segunda-feira, 29 de julho de 2013



Diplomacia

Itamaraty rebate Joaquim Barbosa e nega racismo

Presidente do STF afirmou ter sido discriminado no Ministério das Relações Exteriores, definido por ele como “uma das instituições mais discriminatórias do Brasil”
por Redação — publicado 29/07/2013 13:47, última modificação 29/07/2013 14:00
 
 
Valter Campanato / ABr
Joaquim Barbosa
Ministro do STF disse ter sido discriminado no Ministério das Relações Exteriores, definido por ele como “uma das instituições mais discriminatórias do Brasil”
O Itamaraty negou negou as afirmações do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Joaquim Barbosa, de que o órgão seria racista. Em entrevista ao jornal O Globo, publicada no domingo 28, o ministro disse ter sido discriminado no Ministério das Relações Exteriores, definido por ele como “uma das instituições mais discriminatórias do Brasil”.
O ministro afirmou que “como em todos os trabalhos" do momento em que começou "a galgar escalões" foi discriminado. "Passei nas provas escritas, fui eliminado numa entrevista, algo que existia para eliminar indesejados. Sim, fui discriminado, mas me prestaram um favor. Todos os diplomatas gostariam de estar na posição que eu estou. Todos.”
Em nota, o Itamaraty disse ser oportuno lembrar que o ministério mantém o programa de ação afirmativa Bolsa Prêmio Vocação Para a Diplomacia, que visa proporcionar “maior igualdade de oportunidades de acesso à carreira de diplomata e de acentuar a diversidade nos quadros da diplomacia brasileira”. “Lançado em 2002, o programa já concedeu 526 bolsas para 319 bolsistas afrodescendentes. Dezenove ex-bolsistas foram aprovados no Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata e integrados ao Serviço Exterior Brasileiro. As bolsas concedidas têm atualmente o valor anual de 25 mil reais e devem ser utilizadas na compra de materiais de estudo e no pagamento de cursos preparatórios. Esse programa tem melhorado, de forma concreta e decisiva, as possibilidades de ingresso na carreira diplomática por candidatos afrodescendentes.”
Segundo o Itamaraty, desde 2011 há uma reserva de 10% das vagas na primeira fase do concurso para a carreira diplomata para candidatos afrodescendentes.
Barbosa foi oficial de chancelaria do Ministério das Relações Exteriores entre 1976 e 1979, tendo servido na embaixada do Brasil em Helsinki, na Finlândia.
Racismo
Na entrevista, o ministro negou ter intenção de ser candidato à Presidência da República em 2014 porque o Brasil não estaria pronto para um presidente negro. “Ainda há bolsões de intolerância muito fortes e não declarados no Brasil. No momento em que um candidato negro se apresente, esses bolsões se insurgirão de maneira violenta contra esse candidato.”
Barbosa também declarou ter ficado surpreso com a decisão unânime do STF em aprovar as ações afirmativas, como as cotas. “Entre as inúmeras decisões progressistas que o Supremo tomou essa foi a que mais me surpreendeu. Eu jamais imaginei que tivéssemos uma decisão unânime.”
Na ocasião, muitos ministros reconheceram haver racismo no Brasil em seus votos. “O que foi dito naquela sessão foi um momento único na história do Brasil. Ali estava o Estado reconhecendo aquilo que muita gente no Brasil ainda se recusa a reconhecer, e a ver o racismo nos diversos aspectos da vida brasileira.”
O ministro disse ainda que a ascensão da população negra a cargos de comando em diversas áreas ainda não é “algo muito significativo”. “Há muito caminho pela frente. Ainda há setores em que os negros são completamente excluídos”, afirmou. “O que de melhor nós temos é a convivência amistosa superficial, mas, no momento em que o negro aspira a uma posição de comando, a intolerância aparece.”

tália

O “dia D” para Berlusconi

Se for condenado nesta terça-feira 30, Berlusconi pode levar consigo o governo Letta e a economia da Itália. Por Wálter Maierovitch
por Wálter Maierovitch — publicado 29/07/2013 16:46, última modificação 29/07/2013 16:53
 
 
Giulio Napolitano / AFP
A Câmara de Férias da Suprema Corte de Cassação italiana, composta por cinco ministros, marcou para esta terça-feira 30, o julgamento do recurso interposto pelo ex-premier Silvio Berlusconi. Diz respeito ao apelidado processo Mediaset, ou seja, uma fraude fiscal, consumada nos anos de 2002 e 2003, de uma das suas empresas e equivalente a 7,3 milhões de euros.
Berlusconi, nesse processo Mediaset, restou condenado em primeiro e segundo graus de jurisdição. Na Corte de Apelação, Berlusconi recebeu as penas de 4 anos de reclusão e de 5 anos de interdição para o exercício de função pública. Atualmente, Berlusconi é senador e foi eleito como cabeça de lista do seu partido PDL-Popolo della Liberta.
Pela Constituição italiana de 1948 e em pleno vigor, a cassação de mandato em curso de senador depende da aprovação do Parlamento. Se o Parlamento não acolher de pronto a decisão da Corte de Cassação, Berlusconi, apesar de condenado, ficará inelegível apenas na próxima legislatura: com o ‘mensalão’ brasileiro a solução foi diversa, com o Supremo Tribunal Federal (STF) a entender, por maioria, a sua competência para cassar mandatos como efeito de condenação.
A Corte de Cassação não entra no exame do mérito da condenação e lá não existe, ao contrário do Brasil, foro privilegiado por prerrogativa de função. Pela lei procesual-constitucional, a Suprema Corte peninsular apenas verifica a legitimação, ou seja, nulidades, adequação da tipificação e coerência lógica na interpretação das provas.
Apesar de não ingressar no exame do mérito, Berlusconi continua a trombetear que, quando dos fatos, não assinou o balanço da Mediaset e era primeiro-ministro. Só que jamais reconheceu conflito de interesse e, só depois do escândalo, afastou-se da direção das suas empresas.
Em resumo, Berlusconi bate na tecla de que não pode ser co-autor de crime de fraude em razão de não haver assinado o balanço dado como falso. Trata-se da velha tese de sempre “sobrar” para o funcionário de escalão inferior, um “eterno bode expiatório”.
O processo Midiaset foi remetido para a Câmara de férias (julho e agosto a Corte entra em recesso de verão) pelo risco de se consumar a prescrição.
Nesta terça-feira, caso a Câmara de férias aceite o pedido de adiamento, o processo será enviado à câmara regular, em setembro. E a prescrição, segundo cálculos de juristas ouvidos pela mídia italiana, ocorrerá entre 13 e 26 de setembro. Em outras palavras, não haverá tempo para se evitar a prescrição.
O pedido de adiamento da sessão foi feito pelo advogado de defesa Nicolò Ghedine. Ghedine, de 53 anos, foi eleito senador na lista (sistema italiano de lista, igual o Partido dos Trabalhadores deseja numa reforma política) do partido de Berlusconi (PDL) e por sua imposição: passa-se até a impressão que a defesa técnica está sendo paga com o remuneração de senador.
No caso de condenação, Berlusconi não irá para a cadeia. Como tem mais de setenta anos, poderá cumprir a pena em prisão domiciliar ou, se quiser (ele já disse que não), trocar a prisão domiciliar por prestar serviços comunitários.
O problema político coloca o país em alerta. Decorre da aliança feita para a governabilidade da Itália. E foi celebrada, – com oposição do Movimento 5 Estrelas do cômico Beppe Grillo e do partido liderado pelo governador de esquerda Niche Vendola –,  entre o Partido Democrático (venceu a eleição mas não tem maioria na Câmara), o partido de Berlusconi (PDL) e a Scelta Cívica, do fracassado ex-premier Mario Monte.
Embora Berlusconi assegure que, da sua parte (não do PDL) e em caso da confirmação da sua condenação, não haverá a queda do governo do premier Enrico Letta, existe alto risco. E uma crise institucional, no momento, é tudo que a Itália não precisa.
Para muitos, Berlusconi, – ao dizer que a coalizão permanecerá de pé –, deixa no ar uma ameaça. E a pergunta que não quer calar: como o governo de Letta (centro-esquerda) poderá, – caso confirmada a condenação pela Corte de Cassação –, manter aliança com partido (PDL) liderado por um criminoso? Nessa linha, o próprio PD deverá rescindir o acordo, pois não poderá justificar uma aliança com o condenado Berlusconi. Na verdade, um eterno rival e que perdeu as últimas eleições. Como não houve acordo com Grillo e Vendola, e era o desejo do então candidato a premier Pierluigi Bersani, o PD, com Letta à frente, fechou com Berlusconi e com Monte, cujo partido tem representação mínima no Parlamento.
Claro que o governo de Letta cairá se Berlusconi for condenado pela Cassação. Aí, teremos, – com Berlusconi no comando político pois não será cassado no Parlamento –, uma nova eleição. Fora isso, a Itália, economicamente, poderá quebrar de vez, com reflexos planetários.
Na hipótese de a Corte de Cassação não deferir o pedido de adiamento, teremos, além da condenação ou da absolvição de Berlusconi, outras alternativas previstas na lei processual peninsular. Assim, poderá o processo ser anulado e remetido de volta para as instâncias inferiores, com prescrição em setembro próximo. Outra hipótese, bem italiana, é a de a Corte anular e reenviar o processo à Corte de Apelação. Isso para reexame lógico da prova e melhor motivação do juízo condenatório: nessa última hipótese, a prescrição se consumará.
Fora o processo desta terça-feira (Mediaset), Berlusconi responde, na Justiça italiana, a três outros:
1) No chamado processo “Ruby Rubacuore” e que versa sobre prostituição infantil e concussão, Berlusconi está condenado, em primeiro grau e por Milão, à pena de 7 anos de prisão e interdição perpétua para exercer função pública;
2) Em Nápoles e em primeiro grau, está previsto o julgamento do caso Di Gregório, onde Berlusconi é réu e aparece também como vítima. Di Gregorio, antigo senador eleito pela lista e imposição de Berlusconi, confessou ter dele recebido dinheiro para votar pela queda do governo do primeiro-ministro Romano Prodi, fato acontecido. Segundo Di Gregori, um ex-jornalista de destaque e tido como íntegro, Berlusconi comprou vários senadores. Os depósitos em sua conta-corrente servem para confirmar as corrupções passiva e ativa. Neste mesmo processo, Berlusconi aparece como vítima de chantagem feita por Valter Lavitola (ex-jornalista e testa de ferro usado em negócios ilícitos de Berlusconi). Lavitola, quando estourou o escândalo “bunga-bunga”, passou a chantagear Berlusconi pois era ele quem entregava dinheiro ao então senador Di Gregori.
3) O processo referente a grampos telefônicos e difusão das conversas, que tramita em Milão e Berlusconi é acusado de co-autoria, deverá prescrever em 7 de março, ou seja, se houver condenação e apelo, não haverá tempo para reexame.
Pano rápido. Para usar uma expressão italiana, Berlusconi faz o papel de “furbo” (espertalhão) ao garantir governabilidade e cumprimento da pena se for condenado. Já declarou que não fugirá como fez o premier Bettino Craxi (apanhado pela Operação Mãos Limpas e condenado, Craxi fugiu e anos depois morreu na Tunísia). No fundo, Berlusconi sabe que o governo Letta implodirá (com ele a Itália) no caso da sua condenação e espera uma decisão política da Corte de Cassação.

Transporte público

"Superfaturamento de 30% em trens e metrô lesou cofres em 425 milhões de reais"

Segundo revista, MP e Cade se surpreenderam com a quantidade de irregularidades encontradas nos acordos feitos entre os governos tucanos de São Paulo e as companhias encarregadas
por Redação — publicado 29/07/2013 11:48, última modificação 29/07/2013 12:07
 
 
Marcelo Camargo / ABr
alckmin
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, pede 'rigor nas investigações'
Com acesso a documentos inéditos e o depoimento voluntário de um ex-funcionário da multinacional alemã Siemens ao Ministério Público, a revista IstoÉrevelou que o esquema montado por empresas da área de transporte sobre trilhos em São Paulo para vencer e lucrar com licitações públicas nos governos do PSDB nos últimos 20 anos contou com a participação de autoridades e servidores públicos, além de abastecer um propinoduto milionário que desviou dinheiro das obras para políticos tucanos.
Ao analisar documentação e depoimentos colhidos, integrantes do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e do Ministério Público se surpreenderam com a quantidade de irregularidades encontradas nos acordos feitos entre os governos tucanos de São Paulo e as companhias encarregadas da manutenção e aquisição de trens e da construção das linhas. Segundo a investigação, o cartel superfaturou cada obra em 30%. Ou seja, de cada dez reais desembolsados com o dinheiro arrecadado dos impostos, os governantes tucanos jogaram nos trilhos três reais. Foram analisados 16 contratos correspondentes a seis projetos. Segundo o MP e o Cade, somente nesses negócios, os prejuízos aos cofres públicos chegaram a 425,1 milhões de reais.
Dentre os contratos envolvendo superfaturamento, segundo a publicação, está a instalação da fase 1 da Linha 5 Lilás do metrô da cidade de São Paulo. A licitação foi vencida pelo consórcio Sistrem, formado pela francesa Alstom, a alemã Siemens, a ADtranz (da canadense Bombardier) e a espanhola CAF. Os serviços foram orçados em 615 milhões de reais. Segundo testemunhos ao Cade e ao MP, o contrato rendeu uma comissão de 7,5% a políticos do PSDB e dirigentes da estatal – o que significa cerca de 46 milhões de reais em propina.
De acordo com a revista, o responsável por estabelecer o esquema com as empresas no contrato era o executivo Masao Suzuki, da Mitsui. Apesar disso, sua empresa não foi a principal beneficiária. Quem ficou com a maior parte dos valores recebidos na fase 1 da Linha 5 Lilás do metrô foi a Alstom, que comandou o cartel durante a licitação.
Já no contrato da Linha 2 do metrô, o superfaturamento identificado até agora causou um prejuízo de 67,5 milhões de reais ao tesouro paulista. As licitações investigadas foram vencidas pela dupla Alstom/Siemens e pelo consórcio Metrosist, da qual participa também a Alstom também fez parte. O contrato, orçado em 81,7 milhões de reais, previa a prestação de serviços de engenharia, o fornecimento, a montagem e a instalação de sistemas destinados à extensão oeste da Linha 2 Verde. Desde que foi assinado, em outubro de 1997, recebeu 13 reajustes. Enquanto as multinacionais francesa e alemã ficaram responsáveis pelo projeto para fornecimento e implantação do trecho Ana Rosa/ Ipiranga. A Asltom e a Siemens receberam 143,6 milhões de reais para executar o serviço.

Papa é um Feliciano com muito mais poder e o apoio da Globo

Opinião / visita do papa

Homofobia, machismo, apego ao dinheiro, religião interferindo no Estado. Os motivos que inspiram o “Fora Feliciano” se aplicam ao papa. Com o agravante de que ele é bem mais poderoso
por Lino Bocchini — publicado 23/07/2013 14:49, última modificação 23/07/2013 16:34
 
 
globo papa.jpg
No Jornal Nacional, fiel chora de emoção ajoelhada diante do microfone da Globo
Os evangélicos estão sendo injustiçados. O tsunami de críticas que atingiu Marco Feliciano, Silas Malafaia e demais líderes evangélicos fundamentalistas se aplica ao papa Francisco e à Igreja Católica. Explico: as mesmas bandeiras conservadoras levantadas pelo presidente da Comissão de Direitos Humanos do Congresso estão no centro da atuação da igreja católica há séculos. E o argentino Mario Bergoglio, agora chamado de Francisco, comunga destes ideais e não se mostra disposto a alterá-los. Pelo contrário.
Vamos por partes:
Primeiro, a homofobia
Muito se reclamou da atuação de Feliciano contra os direitos fundamentais dos homossexuais. A coleção de frases e a atuação do pastor não deixam dúvidas quanto à sua posição. Como é sabido, a igreja católica igualmente condena a homossexualidade, e considera pecado o amor da população LGBT.
O próprio Francisco, pessoalmente, demonstra preocupação com o que chama de “lobby gay” no Vaticano. Conforme revelou o site católico Reflexión y Liberación, o pontífice afirmou o seguinte em uma audiência recente com a diretoria da Confederação Latino-Americana e Caribenha de Religiosos: “Na Cúria há gente santa de verdade. Mas também há uma corrente de corrupção, é verdade. Fala-se de lobby gay, e é verdade, ele está aí... temos que ver o que podemos fazer”.
Segundo, os direitos da mulher
Em entrevista para o livro “Religiões e política”, o deputado do PSC-SP afirmou o seguinte: “Quando você estimula uma mulher a ter os mesmos direitos do homem, ela querendo trabalhar, a sua parcela como mãe começa a ficar anulada, e, para que ela não seja mãe, só há uma maneira que se conhece: ou ela não se casa, ou mantém um casamento, um relacionamento com uma pessoa do mesmo sexo; [assim] você destrói a família, cria-se uma sociedade só com homossexuais, e essa sociedade tende a desaparecer, porque ela não gera filhos”.
A igreja católica sempre tratou a mulher de forma diferenciada. A começar pelo fato de que elas não podem ser ordenadas. Aos homens (padres) cabe orientar os fiéis, ditar os rumos da igreja e do mundo. Às freiras cabem tarefas como cuidar dos enfermos e necessitados e, por exemplo, cozinhar, lavar e passar para o “homem simples de fala mansa” que está entre nós.
Mais: estão sendo distribuídas 2 milhões de cópias de um Manual de Bioética (em PDF) durante a visita do papa ao Brasil, sendo quase a metade da tiragem a versão em português, segundo informações da Confederação Nacional de Bispos Brasileiros. De suas 72 páginas, praticamente a metade traz pilhas de informações “científicas” e julgamentos morais contra o aborto. O restante divide-se entre a condenação de pesquisas com células-tronco, a condenação da inseminação artificial e a condenação da eutanásia.
O direito sobre o próprio corpo, uma questão que o movimento feminista do mundo todo considera vital desde a década de 1960, é classificado como “crime” em diversos pontos do texto. De acordo com o manual, mesmo em caso de estupro ou de inviabilidade do feto, a interrupção da gravidez não pode ser sequer aventada: “O direito de matar o próprio filho não pode ser fonte de liberdade nem de realização pessoal”. Todos os métodos contraceptivos, pílula e DIU inclusive, são considerados abortivos e criminosos.
Em terceiro lugar, o apego ao dinheiro
Causou espécie um vídeo que circulou recentemente, no qual o pastor Marco Feliciano pedia a senha de um cartão de crédito para um fiel, dizendo que, caso a senha não fosse revelada, “o milagre não viria”. Costuma ser igualmente criticada a cobrança do dízimo por parte de igrejas evangélicas –como se a igreja católica não o fizesse.
Tudo isso, contudo, é esmola perto do patrimônio misterioso e incalculável da igreja católica. A revista Exame fez uma reportagem bastante reveladora sobre o Banco do Vaticano. Entre diversos casos de lavagem de dinheiro, escândalos sexuais, corrupção e má administração relatados pela publicação, destaco uma informação: o banco gere cerca de 6 bilhões de euros em ativos. Vou repetir: 6 bilhões de euros.
Isso sem contar as milhares de propriedades da igreja católica ao redor do globo todo. Não sou um estudioso do cristianismo, mas acredito que valores como ajuda ao próximo, desapego e amparo aos pobres não combinam com a acumulação de fortunas dessa grandeza. Mesmo que o chefe da instituição prefira andar num fiat “sem luxo” e dormir num “quarto simples”.
Em quarto lugar, a promiscuidade com o poder público
Muito se critica Feliciano e a bancada evangélica por usarem o poder público que detêm para obter vantagens para suas instituições. O que afronta o conceito de estado laico. O catolicismo faz o mesmo.
O amplo uso de estruturas e verbas públicas durante a visita de Francisco; o mesmo lobby para isenções fiscais e outras benesses financeiras; a mesma submissão dos governantes (de Dilma ao vereador de Pindamonhangaba). Mais: há crucifixos em repartições públicas (desrespeitando os evangélicos, inclusive) e mensagens religiosas nas notas de dinheiro, que são um símbolo nacional. E por aí vai.
(Parênteses: pedofilia)
Aqui não há o paralelo com Feliciano, mas vale lembrar das inúmeras acusações de abuso sexual contra padres no mundo inteiro, muitas cometidas contra menores e encobertas pelo Vaticano. A situação é tão grave que a ONU pediu, agora no começo de julho, esclarecimentos sobre os crimes cometidos por padres em todo mundo. Como o vaticano é membro das Nações Unidas e tem a falta de transparência como uma de suas marcas, a ONU quer saber o que a Igreja Católica têm feito de efetivo contra os criminosos que foram descobertos em suas fileiras.
Por fim, o apoio da mídia
Aqui, uma das maiores injustiças com Marco Feliciano. O pastor é hostilizado por todos, TV Globo inclusa. Suas posições, conforme demonstrado, são irmãs siamesas das defendidas por Francisco e pela religião que comanda. E dos dogmas vindos de Roma ninguém reclama.
Pior: a maior TV do país (bem como quase todos os outros veículos de imprensa) ajoelha-se ao mandatário da tv católica. E não acredito ser esta uma decisão baseada somente pela audiência. A missa de domingo está na grade da Globo há décadas --atualmente é celebrada ao vivo pelo Padre Marcelo. E a emissora, apenas recentemente, de olho na perda de audiência e de dinheiro, começou um flerte institucional com os evangélicos, inaugurado com o festival de músicas gospel Promessas.
Pare finalizar, deixo vocês com algumas frases do primeiro bloco do Jornal Nacional desta segunda-feira. Tentem imaginar Marco Feliciano ou qualquer outro líder evangélico sendo tratado desta forma pelo noticioso visto por quase metade da população brasileira toda noite:
“De papamóvel, fez um passeio que vai ficar na memória dos fieis”
“Distribuiu simpatia”
“Mais perto do povo, do jeito que o papa Francisco gosta”
Fiel: “Foi um presente de Deus, eu consegui estar perto dele e pude constatar que ele realmente é esse pastor humilde, amigo do povo e que veio pra resgatar mais fieis pra igreja católica”
“Deixou uma legião de fieis encantados”
“Santo, abençoado, humilde... os elogios vão brotando”
Fiel: “Ele é gente como a gente”
“A cada esquina ele faz novos amigos”
“Os gritos pareciam saídos de um show de rock”
“Se fosse só isso, já valeria a pena, e o papa Francisco acabou de chegar”.

São Paulo

Repressão policial impulsionou a delinquência urbana, diz socióloga

Estudo de Alessandra Teixeira, da USP, mostra que a mistura de omissão e violência proporcionou as condições para a articulação do crime organizado
por Paloma Rodrigues — publicado 24/07/2013 13:54, última modificação 24/07/2013 13:57
 
 
Marcelo Camargo/ABr
Polícia Militar
Reintegração de posse de um terreno ocupado no Jardim Iguatemi, zona leste da capital paulista, em março deste ano

O processo da construção da criminalidade no Brasil foi diretamente influenciado pela atuação das polícias. A conclusão é da socióloga Alessandra Teixeira, que em sua pesquisa analisou a construção da ilegalidade no Estado de São Paulo da década de 1930 até os dias atuais e verificou que a base do policiamento do Estado se fincou em dois pontos: repressão violenta e uma mistura de omissão e corrupção, características comuns nas polícias civil e militar. O estudo também indica que o aumento da repressão antecede a disseminação do crime organizado e que essa repressão colabora para sua massificação.
A pesquisa de Alessandra é um doutorado realizada na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e analisou depoimentos de ex-presos, biografias e relatos policiais, além de relatos e reportagens jornalísticas de todo o período (a pesquisa em PDF pode ser acessadaAQUI).
Segundo Alessandra, o atual modelo do crime em São Paulo se configurou no final dos anos 1980 e início dos anos 1990. A organização da “economia da droga”, termo usado pela socióloga, se dá em grande parte dentro dos presídios. “Neste período ocorreu a prisão em massa, direcionada aos autores de roubo e da 'criminalidade patrimonial desarticulada', proporcionando um 'recrutamento' da população para o espaço da prisão”, diz. A partir disso, afirma Alessandra, o Estado brasileiro teria permitido a formação de uma situação particular que influenciaria os moldes do novo mercado do crime: um misto de omissão do controle das forças dentro das prisões ao mesmo tempo em que usava de repressão violenta. “O Estado não se interessava em controlar o monopólio da violência dentro das prisões e permitia que acontecesse uma luta permanente por poder entre os presos”, afirma. Por outro lado, o Estado fortalecia a tortura e a violência dentro das cadeias. “Foi o caldo de onde nasceu o PCC. Ele não só nasce, como se consolida e se expande por meio da prisão”, diz.
A base da omissão das polícias, que Alessandra chama de permissividade, está nas origens das instituições de policiamento. Nos anos 1960, a ilegalidade se concentrava em regiões específicas da cidade, como o quadrilátero da Boca do Lixo, no centro da capital paulista. Nesses locais, funcionava o esquema da “mercadoria política” em torno da prostituição. “A mercadoria política é o 'acerto', o preço pela liberdade, o dispositivo que se estabelece com o agente que deveria aplicar a lei, mas que cobra para se omitir de aplicá-la”. Os crimes giravam em torno da exploração da prostituição em si, do jogo e do pequeno tráfico de drogas. “Nos anos 60, as prostitutas tinham que pagar a 'caixinha' para os policiais para continuar exercendo a profissão nas ruas.” O perfil dessa mercadoria política muda ao longo dos anos, mas a lógica se mantém.
A “gestão de ilegalismos”, segundo Alessandra, vai para além da esfera dos órgãos policiais. “As secretarias e o judiciário também têm um modus operandi. O judiciário brasileiro é absolutamente tolerante a qualquer violência institucional promovida. As instituições se blindam internamente, é preciso que escândalos aconteçam para que algo mude”.
Histórico. No período do Império até meados do século XX, a repressão era voltada para o controle da vadiagem. "A definição do que era o vadio era subjetiva e feita a partir de critérios discriminatórios", diz. A socióloga explica que a criminalização daqueles que não trabalhavam e eram considerados improdutivos (os "vagabundos") pode ser relacionada à libertação dos escravos. "O fim da escravatura colocou um enorme contingente de negros nas ruas, o que fez com que as elites quisessem controlar essa demanda, muitas vezes definindo essa massa como insubmissa ao trabalho", diz.
Para operar esse controle foi criado um sistema de prisões para averiguação. Essas casas de detenção abrigavam aqueles que a polícia acreditava ter potencial para a ilegalidade, um critério que, segundo Alessandra, era subjetivo e discriminatório, considerando que muitas suspeitas surgiam sem que houvesse provas. "O local passou a ser chamado de 'mofo', porque as pessoas eram colocadas lá e ficavam por muito tempo, até que se averiguasse se elas eram culpadas ou não. Era um número excessivo de prisões para um baixo número de investigações e inquéritos."
O crescimento urbano gerou um boom populacional a partir de meados dos anos 1960, fazendo com que as periferias das cidades passassem a receber contingentes cada vez maiores de pessoas. "É um momento que, apesar da expansão, é de crise. Vão nascer dali as formas mais precárias de habitação”, diz Alessandra. É neste período que surge o fenômeno da marginalização, com o marginal já nascendo como uma figura vista, a priori, como perigosa. “Você tem aqueles farrapos urbanos - que de fato cometem pequenos crimes -, mas você não tem o número de roubos nem a organização que temos hoje", diz. "Aquilo gerou uma distorção da realidade, incentivada pela ditadura.”
A ditadura, em 1969, faz da Polícia Militar, seu braço armado, o único detentor do policiamento na cidade, enquanto a Polícia Civil se torna uma polícia judiciária e investigativa. Até então, o policiamento se dividia entre a Força Pública, uma instituição que apesar de ser moldada pelos preceitos militares, não tinha ligação direta com o Exército, e a Polícia Civil. “A PM nasce como uma força ambivalente: ao mesmo tempo em que era uma força de repressão do Estado, que reprimia contraventores e questionadores do regime, era a força que combatia o crime urbano”, explica a socióloga. O golpe de 64 e o policiamento por ele empregado estigmatizam a população às margens das grandes cidades e reforçam o sentimento de insegurança da população.
Mesmo depois do fim da ditadura, a postura repressiva da polícia não se perdeu. Na verdade, o que Alessandra aponta é que a evolução caminha na direção contrária: na última década se observa uma política mais intensa de valorização da PM, com a transferência maciça de recursos para a corporação, em detrimento da Polícia Civil e de outros órgãos também ligados a segurança pública. Entre 2005 e 2010, diz a pesquisadora, a PM recebeu 35% a mais dos recursos previstos no orçamento do Estado, enquanto a Polícia Civil recebeu 13% a menos do que o planejado. Em valores, são quase 300 milhões de reais a mais para a PM e 65,6 milhões de reais a menos para a Polícia Civil. "O sucateamento de Polícia Civil continua e isso é grave, porque se perde o poder investigativo e o que passa a ter destaque são as 'operações'. Tudo passa a ser com uma operação militar de guerra, com invasões de favela e combate ao tráfico".
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