domingo, 24 de maio de 2015

Entrevista - Ivo Herzog

"O PSDB aceitou Telhada por votos?"

por Wanderley Preite Sobrinho — publicado 20/05/2015 02h23, última modificação 20/05/2015 22h18
Para o ativista, filho de Vladimir Herzog, o PSDB tem de decidir se quer defender as ideias do ex-coronel da Rota indicado para a Comissão de Direitos Humanos
Marcelo Camargo/ABr
Ivo Herzog
Ivo Herzog segura o novo atestado de óbito do pai indicando as verdadeiras causas de sua morte; à direita, a viúva, Clarice Herzog
Em descrédito, o sistema político brasileiro vem criando o ambiente perfeito para o conservadorismo avançar sem poupar os partidos, que, em troca de votos, rasgam sua história. Essas são algumas conclusões de Ivo Herzog, filho do jornalista e dramaturgo Vladimir Herzog, torturado e morto em 1975 pelo regime militar em São Paulo
Em entrevista a CartaCapital, o diretor do Instituto Vladimir Herzog acredita que a “desilusão" com a política criou as condições para que o PSDB indicasse o ex-policial da Rota e deputado estadual Coronel Telhada para a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo. “Ele está no partido porque atrai votos? Como representante do partido, o Telhada fala pelo partido. São essas ideias que o PSDB quer defender?”, questiona.
Leia a entrevista completa:
CartaCapital: Qual é a sua opinião sobre a indicação do Coronel Telhada para compor a Comissão de Direitos Humanos da Alesp?
Ivo Herzog: Eu acho extremamente inoportuna. Essa comissão tem de liderar debates sobre direitos humanos, e o primeiro deles é o direito à vida. É complicado ter uma comissão desse tipo ocupada por uma pessoa que não tem apreço pela vida e se vangloria dos bandidos que já matou. A Rota é a instituição policial mais violenta do País e a Polícia Militar brasileira é a mais violenta do mundo.
Vladimir Herzog
O jornalista Vladimir Herzog
CC: Qual a sua avaliação sobre políticos que pregam o combate à violência com mais violência?
IH: Tem pessoas que se aproveitam de um discurso populista a partir de fatos com apelo emocional junto à população. A redução da maioridade penal, por exemplo, terá o efeito de aumentar a violência urbana. E só uma ação ineficaz, mas com apelo. A trajetória do Coronel Telhada é marcada por acreditar que a solução para a violência se dá através de caminhos de intolerância.
CC: Em que medida essa indicação fere a memória de perseguidos pela ditadura, como foi o seu pai, o jornalista Vladmir Herzog?
IH: Várias pessoas ligadas ao PSDB lutaram pela democratização, pela anistia, defenderam Vladimir Herzog e foram exilados. Essa indicação vai na contramão desses fatos.
CC: O conservadorismo cresce entre os partidos?
IH: Essa questão de ideologia partidária vem se enfraquecendo ao longo do tempo, mas tem limite. O Telhada como membro do PSDB já é um contrassenso injustificável. Ele está no partido porque atrai votos? É por isso que está no PSDB? Então pode-se ter qualquer associado? O passado não tem nenhuma importância? Como representante do partido, o Telhada fala pelo partido. São essas ideias que o PSDB quer defender? As do Coronel Telhada? O partido tem de responder à população.
CC: Os legislativos estão especialmente conservadores atualmente. O senhor esperava que isso acontecesse no Brasil apenas 30 anos após a redemocratização?
IH: Não esperava. Eu acho que a razão é o modelo político brasileiro, as regras eleitorais. Vale qualquer coisa para conseguir bancada. É preciso mudar o modelo eleitoral para que ele se aproxime da população.
CC: A Lei da Anistia, que perdoou agentes da ditadura, impediu que a população fosse educada sobre o que aconteceu no passado?
IH: A lei tem a ver com impunidade contra agentes do Estado. Ela explica por que temos uma polícia violenta.
CC: A escola falhou ao ensinar sobre a ditadura no Brasil?
IH: Existe uma questão de desconhecimento da nossa história. Mas também existe uma grande desilusão com o sistema político, e aí existem grupos que estão ocupando esse espaço.
CC: E esses pedidos de intervenção militar, te assustaram?
IH: É uma bobagem. Não dou bola para isso. Primeiro porque temos espaço para nos manifestarmos, o que é importante em uma democracia. Depois, esses eventos acabam gerando uma reflexão sobre nossa própria história. Uma conscientização que fortalece os princípios democráticos.
CC: A presidenta Dilma Rousseff não está muito calada em relação à ascensão conservadora?
IH: Esse não é o papel dela. Na verdade, acho que ela deu um passo importante com a Lei de Acesso à Informação, a Comissão da Verdade. Ela deu passos importantes para que a população tenha mais conhecimento sobre a nossa história.

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