Missão, superação da violência e construção da paz...
FOTO: ACERVO PESSOAL
Por Jane Menezes Blackburn
Ao considerarmos os desafios da missão junto às pessoas vivendo com
violência, somos levados/as a refletir sobre dignidade, liberdade e cidadania.
Nos leva, principalmente, pensar sobre nossa relação com Deus.
Ao mesmo tempo em que a violência aparece na mídia televisiva e escrita,
ela está presente nos programas das Secretarias Estaduais e Municipais, nas ONGs
e nalgumas Igrejas e certos organismos ecumênicos. A violência é considerada
pelo Ministério da Saúde como uma questão de saúde pública, o qual recomenda que
haja iniciativas públicas de combate ao problema.
As causas que produzem a violência ainda carecem de aprofundamento, assim
como o fenômeno em si. Porém, é clara a contradição entre a ênfase atual devido
à situação alarmante e a ocultação da violência real.
A Violência acontece nas relações desiguais e por isso é um insulto a Deus.
Quando nós nos permitimos considerar outra pessoa como objeto de dominação e
dirigimos a ela nosso preconceito e agressividade, nos desumanizamos e na nossa
desumanização nos afastamos de Deus.
Quanto mais somos capazes de perceber as outras pessoas, aceitá-las
incondicionalmente, valorizar suas capacidades e considerá-las como filhas de
Deus e nossas irmãs, seremos capazes de viver e ensinar a enfrentar as situações
de conflito sem deixar que a não satisfação das necessidades pessoais leve a nós
e aos outros a agir com violência.
Poderemos acolher, prevenir e consolar pessoas vivendo com violência para
que Deus possa curar as feridas e potencializar a resiliência que existe em cada
uma permitindo que o sofrimento possa ser usado para desenvolver habilidade de
cuidar de outras pessoas em situações semelhantes.
A missão acontece numa realidade que grita pela presença de Deus e que é
marcada pelo individualismo, pelo mercado e o lucro, por relações baseadas no
prazer e pela desesperança. Quando em Mateus (16.13 a 18), Jesus faz uma
sondagem da realidade, perguntando “—Quem o povo diz que o Filho do Homem é”
?(Mt 16.13), nos leva a considerar a necessidade de conhecer o que as
pessoas pensam sobre a questão da violência, compreender as crenças no meio de
nossas Igrejas e na comunidade, com relação a questões como redução da idade
penal, castigo físico e outras faces da violência. A missão possibilita que as
pessoas conheçam a Deus como único caminho para promover “igualdade entre os
gêneros e a valorização da mulher”. (Meta do milênio nº 3)
Podemos ouvir a pergunta que Jesus faz aos discípulos: “Quem vocês dizem
que eu sou?”(Mt 16.15) e responder a ele e a nós mesmos/as o que pensamos
ser a proposta de Deus para superação da violência e construção da paz.
Nós cremos em Jesus Cristo, o “Príncipe da Paz” (Is 9.6), Aquele que traz a
paz em seu sentido profundo e afirmamos que a paz provém de Deus e é dom de
Jesus Cristo (Fp 4.7; Jo 14.27; 20.19,21,26).
Nós aceitamos a paz de Cristo e alcançamos a paz na medida em que estamos
ligados a ele e permitimos que ele nos revele o seu desejo para a transformação
da realidade de violência e assim ouvir dele: “você é feliz porque esta
verdade não foi revelada a você por nenhum ser humano, mas veio diretamente do
meu Pai, que está no céu.” (Mt 16.15)
Afirmando: “—O senhor é o Messias, o Filho do Deus vivo” (Mt 16.16),
abrimos a possibilidade que outra ordem mundial é possível e que podemos ser
instrumentos de Deus para que sua vontade seja estabelecida.
Em Deus, podemos ter força e discernimento para contribuir na promoção da
paz.
“Portanto, eu lhe digo: você é Pedro, e sobre esta pedra construirei a
minha Igreja, e nem a morte poderá vencê-la” (Mt 16.18). Colocando os
nossos dons a serviço da paz,
precisamos tomar algumas iniciativas para que a Igreja possa:
• Sensibilizar-se,
comprometer-se e capacitar-se no assunto.
• Agendar o tema
de forma permanente nos motivos de oração.
• Combater as
crenças e os sistemas sociais que favorecem a existência da violência. Ser uma
voz profética de denúncia.
• Aprofundar a
reflexão bíblico-teológica sobre a violência. Analisar criticamente nossa
maneira de interpretar a Bíblia. Reconhecer e responsabilizar-se por aquelas
interpretações que induziram a adoção de condutas abusivas.
• Instrumentalizar
o desenvolvimento de Fatores Protetores em crianças e adolescentes, no trabalho
cotidiano da Igreja, como: a adequada educação da sexualidade, conhecimento dos
direitos e deveres, educação para uma comunicação não violenta, etc.
• Desenvolver o
papel protetor das famílias e da comunidade.
• Desenvolver
políticas oficiais de Proteção Infantil na Igreja e em suas instituições
dependentes.
• Desenvolver
ações de acompanhamento de famílias de alto risco.
• Aprender a
trabalhar em redes sociais cristãs e não-cristãs, privadas e estatais, ligadas
ao tema, para enfrentar de forma efetiva a multifatorialidade e complexidade do
tema.
• Acompanhar
pastoralmente os protagonistas de situações de Violência e Abuso Sexual, sempre
que possível, sem deixar de fazer os encaminhamentos técnicos pertinentes.
• Manter a
esperança e o compromisso, apesar dos fracassos, confiando em tudo o que Deus
pode fazer, apesar de nossas limitações.
• Ser um espaço
de segurança e confiança que garanta o desenvolvimento pleno de seus membros,
sendo modelo das relações saudáveis do Reino de Deus, baseadas no amor e no
respeito mútuo.
Considerando o
foco no desenvolvimento dos fatores de proteção e de fortalecimento pessoal das
crianças, adolescentes e adultos para que se tornem menos vulneráveis frente a
situações de violência e agentes de prevenção para si mesmos/as e para outras
pessoas com quem se relacionam, podemos pensar em caminhos que possibilitem que
elas:
• Experimentem o
amor incondicional e a aceitação de, pelo menos, uma pessoa significativa.
• Descubram o
sentido da vida, o sentido de transcendência.
• Possam ser
reconhecidas por suas aptidões.
• Desenvolvam
uma auto-estima adequada e senso de humor.
• Desenvolvam
habilidade de comunicação social que lhes permitam comunicar suas necessidades
com clareza, opinar, criticar e promover mudanças no seu ambiente.
• Exercitem a
humildade conhecendo seus limites e dons.
• Reconheçam em
quem podem confiar.
• Conheçam seu
próprio corpo, valorizem, controlem, curtam e cuidem dele.
Que ajudem as famílias a:
• Identificar e
responder às necessidades dos seus membros com empatia e compromisso
afetivo.
• Ter clareza
dos papéis e desenvolver ferramentas de disciplina e estabelecimento de limites
de forma não-violenta.
• Estabelecer
relações familiares baseadas no amor e respeito e não no poder.
• Ter espaço de
convivência e lazer entre todos os seus membros.
• Contar com a
família estendida e com redes de apoio.
E assim as pessoas que vivem com violência compreendam que:
• O problema não
é só dela, mas de um grande número de pessoas;
• A violência
pode ser superada;
• É importante
pedir ajuda;
• É possível se
proteger;
• É
imprescindível sair do silêncio!
A Igreja pode cumprir a sua missão como comunidade que ama, apóia cura e
promove a paz de Deus!
__________
¹ Lista baseada em anotações de palestra de Alicia Casa Gorgal.
2006.
² Gorgal, Alicia Casas, Goyret, Maria Eugenia. Mãos à Oficina. Juventude
para Cristo. Uruguai. 2005. p 38.
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