sexta-feira, 26 de agosto de 2022

DESMATAMENTO E HIDRELÉTRICAS

 POR: CÍCERO PEDROSA NETO
Se parte da importância dos manguezais reside no fato de que entre suas raízes se proliferam os caranguejos, a vegetação ciliar dos rios amazônicos cumpre um papel similar para a reprodução dos peixes de água doce. “Igual que o manguezal, a mata ripária [vegetação próxima aos cursos d’água] tem uma função de proteção dos jovens, de berçário”, diz Victoria.

“Quando a chuva cai, a planta segura o sedimento. Se não tem mais mata, chove e lava o solo. E esse solo lavado vai cair pro rio”, explica a bióloga. “Tem vários trabalhos que mostram que a longo prazo, 50, 100 anos, vai mudar toda a dinâmica desse rio devido a essa contribuição errada, digamos assim da falta de mata.” A mudança do uso do solo, a transformação da floresta para pasto ou monocultivo de soja ou milho, por exemplo, afetam diretamente a reprodução do pescado.

As hidrelétricas, por sua vez, representam uma ameaça para os peixes do interior da Amazônia, por interromperem os fluxos migratórios, “empobrecendo geneticamente as populações, isolando a população acima e abaixo, criando subpopulações”. Segundo a pesquisadora, as hidrelétricas têm levado a uma substituição de espécies. Há casos em que há tamanha alteração hidrológica do rio que certas espécies se afastam ou não conseguem conviver nesse ambiente. Ocorre então uma substituição por espécies mais simples, que não migram ou não necessitam entrar nas várzeas ou nos igapós para se reproduzir.

Um dos locais onde hidrelétricas afetam a reprodução de pescados é o rio Xingu, que, barrado por Belo Monte, vive um declínio na reprodução de peixes.

Victoria explica que a dependência dos pescados como fonte de proteína para alimentação é maior no interior que no litoral, devido à dificuldade de acesso a centros urbanos. “Grandes ameaças perpassam certamente pelas hidrelétricas, pelo desmatamento para construção de campos de soja, pelo desmatamento para construção de portos.”

Cícero Pedrosa Neto/Agência Pública
“90% da população [amazônica] tem o peixe como fonte de proteína nessa região”, diz Adalberto Val, biólogo e pesquisador

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