terça-feira, 17 de abril de 2018


O sorriso negro de dona Ivone Lara, por Luis Nassif


A última vez que assisti Dona Ivone Lara foi em um evento da Virada, na praça Marechal Deodoro. O golpe caminhava a pleno vapor, a democracia começava a ruir, o conceito de Nação a se esboroar. Mas, ali na praça, viam-se, no meio de um público extasiado com dona Ivone, grupos de negros de todos os cantos de São Paulo, celebrando a negritude.
Depois de aculturado, assimilado, depois de entrar em todas as rodas, parecia que o samba se tornara novamente uma arma de resistência dos negros, nítido no caso de São Paulo, de um pessoal não apenas orgulhoso de sua cor e de sua cultura, mas preocupado em defender sua bandeira de paz das presepadas de um país branco, selvagem, explicitado nos bárbaros que berravam loas às próprias famiglias no palco do Congresso.
Não me considerei um intruso, entrando naquele clima. Há muito, em nossas rodas, “Sorriso Negro”, de dona Ivone, era mais do que uma ode ao negro, mas uma celebração da raça Brasil, o sonho de que houve um tempo em que criamos uma pax nacional multicolorida, afetiva, em torno do samba.
O sorriso de dona Ivone não era mais o das amas de leite, das negras que se tornaram apêndices de famílias da casa grande e passaram a ser vistas com o olhar condescendente do patrão: era o sorriso das nossas mães, de nossas avós, das matriarcas que ajudaram a construir a nação Brasil. Seu olhar terno, seus olhos de cobertor, aqueciam nossos corações, como se nos visse, nos abrigasse, mesmo estando apenas na televisão ou nos palcos distantes de shows.
Abaixo, uma seleção feita por Luciano Hortencio

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