quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Pronunciamento da UNAC sobre o Programa ProSavana
Nós camponesas e camponeses do Núcleo Provincial de Camponeses de Nampula, Núcleo Provincial
de Camponeses da Zambézia, União Provincial de Camponeses de Niassa e União Provincial de
Camponesas de Cabo Delgado, todos membros da União Nacional de Camponeses, reunimo-nos no
dia 11 de Outubro de 2012, na Cidade de Nampula, com o objectivo de debater e analisar o Programa
ProSavana.
O ProSavana é um Programa triangular entre a República de Moçambique, a República Federativa do
Brasil e o Japão, para o desenvolvimento da agricultura em grande escala no Corredor de
Desenvolvimento de Nacala, incidindo sobre 14 distritos das províncias de Niassa, Nampula e
Zambézia, numa área de sensivelmente 14 milhões de hectares. Este projecto inspira-se no projecto
de desenvolvimento agrário levado a cabo pelos governos brasileiro e japonês no Cerrado brasileiro,
onde hoje em dia se desenvolve uma agricultura industrial de larga escala e monocultura
(principalmente a soja), que levou a uma degradação ambiental e à quase extinção das comunidades
indígenas que viviam naquelas áreas. O Corredor de Nacala foi escolhido pela sua savana ter
características climáticas e agroecológicas semelhantes ao Cerrado brasileiro, bem como pela
facilidade de escoamento dos produtos para o mercado externo.
Desde que ouvimos falar do Programa ProSavana, temos notado uma insuficiência de informação e
reduzida transparência por parte dos principais actores envolvidos (Governos de Moçambique, Brasil e
Japão), daí a realização da reflexão acima referenciada.
Nós camponesas e camponeses, condenamos a forma como foi elaborado e se pensa implementar o
ProSavana em Moçambique, caracterizado pela reduzida transparência e exclusão das organizações
da sociedade civil em todo processo, em particular as organizações de camponeses.
Após uma análise profunda do ProSavana, Nós camponesas e camponeses, concluímos que:
O ProSavana é resultado de uma política que vem do topo para a base, sem no entanto levar
em consideração as demandas, sonhos e anseios da base, particularmente dos camponeses
do Corredor de Nacala;
Condenamos veementemente qualquer iniciativa que preconize o reassentamento de
comunidades e expropriação de terra dos camponeses, para dar lugar à mega projectos
agrícolas de produção de monoculturas (soja, cana-de-açúcar, algodão etc.);
Condenamos a vinda em massa de agricultores brasileiros que se dedicam ao agronegócio,
transformando camponesas e camponeses moçambicanos em seus empregados e em
trabalhadores rurais;
Pronunciamento da UNAC sobre o Programa Prosavana Page 2
Notamos com enorme preocupação que o ProSavana demanda milhões de hectares de terra
ao longo do Corredor de Nacala, porém a realidade local mostra a falta de disponibilidade
dessas extensões de terra, visto que a mesma é usada por camponeses com recurso à
técnica de pousio.
Olhando para a forma como foi elaborado e o processo de implementação do ProSavana, Nós
camponesas e camponeses, alertamos para os seguintes impactos esperados:
O surgimento de Comunidades Sem Terra em Moçambique, como resultado dos processos de
expropriações de terras e reassentamentos;
Frequentes convulsões sociais ao longo do Corredor de Nacala, e não só;
Empobrecimento das comunidades rurais e redução de alternativas de sobrevivência;
Aumento da corrupção e de conflitos de interesse;
Poluição dos recursos hídricos como resultado do uso excessivo de pesticidas e fertilizantes
químicos, bem como o empobrecimento dos solos;
Desequilíbrio ecológico como resultado de desmatamento de extensas áreas florestais para
dar lugar aos projectos de agronegócio.
Se é para se investir no Corredor de Nacala, ou em Moçambique em geral, recomendamos e exigimos
que esses investimentos sejam feitos prioritariamente para desenvolver a agricultura e a economia
camponesas, que nós, membros da UNAC e membros da Via Campesina, sabemos que é a única
agricultura capaz de criar empregos dignificantes e duradouros, conter o êxodo rural, produzir
alimentos de qualidade e em quantidade suficiente para toda a Nação moçambicana, e assim
favorecer o caminho para atingirmos a
Soberania Alimentar.
Continuamos firmes e fiéis na nossa aposta na agricultura camponesa e no modelo de produção
agroecológica que se assenta na Soberania Alimentar, como alternativa para o desenvolvimento do
sector agrário em Moçambique, modelo este que considera todos os aspectos ligados a
sustentabilidade e na sua pratica é amigo da natureza.
A agricultura camponesa é o pilar da economia local e contribui para manter e aumentar o emprego
rural e permite a sobrevivência das cidades e das aldeias. Permite que as colectividades reforcem a
sua própria cultura e identidade. Neste modelo alternativo, as políticas de desenvolvimento devem ser
social e ambientalmente sustentáveis e enquadradas aos desafios e demandas reais dos povos.
Os camponeses e as camponesas são os guardiões da vida, da natureza e do planeta. A UNAC como
movimento de camponeses do sector familiar, propõe modelos de produção baseados nos
fundamentos camponeses (respeito e conservação dos solos, uso de tecnologias adaptadas e
apropriadas, uma extensão rural participativa e interactiva).
Num momento em que as Nações Unidas, através da FAO, informam que 1 (uma) em cada 8 (oito)
pessoas no Mundo sofre de fome, com particular incidência nos países em desenvolvimento, como é o
caso de Moçambique, defendemos que a prioridade do Governo de Moçambique deve ser a produção
Pronunciamento da UNAC sobre o Programa Prosavana Page 3
de alimentos pela agricultura do sector familiar para o consumo interno, procurando desenvolver as
potencialidades endógenas e envolvendo diferentes segmentos da sociedade.
UNAC, 25 anos de luta Camponesa pela Soberania Alimentar!
Lutando por um maior protagonismo dos camponeses (homens, mulheres e jovens) na construção de
uma sociedade mais justa, próspera e solidária.
Nampula, 11 de Outubro de 2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário