Não tem sentido sustentar a candidatura do Lula
Wanderley: "sebastianismo evangélico" sitia as esquerdas
publicado
16/04/2018

O MTST ocupou o triplex que não é do Lula. Ao lado
fica o da Mossack Fonseca e da Globo, que o Moro blindou para "reduzir a
atividade política do pais ao PT", como diz o professor Wanderley
(Reprodução/DCM)
O Conversa Afiada republica do Segunda Opinião magistral e desde já polêmico artigo do professor Wanderley Guilherme dos Santos:
A HORA DO LOBO DE LUIZ INÁCIO
A direita só chegará à presidência da República com o auxílio involuntário do Partido dos Trabalhadores. A estratégia do PT obedece às diretivas de Lula. Segue-se que o obstáculo a que Joaquim Barbosa – o cavalo de Troia que a direita busca contrabandear – impeça a reconstituição democrática, encontra-se no discernimento do ex-presidente Luiz Inácio. Submeter a plebiscito algumas das aberrações decretadas por Temer, por exemplo, jamais seria cogitado por tal demofóbico. No momento, fragmentar a esquerda equivale a criar inesperada oportunidade a uma direita sem rumo. Não é centralizando frentes de siglas sem voto ou efetiva representatividade que se evitará o abismo autofágico. Ao contrário, este talvez resulte da ambição de parasitas inoculados em movimentos de massa. Lula pode implodir a manobra de concentração burocrática, ou submeter-se a ela, vencido pelo estalinismo historicista que o cerca.
A sagacidade do emergente líder
metalúrgico conquistou sólida adesão do lado esquerdo da política. O
cálculo do sapo barbudo manteve os liderados na senda favorável aos
pobres e à democracia. Embora desconfiando dos que cursaram
universidades, foram muitos os diplomados que, com ele, colaboraram na
construção do primeiro partido visceralmente trabalhista. A Universidade
o adotou. Adotou-o, garantindo-lhe a tribuna negada pela mídia e,
ainda, considerável fatia de votos surrupiados à classe média. A
esquerda isolada não elege presidente da República. Foi Lula, seu
discernimento, que dobrou o sectarismo da opinião vigiada e punida
quando, antigamente, divergia do velho Partidão.
A barafunda de junho de 2013
gerou confusão ideológica na esquerda. Anônimos e mascarados abriram a
porta das ruas à direita. E delas a direita não mais saiu, contribuindo
para o baixo nível da campanha eleitoral de 2014. Pormenor relevante: a
Lava Jato, a rigor, não existia. A demonstração de força da direita, com
indisfarçada simpatia da mídia, animou o periférico time curitibano.
Tinha padrinhos poderosos. Tinha jogo.
À difícil vitória de Dilma
Rousseff, apesar da hesitação petista, seguiu-se a contestação de sua
legitimidade pelo derrotado Aécio Neves. O mandato de Dilma passou às
mãos do Judiciário. Não do STF, mas da Lava Jato curitibana. Sergio Moro
reduziu toda atividade política dos brasileiros ao Partido dos
Trabalhadores, e comprimiu esse complexo partido aos operadores
associados à quadrilha de Pedro Barusco, Paulo Roberto Costa, Nestor
Cerveró, Jorge Zelada, com coordenação do doleiro Youssef. Foram dois
anos de conduções coercitivas, prisões humilhantes, vazamentos ilegais e
ameaças apocalípticas, tolerados a pretexto de revelar o saque
patrocinado pelo PT. Indiferente, destruiu segmentos estratégicos da
infraestrutura brasileira, de onde os atuais desemprego e abulia
empresarial. Escrevia-se o capítulo inicial da saga “Prendam Lula”, só
encerrado com o impedimento da presidente Dilma Rousseff, com prelibação
na Câmara dos Deputados, em 17 de abril de 2016.
A lembrança não é ociosa porque
poucos participantes das libações não estão presos ou em vias de sê-lo,
em arrastão que incorporou parte ladravaz do empresariado. Consumado o
impedimento, o pelotão curitibano aliviou a exclusiva malignidade do PT,
descobriu quadrilhas operando fora da Petrobrás, e, em êxtase, vem
anunciando que a sociedade e a economia brasileiras se transformaram em
vasto cupinzeiro de corrupção. A Lava Jato replica raros tumores de
efeitos colaterais positivos, sem, contudo, promover reparação aos
caluniados e arbitrariamente presos. A meta, como sempre, era Lula. Mas
nesta gigantesca facciosidade parte da esquerda embriagou-se com o
rancor da psicologia reacionária.
Em 2010, a alegada marola de
2008 submergiu o planeta. Não obstante, Dilma acrescentou programas à
pauta social petista. Ousada ou imprudente, seu primeiro mandato
sustentou a generosidade da era de abundância em contexto econômico de
soma zero. O conflito consistia em saber quem pagaria a conta social. Ao
fundo, a ganância estrangeira pelo pré-sal e o incômodo do Império com
as fumaças brasileiras de autonomia nuclear. A hesitação do segundo
mandato, com ministério formado com decisiva influência de Lula,
espelhou a intensidade da queda de braço. O impedimento de Dilma
assinalou a derrota de toda a esquerda.
Os petistas aceitaram a tese da
hierarquia partidária, debitando o infortúnio à incapacidade de Dilma
Rousseff e sua personalidade belicosa. Defeitos nada triviais, embora
sem contribuição significativa para a essência do conflito central. Na
versão em uso, todavia, a maioria dos militantes imagina que, fosse Lula
presidente, o desastre seria evitado. Ilusão sebastianista, exceto se o
imaginário presidente cumprisse o programa de Michel Temer.
Intrigas à esquerda, o enredo
curitibano avançava, valendo-se de excepcionalidades quando necessárias.
Surpreendentemente, as derrotas jurídicas extraíram das lideranças de
esquerda a reclamação de que a direita estava se comportando como
direita! Desde 17 de abril de 2016 ficara selado o destino de Lula e,
sem Judiciário e Legislativo, ruas lotadas não comprometeriam o sucesso
do projeto “prendam Lula”. Nem as ruas foram lotadas, mas repartidas com
a direita em lua de mel com Moro, em Curitiba, e as polícias militares
locais.
A associação entre inocência
penal e direito à candidatura respondia ao ataque direto ao
ex-presidente. Mas, apesar da reiteração de que as leis concluiriam pela
prisão de Lula, o clamor contra a injustiça penal continuou, por
interpolação de cálculo eleitoral, subordinado ao reconhecimento de seu
direito à candidatura. Com a condenação em segunda instância, a
guilhotina da “ficha suja” vedou a essencial via de sucesso jurídico. O
sebastianismo adquiriu, então, uma dimensão mística, exigindo conversão
dos eleitores a credo contrário à racionalidade. Sustentar a candidatura
Lula “até o fim” não tem sentido político claro.
Ou melhor, algum sentido faz. O
silêncio de Lula, ignorando a fúria vocabular do “sebastianismo
evangélico” contra os que discordam, mantem sitiada grande parte das
esquerdas. A chantagem emocional com que assediam históricos apoiadores
decepciona. Levantar o sítio à esquerda se impõe como urgente medida
reunificadora, indispensável à vitória contra a avalanche reacionária.
Não importam os bumbos
acampados em Curitiba. O cárcere solitário sadicamente imposto a Lula
não é único. A hora do lobo é a hora da solidão interna. A hora de Lula.
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