Não há razão científica que justifique a proibição do uso da cannabis para tratamentos médicos, e menos ainda a perseguição de médicos que fazem sua defesa. É o que pensa Paulo Fleury Teixeira, médico, pesquisador e filósofo que publicou, na semana passada, o texto de defesa pública Por que eu receito maconha, no Outra Saúde. Conversamos com ele, para entender melhor suas pesquisas e sua clínica, e a entrevista pode ser lida em nosso site. O médico está sofrendo processos dos Conselhos Regionais de Medicina da Bahia e do Paraná por sua prescrição a pacientes – mas sobretudo por sua militância a favor do tema. Paulo acredita que o tratamento com derivados da cannabis, muito eficaz e de extrema segurança, pode representar uma transformação importante. É o que ele chama de medicina canábica. Paulo começou a estudar a cannabis com pacientes com epilepsia, mas logo voltou sua pesquisa para o tratamento de autismo. Em um trabalho inicial com 18 crianças autistas da região de Belém (PA), ele percebeu que os resultados com o óleo de canabidiol eram excelentes. Sua defesa do tratamento com a maconha também se baseia no fato de que o produto é extremamente seguro. "Vi evidências, desde o princípio, da efetividade da planta ou de seus princípios ativos no tratamento de diversos problemas de saúde, às vezes problemas muito graves”, escreveu Paulo em sua defesa pública. “Essa evidência vinha da literatura médica da área, que cresce cada vez mais, assim como da minha própria prática clínica.” Paulo percebe a eficácia do uso de produtos derivados da maconha – ou mesmo de seu consumo tradicional, em cigarros feitos com as flores da planta – para diversas outras condições. Ele lista algumas das que atende: “Hoje, quem mais frequentemente me procura são pacientes com dor crônica, autistas, ansiedade, insônia, depressão, epilepsias, fibromialgia, os distúrbios neurodegenerativos (como Alzheimer e Parkinson), dependência química”. O médico tem 35 anos de prática clínica, mas trabalhou por muito tempo com medicina preventiva e saúde pública. Oito anos atrás, começou a fazer pesquisas com tratamentos que utilizam a cannabis em diversas formas. Isso deu novo sentido à sua profissão, e hoje ele é um propagador de conhecimento em torno da medicina canábica. Faz palestras pelo Brasil e ajudou a criar várias redes de cultivadores, que fornecem derivados da maconha para milhares de pacientes. Mas Paulo preocupa-se com o fato de que os fármacos são muito inacessíveis financeiramente – e que a proibição da planta é um grande entrave à democratização do acesso a essa medicina. “Ao fim e ao cabo, se trata de uma planta. Pode ser de custo próximo a zero para a pessoa, caso ela tenha condições de cultivar em casa”, comenta. Mas, para populações marginalizadas, isso é impossível – negros são presos em número muito desproporcional ao de brancos por suposto tráfico de drogas, mesmo portando quantidades pequenas. “Essa é uma face ainda não compreendida do fascismo”, defende Paulo. “A política antidrogas é uma política fascista, de terrorismo de Estado. É uma forma de justificar a violência indevida, abusiva contra certos grupos, extratos ou culturas.” |
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