quinta-feira, 8 de setembro de 2022

 

Assédio e objetificação

outrasmidias

por: intercpt Brasil

Marcelo, motorista negro, me disse que muitos usuários escondiam bolsas quando entravam em seu carro e demonstravam preocupação com a chegada ao destino final. A nota dele é 4. Felipe, usuário do app autodeclarado pardo e também nota 4, teve a mesma percepção. “Já me senti constrangido algumas vezes quando tive de pegar um Uber à noite e o motorista fazia comentários sobre roubos ou assaltos assim que eu entrava”. Fernando, negro, motorista da Uber nota 4, me relatou que, em uma discussão com uma passageira, no desembarque, chegou a ser chamado de “macaco”.

Já motoristas e passageiras mulheres compartilharam casos que cruzam racismo e machismo. Gabriela, motorista da Uber negra nota 4,4, enxerga racismo na avaliação e machismo na interação com os homens. “Um homem branco achou que, por eu ser mulher e negra, motorista, eu podia também fazer programa, e fez várias insinuações durante o trajeto, me constrangendo e me assediando. Não o deixei na estrada porque era uma corrida boa, e eu precisava da grana naquele dia”, ela me relatou.

Já Helena, usuária da Uber, foi assediada pelo motorista. “Acredito que o fato de ser uma mulher negra por si só faz com que os homens achem que sou pública, que podem falar o que quiserem e tudo bem. Eu não reclamei. Mas deveria ter feito uma reclamação. Não vou mais deixar passar”. A nota dela é 4,67.

Nas minhas entrevistas, também observei casos de racismo velado, ou seja, quando o racismo não é expressado verbalmente, mas simbolicamente. São situações em que, por exemplo, motoristas e passageiros são tratados com pouca cordialidade, sentem diferença de tratamento de acordo com as roupas que vestem, percebem olhares de indiferença ou são ignorados pelos motoristas.

“Os motoristas muitas vezes olham com indiferença quando veem uma mulher negra esperando Uber. Muitas vezes, ignoram o fato de ser eu mesma que estou ali esperando o serviço e passam direto, mesmo que eu esteja com o celular na mão e tenha mandado mensagem dizendo exatamente a minha localização”, me relatou Bruna, usuária negra da Uber, nota 4,77.

Os relatos dos motoristas e passageiros podem ser classificados em dois tipos penais: injúria racial e racismo. “Injúria racial é quando alguém se vale de elementos como raça, cor, etnia, origem, religião, entre outros, para atacar a honra. Como exemplo, quando alguém é chamado de ‘macaco’, explicou o advogado Filipe Lopes. Já o racismo se refere a um ataque à coletividade. “É um tipo de discriminação que ataca de maneira integral a origem racial da pessoa. Um exemplo, quando o [motorista da] Uber deixa de levar um passageiro porque ele é negro”.

O advogado recomenda que as vítimas, além de reportarem o caso à própria Uber, procurem a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância, a Decradi, especializada nesse tipo de atendimento.

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