Réus do Carandiru mentiram em 'julgamento histórico', diz MP
Janaina Garcia e Gabriela Fujita
Do UOL, em São Paulo
Do UOL, em São Paulo
O dia a dia do júri
O promotor sustentou boa parte do debate no argumento de ação conjunta da tropa, uma vez que não houve individualização das condutas, tal como a primeira denúncia, em março de 1993. Entretanto, individualizou as vítimas --apresentou em um telão os laudos do IC (Instituto de Criminalística) à época com as indicações dos tiros nas regiões do corpo de cada uma.
Em média, cada detento recebeu pelo menos quatro disparos de arma de fogo, de diferentes munições ou armas empregadas. Um recebeu sete tiros, outro, oito. "Imaginem quando os familiares foram reconhecer esse corpo", disse Silva, referindo-se ao detento assassinado com sete disparos. "A única coisa que sobrou para a mãe dele foi a carteira de trabalho com a foto do filho", completou.
Negadas pelos réus, rajadas de metralhadora constam de processo
O uso de metralhadora pelos PMs em tiros de rajadas foi negado pelos quatro réus interrogados nessa sexta-feira (19). Depoimentos de testemunhas de acusação e defesa, porém, além de perícia nas celas, contradizem a versão.Leia Mais
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Um dos pontos chave do debate foi o momento em que, ao justificar a impossibilidade de individualização nas ações dos reús, o promotor afirmou que 160 projéteis retirados dos corpos das vítimas desapareceram de um prédio do próprio TJ. .
Versão de PMs feridos em confronto "é balela", diz promotor
A versão de que 23 policiais da tropa se feriram em suposto confronto com os presos foi classificada pelo promotor como "balela". Ele citou trechos de depoimentos de PMs à CPI que investigou o caso pela Alesp (Assembleia Legislativa), meses depois do massacre, em que policiais admitiam a possibilidade de colegas se ferirem por tiros deles próprios, dada a proximidade entre eles no corredor estreito do presídio.Para a acusação, porém, são novamente laudos técnicos que derrubariam a hipótese de confronto armado: "Cinquenta por cento dos PMs tiveram escoriações, e vários de queda na escada, que estava escorregadia, e mesmo de um esbarrão com um preso. Os que ficaram feridos por armas brancas o foram nas pernas e braços; os feridos por armas de fogo o foram de natureza leve", enumerou.
"O laudo é cabal em demonstrar que esses réus mentiram aos senhores e mentiram ao longo desses 20 anos. A tropa praticou um massacre, os laudos mostram que houve verdadeiras execuções que comprovam a mentira", disse o promotor.
Provas plantadas
Na parte final de sua fala aos jurados, Silva elencou "13 argumentos contundentes" para reforçar a tese da promotoria de que não se sustenta a alegação dos réus de terem atirado para se defender quando entraram no segundo pavimento do pavilhão 9.Um dos itens apresentados pelo promotor foi a participação de alguns dos 24 policiais militares em ocorrências envolvendo o que ele considera "plantar armas de fogo". Silva citou, por exemplo, o capitão do Corpo de Bombeiros Marcos Ricardo Poloniato, interrogado nesta sexta-feira (19), e de outros dois policiais que estiveram no segundo pavimento, em um episódio de maio de 1992 com troca de tiros em uma perseguição de veículos.
Silva também afirmou que um dos dois réus que não compareceram ao julgamento, Argemiro Cândido, é "foragido, procurado pela polícia por homicídio qualificado".
Outro item destacado pelo promotor foi a apreensão de 13 armas de fogo que teriam sido usadas pelos presos do pavilhão 9. De acordo com Silva, policiais militares que relataram terem visto a apreensão de armas no segundo pavimento não estavam no local onde os objetos teriam sido recolhidos.
O promotor argumentou que, além disso, das 13 armas apresentadas pelos policiais militares, foram identificadas apenas sete –três no segundo pavimento e quatro no terceiro pavimento. "Somente policiais da Rota apreenderam armas de fogo. E as outras seis?", perguntou.
"O encontro dessas armas demonstra uma grande farsa que se criou para justificar o injustificável", afirmou o promotor, destacando que, das 13 armas, várias, danificadas já à época da suposta apreensão, seis não tiveram até hoje a origem confirmada. Duas tiveram a origem rastreada durante as investigações –comprada pelo Exército e pela PM.
Silva citou trecho de um relatório elaborado por uma comissão especial do Ministério da Justiça criada à época para apurar as circunstâncias das mortes dos detentos e no qual é mencionado que "maus policiais plantaram 13 armas de fogo" no local do massacre.
"Eles não são super-heróis"
No arremate, o promotor resumiu a proposta da acusação: "O que os policiais disseram, que estavam se defendendo de armas brancas e de armas de fogo que eles não viam, atirando na cabeça de 85% dos presos: essa versão é mentirosa", disse o promotor."Eles não são super-heróis, são homens que tiveram seus acertos, mas tiveram também seu grande erro. É preciso acreditar que podemos mudar, fazrer algo diferente para o futuro do Brasil. É preciso acreditar: estamos diante de um julgamento histórico que vai repercutir no mundo todo".
E encerrou: "Não é a polícia que está no banco dos réus, são aqueles homens. É um julgamento sobre o respeito e o desrespeito à lei".
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