sexta-feira, 23 de setembro de 2022

CRIMES COM CONIVÊNCIA DE AUTORIDADES E RELAÇÕES COM NARCOTRÁFICO

 Crimes com conivência de autoridades e relações com narcotráfico

Professor da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e coordenador do Núcleo de Estudos Socioambientais da Amazônia, o pesquisador Pedro Rapozo afirma à Pública que o narcotráfico também atua no crime ambiental na região e se aproveita do contexto de falta de fiscalização pelo estado e até do incentivo aos crimes ambientais pelo poder público, em especial dos municípios. 


Ele é um dos autores do estudo “Invisibilidades e violências nos conflitos socioambientais em terras indígenas da microrregião do Alto Solimões, Amazonas Brasil”, feito em parceria entre a Ufam e a Universidade Nacional da Colômbia. O Alto Solimões, onde ficam as cidades da fronteira como Tabatinga e Atalaia do Norte, é uma rota, consolidada há mais de uma década, da entrada de cocaína no Brasil e do fornecimento da droga para a Europa e a África. 


Rapozo explica que entre as características das organizações criminosas do estado — facções e milícias —, está uma diversificação econômica por meio da exploração ilegal de recursos naturais. As mesmas rotas que transportam a cocaína são usadas para contrabandear os frutos da degradação da floresta. 


“A disputa de territórios [do tráfico] com piratas e garimpeiros é resultado de uma consolidação da ausência de fiscalização de instituições públicas nesses territórios. O que a gente tem são atuações de facções que procuram maximizar seus lucros com a exploração de outra ordem, de recursos naturais”, diz Rapozo. 


Segundo ele, há, por um lado, deficiência da segurança pública para controlar e manter o monitoramento e a fiscalização dessas situações e, por outro, “uma guerra invisível e disputa por território com objetivo de consolidação”. 


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Outro fator é que as regiões de fronteira são marcadas por inúmeras vulnerabilidades sociais. Para o professor, um dos desafios para enfrentar de fato os problemas de segurança na região é não criminalizar indivíduos agenciados por essas redes que enriquecem seus operadores, tornam as comunidades locais reféns da violência e elevam os índices de criminalidade em cidades pobres da Amazônia. 


O posicionamento do sociólogo encontra ressonância nos dados do Anuário de Segurança Pública deste ano. Das 30 cidades com taxas de mortes violentas intencionais superiores a cem mortes para cada grupo de 100 mil habitantes, dez estão próximas a Terras Indígenas na Amazônia e nas fronteiras, condição das cidades amazonenses na rota do tráfico. 


Rapozo destaca que, na escalada de mortes violentas intencionais do estado, está o aumento de registros nos municípios do interior marcados pela ausência do sistema de segurança e justiça e por acertos de contas de grupos que buscam consolidar territórios e mercado ilegal. 


O aumento do consumo de cocaína na cidade e dos pontos de comercialização de drogas também são fatores que reforçam a guerra por territórios e os homicídios em Manaus, avalia o sociólogo Candotti.


“Não tinha, antigamente, tanta boca. É um mercado muito pobre, que paga muito mal e coloca pessoas pobres em muito risco. Ao mesmo tempo, enriquece facilmente pouca gente. Esse mercado de varejo tem dinâmicas mais violentas que o mercado de transporte internacional”, diz.


Para o pesquisador, o tratamento dado pelo Estado aos consumidores é outro fator que interfere nos dados da segurança pública. Ele faz uma comparação: enquanto as classes média e alta, no máximo, vão parar num psicólogo ou psiquiatra para tratar a dependência química, os filhos das famílias pobres acabam presos ou mortos por falta de atendimento psicossocial.


Exemplo disso ocorreu no condomínio de luxo no bairro Ponta Negra, em setembro de 2019, quando o engenheiro Flávio Rodrigues foi torturado e assassinado depois de ter participado de uma festa regada a álcool e entrega de cocaína delivery na casa de Alejandro Valeiko, enteado do ex-prefeito e candidato ao Senado Arthur Virgílio (PSDB).


Em defesa do enteado, a família de Arthur alegou que Valeiko era dependente químico e o afastou da cidade para internação. Posteriormente, a perícia confirmou que não houve participação do enteado no homicídio.

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