quarta-feira, 18 de abril de 2018

Opinião

Lula "Ali Babá", o triplex e o Brasil das Mil e Uma Noites

por Sergio Lirio publicado 18/04/2018 17h00, última modificação 18/04/2018 13h19
As cenas capturadas pelo MTST no edifício Solaris e um vídeo argentino resumem a tragicomédia do processo contra o ex-presidente e o delírio coletivo

Mídia Ninja
Lula "Ali Babá", o triplex e o Brasil das Mil e Uma Noites
O MTST fez o que nenhum jornalismo foi capaz
Imelda Marcos, mulher do ditador das Filipinas, tinha uma coleção de 1,2 mil pares de sapatos e edifícios em Nova York avaliados à época em mais de 100 milhões de dólares, enquanto seu país afundava na miséria. O general chileno Augusto Pinochet, com as mãos manchadas de sangue, acumulou 21,3 milhões de dólares. A fortuna de Hosni Mubarak, autocrata do Egito, foi calculada em 70 bilhões de dólares. Muammar Kaddafi, tirano da Líbia assassinado em 2011, teria amealhado 200 bilhões. Bashar al-Assad, czar de uma Síria destroçada, contabiliza um patrimônio de 1,5 bilhão.
Sanguinários, déspotas, atrabiliários e ladrões reconhecidos no mundo... Para uma porção do Brasil, nem um deles se compara a Lula, “o maior corrupto da história”, o “inventor da roubalheira no País” (antes de o PT chegar ao poder éramos uma nação imaculada), o “Ali Babá”, o “chefe da quadrilha”. Nesta galeria de malfeitores, segundo esta fatia de convictos à Dallagnol, o ex-presidente deveria ocupar a fotografia maior, central.
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Desde que Lula alcançou a presidência da República em 2002, as mentiras a respeito de sua fortuna e da família transbordam pelos poros da internet ou foram excretadas pela mídia tradicional: um campus de uma universidade virou a fazenda do “Lulinha”, um outro filho teria se exibido nas ruas de Montevidéu com uma Ferrari banhada em ouro, o iate de um dos sócios da Rede TV! transmutou-se em propriedade do petista (provavelmente seria estacionado no famoso Edifício Solaris).
A fortuna de Lula engorda a cada dia nas redes sociais, mas nunca é encontrada no mundo real. Chego a imaginar que o ex-presidente, além de “corrupto-alfa”, teria a habilidade de um pirata para esconder o butim. Penso em Lula, cercado por corsários, em uma noite de lua cheia a enterrar os bilhões roubados dos brasileiros em alguma praia do Guarujá, chapéu de Barba Ruiva, tapa-olho, papagaio no ombro e uma garrafa de rum para animar a escavação. Yo-ho-ho.

Um tesouro marcado com um x, quem sabe perto do triplex que lhe foi atribuído pelo juiz Sergio Moro e que, ao fim do julgamento em segunda instância, lhe rendeu 12 anos de prisão. Aquela joia da coroa fotografada e filmada pelos militantes do MTST que a ocuparam no início desta semana, cuja reforma, segundo a mídia, teria custado 777 mil reais. Alguém foi ludibriado nesta história. Onde está o famoso elevador exclusivo? E a cozinha suntuosa? E os cômodos dignos de um nababo?
Que “Ali Babá”... O fruto de seu “roubo” sequer se compara às posses de Paulo Preto, dito operador do PSDB, funcionário público de terceiro escalão, ainda assim proprietário de um apartamento de 550 metros quadrados na Vila Nova Conceição, bairro mais valorizado de São Paulo, e de 113 milhões de reais em contas (comprovadas) na Suíça.
E o que dizer do misterioso dono do imóvel na Avenue Foch, uma das mais concorridas de Paris, à disposição de Fernando Henrique Cardoso? Sem falar nas malas de dinheiro transportadas com desenvoltura ou guardadas com displicência pela turma que se aboletou no poder em companhia de Michel Temer. Ou o “empréstimo” de 2 milhões de reais da JBS ao senador Aécio Neves, coletado em espécie pelo primo do tucano.
Um leitor poderia argumentar: não importa se muito ou pouco, se milhões ou centavos, é crime um homem público receber propina ou presentes, principalmente de uma empresa que se relaciona com o Estado.
Mas nem isso, no caso do triplex, se pode atribuir a Lula (os outros processos contra o petista estão em curso), apesar do malabarismo jurídico dos magistrados que o julgaram para tentar demonstrar o contrário. O apartamento de escadas claustrofobicas que serviriam de cenário perfeito para “Um Corpo que Cai”, de Alfred Hitchcock, de janelas envergonhadas e corredores estreitos não pertence ao ex-presidente e este é o fato inegável desse processo.
A polícia do Guarujá escorou-se em um argumento duvidoso, “flagrante”, para exigir a saída dos sem-teto que ocupavam a cobertura, caso contrário não haveria um proprietário para reivindicar a posse. E continuará sem por enquanto. Na terça-feira 17, fracassou o leilão do imóvel ordenado pela Justiça federal. A cobertura do Edifício Solaris, como percebera Lula na primeira visita ao local, é um mau negócio.
Assista ao vídeo dos comediantes argentinos:

Coube ao MTST expor de forma cristalina o ridículo da obsessão pelo triplex, cenas que de tão óbvias se tornam espantosas. No fundo, um excelente trabalho jornalístico. Como coube a dois humoristas argentinos traduzir em cerca de um minuto a comédia farsesca do interrogatório que o juiz Sérgio Moro submeteu o ex-presidente.
“O apartamento é seu”, pergunta um dos atores.
“Não”, responde o outro, rosto bem próximo do inquisidor.
“Certeza?”
“Certeza.”
“Então não é seu.”
“Não.”
“Nem um pouquinho?”
“Nem um pouquinho.”
Mais adiante, o interrogado pergunta: “Senhor juiz, o senhor tem provas de que o apartamento é meu?”
Resposta: “Não, por isso estou lhe perguntando”.
O vídeo se encerra com um letreiro: “Não é uma piada, é o interrogatório do juiz Sérgio Moro a Lula da Silva”.
Pano rápido.

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