Meio
Ambiente
26.01.2015
[ Brasil ]
Pesquisa
inédita no Semiárido aponta como famílias agricultoras enfrentam os impactos
ambientais
Adital
Desde 2013, uma pesquisa vem acompanhando a trajetória de vida
de 100 famílias, distribuídas em 10 territórios dos nove estados do Semiárido
brasileiro. O objetivo é identificar as estratégias ecológicas e sociais
implementadas pelos agricultores e agricultoras que lhes têm possibilitado
resistir e/ou recuperar-se de impactos ambientais extremos, como a
desertificação, as mudanças climáticas e os períodos longos de
estiagem.
Os territórios estudados pela Articulação Semiárido Brasileiro
(ASA) e o Instituto Nacional do Semiárido (Insa/MCTI) são: Sertão do São
Francisco (Estado da Bahia), Ibiapaba (Ceará), Alto Rio Pardo (Minas Gerais),
Cariri/Seridó e Borborema (Paraíba), Sertão do Araripe (Pernambuco), Vale do
Guaribas (Piauí), Sertão do Apodi (Rio Grande do Norte), Alto Sertão (Sergipe) e
Médio Sertão (Alagoas).
Os primeiros resultados da pesquisa pesquisa "Sistemas
Agrícolas Familiares Resilientes a Eventos Ambientais Extremos no Contexto do
Semiárido Brasileiro” apontam que o acesso à área coletiva favorece o pastejo de
200 animais e o extrativismo vegetal de forma sustentável. Mesmo no período da
pior seca dos últimos 50 anos, que assolou a região nos últimos quatro anos, a
família conseguiu manter o mesmo número de animais.
O acesso à terra e ao território também são aspectos
importantes apontados. No agroecossistema do casal João Almeida e Sueli,na
comunidade geraizeira de Vereda Funda, no território do Alto Rio Pardo, em Minas
Gerais, a conquista da terra possibilitou o maior controle e autonomia da
família em relação às fontes de água, ao trabalho de recuperação ambiental,
reaparecimento de nascentes e fortalecimento da prática agroextrativista, por
meio da coleta de frutos nativos e plantas medicinais numa área coletiva do
assentamento.
Durante o seminário se apresentação dos resultados da pesquisa,
realizado na semana passada, foram apresentadas informações referentes a quatro
propriedades, entre elas, a do casal Maria do Socorro e Júlio Rodrigues, da
comunidade Jaquinicó, no município de Curaçá, no território do São Francisco
(Bahia). Na propriedade de 15 hectares, a família desenvolve diversos
subsistemas agrícolas, como o roçado, o plantio de hortaliças e a criação de
galinhas. Além disso, criam animais (caprino e bovino) soltos na Caatinga e
praticam o extrativismo numa área coletiva de 3000 hectares. Essa prática é
conhecida tradicionalmente como fundo de pasto.
Antônia Iva Ferreira, uma das bolsistas do Projeto, acompanha a
pesquisa com o casal de agricultores, dona Maria Aparecida e seu Claudionor, no
povoado Sítio Verde, município de Porto da Folha, Estado de Sergipe. Ela observa
que a participação de dona Maria Aparecida na Associação de Mulheres Resgatando
sua História, que promove formação, intercâmbio e partilha de experiências,
permitiu o acesso a informações e conhecimentos que possibilitou inovações no
sistema agroecológico. Dentre as alternativas adotadas pelo casal em um pequeno
espaço de terra (0,3 hectare), está a organização de um quintal diversificado,
onde possui frutas, hortaliças, criação de aves, abelhas e produção energética,
que contribuíram para aumentar a resiliência de seu sistema produtivo.
De acordo com Paulo Petersen, da AS-PTA, uma das entidades que
coordena a pesquisa, a resiliência não pode ser analisada por um ou dois
indicadores, e sim pela interação de vários fatores ecológicos e sociais
articulados num sistema. "Você não explica a resiliência só pelo solo, só pela
vegetação, pelo tamanho da terra, pela participação da mulher, mas tudo isso em
conjunto. Essa é a grande complexidade e dificuldade de fazer esse tipo de
pesquisa”, avalia.
A Pesquisa
A pesquisa busca a sistematização de práticas acumuladas pelos
agricultores e agricultoras e o mapeamento das estratégias adotadas para a
convivência com o semiárido. O projeto utiliza a metodologia de pesquisa
participativa, incentivando que os próprios atores realizem as avaliações de
resiliência dos agroecossistemas. É uma experiência de pesquisa inédita que
reúne uma rede formada por organizações sociais, um centro de pesquisa em
ciência, tecnologia e inovação para o Semiárido brasileiro e os próprios
agricultores experimentadores. Deste modo, inaugura na região uma estratégia sem
precedentes de mapear, construir e aperfeiçoar conhecimentos, visando subsidiar
a formulação de políticas públicas.
Paulo Petersen destaca a pesquisa como um processo de
construção do conhecimento que envolve diversas entidades da agricultura
familiar, e o desafio de que os resultados levantados possam influenciar as
politicas públicas. "Nosso desafio é entender as estratégias das famílias e
tirar ensinamentos que possam inspirar a formulação de políticas que sejam
sensíveis ao que as experiências estão dizendo”, conclui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário