Os atravessadores
Entre as empresas de geração eólica e os agricultores donos das terras, há uma figura que lucra muito com todo o negócio. São os atravessadores, geralmente conhecidos dos moradores que são convocados pelas empresas para convencê-los a assinar os contratos. Eles são chamados pelos locais de “corretores dos ventos” e recebem uma porcentagem dos acordos fechados.
Mariana Traldi calculou os ganhos dos atravessadores com base em dados disponíveis na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, a CCEE, e no Operador Nacional de Sistemas Elétricos, o ONS.
Em um dos parques eólicos analisados, da francesa Voltalia Energia, a pesquisa estimou que um mesmo advogado intermediador recebeu quase cinco vezes mais do que cada um dos arrendatários. Em 2017, a empresa arrendou 57 lotes (ao todo, 2.850 hectares) e fechou acordo para ratear 2% do faturamento bruto mensal da empresa entre todos os proprietários. Na ponta do lápis, são R$ 50.716 anuais para cada um, ou R$ 4.226 ao mês. Já o atravessador recebeu 7,5% de cada um dos contratos. No saldo final, embolsou R$ 234 mil.
Procurada, a Voltalia, me disse desconhecer a existência de atravessadores e fechar contratos diretamente com os donos de terras. Contudo, admitiu que estimula os proprietários a contratarem, “por livre escolha deles”, advogados que prestem assistência jurídica nos acordos.
Moema Hofstaetter, pesquisadora do Laboratório Sociedades, Ambientes e Territórios da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, afirma ter se deparado em campo com vários abusos cometidos pelos atravessadores.
“Encontramos situações em que o terreno foi arrendado por R$ 1 mil a cada torre, mas os assentados recebiam só R$ 300, porque o atravessador embolsava R$ 700”, ela afirmou.
Hofstaetter contou que, ao visitar famílias que negociaram arrendamentos para as eólicas, topou com sítios cercados e vigiados por capangas armados. Além disso, as empresas impediam que os agricultores proprietários entrassem na área, circulassem livremente por estradas que dão acesso às usinas e plantassem coqueiros, mangueiras e cajueiros.
A proibição ao cultivo da terra é uma ordem silenciosa de expulsão, afirma. Os pequenos agricultores muitas vezes acabam obrigados a ir embora para a cidade, se encostando em familiares distantes ou buscando subempregos em ramos que mal conhecem. “Eles são expropriados, espoliados e já perdem a posse da terra, mesmo que simbolicamente, quando são impedidos do acesso a toda a propriedade”, diz Hofstaetter.
Questionada sobre as situações relatadas pelas pesquisadoras, a ABBEólica negou que agricultores sejam impedidos de acessar suas terras ou seguir com suas atividades.
A entidade também disse repudiar a atuação de atravessadores. “É uma prática que repudiamos e que as empresas, nas regiões em que atuam, tentam coibir por meio do seu relacionamento com a comunidade”.
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