sexta-feira, 29 de julho de 2022

COORDENADOR DA FUNAI NO JAVARI PEDE DEMISSÃO; É A SEXTA TROCA EM TRÊS ANOS

 



Rubens Valente

 @rubensvalente

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COLUNA

Colegas do coordenador disseram que o pedido de dispensa do cargo tem relação direta com o clima de insegurança e as condições de trabalho na região


29 de julho de 2022

15:00

O ocupante do principal cargo da Funai (Fundação Nacional do Índio) na Terra Indígena Vale do Javari – em razão da qual foram assassinados, em 5 de junho, o indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips – pediu demissão em meio ao clima de grande insegurança entre os servidores do órgão naquela região do Amazonas. Além de Bruno e Dom foi assassinado o colaborador da Funai Maxciel Pereira, em 2019, eventos traumáticos que tornaram o dia a dia dos servidores da Funai na região um foco constante de tensão e preocupação.


É a sexta vez, durante o governo de Jair Bolsonaro, que há uma mudança no cargo, sintoma da grande instabilidade administrativa provocada pelas decisões do comando da Funai, em Brasília, e que atinge o cotidiano das atividades da Frente, segundo indigenistas consultados pela Agência Pública. As frentes de proteção etnoambientais no país são vinculadas a uma coordenação da Funai na capital federal.


A Frente do Javari está sem titular desde novembro de 2020, após um titular ter sido nomeado e ficado no cargo apenas três meses. Desde então, a Frente tem sido sempre ocupada por interinos. O presidente da Funai, o delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, nunca esteve na região, nem mesmo após os assassinatos de Bruno e Dom.


O coordenador substituto da Frente de Proteção Etnoambiental da Funai na terra indígena, Leandro Ribeiro do Amaral, foi dispensado, a pedido, do seu encargo. O ato foi assinado pelo presidente da Funai, o delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, e publicado na edição desta quinta-feira (28) do Diário Oficial da União.


Nascido no interior de São Paulo, Amaral é graduado em história pela Unesp (Universidade Estadual Paulista), mestre em preservação do patrimônio cultural pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e está na Funai desde 2018. Há quatro anos ele atua no Vale do Javari, onde conheceu e se tornou amigo de Bruno Pereira. Ele atuava de fato como coordenador da Frente desde abril passado. A ocupante anterior do cargo, também interina, Idenilda Obando de Oliveira, foi transferida para a coordenação regional do Alto Solimões (AM).


Colegas de Amaral ouvidos pela Pública disseram que o pedido de dispensa do cargo tem relação direta com o clima de insegurança e as condições de trabalho na região. Além do impacto dos três assassinatos e da falta de policiamento adequado, “é uma atividade estressante, cansa psicologicamente, há poucos servidores, a logística é difícil”, disse um servidor no Javari.


Com 8,5 milhões de hectares, o equivalente ao território de Portugal, a Terra Indígena Vale do Javari é a segunda maior do país. Nela há cerca de 15 registros de povos indígenas isolados, dos quais nove confirmados, o que é considerada a maior incidência do gênero no mundo. Na Frente há apenas dez servidores públicos da Funai em atividade. Ou seja, um servidor a cada 850 mil hectares. Somando os registros de isolados e as bases, há 22 frentes de trabalho possíveis, para apenas dez servidores.


Como consequência da pandemia da Covid-19, sob pressão de uma ação ajuizada pelo movimento indígena no STF (Supremo Tribunal Federal), a Funai contratou cerca de 85 colaboradores indígenas, mas os contratos são temporários e os salários, baixos.


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