“Negócios do vento” no
Nordeste brasileiro: caso a investigar
Heitor Scalambrini
Costa
Professor aposentado
da Universidade Federal de Pernambuco
A geração de energia elétrica em larga escala, produzida
a partir dos ventos, conhecida como energia eólica, tem crescido vertiginosamente
no Nordeste brasileiro, o que significa ocupação crescente de grandes áreas para
instalação dos aerogeradores, no bioma Caatinga, e em áreas costeiras. Em torno
de 80% da capacidade instalada no país concentra-se no Nordeste.
A energia eólica é uma das fontes renováveis que
apresenta mais vantagens, e menos riscos ambientais na geração de energia
elétrica, desde que esta geração seja descentralizada (geração próxima do local
de consumo, em menor escala de potência instalada). Mesmo assim diminui, mas
não evita os efeitos colaterais sociais e ambientais provocados. Dai um grande
erro de chamar qualquer fonte de energia, inclusive a eólica, a solar, de
limpa.
Em todo mundo, o uso dessa fonte na geração de
eletricidade tem tido um forte crescimento contribuindo ao necessário e
desejável processo da transição da matriz energética mundial. Diminuindo assim,
cada vez mais, a participação dos combustiveis fosseis e dos minerais
radioativos nas matrizes energéticas nacionais. Questiona-se essencial a opção
pela geração concentrada desta fonte energética.
No Brasil foi criado mecanismos de incetivos a promoção
dessa fonte energética, dando prioridade ao modelo de grandes parques eólicos,
as usinas, que produzem enormes quantidades de energia elétrica conectadas a
rede de transmissão, e depois as redes de distribuição até o consumidor final .
Privilegiando um modelo de expansão que provoca inúmeros problemas socioambientais.
Os principais elementos
destes mecanismos de incentivo são os contratos de longo prazo
estabelecidos através de leilões (PPAs), e o finaciamento privilegiado do
BNDES. Hoje existem cadeias produtivas da indústria de equipamentos da energia
eólica, com fornecedores locais e empresas que se instalaram no Brasil.
Constata-se que os principais protagonistas deste “negócio” são o setor
financeiro, fundos de pensão, grandes investidores estrangeiros, grandes
corporações, se associando a empresários nacionais, em alguns casos. Um negócio
de “peixe grande”.
O que tem chamado atenção, e verificado “em campo”, é a
atuação das empresas deste tipo de negócio, que tem agravado e causado sérios conflitos,
principalmente pelos “modus operandi” de atuação destes empreendedores (sem
generalizar).
Os contratos celebrados põem em dúvida os princípios de
lisura e transparência da parte dos empreendedores. Posseiros são pressionados
a assinarem os contratos e arrendamento sendo proibidos de analisarem o
conteúdo de maneira independente, sempre induzidos por funcionários da empresa,
acompanhados geralmente de moradores locais que sucumbiram a ofertas destas
empresas. Assim, muitos trabalhadores ficam inibidos a procurarem orientações
do que é proposto no contrato. Em sua grande maioria, os trabalhadores
desconhecem o conteúdo dos contratos, sendo que algumas cláusulas põem em risco
a autonomia dos moradores em suas terras, e no direito de uso dos seus
territórios tradicionalmente ocupados
São recorrentes violações graves contra direitos dos posseiros, das populações tradicionais
(agricultores familiares, quilombolas, pescadores, marisqueiras), e contra o meio ambiente. O executivo,
legislativo, orgãos de fiscalização e de proteção do meio ambiente dos estados nordestinos
e municípios, tem sido coniventes e omissos diante do avanço devastador dos
“negócios do vento”.
Mais e mais denúncias de ameaças, violência contra
posseiros, de contratos “draconianos” de arrendamento de terras, de
compromissos não cumprido pelas empresas, recaem sobre estes empreendedores,
que atuam nos vários Estados nordestinos, e que tem usado e abusado do poder econômico
para iludir e cooptar o poder local, regional, e lideranças comunitárias.
Lamentávelmente, fatos relatados e denunciados pelas
populações atingidas não tem recebido eco junto aos orgão de Estado que
deveriam, ao menos, investigar os abusos que estão sendo cometidos.
Esta é mais uma advertência sobre o que acontece com
estas grandes obras, que se alastraram nos últimos anos, e estão contribuindo
para o desmatamento da Caatinga, de restingas, dos resquícios da Mata Atlântica,
da vegetação de brejos de altitude, …. Além de provocarem o exodo forçado das
populações campesinas, assim alimentando e agravando o processo de urbanização
caótica.
E as centrais solares fotovoltaica estão chegando com os
mesmos problemas e violações socioambientais causados pelo “negócio dos
ventos”.
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