segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

 Mino Carta: O caso Battisti, do asilo à extradição

Leia também: Entenda: Cesare Battisti não é um perseguido político
Condenado à revelia, fugiu por rotas diversas até buscar na França a proteção da Lei Mitterrand, tão hipócrita quanto quem a promulgou, para contar ao cabo com o lobby de figuras secundárias, como Fred Vargas e Bernard-Henry Levy. Diante dos pedidos de extradição encaminhados pela Itália, refugiou-se no Brasil com a provável ajuda da polícia francesa.
Passou uma temporada na Papuda e finalmente recebeu asilo por determinação de Lula a 31 de dezembro de 2010, último dia do segundo mandato. O presidente sofrera as pressões de vários apaniguados, Luís Eduardo Greenhalgh, José Dirceu e Eduardo Suplicy à frente, e até de manifestações populares pela libertação de Battisti.

“Foi uma ofensa à nossa democracia”, afirma hoje Spataro na entrevista ao La Repubblica. Houve, na esteira do apoio ao terrorista, professores universitários, escassamente afeitos ao conhecimento da história contemporânea, prontos a propalar que nos anos de chumbo a Itália foi governada pela extrema-direita e contra esta se deu o desafio das Brigadas Vermelhas e outros grupos de menor expressão. Ocorre que houve terrorismo de esquerda e de direita.
Por exemplo, o atentado de Bolonha, que matou 89 inocentes, foi obra de saudosos do fascismo. A península viveu então anos de grande tensão, mas sem se afastar dos valores e princípios inscritos na sua impecável Constituição, a repressão ao terrorismo, enfim vencedora sob o comando do general Dalla Chiesa, foi conduzida sem recursos a medidas especiais que demandassem a alteração da Carta. Foi uma lição inesquecível para as polícias de todo o mundo.
Leia também: Mino Carta: “Manutenção de Pizzolato na Itália não é uma vingança pelo caso Battisti”
Na década de 70, o país caminhou, ao contrário do que se propalava por aqui, no sentido da esquerda. Nas eleições de 1976, o PDC teve 36% dos votos e o PC 34%, e em seguida Aldo Moro e Enrico Berlinguer começaram a cogitar de uma aliança que se chamou de compromisso histórico. O PC era dissidente de Moscou havia 20 anos, condenava abertamente o terrorismo e, como dizia Eugenio Scalfari, um dos grandes do jornalismo italiano, era de fato um partido social-democrata na acepção correta.
Infiltradas pela CIA, as Brigadas sequestraram Moro em 1978 e o mataram dois meses depois. A perspectiva do tal compromisso deixou de assombrar os EUA. Tais fatos estão nos livros, mas, entre outras coisas, a esquerda brasileira não gosta de ler.

Frequentei o assunto Battisti muitas vezes e agora, mais do nunca, parece-me indicativo da parvoíce e do atraso nativos. Certo é que, na Itália dos anos de chumbo e na de hoje, o inquisidor Moro teria sido removido de Curitiba por uma Alta Corte que cumpre à perfeição o seu papel de poder independente e democrático, sem alarde e com a devida energia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário