a descoberta de que os envenenados não fazem tão mal quanto alardearam. 
Sonhos, como você pode ver, são muitos. Um deles foi realizado: a absolvição do ovo. O mais ousado deles diz respeito aos exercícios físicos. Serão considerados pouco eficientes para a saúde. O mais importante, vão nos alertar os cientistas, é se alimentar com comida de muito sabor, usar muito o cérebro e deixar o corpo sossegado. Quem sabe? 

CHUVAS

PARA SE CONTRAPOR A ESTE BANDITISMO QUE ASSOLA O PAÍS DO GOLPE, NADA MELHOR  QUE AS NOTICIAS DE CHUVA E A  PRÓPRIA CHUVA QUE ESTÁ CHEGANDO AOS POUCOS, MAS, ESTÁ DANDO O AR DA SUA PRESENÇA, NA MAIORIA DO ESTADO TEMOS NOTICIAS DE CHUVAS EM MAIOR OU MENOR INTENSIDADE, SABEMOS QUE AINDA FALTA MUITO, MAS, JÁ É UM ALENTO MUITO BOM QUANDO ASSISTIMOS UM RIO DERRAMANDO ÁGUA NO SEU LEITO, FALO  DO RIO POTENGI QUE DESCEU COM ÁGUA NA SEMANA PASSADA, SERVINDO PARA RENOVAR AS ESPERANÇAS DO AGRICULTOR/A POR UM ANO REPLETO DE FELICIDADES COM LAVOURAS E PÁSSAROS POR  TODO CANTO.
ESTIVEMOS  NA REGIÃO DO SERIDÓ, JÁ TEMOS UMA PRESENÇA DE PASTO PARA O GADO E MUITA ÁGUA NOS BAIXIOS, JÁ MUDANDO E MUITO A  PAISAGEM.
EM SÃO TOMÉ LÁ PARA OS LADOS DE MORADA NOVA E RIACHO FECHADO, AS CHUVAS FORAM MAIS INTENSAS, CHEGANDO A 100 MILÍMETROS NUMA TARDE DE SÁBADO DE 15 ÁS 18 HORAS DE  CHUVA  INTENSA, COM BARREIROS E AÇUDES TOMANDO UMA BOA QUANTIDADE DE ÁGUA.

ESTÁ COMPLETO

ASSISTIMOS A INDICAÇÃO DE ALEXANDRE MORAIS  PARA O  STF, SIGNIFICA A DESMORALIZAÇÃO COMPLETA DE UMA INSTÂNCIA QUE JÁ ESTAVA EM PROCESSO DE DERROCADA COM O EPISÓDIO DO GOLPE, ESTAMOS AGORA COM UMA DUPLA INFERNAL DA CORRUPÇÃO, DO DESCARAMENTO, DO BANDITISMO. AVANTE BRASIL, SÓ NÃO SABEMOS PARA ONDE.

PML: Lula vem aí - e isso é ótimo!

É por isso que querem removê-lo da cena à força!
publicado 27/02/2017
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Conversa Afiada reproduz artigo do jornalista Paulo Moreira Leite:
No Brasil que transformou o Carnaval de 2017 num protesto inesquecível contra Michel Temer, o esforço para construir a candidatura presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva ganhará novo fôlego após a Quarta-Feira de Cinzas.
Estimulado por personalidades ligadas à resistência democrática, a começar por Chico Buarque e Leonardo Boff, em conversas reservadas ocorridas nos últimos dias, Lula tem deixado claro que está inteiramente convencido de que deve assumir de uma vez por todas a candidatura a presidente da República na sucessão de Michel Temer.
Quando os interlocutores perguntam se estaria disposto a voltar à presidência do Partido dos Trabalhadores, que em 2017 enfrenta a mais grave crise em quase 40 anos de história, a resposta de Lula tem sido um não categórico. Ele deixa claro que compreende a necessidade de ocupar cargos na direção do partido e participar dos debates essenciais que irão ocorrer antes e depois do próximo Congresso, a realizar-se em junho.
Mas, com a autoridade de quem lidera todas as pesquisas eleitorais, em função do reconhecimento popular pelas políticas econômicas favoráveis ao crescimento e distribuição de renda associadas a seu governo, o compromisso é concentrar-se na candidatura presidencial e discutir propostas que possam ajudar o Brasil a vencer a pavorosa crise -- econômica, social, política -- em que se encontra. A ideia central, aqui, é debater com urgência propostas de crescimento, visto como eixo que deve centralizar as preocupações com os destinos -- próximos e remotos -- dos brasileiros.
Dias atrás, a economista Laura Tavares levou a Lula dados sobre a Previdência que confirmam uma verdade fundamental no principal debate político dos próximos meses, tanto no Congresso como nos sindicatos e na casa de cada família de trabalhadores. Os números mostram que a saúde financeira de nosso sistema público de aposentadorias não envolve uma discussão no vazio de especialistas e consultores alinhados, mas alimenta-se de um componente essencial -- o comportamento da economia. Assim, nos anos de crescimento e ampliação do emprego com carteira assinada, a Previdência ganhou uma contabilidade saudável e até produziu receitas superiores a seus gastos. Já nos períodos de recessão, perda de empregos e isenções de contribuições, tragédia acentuada com o desemprego recorde após o golpe, ocorreu aquilo que até uma criança poderia imaginar -- os números se tornaram negativos. A ideia é deixar claro que essa realidade não constitui nenhuma surpresa mas permite reafirmar uma noção que Lula estabeleceu durante em seus oito anos de mandato: um país como o Brasil não tem alternativa além de crescer, crescer ou crescer.
No ambiente de dúvidas imensas que alimentam a conjuntura política de 2017, que envolvem inclusive a capacidade de sobrevivência de Michel Temer até 2018, o debate sobre o lançamento da candidatura Lula se apoia numa visão sobre o golpe parlamentar de agosto de 2016, partilhada por dirigentes e quadros experimentados do PT e dos movimentos sociais que têm participado de muitas conversas.
A análise é que a partir de maio de 2016, quando a Câmara aprovou o afastamento de Dilma, entrou em movimento um golpe que não se reduz a um lance único, mas deve ser compreendido como uma sequencia de operações destinadas a construir um estado de exceção. Desse ponto de vista, toda avaliação sobre o papel político de Lula na conjuntura só pode ser compreendido em acordo com a visão das partes interessadas.
Para os aliados de Temer e demais beneficiários do golpe, não apenas no universo político, mas também na República de Curitiba, Lula é o principal entrave para a consolidação do novo estado de coisas. Numa comparação que este blogueiro já explicitou em artigos anteriores neste espaço, em 2017 Lula tornou-se um personagem que, a exemplo de Juscelino Kubitschek em 1964, encontra-se no ponto de encruzilhada do momento político.
Caso Lula seja removido de cena à força -- como ocorreu com JK, cassado dois meses depois da queda de Goulart -- a evolução política irá avançar em direção ao enfraquecimento ainda maior da resistência democrática ao mais radical projeto conservador em curso no país desde o fim da República Velha, em 1930. Caso tenha seus direitos políticos preservados, e, como candidato, possa fazer o debate sobre os rumos do país, expressando uma visão legítima, apoiada por uma parcela respeitável da população -- a mesma que assegurou quatro vitórias consecutivas em eleições presidenciais, feito raro em qualquer democracia moderna -- a evolução será em outra direção.
Não é preciso confundir as coisas. O que se trata, como prioridade, é impedir um veto a sua candidatura -- no estilo que, em 1955, os adversários quiseram impor a JK, alvo de sucessivas maquinações antes, durante e depois de uma vitória clara nas urnas. Caso uma eventual candidatura de Lula não seja vitoriosa nas urnas, hipótese prevista em toda disputa eleitoral digna desse nome, a preservação de seus direitos políticos representa a continuidade da democracia nascida com a carta de 1988, que criou o mais amplo regime de liberdades desde a Independência, que assegura o respeito absoluto a liberdade de expressão e de opinião.
Essa convicção -- de que um veto a Lula é absolutamente inaceitável -- contribui para o desgaste de Ciro Gomes junto a diversos interlocutores do presidente. Sem deixar de reconhecer o comportamento leal que Ciro demonstrou em vários momentos, inclusive na AP 470, eles avaliam que Ciro só conforta os adversários do campo político à esquerda quando diz que a candidatura de Lula é um "desserviço" ao pais.
Para começar, é uma postura que não o aproxima de eleitores do PT, que, obviamente não acham que a candidatura Lula faz mal ao Brasil. Outro problema é que não consegue dar ao próprio Ciro um traço essencial a toda liderança política, em particular numa situação de beira de abismo -- a capacidade de colocar-se acima de projetos pessoais.
Um dado animador para a campanha de Lula reside na temperatura política interna do PT. Guardiã da memória do partido e sua principal fonte de energia nas horas difíceis da luta política, a militância tem ensaiado um movimento rumo às próprias raízes, a partir de um balanço crítico do golpe e dos erros cometidos no governo e no Congresso. Uma amostra desse novo momento tornou-se visível quando a bancada de deputados foi forçada a renunciar a uma aliança com Rodrigo Maia para a presidência da Câmara, sendo levada a apoiar uma candidatura de oposição a Temer. Não se trata de um gesto isolado, mas de uma nova melodia, que contraria a postura que se verificava em tempos recentes.
O preço cobrado por 13 anos consecutivos de governo federal, somados ao impressionante conjunto de prefeituras conquistadas e acumuladas, foi um esvaziamento do partido, que perdeu quadros e dirigentes para as funções de Estado. O PT também perdeu autoridade nas discussões políticas, em grande parte monopolizadas por quem se ocupava das funções de governo -- ou assumia funções parlamentares. O golpe contra Dilma, somado ao massacre municipal, modificou essa situação e abriu a necessidade do partido se revalorizar, tornando-se um centro real de discussão e tomada de decisão, o que só irá reforçar sua importância política. O debate sobre a nova direção, tema principal do Congresso, ganha uma importância particular em função disso.

domingo, 26 de fevereiro de 2017

Eliseu Padilha virou uma demissão incontornável

Josias de Souza
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MODELO DE DEMISSÃO DE MINISTROS A PRAZO PERDEU A VALIDADE


Instituído por Michel Temer há 13 dias, o modelo de demissão de ministros em suaves prestações já está com o prazo de validade vencido. Ministros denunciados pela Procuradoria na Lava Jato, esclareceu Temer, amargariam um afastamento temporário, conservando o salário e o privilégio de foro. Convertidos em réus pelo Supremo Tribunal Federal, os ministros seriam, aí sim, mandados ao olho da rua. Eliseu Padilha, o chefe da Casa Civil, ainda não foi denunciado. Tampouco virou réu. Entretanto, embora a ficha de Temer ainda não tenha caído, a demissão do chefe da Casa Civil tornou-se incontornável. Até aliados do presidente já admitem em privado que o mais conveniente seria que o ministro, licenciado por problemas de saúde, não retornasse.
Temer enxerga em Eliseu Padilha uma honestidade incrível. Mas o braço brasiliense da força-tarefa da Opreação Lava Jato passou a ver no ministro uma inocência inacreditável. A incredulidade dos investigadores cresceu depois que o ex-assessor presidencial José Yunes veio aos holofotes para dizer que recebeu, a pedido de Padilha, um envelope levado pelo doleiro Lúcio Funaro. O enredo tem pontos de contato com as delações da Odebrecht, que indicam o escritório paulista de Yunes como um dos endereços de entrega de parte dos R$ 10 milhões que Temer solicitou a Marcelo Odebrecht em 2014.
Em política, não adianta brigar com o inevitável. Diante de um pé d’água, a primeira coisa a fazer é encontrar um guarda-chuva. A segunda, é abrir o guarda-chuva. A terceira, é tentar se molhar o mínimo possível. Alcançado por um temporal, Padilha deixou Temer ensopado. O modelo de demissão a prazo —afastamento na denúncia e exoneração no envio ao banco dos réus— deixou o almoxarifado do Planalto sem guarda-chuvas. A fórmula pode interessar aos ministros que estão na chuva. Mas mantém a reputação do presidente, já encharcada, à mercê de todo tipo de intempérie.
A integridade de um presidente da República é como a gravidez. Não dá segunda safra. Mas convém a Temer manter ao menos as aparências. O autodenominado “núcleo duro” do Planalto se liquefez. A cúpula do governo vira chorume junto com a fina flor do PMDB. E Temer encontra-se perigosamente próximo do lixão para o qual a Lava Jato arrasta personagens como Renan Calheiros, Romero Jucá, Edison Lobão, José Sarney, Jader Barbalho… A atmosfera malcheirosa adensou-se com achegada ao Brasil dos operadores de propinas Jorge e Bruno Luz, presos em Miami. Licenciado da presidência do PMDB, Temer comandou o partido por 15 anos. Perdeu o direito de usar o bordão “eu não sabia”.