segunda-feira, 4 de maio de 2015

Para que(m) serve a terceirização?



O PL 4330 serve aos setores da direita, comprometidos com a retomada das taxas de lucros, com a queda da renda e valorização do trabalho.
04/05/2015
Por Juliane Furno*
Em abril de 2008, o movimento Levante Popular da Juventude escreveu a seguinte indagação na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul: “Para que(m) serve o teu conhecimento?”. A pergunta incomodou imensamente uma parcela dos estudantes e da sociedade, que se nega a questionar o que está como pano de fundo das grandes questões nacionais. 
Desde aquele momento, a indagação parece ter sintetizado a necessidade de atribuir “nome aos bois”. Com isso, inaugura-se uma onda de contestações de “para que” e “quais” são os segmentos que se beneficiam a partir das nossas ações ou da omissão delas.
Mais uma vez, faço uso desse questionamento, a fim de problematizar quais são os principais beneficiados e a que lógicas respondem a terceirização e seu correlato projeto de ampliação irrestrita, o Projeto de Lei 4330 (PL das Terceirizações). 
Em uma perspectiva histórica, os anos 1970 são palco de um movimento denominado 3ª Revolução Industrial e Tecnológica, a qual suprime o modelo fordista e inaugura a acumulação produtiva, mediante ao que se denominou toyotistmo-flexível. 
Para retomar as taxas de lucro do grande capital nesse período de crise dos Estados de bem-estar social nos países de capitalismo central, instaura-se uma ofensiva conservadora que busca reestabelecer os patamares de acumulação através da flexibilização das relações de trabalho. O neoliberalismo foi a ideologia e o modelo de desenvolvimento que melhor deu conta desse recado. 
No Brasil, a flexibilização das relações trabalhistas ganha enormes proporções nos anos 1990. A principal forma de burlar a legislação trabalhista e instituir uma lógica de precarização foi a utilização do trabalho terceirizado, que significa a existência de uma relação contratual entre a empresa e o trabalhador, intermediada por uma outra empresa sobreposta, que aufere seus lucros da venda da força-de-trabalho de outro. O professor da Unicamp, Ricardo Antunes, denomina esse processo de “subsunção real do trabalho ao capital”.
Segundo dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), de 2007, as empresas optam por terceirizar por, fundamentalmente, três razões prioritárias. 
A primeira delas seria a redução dos custos e o melhor controle de desempenho e qualidade. Uma segunda razão insere-se no objetivo de enfraquecer a organização dos trabalhadores, mediante a sua pulverização em atividades dispersas na empresa, o que dificultaria suas capacidades de mobilização e demais ações coletivas. E, por último, a terceirização é utilizada com o intuito de burlar as conquistas sindicais, de forma a fragmentar a organização e a representação coletiva dos trabalhadores. 
Assim, fica visível que o principal motivador da terceirização por parte das empresas representa uma movimentação que vai contra os interesses e conquistas históricas da classe trabalhadora. 
Além disso, fica nítido que o argumento da maior produtividade e especialização de uma empresa terceira é falacioso, uma vez que a preocupação com a qualidade da produção não aparece nos objetivos principais.
Embora tenha sido feita em uma conjuntura econômica favorável aos trabalhadores – com a valorização real dos salários mínimos, políticas sociais e queda nos índices históricos de desemprego –, a aprovação na Câmara dos Deputados do PL 4330 parece representar uma nova ofensiva dos setores ligados ao grande capital. Esses grupos representam o que há de mais retrógrado e conservador (supostamente com roupagem moderna), que é a flexibilização de relações de trabalho que já foram firmadas, sob muita luta, pelos trabalhadores. 
Dessa forma, termino essa breve reflexão voltando à pergunta motivadora. Para que(m) serve a terceirização? 
Trocando em miúdos: para os setores da direita, comprometidos com a retomada das taxas de lucros, com a queda da renda e valorização do trabalho e com um modelo de desenvolvimento não mais assentado na valorização do trabalho e do trabalhador. 
Em síntese, serve a uma parcela da burguesia interna perfeitamente associada com o capitalismo dependente e imperialista. Em última instância, não serve aos trabalhadores e, sobretudo, àqueles que querem a transformação da sociedade e caminham no rumo das mudanças à esquerda.
*Por Juliane Furno é mestranda em Desenvolvimento Econômico na Unicamp.

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