O sorriso negro de dona Ivone Lara, por Luis Nassif
ter, 17/04/2018 - 10:03

A última vez que assisti Dona Ivone Lara foi em um evento da Virada, na praça Marechal Deodoro. O golpe caminhava a pleno vapor, a democracia começava a ruir, o conceito de Nação a se esboroar. Mas, ali na praça, viam-se, no meio de um público extasiado com dona Ivone, grupos de negros de todos os cantos de São Paulo, celebrando a negritude.
Depois
de aculturado, assimilado, depois de entrar em todas as rodas, parecia
que o samba se tornara novamente uma arma de resistência dos negros,
nítido no caso de São Paulo, de um pessoal não apenas orgulhoso de sua
cor e de sua cultura, mas preocupado em defender sua bandeira de paz das
presepadas de um país branco, selvagem, explicitado nos bárbaros que
berravam loas às próprias famiglias no palco do Congresso.
Não
me considerei um intruso, entrando naquele clima. Há muito, em nossas
rodas, “Sorriso Negro”, de dona Ivone, era mais do que uma ode ao negro,
mas uma celebração da raça Brasil, o sonho de que houve um tempo em que
criamos uma pax nacional multicolorida, afetiva, em torno do samba.
O
sorriso de dona Ivone não era mais o das amas de leite, das negras que
se tornaram apêndices de famílias da casa grande e passaram a ser vistas
com o olhar condescendente do patrão: era o sorriso das nossas mães, de
nossas avós, das matriarcas que ajudaram a construir a nação Brasil.
Seu olhar terno, seus olhos de cobertor, aqueciam nossos corações, como
se nos visse, nos abrigasse, mesmo estando apenas na televisão ou nos
palcos distantes de shows.
Abaixo, uma seleção feita por Luciano Hortencio
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