sexta-feira, 6 de setembro de 2013



Entrevista

"Esporte só vai melhorar com mais transparência", diz senadora

Relatora de projeto que acaba com a reeleição indefinida nas federações esportivas, Lídice da Mata (PSB-BA) lembra que elas são entidades privadas, mas recebem dinheiro público
por José Antonio Lima — publicado 06/09/2013 08:40
Waldemir Barreto/Agência Senado
Lídice da Mata
Lídice da Mata: a senadora está otimista com as mudanças no esporte brasileiro
Após anos de tentativas, a Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado aprovou nesta semana um projeto que pode afetar a dominação de uma classe de dirigentes sobre as federações e confederações esportivas. O texto, que ainda precisa ser analisado na Câmara, acaba com as reeleições indefinidas de cartolas e tem efeito inclusive sobre os atuais mandatários. Em entrevista por e-mail a CartaCapital, a relatora do projeto, a senadora Lídice da Mata (PSB-BA), se diz otimista com os avanços e os atribui, em parte, à mudança de clima no Congresso após as manifestações de junho.
CartaCapital - Há anos havia tentativas de aprovar projetos como o que a senhora relatou. Essas tentativas sempre acabavam frustradas. A que a senhora atribui a mudança de postura dos integrantes da Comissão de Educação desta vez?
Lídice da Mata (PSB-BA) – Não é somente uma mudança de postura dos membros desta ou outra comissão. Os grandes eventos esportivos internacionais sediados pelo Brasil trouxeram um novo olhar da sociedade sobre os esportes e os negócios a eles ligados. Paixão de milhões, os esportes são hoje, em todo o mundo, um negócio de bilhões de dólares. As recentes manifestações populares nas ruas conseguiram mudar a pauta da política brasileira. E o Parlamento não poderia ficar indiferente a tudo isso. Projetos que estavam parados há anos, obstruídos por interesses minoritários mas poderosos, acabaram por ganhar luz e força. Este projeto, da normatização dos processos eletivos em clubes e entidades desportivas, de autoria do senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e por mim relatado, vai ao encontro da necessidade de dar mais transparência ao funcionamento das entidades diretivas do esporte e evitar abusos relacionados ao mau uso dos recursos dessas instituições que, embora privadas, também exercem suas funções com investimentos públicos, como, por exemplo, os decorrentes das loterias esportivas, e mesmo recursos públicos diretos, como os esportes olímpicos. Uma contribuição que consegui emprestar ao projeto foi a de que essa interdição à reeleição e ao tempo de mandato conte a partir dos atuais mandatos, o que certamente provocará uma ampla renovação no quadro dirigente esportivo nacional.
CC - Atribui-se essas tentativas frustradas à ação da chamada “bancada da bola”. Essa bancada existe de fato? Qual seu real poder?
LDM – Essa expressão foi cunhada durante a CPI da Nike, em 2001. Hoje, considero que o quadro político evoluiu bastante. Se for verdade que existem parlamentares "cartolas" ou por eles apoiados, também é verdade que uma nova geração de parlamentares atletas e profissionais de Educação Física, principalmente na Câmara dos Deputados, trouxe novas abordagens sobre a questão esportiva brasileira. Também na sociedade, novas articulações contribuíram decisivamente para a construção dessa nova realidade. Destaco aqui os Atletas pela Cidadania, presidida por Ana Moser e integrado por atletas de expressão como Raí, Mauro Silva, Gustavo Borges, Cafu, Lars Grael, Magic Paula, Fernando Meligeni, Joaquim Cruz e muitos outros. Prefiro destacar esses avanços e essas novas forças.
CC - Na opinião da senhora, por que são raros os casos de parlamentares que admitem fazer parte desta “bancada da bola” ou defender os interesses de dirigentes esportivos?
LDM – Certamente, defender a essa altura do campeonato a eternização dos dirigentes esportivos, quando toda a sociedade brasileira clama por mudanças e reformas políticas profundas, não é, de fato, uma bandeira muito simpática. Lembro que a questão dos gastos na Copa do Mundo ocuparam o centro das atenções nas recentes manifestações populares. A transparência hoje reclamada ao poder público, certamente deve se estender ao mundo privado, dos clubes e suas federações. Essa nos parece uma tendência irreversível. Urge a reestruturação da atual legislação do sistema esportivo nacional e a criação de um Plano Nacional de Esporte, com metas, estratégias e objetivos claros. Tudo isso só será possível com transparência, profissionalismo na gestão esportiva e maior democracia, com a ampla participação de atletas, técnicos, especialistas e da população em geral. E esse projeto, agora aprovado, contribui nessa direção. Os interesses menores, confessados ou não, ficarão pelo caminho. Vejo com muito otimismo as mudanças que virão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário