Todo dia é dia do índio, por Mariana Nassif
qui, 19/04/2018 - 14:09

Todo dia é dia do índio, por Mariana Nassif
Instituído em 1943 por Getúlio Vargas, o dia do índio, celebrado hoje, 19 de Abril, foi uma proposta das lideranças indígenas que participaram do Congresso Indigenista Inetramericano em 1940, no México. Informação factual, pronto, começo a destilar a parte que me bem cabe, os misticismos.
Para os praticantes da Umbanda e do Candomblé, em algumas vertentes, os índios, ou caboclos, como são chamados, têm força de chefe de falange. Os Umbandistas carregam na história da fundação da religião o momento em que Zélio Fernandino de Morais manifesta, em uma sessão espírita, o Caboclo das Sete Encruzilhadas e, ali, propõe o que seria o primeiro elemento utilizado em processos ritualísticos, uma simples flor, colocada à mesa de atendimento. Não tenho certeza se a ligação dos índios com este tipo de liderança espiritual tem relação direta com este fato em si, mas a verdade é que os caboclos são os grandes responsáveis, na Umbanda, por todo o grupo de entidades que acompanham e se manifestam nos médiuns, como se coubesse a eles organizar e proteger as energias competentes à evolução de uns e outros, atuando como verdadeiros cuidadores.
Outras tias-velhinhas da minha família manifestaram seus caboclos e minhas tias, as bruxas, carregam lembranças que, vez ou outra, menos do que eu gostaria, compartilham com a gente, a ala jovem que já vem envelhecendo há um certo tempo. Portanto, não foi surpresa pra mim que eu mesma trouxesse uma caboclinha forte, porreta e que, mesmo sob questionamentos racionais e psicológicos – os tenho, sempre e cada vez mais, especialmente estudando as psicologias – tem o poder de interferir e influenciar nas escolhas que eu mesma faço, impregnada pelo conceito do livre-arbítrio. Algum dia, prometo, paro e escrevo sobre este conceito que, aos meus olhos, é, de certa forma, não tão livre assim. Seguimos.
É desta cabocla que nasceu uma força que até então eu desconhecia e que me foi necessária para me recompor após uma forte depressão que me abateu, agora eu sei, por cerca de quatro anos. O desenvolvimento espiritual dentro da umbanda tem como premissa que tanto o médium quanto as entidades cresçam e, sem dúvida alguma, meus encontros com esta pequena filha de Oxum, orixá responsável pelo útero, pela gestação em si, me oportunaram a sentir bem-querência acerca de um momento que foi particularmente incógnito mesmo que sensorialmente traumático. Sentir a dança de uma cabocla nos pés, a força de sua lança nos braços e o poder de pensar sempre em frente, positivando as vivências e aparecendo sempre com uma história metafórica que é pra gente usar a cabeça e refletir, olha, indico para quem não experimentou – mesmo que não manifesta mediunicamente, é extremamente indicado que, pelo menos uma vez na vida, você sente na frente de um caboclo e escute o que ele tem a dizer. Recomendo.
Aqui em Ubatuba reina, ainda, uma lenda que dá conta da Maldição de Cunhambebe, líder indígena que praguejou todos os negócios do homem branco após a invasão e chacina de seu povo neste belíssimo litoral. Quem chega em Ubatuba deve, antes de mais nada, harmonizar-se com esta liderança - encontrar a forma, penso eu, passa por respeitar a terra, a natureza e os movimentos peculiares da cidade. Vem funcionando comigo e, também me entusiasma essa parte, Cunhambebe é tupinambá autoridade máxima entre os líderes tamoios da região compreendida entre Cabo Frio (RJ) e Bertioga (SP). Me sinto em casa, de corpo e alma, desde que mudei pra cá - apesar de ter enfrentado impropérios dignos da tal maldição logo na primeira semana, como alagamentos, término de relacionamento e a sensação de que a cidade estava me expulsando. Processos e conversas invisíveis depois, além da adequação às energias locais,veio o acolhimento. Estudar, compreender, aceitar e, especialmente, respeitar - ingredientes fundamentais para todas as esferas deste mundo e arredores.
Acontece que índio não é só entidade de umbanda, pelo menos não por enquanto.
Neste Brasil tão complicado e esquisito desde os tempos do golpe, reflexões sobre “índio não é fantasia” durante o carnaval e o esquecimento sobre a importância e potência deste povo no restante dos dias, é relevante pontuar o Dia do Índio como janela para que possamos reavaliar as questões políticas e sociais que contaminam, mais uma vez, a história dos indígenas no país.
Pauta não falta, não precisa nem procurar tão bem assim – se trata, muito mais, de envolver-se nas movimentações e defesas sobre preservação, manutenção e viabilização daqueles que, por enquanto, ainda se fazem presentes em vida por aqui enquanto a maior parte de nós, tolinhos, segue “civilizadamente”. Sei.
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