quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Política

Ícone político

As coxinhas e os coxinhas

A política comprometeu a reputação da pizza. Ainda dá tempo de defender esse nosso petisco de um risco parecido?
por Manuela Carta — publicado 07/01/2016 02h21

Beto Chagas/iStockphoto
Coxinha
O embate ideológico trouxe à mesa um novo tempero para um tira-gosto 100% nacional
Alguém aí há de explicar por que é que coxinha, de repente, deixou de significar um tira-gosto apetitoso para designar uma criatura desprezível.
É gíria recente, sem origem clara, como, de resto, costumam ser as gírias, nomeando de forma suavemente pejorativa, aquela rapaziada mimadinha pelo dinheiro fácil e endereço chique, eternos filhinhos de papai, ratos de shopping center que, a bordo de suas camisetas Sergio K ou Abercrombie & Fitch (por favor, só as originais), bem justinhas junto ao muque marombado.
Eles que desfilam o tédio de um exílio forçado no país do PT e do Bolsa Família quando tudo o que mais ambicionam é a dolce vita num penthouse da Brickell, em Miami. Pela cara do jargão, deve ter mais a ver com menção anatômica do que com afinidade culinária.
Certamente, jamais navegaram um livro além da orelha ou do prefácio. De um ano para cá, saíram às ruas sacudindo estandartes verde-amarelo e brandindo cartazes escatológicos, imbuídos de abrupto surto cívico “contra a corrupção” – só aquela, específica, seletiva, a que enche de alegria e de elogios o juiz Moro, nada a ver com aquele dinheirinho que papai mandou para Genebra, sob as bênçãos da Fiesp, a fim de escapar da cruel taxação bolivariana.
Acabaram, os coxinhas, comprometendo a boa reputação da coxinha, esta sim, uma instituição legitimamente nacional, sem nenhuma vergonha de ser 100% brasileira.
Corre o risco de, por culpa da simbologia política, ser execrada pela esquerda, logo a esquerda que preza os valores ideológicos de um bom pé-sujo e seus petiscos, e que não há de ser na direita gourmet, de paladar cosmopolita, que um acepipe de apelo tão popular vai encontrar defensores desde sempre habituados à trufa branca e ao caviar beluga.
Sem exagero, dá até para pensar que pode acontecer à coxinha – não ao coxinha – a triste sina da pizza, transformada em indigesto sinônimo para as tramoias parlamentares de Brasília e similares.
É hora, portanto, de esquecer os coxinhas e resgatar a coxinha, ícone maior, juntamente com o pastel de feira, daquilo que o cronista Ruy Castro chamou, com todo respeito, de baixa gastronomia. Coxinha com Catupiry ou sem. Coxinha de frango – a mais clássica – ou de carne.
Coxinha de mandioca e de batata-doce. Frita, que a tradição recomenda, ou assada, o que configura um desafio. Óbvio que não faltaria a coxinha vegana.
O receituário da resistência é tão amplo que até coxinha de brigadeiro com morango está disponível na web. Quando a gente vai checar, a única semelhança com coxinha que há ali é o formato. Mas taí uma coxinha que deve agradar ao paladar dos, aí sim, coxinhas vorazes.
Dois endereços disputam, em São Paulo, o campeonato da melhor coxinha – não o do melhor coxinha, bem entendido. A do Frangó é clássica, no ambiente onde impera há mais de 28 anos, na Praça da Matriz, a cavaleiro da Freguesia do Ó (leia a receita abaixo).
A outra, do Velloso, na Vila Mariana, também convoca a paciência de filas permanentes, mas bem recompensadas. A coxinha é patrimônio nacional, e não apenas paulistano, e com maestria persegue, do Oiapoque ao Chuí, no artesanato carinhoso da comida de boteco, aquele croc, croc, croc que irmana todos os autênticos templos da coxinha, campeões de audiência ou não, protegendo-os da presença nefanda dos coxinhas. 

Frite seu coxinha, perdão, sua coxinha (À moda do Frangó) 
Ingredientes da massa:
900 ml de água filtrada
¼ de xícara de óleo de soja
6 cubos de caldo de galinha
650 gramas de farinha de trigo
Recheio:
900 gramas de peito de frango cozido e cortado bem fino
1 cebola pequena picada
¼ xícara de salsinha picada
sal e pimenta-do-reino
900 gramas de Catupiry cremoso
500 gramas de farinha de rosca
1 litro de óleo 
Como preparar a massa:
Bote a água, o óleo de soja e o caldo de galinha numa panela grande e leve ao fogo. Assim que ferver, mas sem desligar o fogo, vá despejando a farinha de trigo já peneirada, mexendo sempre até que a massa se solte do fundo da panela e esteja suficientemente cozida (leva perto de dez minutos). Reserve e deixe esfriar.
Recheio e acabamento:
Tempere o frango picado com a cebola, a salsinha, o sal e a pimenta-do-reino. Pegue uma porção de massa (uma colher de sopa) e recheie com meia colher de sobremesa de Catupiry e uma colher de sobremesa de peito de frango temperado.
Feche a massa sobre o tempero, com formato de coxinha. Passe as coxinhas, uma a uma, na farinha de rosca. Aqueça o óleo numa panela funda, o suficiente para submergir as coxinhas. Espere que elas fiquem crocantes e douradas. Escorra em papel absorvente e bom apetite.

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