sábado, 30 de julho de 2022

AGROTÓXICOS PERIGOSOS

 Agrotóxicos perigosos
A pesquisa também traz outro dado preocupante. Em 37% dos produtos foi possível detectar glifosato. O ingrediente ativo é classificado como provavelmente cancerígeno pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (Iarc) e é o mais utilizado no Brasil. Apesar de ser um dos pesticidas que mais matam brasileiros, a Anvisa optou por manter o seu registro após uma reavaliação que durou 12 anos.

O glifosato não é o único que levanta o alerta dos pesquisadores. Dos oito agrotóxicos detectados, seis estão relacionados ao aparecimento de doenças crônicas. O glufosinato, utilizado como alternativa ao glifosato, está relacionado à má formação embrionária e a problemas no sistema nervoso central, segundo testes realizados em ratos.

A bifentrina, fipronil e cipermetrina são classificados como possivelmente cancerígenos pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (Environmental Protection Agency, na sigla em inglês). Já o clorpirifós está associado a problemas de desenvolvimento neurológico, principalmente em crianças. No ano passado a agência americana baniu o uso deste agrotóxico no país. Já no Brasil ele segue na lista dos 10 pesticidas mais vendidos.

O coordenador do Idec ainda chama a atenção para as consequências para a saúde que a combinação de vários agrotóxicos podem trazer. “Foram cinco ingredientes diferentes encontrados no nuggets, nove encontrados na bisnaguinha em 2021. O estudo mostra que além de por si só os agrotóxicos serem isoladamente potencialmente carcinogênicos, tem o coquetel que deixa o risco mais elevado”, pontua Rioja.

De acordo com o pesquisador, faltam estudos para analisar a interação dessas substâncias nos organismos e regras que definam limites para essa mistura tanto nos alimentos quanto na água. A União Europeia, por exemplo, possui uma regulação específica que determina os valores máximos dos coquetéis em cada litro de água. Por aqui, a Anvisa define apenas limites individuais.

Sem previsão de novos limites
Apesar de a possibilidade de aparecimento de agrotóxicos nos produtos ultraprocessados já ser de conhecimento dos órgãos governamentais e das empresas, nada foi feito para criar regras que definam limites máximos de resíduos para esses alimentos.

De acordo com o Idec, os resultados da pesquisa foram “bem acolhidos e recebidos pela Anvisa”. A agência já analisa alguns produtos processados – derivados diretamente de alimentos in natura – em seu Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). É o caso da farinha de trigo e da bebida de soja.

Em resposta à Repórter Brasil e Agência Pública no ano passado, o órgão disse querer incluir aos poucos novos produtos ao seu monitoramento. Contudo, além de não ampliar o número de alimentos analisados, desde 2019 a Anvisa não publica os novos resultados do PARA.

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Procurada pela reportagem novamente, a Anvisa informou que o programa de análise de alimentos está previsto para ser publicado ainda este ano e disse que a inclusão de produtos ultraprocessados”requer um estudo preliminar, a fim de verificar quais produtos melhor representam o consumo do alimento pela população brasileira e ainda a possibilidade de detecção de resíduos nesses produtos, observando fatores de processamento, que retratam a proporção do ingrediente ativo e metabólitos que permanecem no alimento processado”.

A Vigor disse à reportagem que não teve acesso  aos dados técnicos da pesquisa realizada pelo Idec para que pudesse analisar e rastrear o lote do produto. “A companhia reforça que realiza constantemente programas de controle interno em todas as suas unidades fabris e postos de captação de leite, bem como o monitoramento através de laboratórios credenciados na rede brasileira de qualidade do Leite-RBQL, não tendo verificado a presença de inseticidas, acaricidas e agrotóxicos em seus produtos”. O instituto responsável pela pesquisa afirma ter entrado em contato com todas as companhias citadas no estudo.

A Aurora Alimentos afirmou que não iria responder os questionamentos feitos pela Repórter Brasil e pela Agência Pública e que iria solicitar esclarecimentos sobre a metodologia dos testes realizados pelo Idec. (Leia as respostas das empresas na íntegra aqui).

Procurada, a produtora de laticínios Itambé não respondeu os questionamentos até o fechamento desta reportagem.  Histórias como essa precisam ser conhecidas e debatidas pela sociedade. A gente investiga para que elas não fiquem escondidas por trás de interesses escusos. Se você acredita que o jornalismo de qualidade é necessário para um mundo mais justo, nos ajude nessa missão. Seja nosso Aliado

Esta reportagem faz parte do projeto Por Trás do Alimento, uma parceria da Agência Pública e Repórter Brasil para investigar o uso de Agrotóxicos no Brasil. A cobertura completa está no site do projeto.


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