Efeitos da crise
15.03.2013 10:37
A democracia oligárquica
Luiz Gonzaga Belluzzo
Anunciados os resultados das eleições italianas, o economista Joseph Stiglitz escreveu um artigo contundente no site Project Syndicate. O resultado das eleições italianas, diz Stiglitz, deveria mandar uma mensagem clara para as lideranças europeias: as políticas de austeridade recomendadas e praticadas por eles são rejeitadas pelos eleitores.
O economista considera um despropósito antidemocrático entregar os governos a tecnocratas enredados em ligações com o establishment, inclinados a adotar políticas ineficazes para atingir os objetivos proclamados, mas suficientemente cruéis para disseminar a miséria entre os cidadãos da Eurolândia.
“A realidade mostra que a maioria dos países da União Europeia está mergulhada na depressão. A queda do PIB italiano desde o início da crise é tão grande quanto a observada nos anos 1930 do século XX. Na Grécia, o desemprego entre os jovens bateu nos 60%, e na Espanha chegou a mais de 50%. Com essa destruição de capital humano, o futuro da Europa não parece brilhante.”
A grande imprensa nacional e estrangeira rodopiou em torno de seus preconceitos para estigmatizar o humorista Beppe Grillo. Tal como a grã-fina de Nelson Rodrigues, os midiáticos de anedota e champanhota lançaram de suas narinas de cadáver as mesmas ventanias desferidas contra o presidente venezuelano Hugo Chávez antes, durante e depois do anúncio de sua morte. “Populismo!”, gritam indignados, enquanto escondem sob as cuecas as vergonhas de suas ideias grotescas e as patifarias de suas políticas malfazejas.
A “impotência política” dos governos esconde os segredos da dominação oligárquica: a ocupação do Estado e de seus órgãos de regulação pelas tropas das finanças e dos interesses corporativos graúdos, sob as bênçãos da cogula midiática.
Nos 1990, sob a forte e notória influência dos lobistas das grandes instituições financeiras, os Parlamentos aceleraram as reformas da legislação para abrir caminho às práticas agressivamente “inovadoras” dos mercados.
A finança e sua lógica notabilizaram-se por sua capacidade de impor vetos às políticas macroeconômicas.
A despeito do desemprego e da desigualdade escandalosa, as ações compensatórias dos governos sofrem fortes resistências das casamatas conservadoras. Ao tornar mais livre o espaço de circulação da riqueza e da renda dos grupos privilegiados, a globalização desarticulou a velha base tributária das políticas keynesianas, nas quais prevaleciam os impostos diretos sobre a renda e a riqueza.
Os programas de redistribuição de renda, reparação de desequilíbrios regionais e assistência a grupos marginalizados têm encontrado forte resistência dentro das sociedades. Mais um ardil da razão: o novo individualismo construiu a sua base social na grande classe média emergente na longa prosperidade e as políticas igualitárias predominantes na “Idade de Ouro” do Estado do Bem-Estar.
Agora em escombros, as classes médias, nos Estados Unidos e na Europa, ziguezagueiam entre os fetiches do individualismo e as realidades de declínio social e econômico. O reconhecimento da crise como um fenômeno social é inevitável. E esse reconhecimento torna-se mais disseminado quando o desemprego e a desigualdade prosperam em meio à teimosa celebração do sucesso de alguns indivíduos.
Trata-se, isso sim, de esmagar os princípios do regime democrático representativo, movendo as engrenagens do moinho satânico. No atual funcionamento das democracias parlamentares do Ocidente, como disse Luciano Cânfora, o sistema trata de limitar a eficácia dos organismos eletivos que acabam por assumir funções periféricas ou de mera ratificação diante dos poderes oligárquicos, sobretudo no campo da economia e das finanças, enquanto a mídia de massa cuida de obstruir a capacidade de compreensão da opinião pública.
Na visão de Cânfora, as forças populares e seus partidos não foram capazes de antecipar o recurso mais eficaz da economia capitalista, a diversificação e a fragmentação crescente das classes em escala nacional e internacional. “Os poderosos são unidos e internacionalistas, prontos para enfrentar por meio de governos considerados democratas, a seu serviço em qualquer emergência; os outros não dispõem de coligação internacional, nem de partido, nem de perspectiva.”
Só os cínicos ou néscios ignoram que as tropas da Economia, essa degeneração da metafísica ocidental, transformaram os Estados numa caricatura da República, em um mercado de influências e transações suspeitas.
Essa engrenagem controla o Estado por dentro e precisa produzir as condições que a ajudem a reproduzir a si mesma.
O economista considera um despropósito antidemocrático entregar os governos a tecnocratas enredados em ligações com o establishment, inclinados a adotar políticas ineficazes para atingir os objetivos proclamados, mas suficientemente cruéis para disseminar a miséria entre os cidadãos da Eurolândia.
“A realidade mostra que a maioria dos países da União Europeia está mergulhada na depressão. A queda do PIB italiano desde o início da crise é tão grande quanto a observada nos anos 1930 do século XX. Na Grécia, o desemprego entre os jovens bateu nos 60%, e na Espanha chegou a mais de 50%. Com essa destruição de capital humano, o futuro da Europa não parece brilhante.”
A grande imprensa nacional e estrangeira rodopiou em torno de seus preconceitos para estigmatizar o humorista Beppe Grillo. Tal como a grã-fina de Nelson Rodrigues, os midiáticos de anedota e champanhota lançaram de suas narinas de cadáver as mesmas ventanias desferidas contra o presidente venezuelano Hugo Chávez antes, durante e depois do anúncio de sua morte. “Populismo!”, gritam indignados, enquanto escondem sob as cuecas as vergonhas de suas ideias grotescas e as patifarias de suas políticas malfazejas.
A “impotência política” dos governos esconde os segredos da dominação oligárquica: a ocupação do Estado e de seus órgãos de regulação pelas tropas das finanças e dos interesses corporativos graúdos, sob as bênçãos da cogula midiática.
Nos 1990, sob a forte e notória influência dos lobistas das grandes instituições financeiras, os Parlamentos aceleraram as reformas da legislação para abrir caminho às práticas agressivamente “inovadoras” dos mercados.
A finança e sua lógica notabilizaram-se por sua capacidade de impor vetos às políticas macroeconômicas.
A despeito do desemprego e da desigualdade escandalosa, as ações compensatórias dos governos sofrem fortes resistências das casamatas conservadoras. Ao tornar mais livre o espaço de circulação da riqueza e da renda dos grupos privilegiados, a globalização desarticulou a velha base tributária das políticas keynesianas, nas quais prevaleciam os impostos diretos sobre a renda e a riqueza.
Os programas de redistribuição de renda, reparação de desequilíbrios regionais e assistência a grupos marginalizados têm encontrado forte resistência dentro das sociedades. Mais um ardil da razão: o novo individualismo construiu a sua base social na grande classe média emergente na longa prosperidade e as políticas igualitárias predominantes na “Idade de Ouro” do Estado do Bem-Estar.
Agora em escombros, as classes médias, nos Estados Unidos e na Europa, ziguezagueiam entre os fetiches do individualismo e as realidades de declínio social e econômico. O reconhecimento da crise como um fenômeno social é inevitável. E esse reconhecimento torna-se mais disseminado quando o desemprego e a desigualdade prosperam em meio à teimosa celebração do sucesso de alguns indivíduos.
Trata-se, isso sim, de esmagar os princípios do regime democrático representativo, movendo as engrenagens do moinho satânico. No atual funcionamento das democracias parlamentares do Ocidente, como disse Luciano Cânfora, o sistema trata de limitar a eficácia dos organismos eletivos que acabam por assumir funções periféricas ou de mera ratificação diante dos poderes oligárquicos, sobretudo no campo da economia e das finanças, enquanto a mídia de massa cuida de obstruir a capacidade de compreensão da opinião pública.
Na visão de Cânfora, as forças populares e seus partidos não foram capazes de antecipar o recurso mais eficaz da economia capitalista, a diversificação e a fragmentação crescente das classes em escala nacional e internacional. “Os poderosos são unidos e internacionalistas, prontos para enfrentar por meio de governos considerados democratas, a seu serviço em qualquer emergência; os outros não dispõem de coligação internacional, nem de partido, nem de perspectiva.”
Só os cínicos ou néscios ignoram que as tropas da Economia, essa degeneração da metafísica ocidental, transformaram os Estados numa caricatura da República, em um mercado de influências e transações suspeitas.
Essa engrenagem controla o Estado por dentro e precisa produzir as condições que a ajudem a reproduzir a si mesma.
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