sábado, 30 de julho de 2022

 

AEPET apresenta ao Congresso novos parâmetros para uma política de preços dos combustíveis

Publicado em 18/02/2022 Escrito por  Editorial AEPET Lido 1842 vezes

Propostas analisadas no Congresso tem pouca eficácia

 

As quatro propostas tramitando no Congresso Nacional com o objetivo de conter a alta dos preços dos combustíveis têm pouca eficácia na redução da volatilidade dos preços ao consumidor e praticamente nenhum impacto na redução dos preços nas bombas.  As propostas somente levarão à transferência de renda da população para as distribuidoras de combustíveis. Perderão os governos, os consumidores e a sociedade brasileira, porque não discutem a origem do problema: a falta de competição na distribuição de combustível e o Preço Paritário de Importação (PPI). Com a privatização da BR distribuidora, as competições nos mercados regionais foram reduzidas. Este é o cerne do problema que levaram os preços dos combustíveis ao máximo alcançável e alta volatilidade, e que o congresso deveria discutir.

A AEPET pede a rejeição dos quatros projetos de “Irresponsabilidade Fiscal” que tramitam no Congresso, que através de visões míopes e ideológicas, propõem a lesiva transferência do patrimônio público de US$ 3,05 bilhões anuais para as onze companhias distribuidoras de combustíveis e de lubrificantes.

Os números demonstram que a competição, menor preço alcançável de combustível e baixa volatilidade só retornarão ao mercado, se a Petrobrás voltar ao mercado de distribuição.

Em contrapartida às quatros propostas do Congresso, a AEPET propõe a restauração da verticalização da Petrobrás, a volta ao mercado de distribuição de combustíveis e o fim da imposição à Petrobrás dos preços de paridade importação (PPI), como política pública, para alcançar o menor preços dos combustíveis e a redução da volatilidade dos preços do combustível aos consumidores.

Segundo a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o Brasil tem mais de 500 distribuidoras de combustíveis, sendo a grande maioria de distribuidoras regionais. As atividades das distribuidoras abrangem o armazenamento, transporte, controle de qualidade e comercialização de combustíveis líquidos de derivados de petróleo, álcool e biocombustíveis, glp, lubrificantes e outros combustíveis automotivos.
A cadeia de suprimentos das distribuidoras consiste em empresas transportadoras rodoviárias e ferroviárias, bases primárias e bases secundárias.

As distribuidoras recebem nas bases primárias os combustíveis das refinarias ou das bases dos importadores através de dutos ou navios. As bases primárias têm infraestrutura necessária para receber, armazenar, misturar, embalar e distribuir os derivados de petróleo.

As distribuidoras, por sua vez, enviam para suas bases secundárias. As bases secundárias tem capacidade para receber, armazenar e distribuir para os TRR (Transportador-Revendedor-Retalhista), pequenos distribuidores, revendedores varejistas e postos de vendas ao consumidor.

Dependendo do porte da distribuidora, as bases primárias e secundárias podem ser próprias ou em pools (ativos compartilhados por diversas empresas distribuidoras que participam com um percentual de investimento), ou bases operadas por terceiros, na qual a empresa distribuidora possui apenas os produtos movimentados, e depende dos ativos de terceiros para viabilizar a movimentação de seus produtos.

Os dados da ANP mostram que apenas três distribuidoras concentram 63% do mercado: BR distribuidora (Vibra), Shell (Cosan/Raizen) e Ipiranga (Ultrapar). Constata-se nos dados que as bases primárias são apenas 36,4% do total das bases, contudo, essas bases primárias respondem por 72,5% da capacidade total de armazenagem de combustíveis líquidos.

Praticamente, estas bases primárias estão quase todas nas mãos das onze principais companhias distribuidoras de combustíveis e de lubrificantes: BR Distribuidora, Shell, Ipiranga, Raízen, Moove, Petronas Lubrificantes, Iconic, Castrol, Total e YPF. Deve-se lembrar que Raízen, Moove e Cosan são controlados ou tem participação societária da Shell.

Segundo os dados do Sindicom, as onze distribuidoras, que concentram os volumes de armazenamentos das bases primárias, vendem apenas 21% dos combustíveis diretamente aos consumidores, enquanto repassam 79% dos combustíveis importados e comprados das refinarias para os TRR e revendedores. Esses dados é uma clara evidência de concentração de mercado de distribuição de combustíveis.

Os dados da ANP também destacam que a maioria das distribuidoras têm baixa capacidade de armazenamento e mantém estoque semanais de combustíveis. Os dados apontam que as distribuidoras têm planejamento de fornecimento de 30 dias em média, podendo chegar a 60 dias no máximo para as grandes distribuidoras. Em outras palavras, as distribuidoras emitem pedidos de compra de combustíveis para a Petrobrás ou para importadores entre 30 e 60 dias de antecedência. Deve-se destacar que os preços pagos por estas compras é o preço do dia da entrega do combustível, ou seja, o dia da emissão da nota fiscal.

Outra característica logística das grandes distribuidoras é que elas contratam empresas transportadoras de combustíveis que pertence ao mesmo grupo controlador. A maiorias das distribuidoras possuem ativos como caminhões tanques para distribuição para os postos, e terceirizam o transporte dos combustíveis entre suas bases primárias e secundárias. O transporte de combustíveis entre as bases primárias e secundárias e aos clientes é o maior custo das distribuidoras. Desta forma, os vínculos entre as distribuidoras e as empresas transportadoras é forte indício de concentração de mercado.

As distribuidoras explicam que para reduzir o risco de perdas financeiras, devido à baixa capacidade de armazenamento, os compromissos de compras de combustíveis e a alocação de logística antecipadas em até 60 dias, adotam uma estratégia de repassar imediatamente os preços dos combustíveis nas bombas quando os preços sobem, e retardam o repasse dos preços em pequenas reduções em até 60 dias, quando os preços caem. As distribuidoras alegam que essa é única forma de garantia de uma margem de receita positiva em períodos de incertezas do câmbio e alta dos preços do petróleo. Ou seja, as distribuidoras ganham sempre, com alta dos combustíveis, e principalmente com queda dos preços. Quem paga o preço são sempre os consumidores.

Isso mostra apenas que o governo não tem qualquer ferramenta de controle para atuar nas distribuidoras, e que qualquer política governamental para diminuir os preços de combustíveis ou reduzir a volatilidade nos postos implicará numa compensação para as distribuidoras da diferença entre os preços de compra e o preço de repasse aos postos.

A ANP publica que o consumo médio diário de diesel no Brasil nos últimos cinco anos é 988 M bbl/d (milhões de barril/dia) e alcançou 1070 M bbl/d em 2021. O volume médio diário de importação de diesel é 187 M bbl/d, enquanto as refinarias produziram 801 M bbl/d (81% do consumo). No caso da gasolina, o consumo médio diário é 699 M bbl/d e um volume médio diário de importação é 57 M bbl/d e a produção nacional é 522 M bbl/d (74,6% do consumo). Lembrando que a conversão de barril para litros é 159 l/bbl.

Do ponto de vista financeiro, estes números levam a um dispêndio de U$ 5,96 bilhões anuais com importação de diesel e U$ 1,63 bilhões anuais com gasolina (U$ FOB). Somente o consumo de diesel e gasolina representa um mercado direto para as distribuidoras de cerca de U$ 50 bilhões anuais FOB. Se incluirmos toda a cadeia de suprimento e os impostos, a distribuição de diesel e gasolina movimenta diretamente em torno de U$ 130 bilhões anuais.

Considerando a capacidade de armazenamento, os compromissos de compras de combustíveis e a alocação de logística antecipadas das distribuidoras, é necessária uma compensação de 60 dias as distribuidoras para obter previsibilidade de preço e redução de volatilidade aos consumidores.

Em 2021, os preços da gasolina e diesel subiram cerca de 46%, uma média mensal de 3,85%. Para compensação de 60 dias as distribuidoras, estima-se que seria necessário um fundo de compensação da ordem de U$ 584 milhões a cada 60 dias,  levando em conta somente o dispêndio de importação de diesel e gasolina.

Em outras palavras, seria necessário a transferência de U$ 3,05 bilhões anuais da sociedade brasileira para as onze companhias distribuidoras de combustíveis e de lubrificantes, todas empresas privadas.

No congresso, hoje, existem duas linhas de projetos que versam sobre estas compensações as distribuidoras, os projetos que propõem um fundo para repassar parte da receita da Petrobrás e da união para as distribuidoras, e os projetos que usam a redução de impostos federais, estaduais e municipais para reduzirem os preços aos consumidores.

Na linha dos projetos de criação de fundos de compensação, existem duas propostas: PL 1472/2021, do senador Rogério Carvalho (PT-SE), e a PEC 1/2022, do senador Carlos Fávaro (PSD-MT).

A PL 1472/2021 cria um fundo financiado por um imposto sobre exportação do petróleo bruto e pelo lucro extraordinário da Petrobras com o aumento do preço do barril de petróleo. Este projeto estabelece um escalonamento para tributação de exportação do petróleo bruto de 2,5 a 20 %, progressivo com o preço internacional do petróleo acima de U$45,0/barril. Além disso, propõe o uso dos dividendos da Petrobras distribuídos à União, uso das reservas cambiais semestrais do Banco Central no caso de balanço positivo; e uso da participação da União dos resultados do regime de concessão e de partilha de produção de óleo e gás.

A PEC 1/2022 também propõe que os dividendos da Petrobras obtidos pela União, mais os recursos provenientes dos leilões do pré-sal previstos para 2022, façam parte do fundo social. Esta PEC ainda permite que União, Estados e municípios reduzam os impostos incidentes sobre os combustíveis até 2023, tais como, IPI, IOF, Cide, PIS/Pasep, Cofins, IE, e ICMS.

A chamada de “PEC da Irresponsabilidade Fiscal” também estipula um auxílio diesel de até R$ 1.200 por mês para caminhoneiros autônomos. Repasse de até R$ 5 bilhões de recursos da União a Estados e municípios, para assegurar o acesso de idosos ao transporte público coletivo. E amplia o subsídio do Vale Gás de 50% para 100% do valor do botijão para famílias de baixa renda poderem adquirir gás de cozinha.

Em resumo, estes dois projetos propõem repassar parte da receita da Petrobrás com exportação de petróleo, a receita gerada pelo pré-sal para união, e dividendos pagos pela Petrobrás ao governo para as distribuidoras que importam combustíveis.

Em 2021, a receita com exportação de petróleo chegou a U$ 30,5 bilhões anuais, para um volume de exportação diária de 1,387 M bbl/d. Em outras palavras, seria repassado as distribuidoras privadas praticamente 10% de toda receita de exportação de petróleo nacional de uma empresa estatal.

Outro impacto forte destas propostas é a redução de receita da Petrobras, e consequentemente, redução dos impostos e dividendos pagos pela Petrobrás para os governos e acionistas. Além da apropriação de recursos do banco central e da união para transferir a um grupo seleto de empresas privadas.

Finalmente, esses projetos não estabelecem qualquer ferramenta de controle do governo e nenhuma contrapartida das distribuidoras.  
Na segunda linha de projetos no congresso que propõem redução de impostos, estão o PLP 11/2020, do deputado Emanuel Pinheiro (PTB-MT), e a recente proposta de emenda à Constituição apresentada pelo deputado federal Christino Áureo (PP-RJ);

A PLP 11/2020, aprovado em outubro de 2021 pela Câmara, se restringe a diminuir o ICMS, que é o imposto estadual, sobre combustíveis. O projeto determina que os Estados estabeleçam um valor fixo anual e fixa também um teto a ser cobrado de ICMS por metro cúbico de combustível vendido.

A proposta do deputado Christino Áureo também propõe a permissão da redução total ou parcial dos impostos que incidem sobre os combustíveis, e estende a permissão para que outros impostos que não estejam inseridos nos combustíveis possam ser reduzidos até 2023, e sem qualquer compensação.

Mais uma vez, estas duas propostas não criam nenhum mecanismo de controle ou contrapartida para as distribuidoras. Logo, sem controle, a possível redução dos impostos teria um impacto de curto prazo e não garantiria que ocorra a redução dos preços dos combustíveis no longo prazo, porque as distribuidoras se apropriariam desta redução, e aumentariam suas margens de lucro. Outro problema, é que a redução dos impostos não teria nenhum impacto na volatilidade dos preços com a variação do dólar e dos preços internacionais, uma vez que as distribuidoras continuariam praticando a política de aumento imediato e redução escalonada nas variações para cima e para baixo dos preços de venda.
Nenhuma proposta do congresso discute a origem do problema dos preços altos e voláteis dos combustíveis, que é a redução da competição das distribuidoras com a privatização da BR Distribuidora.

A BR Distribuidora, verticalizada com a Petrobrás, alcançava o menor preço e volatilidade porque, na época da sua privatização, possuía uma rede de bases primárias e secundárias, postos de gasolina e presença em quase todos os aeroportos. A BR Distribuidora estava presente praticamente em todos os mercados regionais do território nacional com eficiência logística, e proporcionava o menor custo operacional entre todas as distribuidoras nacionais. A BR distribuidora competia em todos os mercados regionais com o menor preço alcançável sem comprometer a sua margem de distribuição em seus resultados financeiros.

A BR, integrada a Petrobrás, sempre acompanhou a variação de preço das refinarias, aumentando seu fluxo de caixa pelo crescimento das vendas e de sua eficiência. A isonomia de fornecimento e preço nas refinarias e terminais da Petrobras ocorriam no preço de paridade de exportação, e a BR distribuidoras praticava o menor preço alcançável nos mercados regionais.  O preço praticado pela BR distribuidoras era a média ponderada entre o preço Petrobrás, considerando a produção nas refinarias, e o preço de paridade de importação ponderado pela quantidade de combustíveis importados pela BR. Isso garantia o menor preço e menor volatilidade alcançável em todos os mercados regionais onde a BR estava presente.

Entretanto, com a implantação da política de Preços de Paridade de Importação (PPI) nas refinarias da Petrobrás, desde 2016, e com a privatização da BR, os concorrentes da Petrobrás (importadores e distribuidoras) se viram livres para adicionar seus custos de logística, operacional, impostos, seguros, taxas portuárias e maximizar o lucro incorporados aos preços, maximizando seus resultados em prejuízo aos consumidores brasileiros e à economia nacional.


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