A Corte da casa-grande
De como a
politização da Justiça comece nas nossas cabeças
Por onde começar? Pelo presidente do STF, ministro
Joaquim Barbosa. Candidamente admite que as penas cominadas inicialmente foram
exorbitantes, sim, destinadas, contudo, a evitar a prescrição. A mesma que,
muito pelo contrário, premia aos poucos os envolvidos no “mensalão” mineiro,
anterior ao petista, como se sabe, e no entanto postergado por oportunos
caprichos do calendário. Em odor de campanha eleitoral, Barbosa exibe
redondamente sua incompetência inclusive na hora de cair na ratoeira armada por
ele mesmo.
Bons os argumentos a favor da absolvição apresentados
por Barroso na quinta 27, no mínimo eficazes, mas... Tu quoque? Há meses
prejulgou em artigo publicado no Consultor Jurídico, peculiar, misteriosa
entidade que sofre a decisiva influência do ministro Gilmar Mendes. O qual
também prejulgou ao revelar um encontro com Lula, ambos ex-presidentes, ele do
STF, este da República, sem contar que antes ainda do processo não hesitara em
chamar os réus de “bandidos”. Quem prejulga deveria declarar-se impedido. E o
mesmo haveria de fazer o ministro Dias Toffoli, que já advogou a favor do PT e
foi subordinado de José Dirceu quando chefe da Casa Civil. Quem liga, porém,
para certos detalhes?
Depois da absolvição, o coro das lamentações teve o ímpeto e o volume das óperas de Verdi,
ao secundar as declarações desalentadas de Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, para
os quais o mundo havia caído. Para a mídia também. Os jornalões endossaram a
ideia do presidente do STF, de que manobra urdida no Palácio do Planalto criou a
maioria para absolver os réus. A Folha de S.Paulo colocou-a na própria
manchete, ao citar os ministros nomeados por Dilma Rousseff, igual ao inefável
Fux, que votou contra. Veja enveredou pela chacota e definiu melancólica a falta
de condenação. Só esta vale.
Marcelo Coelho escreve na Folha de S.Paulo
sobre a derrota de Joaquim Barbosa, um presidente da Suprema Corte que esqueceu
sua responsabilidade e ofendeu a sua importantíssima função. Montesquieu
revolve-se na tumba. Segundo o colunista, Barbosa perdeu “o poder de construir
uma nova maioria”. Mas seria esta a tarefa de um presidente do STF? O desastre
da Justiça brasileira começa pela própria concepção que temos dela ao percebê-la
como poder levado a agir ao sabor dos interesses políticos do privilégio. Se não
for assim, não serve. Tais como julgar os petistas antes dos tucanos, muito
antes, de sorte a lhes oferecer a via do escape, quando não ignorar a maior
bandalheira-roubalheira da história do Brasil, o episódio da privatação das
comunicações, vergonhoso monumento esculpido por Fernando Henrique Cardoso e sua
turma, que o chamava de “bomba atômica”.
CartaCapital, então quinzenal, teve acesso a
passagens dos grampos executados nos gabinetes do BNDES e revelou o escândalo em
toda a sua miserável imponência. Luiz Carlos Mendonça de Barros, ministro das
Comunicações, e André Lara Resende, presidente do BNDES, despidos como o rei do
conto de Andersen, perderam seus preciosos empregos, mas ninguém se incomodou
com o extraordinário inchaço das suas fortunas pessoais.
Resende, por exemplo, põe a viajar de avião cavalos
de raça para trotar em sua quinta portuguesa, ou em parques londrinos. Conheci o
pai dele, Otto, cidadão arguto e remediado. E daí? Trata-se de assuntos que não
interessam à mídia nativa, tanto mais se levantados por CartaCapital.
Claro que os senhores citados têm porte bastante superior em relação a quem
esconde dinheiro vivo nas cuecas. O único petista de nível tucano é certamente
José Dirceu. A diferença ideológica, está claro, não isenta tal gênero de
esperta elegância. Omito deliberadamente o injustiçado Genoino, homem de boa-fé.
Que fazer, no entanto? A Justiça brasileira funciona a bem da casa-grande, assim
como a mídia nativa desta é o partido.
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