segunda-feira, 3 de outubro de 2022

BOLSONARO: " EU AGRADEÇO A DEUS, AGRADEÇO A ELE A MISSÃO QUE ELE ME DEU DE ME COLOCAR NA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA".

 Por: Bruno Fonseca e Amamda Correia

Se nos discursos de Lula o grupo de termos ligados a Deus e religião aparece em quarto lugar, nos de Bolsonaro, ele é o segundo mais frequente: em mais de 10% de todos os trechos de discursos do presidente analisados há alguma menção a Deus ou tópicos relacionados.


Na maioria das vezes, as menções a Deus feitas por Bolsonaro ocorrem dentro de um dos seus lemas de campanha: “O nosso lema é Deus, pátria, família e liberdade. Esse é o sentimento da grande maioria do povo brasileiro”, afirmou o presidente em discurso na embaixada do Brasil em Londres, em 18 de setembro.


A frase não é uma criação inédita de Bolsonaro, mas remete ao movimento Integralista Brasileiro, da década de 1930. Com origens no fascismo italiano, a Ação Integralista Brasileira (AIB) foi um grupo ultranacionalista, conservador e que se identificava com o catolicismo. Os integralistas usavam o mote “Deus, pátria e família”.


Além de Bolsonaro, membros do seu governo já usaram expressões relacionadas ao integralismo: em 2019, o ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo disse em seu discurso de posse o termo “anauê jaci”, que significa “Ave Maria” no idioma tupi — anauê é uma saudação usada pelos integralistas. Em entrevista, a ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, disse que “esse movimento se identifica comigo porque as minhas pautas são muito parecidas com as dele”.


O lema “Deus, pátria, família e liberdade” tem sido utilizado por Bolsonaro em alternância com seu slogan da campanha de 2018, que também tem referência religiosa: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”. 


Além dos lemas com a citação a Deus, nos discursos de Bolsonaro, o termo que mais surgiu associado à temática religiosa foi a palavra “eu”. A análise feita pela reportagem mostra que Bolsonaro faz menção a si mesmo como um “instrumento” ou “missão” divina. “Algo aconteceu em 2018. Não sou herói e não sou mito. Creio que estou sendo instrumento de Deus”, disse durante ato de campanha em Curitiba, em 1º de setembro. “Eu cheguei à presidência, mas por que eu cheguei à presidência? E essa é uma missão de Deus, que está salvando o nosso Brasil”, afirmou na embaixada brasileira em Londres.



“Bolsonaro tem uma forma de se referenciar a Deus muito personalista. Ele tem um forte componente messiânico no seu discurso, que retoma uma retórica evangélica sobre representantes escolhidos por Deus. Seu discurso tem também um componente de medo. Há a ideia de uma ameaça. Ele aparece como alguém capaz de enxergar a catástrofe e também resolvê-la”, diz o pesquisador Paolo Demuru à Pública.


“Bolsonaro usa essas imagens antagônicas – o bem contra o mal. O mal, os diabólicos, são as esquerdas, Lula, o PT, que ele vincula ao comunismo, a regimes ditatoriais como o da Nicarágua e à cristofobia, que seria a perseguição aos cristãos”, explica Demuru. 


Outro argumento frequente no discurso de Bolsonaro é citar sua identidade cristã para reforçar sua candidatura à presidência. “Hoje vocês têm um presidente que acredita em Deus. Que respeita os seus policiais e seus militares. Um governo que defende a família”, falou durante o ato de 7 de setembro na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.


Bolsonaro também tem evocado o discurso religioso na figura da sua esposa, Michelle. “Não há o que discutir uma mulher de Deus, família e ativa na minha vida. Não é o meu lado não. Muitas vezes ela está na minha frente”, disse também no 7 de setembro em Brasília. Reportagem da Pública mostrou como a campanha bolsonarista tem construído a figura de Michelle para as eleições, comparando a primeira-dama à personagem bíblica que mistura política e religião.


O presidente também tem utilizado o discurso religioso para criticar governos de esquerda, que considera socialistas ou comunistas, uma retórica comum nas falas de Bolsonaro desde a campanha de 2018. “E peço uma coisa ao nosso Deus, peço uma pedra ao nosso Deus que o povo brasileiro não sinta as dores do comunismo”, disse em comício em Prudentópolis, no Paraná, em 16 de setembro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário