Maior pressão ambiental sobre a Baía de Guanabara
Reprodução
Pesquisador Sebastião Raulino fala sobre o futuro do
ecossistema; Pescadores artesanais, marisqueiros e catadores de
caranguejos são alguns dos grupos mais atingidos
02/05/2015
Por Rogério Daflon
Do Rio de Janeiro (RJ)
Professor
de biologia Sebastião Raulino é um dos membros mais atuantes do Fórum
dos Atingidos pela Indústria de Petróleo e Petroquímica das Cercanias da
Baía de Guanabara. Raulino aponta, nesta entrevista, sua preocupação
quanto ao futuro da Baía. O professor fez alertas fundamentais sobre o
nosso mais belo e desrespeitado tesouro ambiental, lugar de vida e
memórias de populações que somadas são mais de 10 milhões de pessoas.
Qual é o quadro social da Baía de Guanabara hoje?
Sebastião Raulino -
A Baía é um corpo hídrico que une diversos municípios do Rio de
Janeiro. Nela, há praias, restingas, costões rochosos, muitos
manguezais, Mata Atlântica, enfim, uma grande diversidade de
ecossistemas. Esse cenário vem se degradando, especialmente, a partir da
segunda metade do século XX, com a industrialização da região,
sobretudo com a indústria do petróleo, petroquímica e química. A
industrialização atraiu milhares de trabalhadores desde então. Assim,
devido à falta de investimento em infraestrutura urbana para receber
essa população migrante, surgiram loteamentos precários, sem água, sem
esgoto e com coleta de lixo precária. Tudo isso transformou a Baía num
grande receptor de esgotos domésticos sem tratamento e de efluentes
industriais.
E o que isso causou?
Ao
longo do tempo, nós percebemos a diminuição da qualidade dos rios que
deságuam na Baía de Guanabara, causando sua degradação, o que veio a
afetar progressivamente a qualidade da água da própria Baía e,
consequentemente, da fauna e flora. Manguezais, praias, lagoas foram
sendo paulatinamente destruídos. Acompanhando esse processo, assistimos
um quadro desolador criado em relação às populações tradicionais da Baía
de Guanabara.
Poderia ser mais específico em relação a essas populações?
Pescadores
artesanais, marisqueiros e catadores de caranguejos são alguns dos
grupos mais atingidos. Esses grupos que, historicamente, subsistem a
partir da Baía se viram frequentemente ameaçados e impedidos de exercer
seu trabalho, numa violação de direitos que vem sendo negligenciada pelo
poder público. Esses grupos vêm decrescendo ano a ano frente ao cenário
de violações que vivem. Vale ressaltar que a perda desses grupos
significa a perda de um modo de vida secular e conhecimentos próprios em
relação à própria Baía de Guanabara. Significa também a perda de
sustento de várias famílias e o agravamento de problemas sociais na
região. Repercute também no distanciamento que o modo de vida de nossa
sociedade gera em relação à natureza, mesmo num cenário natural tão rico
como o Rio de Janeiro e a Baía de Guanabara.
O senhor poderia destacar a indústria do petróleo e petroquímica nesse processo de degradação?
Nesse
processo, a inauguração da Refinaria Duque de Caxias (REDUC) em 1961 e o
polo petroquímico que se formou ao seu redor são marcos mais
importantes. O vazamento de óleo de 2000, que despejou mais de um milhão
de litros na Baía de Guanabara, também merece ser lembrado, dado ao
cenário de degradação e perda de produção pesqueira que se observou a
partir desse episódio. A intensificação do modelo petróleodependente no
estado do Rio de Janeiro, com o anúncio do pré-sal e a implantação do
Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) prenuncia um cenário
de maior pressão ambiental sobre a Baía de Guanabara, retirando da
população a sua possibilidade de escolha sobre qual Baía de Guanabara
deseja. A sociedade precisa escolher se quer uma Baía transformada em
planta fabril, ocupada por oleodutos, gasodutos, terminais de gás,
portos e uma sobrecarga de navios ligados à cadeia de petróleo ancorada
em seu espelho d'água ou se deseja uma Baía de Guanabara despoluída, com
paisagens que sempre foram símbolos do país, onde diferentes formas de
uso sustentável possam conviver nesse espelho d'água.
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