Política
O choque de realidade do PSOL
Clécio Luís,
primeiro prefeito do partido em uma capital, equilibra-se entre o programa do
partido e a realpolitik
ABr
De Macapá
"Dá uma voadora no prefeito!”, gritava um mototaxista em
frente à prefeitura de Macapá na quinta-feira 15. Seus colegas seguiram a ordem
e esbofetearam um boneco de Clécio Luís, primeiro mandatário do PSOL em uma
capital. Pendurado em uma árvore, o boneco foi inundado com gasolina e, após
três tentativas frustradas, finalmente incinerado. Cerca de 200 condutores
trancavam a avenida em frente à sede da prefeitura e pediam mais fiscalização da
atividade ilegal.
No prédio ao lado, na Câmara de Vereadores, cerca de
cem professores tentavam barrar um projeto enviado pela prefeitura. Os
vereadores aprovaram um aumento abaixo do esperado por parte dos docentes. Uma
placa na qual se lia “Clécio traidor” referia-se ao passado do prefeito,
professor de geografia e sindicalista. “Eu apoiei ele, gravei até vídeo, mas
graças a Deus não foi ao ar. Ele estava na luta com a gente, como não confiar
numa pessoa dessas?”, perguntou, decepcionada, a educadora da rede municipal
Nádia Serique.
No dia seguinte, em seu gabinete, Clécio se
mostrava tranquilo. Segundo ele, as manifestações integram o cenário da cidade.
“Macapá experimenta uma sensação de ebulição política há tempos. Com a
proximidade das eleições, e com tudo que tem acontecido no Amapá, isso tem se
tornado mais frequente.”
Apesar dos protestos, o projeto contava com o apoio
do sindicato local e foi aprovado com apenas três votos contrários entre os 23
vereadores. Confrontado pela primeira vez com as restrições impostas pela
governabilidade, o PSOL precisou dos votos de partidos como o PR, Pros e PSB,
além daquele do único vereador do PT na cidade.
A vitória fácil na Câmara, diz o prefeito, não
significa que haja fisiologismo ou acordos escusos. “O principal fator é a
pressão popular. O outro é a realidade amapaense. Alguém do PSOL dificilmente
cruza com o seu opositor do DEM nos lugares onde vai em um estado como São
Paulo. Aqui, a gente cruza com todo mundo no boteco, no supermercado, na
quermesse.”
Um dos vereadores a votar contra o projeto da prefeitura foi Lucas Barreto (PSD), aliado
do senador José Sarney (PMDB-AP). O parlamentar apoiou o atual prefeito na
última eleição. “O Clécio criou uma expectativa de pouco prazo que ele não
conseguiu cumprir. Ele é equilibrado, preparado para ser prefeito. Mas vejo que
ele está tendo muitos problemas na gestão.”
A administração de Macapá deve ser uma das vitrines
do PSOL nesta eleição, dada a origem política amapaense do seu candidato à
Presidência, o senador Randolfe Rodrigues. Desde a posse na prefeitura, a
principal atividade de Clécio Luís tem sido colocar as finanças em ordem depois
da gestão de Roberto Góes (PDT), preso na Operação Mãos Limpas da Polícia
Federal ainda durante o exercício do mandato.
Reorganizar o Orçamento permitirá à cidade receber
repasses do governo federal, principal fonte de renda do exíguo Orçamento de
Macapá. Parte da receita é oriunda da terceira fase do PAC, esperança para
melhorar o saneamento em um município onde o esgoto só chega a 6% da população.
O Programa Mais Médicos também é elogiado pelo prefeito, para quem os cubanos
“têm mudado a cara da cidade”. Clécio Luís ainda pretende entregar 3.460
habitações pelo Minha Casa Minha Vida. “O programa é do governo federal, é da
Dilma, mas eu fiz festa aqui. Para cidades como Macapá, é um programa muito
bom.”
A maior controvérsia em relação ao programa
socialista na cidade é a efetivação de uma Parceria Público-Privada. A regulação
das parcerias entre empresas e o poder público foi feita pelo ex-presidente Lula
em 2004, sob críticas dos petistas que mais tarde formariam o PSOL. Em 2012,
Clécio Luís entregou à iniciativa privada o mapeamento da cidade para
regularização fundiária. “É um negócio que levaríamos muitos anos para fazer,
não teríamos recursos próprios. Eu sou muito acusado por causa disso, mas acho
que vale a pena.”
O prefeito rejeita, porém, a comparação entre a sua
PPP e as privatizações, e critica o leilão do pré-sal dos campos de Libra,
realizado no ano passado pelo governo federal. “O petróleo é um patrimônio, ali
você tem um ativo, é um setor estratégico. Uma coisa é entregar esse patrimônio
para a iniciativa privada, outra coisa é fazer uma PPP e dar um porcentual para
alguém oferecer um serviço que a prefeitura não conseguiria.”
Embora elogie
os programas federais, o prefeito diz que sua
administração se diferencia daquelas do PT. Seu principal argumento é o
orçamento participativo, que ali ganhou o nome de Congresso do Povo. “É a
experiência que o PT teve em prefeituras como Belém e Porto Alegre, mas
melhorada. Fizemos um amplo processo de mobilização e nivelamento de informação.
O que é a prefeitura? Qual é o seu papel? Como funciona o orçamento? Basicão, o
bê-á-bá. O resultado foi extraordinário.”
O caminho do PSOL, vislumbra, está em seguir as
bandeiras históricas esquecidas pelos petistas. “Não fui para o PSOL negar a
minha história, jogar no lixo a minha militância no PT ou construir o PSTU do
B”, compara. “O melhor slogan do PT era: ‘Combater a corrupção e melhorar a vida
do povo’. Então, o que nós vamos fazer de diferente é não seguir o caminho que o
PT seguiu depois.” Por ora, o sindicalista se equilibra entre os sonhos sem
peias da militância e as limitações da realpolitik.
Nenhum comentário:
Postar um comentário