quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Iniciativa de mulheres no semiárido mineiro incentiva mudanças significativas para comunidades

Rogéria Araújo
Jornalista da Adital
Adital


No município de Chapada Gaúcha, na comunidade rural de Barra do Pequi, vem de uma associação comunitária o engajamento e força para a convivência com o semiárido. Esta foi uma das experiências possibilitadas pelo VIII Encontro Nacional da Articulação do Semiárido Brasileiro, que acontece até amanhã (23) na cidade de Januária, em Minas Gerais.

De Januária até a comunidade são quase quatro horas de viagem, contando com atravessia de balsa do Rio São Francisco, que margeia toda a cidade. Durante o trajeto, entre as veredas do norte de Minas vai-se percebendo os problemas daregião.

Diante de tantos desafios e precariedades apresentadas pela falta de chuva, água para consumo humano, poucas escolas e quase nenhuma perspectiva de futuro para os jovens rurais, em 1995 foi criada a Associação Comunitária Mãe Ana (Acoma). Lurdes Araújo Barbosa, presidente da entidade, conta que a insistência foi fundamental para sedimentar projetos que hoje já mudaram a realidade não só da comunidade Barra do Pequi, com outras vizinhas.

A história da Associação começa bem antes de 1995, com as ações de dona Ana (daío nome da entidade), mãe de Lurdes, que iniciou um grupo de bordadeiras e assim despertou nas mulheres da região o entendimento de que as mudanças culturais encrustadas nos povoados poderiam ser feitas pelas mãos das mulheres.

"No começo foi muito difícil. Para as pessoas entenderem que a Associação poderia mudar a realidade, que a força e a união de todo mundo seria capaz de render resultados positivos levou muito tempo. Mas nunca desistimos”, falou Lurdes.

Para se ter ideia, ao longo de todos esses anos, a comunidade organizada, através de apoios como o da Articulação do Semiárido Brasileiro, órgão governamentais e de fomentos institucionais, foram construídas aproximadamente 500 cisternas, garantido o abastecimento de água para centenas de famílias.

"Ninguém entendia como é que era esse negócio de cisterna, como era esse poço. Pra colocar na casa de alguém era um problema, o pessoal achava que a água era parada, que ia trazer doença. Mas com muito cuidado fomos mudando isso”, assinalou a presidente da Associação.

As estruturas das escolas também marcam o antes e o depois da organização popular. As crianças tinham que estudar em construções de palha e, óbvio, o rendimentodo que era ensinado não era satisfatório. Nessa parte, entra um morador especial e querido entre os/as moradores das comunidades da Chapada Gaúcha. João Neto, agricultor, recebeu instruções para trabalhar com tijolos ecológicos e com um equipamento colocou as mãos às obras.

Em depoimento emocionado ele conta que erguer quatro escolas pequenas e duas grandes, além da própria sede da Associação, foi um orgulho para toda a região. Desde então o sentimento de que nada é impossível de mudar nunca mais o largou.

"Estou aqui, vivo aqui e não saio daqui. Vivo como agricultor porque sou agricultor,aqui é o meu lugar. Não tem prazer que me tire de dormir com a janela aberta, a convivência com os vizinhos. Então, essas escolas deram um outro sentido pra vida das pessoas daqui”, disse João Neto.

Guimarães Rosa
Buscandonos escritos de Guimarães Rosas, autor de "Grande Sertão: Veredas”, as mulheres da Acoma, por meio do grupo Mãos de Arte, que conta com cerca de 26 mulheres, lançaram uma recente coleção de bolsas, almofadas, panos de pratos inspirados no autor que melhor descreveu na literatura brasileira essa nuanças mineiras.

Adailça Silva, que está no grupo desde o início, explica feliz que vencer o preconceitofoi a primeira conquista. Os problemas começaram dentro de casa e passaram pela vizinhança. Muitos achavam que eram mulheres "que não tinham o que fazer”.

Mas logo isso mudou. "Começamos a vender, começou a dar retorno, entrar dinheiro, e os maridos foram vendo que a gente podia também contribuir com a renda da família. Hoje temos todo o apoio, antes tinha mulher que saía escondida de casa”,contou.

Conviver
Todas essas ações mostram que a convivência com o semiárido é possível. Basta que setenha iniciativa e parceiros que acreditem e invistam em projetos sustentáveis.

Complementando com a fala de Lurdes, questionada sobre a importância de mulheres terem tomado a frente das iniciativas, ela diz: "Acho que as mulheres têm maissensibilidade. Isso é muito verdade. Via meus filhos, via minhas companheiras, não queria que tivessem um futuro ruim, que tivessem que sair para a cidade. Efoi o que fiz”, disse.

Nenhum comentário:

Postar um comentário