Política
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A vez da coragem
Há de se esperar que Dilma encontre a força necessária para agir
por Mino Carta e Luiz Gonzaga Belluzzo
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publicado
22/01/2016 05h46
Marcelo Camargo/ABr
Desde a vitória eleitoral de Dilma Rousseff em 2014, CartaCapital,
nesta e em muitas outras das suas páginas, aponta a única saída
possível para a crise econômica que humilha o Brasil: crescer e crescer.
O grande exemplo é o New Deal rooseveltiano, inspirado por lord
Keynes, mas vale reconhecer que o presidente dos EUA contava com
instituições sólidas e com uma base popular politizada. Mais ou menos o
contrário da situação atual no Brasil.
Temos Executivo, Legislativo, Judiciário?
Cabem ponderáveis, desoladoras dúvidas. Um juiz da província, um
punhado de delegados de polícia e de promotores assumem tranquilamente o
poder diante da indiferença governista e do comando da PF, enquanto um presidente da Câmara inequivocamente corrupto até hoje comanda a manobra golpista do impeachment de
Dilma Rousseff, legítima presidenta. Está claro, porém, que ela
somente, na qualidade de primeira mandatária, tem autoridade para
reverter a rota, já a trafegar em pleno desastre.
O tempo que lhe sobra para agir é
escasso, é bom sublinhar. O começo da ação tem de se dar antes do início
do ano brasileiro, ou seja, depois do Carnaval, conforme nossa grotesca
tradição. Caberia a Dilma partir de imediato para o mesmo gênero de
investimento público que em 1933 colocou Roosevelt no caminho certo para
estancar os efeitos do craque de 1929.
Ao se mover com esse
norte, a presidenta teria de enfrentar as iras do chamado mercado, o
onipresente Moloch, espantalho do tempo e do mundo, onde, debaixo da sua
hegemonia, pouco mais de 270 famílias detêm o equivalente a 50% da
riqueza do resto da humanidade. Para decisões de tal porte, de tamanha
ousadia, exigem-se coragem, bravura, desassombro além dos limites. A
questão é saber se o governo tem estatura para chegar a tanto.
Por ora, é doloroso constatar que o
Executivo se deixa acuar, em primeiro lugar pela mídia e por quem esta
apoia e protege. Está provado que toda tentativa de mediar, compor,
conciliar, fracassou. Há tempo o governo exibe uma assustadora
incapacidade de reação, a beirar a resignação. A quem mais, senão a
Dilma, compete salvar o País? Creio não exagerar no emprego do verbo.
Pouco importa quanto o FMI propala a
nosso respeito. O próprio Banco Central mostra-se agora mais atento às
pressões do Planalto do que às do Fundo (leia, logo abaixo, as observações de Luiz Gonzaga Belluzzo).
O Brasil dispõe de recursos, a despeito do abandono a que foi relegada a
indústria, maiores de quanto supõe a feroz filosofia oposicionista. Por
exemplo, a chance de produzir petróleo a 8 dólares por barril, como se
lê na reportagem de capa desta edição.
A tarefa que o destino atribui à
presidenta é grandiosa e empolgante e lhe garantiria um lugar decisivo
na nossa história. Os cidadãos de boa vontade, abertos a um diálogo
centrado nos interesses nacionais, hão de esperar que Dilma encontre a
força interior para agir.
Em luta contra o Monstro
Nos últimos meses, alguns membros
do Copom assopraram um aumento de 50 pontos na já alentada taxa Selic.
Às vésperas da reunião do dito Conselho, escudado nas previsões do FMI
sobre o PIB brasileiro, o presidente Tombini deu sinais de moderação. Na
quarta-feira 20, o Copom manteve a Selic em 14,25%.
A franquia local dos Mestres do Universo
manifestou seu aborrecimento. Os Senhores da Finança responderam às
trapalhadas de comunicação do dr. Tombini
& cia. com antecipações que preconizam elevações brutais da taxa de
juros para 2016. A curva de juro longa empinou de forma nunca dantes
observada.
Os próximos capítulos da novela “Manda
Quem Pode, Obedece que tem Prejuízo” serão certamente dramáticos. Os
mandões não arrefecem seu apetites travestidos de sabedoria científica.
As taxas de juros de agiota desempenham a
honrosa função de tesouraria das empresas transnacionais sediadas no
País, travestindo o investimento em renda fixa com a fantasia do
investimento direto. Trata-se, na verdade, de arbitragem com taxas de
juros: as subsidiárias agraciadas com os juros do dr. Tombini contraem
dívidas junto às matrizes, aborrecidas com os juros da senhora Janet
Yellen ou do senhor Draghi.
Essa arbitragem altamente rentável e
relativamente segura conta com a participação dos nativos “desanimados”.
Juntos, engordam o extraordinário volume de “operações compromissadas” –
o giro de curtíssimo prazo dos recursos líquidos de empresas e famílias
abastadas.
Aprisionada no rentismo herdado da indexação inflacionária, a grana nervosa “aplaca suas inquietações”, diria lord Keynes, no aluguel diário dos títulos públicos remunerados à taxa Selic.
A eutanásia do empreendedor é perpetrada pelos esculápios
do rentismo. A indústria e a industriosidade vergam ao peso dos juros
elevados, outrora em contubérnio com câmbio sobrevalorizado. A inflação
dos preços administrados e a desvalorização cambial sustentam a
indexação. O espectro do passado assombra o futuro. A irreversibilidade
do tempo histórico aflige os que acreditam num futuro sem passado.
A economia global governada pela finança é um monstrum vel prodigium, fruto do cruzamento da mula sem cabeça com o bicho-preguiça.
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