Justiça
Operação Zelotes não sensibiliza Justiça e mídia, diz procurador
por André Barrocal
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publicado
13/05/2015 16h07
Para Frederico Paiva, isso ocorre quando poder econômico é atingido. Juiz do caso é acionado em corregedoria
Luis Macedo / Câmara dos Deputados
O procurador Frederico de Carvalho Paiva durante audiência pública na Câmara, nesta quarta-feira 13
O Ministério Público
(MP) entrou com uma representação na Corregedoria do Tribunal Regional
Federal (TRF) da Primeira Região, sediado em Brasília, contra o juiz
responsável pela Operação Zelotes, que investiga um bilionário esquema de anulação de dívidas tributárias de grandes empresas.
Para o MP, o juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara Federal de Brasília, tem
um histórico de segurar processos por muito tempo e sem justificativas
razoáveis, um comportamento que chama a atenção e deveria ser examinado
de perto.
Para procuradores de Justiça e policiais federais da
Operação Zelotes, Leite tomou uma série de decisões que atrapalharam as
investigações. Entre outras coisas, ele negou a prisão temporária de 26 suspeitos de integrar o esquema,
rejeitou o pedido de bloqueio de bens de certos investigados e
recusa-se a quebrar o sigilo do processo. As prisões solicitadas,
segundo os investigadores, eram necessárias para tomar depoimentos sem
que houvesse a oportunidade de os suspeitos combinarem suas versões
entre si, algo que agora já não se pode mais impedir.
O principal procurador da República na Operação
Zelotes, Frederico Paiva, acredita que o caso até agora não entusiasmou
nem o Poder Judiciário nem a mídia – ao contrário do que aconteceu com a
Operação Lava Jato. Isso dificultaria as investigações, já que estão na
mira grandes e poderosas empresas. “É preciso que a corrupção seja combatida por todos. Os valores [da Zelotes] são estratosféricos”. Suspeita-se de um desvio de até 19 bilhões de reais dos cofres públicos.
Para o procurador, os escândalos de corrupção no
Brasil só despertam interesse quando há políticos no meio. “Quando
atingem o poder econômico, não há a mesma sensibilidade.” Em entrevista
recente à TV Gazeta de São Paulo, o ex-governador
paulista Claudio Lembo disse que “o que aconteceu no Carf [o Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais] é gravíssimo, mas a imprensa não
fala”. “Lá está o núcleo da minoria
branca fazendo corrupção efetiva”, disse. “Há um conluio nacional de
preservação de quem está dentro do Carf.”
Ricardo Leite deverá ser acionado também no Conselho
Nacional de Justiça (CNJ). O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) prepara uma
representação de teor parecido com a do Ministério Público. Segundo ele,
Leite é responsável por processos antigos contra personagens da Zelotes
que jamais foram sequer chamados a depor. “Este juiz atrapalha o
combate à corrupção e ao crime do colarinho branco no Brasil”, afirmou
Pimenta.
Apesar das dificuldades, Frederico Paiva disse que o
Ministério Público apresentará à Justiça, entre junho e julho, denúncias
por corrupção e lavagem de dinheiro contra investigados na Zelotes.
Deflagrada em março, a Operação desbaratou um esquema
de fraude que desfalcava os cofres públicos no Carf. O conselho é um
órgão do Ministério da Fazenda em que, sem passar pela Justiça, os
contribuintes podem contestar tributos cobrados pela Receita Federal. É
formado por 216 conselheiros, metade indicada pela Fazenda e metade
pelos contribuintes. As indicações privadas partiam basicamente das três
confederações nacionais patronais: CNI (indústria), CNC (comércio) e
CNA (agricultura).
O esquema era “sofisticado”, segundo explicou
Paiva durante audiência pública na Câmara dos Deputados nesta
quarta-feira 13. Havia conselheiros dispostos a manipular julgamentos e
empresas de fachada a fazer a intermediação deles com contribuintes
interessados em fugir da taxação da Receita. Os contatos entre os
integrantes do esquema raramente eram feitos por telefone, uma forma de
evitar deixar rastros. O pagamento da propina pelas grandes empresas aos
conselheiros e intermediários ocorria por meio de um emaranhado de
contas bancárias, outra forma de tentar não deixar pistas.
Entre as empresas suspeitas de integrarem o
esquema de desfalque do Erário estão Santander, Bradesco, Opportunity,
RBS (afiliada da Rede Globo), Camargo Correa, Safra, Gerdau, entre
outros.
Atualmente, os investigadores estão passando um
pente-fino em 74 processos do Carf. São casos de 2005 a 2013. Juntos,
somam 19 bilhões que podem ter sido sonegados. Segundo Paiva, há
indícios mais veementes de irregularidades em processos a somar 5
bilhões de reais e envolver de 15 a 20 empresas. De acordo com ele,
todos os processos suspeitos envolvem grandes empresas.
Logo após a Operação Zelotes, o governo resolveu
remodelar o Carf, um trabalho ainda em andamento. Uma das mudanças já
definidas foi a instituição de gratificação para os conselheiros. Eles
trabalhavam de graça, circunstância que poderia deixá-los mais
inclinados a se corromper.
A gratificação foi instituída por um decreto de Dilma
Rousseff. O deputado Bruno Covas (PSDB-SP) apresentou um decreto
legislativo na Câmara a propor a anulação do decreto de Dilma, sob a
justificativa de que o governo está em tempos de ajuste fiscal e não
deveria criar gastos novos. “O modelo atual do Carf é propício à
corrupção e ao tráfico de influência”, afirmou Paiva.
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