domingo, 2 de fevereiro de 2014

Eleições 2014

O Bolsa Família na eleição

Embora tente, a oposição não tem a paternidade do programa. O PT perdeu, porém, a luta ideológica a seu respeito
por Marcos Coimbrapublicado 02/02/2014 11:38
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Os dois principais candidatos oposicionistas já deixaram claro que não permitirão que Dilma Rousseff seja sua única “dona”. Especialmente Aécio Neves, que sabe quanto o cidadão comum duvida das reais intenções do PSDB de mantê-lo.
Como mostram as pesquisas, o PSDB perdeu a guerra pela paternidade do programa. Na verdade, nunca chegou a ameaçar a primazia de Lula como seu criador, por mais que tenha tentado se apresentar como responsável por ele.
Ninguém comprou a tese de que “tudo começou” em Campinas, onde a prefeitura tucana, em 1994, lançou um modesto programa local de complementação de renda. Se o argumento fosse bom, não seria difícil dizer que foi Alziro Zarur, com seu “sopão”, o verdadeiro início.
Para o PSDB, o problema é que o Bolsa Família não tem a “cara” tucana, não se parece com aquilo que o eleitor associa a suas ideias e políticos. Por isso, toda vez que um candidato peessedebista o defende, soa artificial – para não dizer falso. Daí a ênfase que Aécio precisa empregar para afirmar que não apenas o continuaria, mas o “melhoraria”, sem que nunca fique muito claro em quê.
É o mesmo que diz Eduardo Campos. Sem padecer do problema tucano de incompatibilidade, não precisa desperdiçar tempo na discussão genética. Não sendo e não posando de “criador” do Bolsa Família, promete “apenas” que vai “aprimorá-lo”.
Enquanto, com mais ou menos naturalidade, os candidatos da oposição fazem o que podem para ficar perto do programa, o PT volta a disputar uma eleição sem resolver a contraditória relação que tem com ele. Pois, se é fato que o Bolsa Família possui a “cara” de Lula e do partido, nem sempre o discurso das candidaturas petistas é adequadamente afirmativo.
Salvo em seus primórdios, quando não tinha adversários, sua defesa nunca foi firme. Foi prioridade nos governos Lula e Dilma e recebeu tratamento orçamentário compatível à sua importância (o que permitiu que crescesse e se consolidasse), mas o discurso sobre o Bolsa Família permaneceu tímido. Como se tivesse que sempre se justificar e se explicar perante seus muitos inimigos na sociedade.
No fundo, se é verdade que a oposição não tem a paternidade do programa, o PT não venceu a luta ideológica a seu respeito.
O paradoxo do papel eleitoral do Bolsa Família está em que, embora os candidatos oposicionistas façam o possível para mostrar-se seus defensores, os eleitores de oposição o repudiam. A rigor, a maioria o detesta.
A partir de 2006, quando a oposição na sociedade e na mídia culpou o Bolsa Família pela reeleição de Lula, ele tornou-se vilão. Em 2010, a vitória de Dilma foi nova confirmação de seu poder “deletério”.
“Esperteza do Lula”, “compra do voto dos miseráveis”, “fonte de indolência”, “incentivo à procriação”, são apenas exemplos do que se ouve sobre o Bolsa Família em pesquisas qualitativas com antipetistas. É o que dizem os intelectuais da “grande imprensa”.
O grave é a ausência de um contradiscurso, que apresente o programa pelo ângulo da solidariedade e da cidadania. Que enfrente estereótipos e preconceitos. Que não fique preso às noções de “condicionalidade”, “contraprestação” e “porta de saída”. Que não aja como se o correto fosse não haver Bolsa Família.
O programa chega a esta eleição vulnerável, sem o vigor da juventude. Mais que isso, com as mudanças sociais e econômicas dos últimos anos, o Bolsa Família tornou-se obsoleto para muitos cidadãos.
Isso é especialmente verdade na tênue e instável fronteira que separa os beneficiários do programa dos segmentos de menor renda das “classes emergentes” urbanas. Às vezes, vizinhos de rua, integrantes da mesma família, sentem que “dão duro” e arcam com pesados impostos, enquanto outros apenas “se escoram”. Uns pagam, outros recebem benefícios.
Sem um discurso positivo e enfático em sua defesa, o Bolsa Família pode deixar de ser um patrimônio para Dilma. Pode tornar-se um problema: um símbolo de política errada.

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