Política
Ícone político
As coxinhas e os coxinhas
A política comprometeu a reputação da pizza. Ainda dá
tempo de defender esse nosso petisco de um risco parecido?
por Manuela Carta
—
publicado
07/01/2016 02h21
Beto Chagas/iStockphoto
O embate ideológico trouxe à mesa um novo tempero para um tira-gosto 100% nacional
Alguém aí há de
explicar por que é que coxinha, de repente, deixou de significar um
tira-gosto apetitoso para designar uma criatura desprezível.
É gíria recente, sem origem clara, como, de resto,
costumam ser as gírias, nomeando de forma suavemente pejorativa, aquela
rapaziada mimadinha pelo dinheiro fácil e endereço chique, eternos
filhinhos de papai, ratos de shopping center que, a bordo de suas
camisetas Sergio K ou Abercrombie & Fitch (por favor, só as
originais), bem justinhas junto ao muque marombado.
Eles que desfilam o tédio de um exílio forçado no país do PT e do Bolsa Família
quando tudo o que mais ambicionam é a dolce vita num penthouse da
Brickell, em Miami. Pela cara do jargão, deve ter mais a ver com menção
anatômica do que com afinidade culinária.
Certamente, jamais navegaram um livro além da orelha ou do
prefácio. De um ano para cá, saíram às ruas sacudindo estandartes
verde-amarelo e brandindo cartazes escatológicos, imbuídos de abrupto
surto cívico “contra a corrupção” – só aquela, específica, seletiva, a
que enche de alegria e de elogios o juiz Moro,
nada a ver com aquele dinheirinho que papai mandou para Genebra, sob as
bênçãos da Fiesp, a fim de escapar da cruel taxação bolivariana.
Acabaram, os coxinhas, comprometendo a boa reputação da
coxinha, esta sim, uma instituição legitimamente nacional, sem nenhuma
vergonha de ser 100% brasileira.
Corre o risco de, por culpa da simbologia política, ser
execrada pela esquerda, logo a esquerda que preza os valores ideológicos
de um bom pé-sujo e seus petiscos, e que não há de ser na direita
gourmet, de paladar cosmopolita, que um acepipe de apelo tão popular vai
encontrar defensores desde sempre habituados à trufa branca e ao caviar
beluga.
Sem exagero, dá até para pensar que pode acontecer à
coxinha – não ao coxinha – a triste sina da pizza, transformada em
indigesto sinônimo para as tramoias parlamentares de Brasília e
similares.
É hora, portanto, de esquecer os
coxinhas e resgatar a coxinha, ícone maior, juntamente com o pastel de
feira, daquilo que o cronista Ruy Castro chamou, com todo respeito, de
baixa gastronomia. Coxinha com Catupiry ou sem. Coxinha de frango – a
mais clássica – ou de carne.
Coxinha de mandioca e de batata-doce. Frita, que a
tradição recomenda, ou assada, o que configura um desafio. Óbvio que não
faltaria a coxinha vegana.
O receituário da resistência é tão amplo que até coxinha
de brigadeiro com morango está disponível na web. Quando a gente vai
checar, a única semelhança com coxinha que há ali é o formato. Mas taí
uma coxinha que deve agradar ao paladar dos, aí sim, coxinhas vorazes.
Dois endereços disputam, em São Paulo, o campeonato da
melhor coxinha – não o do melhor coxinha, bem entendido. A do Frangó é
clássica, no ambiente onde impera há mais de 28 anos, na Praça da
Matriz, a cavaleiro da Freguesia do Ó (leia a receita abaixo).
A outra, do Velloso, na Vila Mariana, também convoca a
paciência de filas permanentes, mas bem recompensadas. A coxinha é
patrimônio nacional, e não apenas paulistano, e com maestria persegue,
do Oiapoque ao Chuí, no artesanato carinhoso da comida de boteco, aquele
croc, croc, croc que irmana todos os autênticos templos da coxinha,
campeões de audiência ou não, protegendo-os da presença nefanda dos
coxinhas.
Frite seu coxinha, perdão, sua coxinha (À moda do Frangó)
Ingredientes da massa:
900 ml de água filtrada
¼ de xícara de óleo de soja
6 cubos de caldo de galinha
650 gramas de farinha de trigo
Recheio:
900 gramas de peito de frango cozido e cortado bem fino
1 cebola pequena picada
¼ xícara de salsinha picada
sal e pimenta-do-reino
900 gramas de Catupiry cremoso
500 gramas de farinha de rosca
1 litro de óleo
Como preparar a massa:
Bote a água, o óleo de soja e o caldo de
galinha numa panela grande e leve ao fogo. Assim que ferver, mas sem
desligar o fogo, vá despejando a farinha de trigo já peneirada, mexendo
sempre até que a massa se solte do fundo da panela e esteja
suficientemente cozida (leva perto de dez minutos). Reserve e deixe
esfriar.
Recheio e acabamento:
Tempere o frango picado com a cebola, a
salsinha, o sal e a pimenta-do-reino. Pegue uma porção de massa (uma
colher de sopa) e recheie com meia colher de sobremesa de Catupiry e uma
colher de sobremesa de peito de frango temperado.
Feche a massa sobre o tempero, com
formato de coxinha. Passe as coxinhas, uma a uma, na farinha de rosca.
Aqueça o óleo numa panela funda, o suficiente para submergir as
coxinhas. Espere que elas fiquem crocantes e douradas. Escorra em papel
absorvente e bom apetite.
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