Calou-se uma voz dos
oprimidos
por Pedro
tierra
Calou-se a voz de Tomás Balduíno,
nessa noite de 2 de maio.
Uma voz que nunca quiz ser sozinha,
sabia, desde os anos de chumbo:
uma voz solitária não suspende a manhã.
Quiz ser uma voz entre vozes,
ergueu sua voz dentro do vasto coro dos
oprimidos:
os índios, os posseiros, os
lavradores,
os retirantes da seca e da cerca
e os que se levantam contra
elas,
as mulheres, os negros, os migrantes, os
peregrinos
para forçar claridades, para ensinar
amanhecer.
Tomás é palavra.
A palavra que banha como bálsamo.
A palavra que fustiga.
Incendeia.
A palavra que perdoa
mas aponta - sempre - o caminho da
Justiça.
E o que somos na vida?
Somos os ossos das palavras
que povoam o caminho de pedra ou flores
que sangram os pés dos nossos filhos.
Tomás é sertão.
O sertão e suas armadilhas.
O sertão e suas infinitas contradições.
Tomás é sertão
onde se dobram os ventos de Goiás e Minas,
onde nascem águas
nessa infinita geografia
que alimenta nossas
esperanças.
Calou-se a voz de Tomás Balduíno.
Permanecerá sua palavra.
Tomás é sertão:
gesto de fé nessa gente que não se
dobra.
Brasilia,Manhã de 3 de maio
2014, como um quadro de Goya.
NOTA DE
FALECIMENTO
Dom Tomás Balduino, fundador
da CPT, fez a sua páscoa
“Para tudo há
uma ocasião certa;
há um tempo certo para cada propósito
debaixo do céu: Tempo de nascer e tempo de morrer,
tempo de plantar
e tempo de arrancar o que se plantou...
há um tempo certo para cada propósito
debaixo do céu: Tempo de nascer e tempo de morrer,
tempo de plantar
e tempo de arrancar o que se plantou...
tempo de lutar e tempo de
viver em paz”.
(Eclesiastes
3:1-8)
É com grande pesar e muita
tristeza que a Comissão Pastoral da Terra (CPT) comunica a todos e todas o
falecimento de Dom Tomás Balduino. Fundador da CPT, bispo emérito da cidade de
Goiás e frade dominicano, Dom Tomás lutou por toda sua vida pela defesa dos
direitos dos pobres da terra, dos indígenas, das demais comunidades
tradicionais, e por justiça social. Nem mesmo com a saúde debilitada e internado
no hospital ele deixava de se preocupar com a questão da terra e pedia, em
conversas, para saber o que estava acontecendo no mundo.
Aos 91 anos, completados em
dezembro passado, Dom Tomás Balduino, o bispo da reforma agrária e dos
indígenas, nos deixa seu exemplo de luta, esperança e crença no Deus dos pobres.
Ficamos, hoje, todos e todas um pouco órfãos, mas seguimos na certeza de quem
Dom Tomás está e estará presente sempre, nos pés que marcham por esse país e nas
bandeiras que tremulam por esse mundo em busca de uma sociedade mais justa e
igualitária.
Dom Tomás faleceu em
decorrência de uma trombo embolia pulmonar, às 23h30 de ontem, 02 de maio de
2014. Ele permaneceu internado entre os dias 14 e 24 de abril último no hospital
Anis Rassi, em Goiânia. Teve alta hospitalar dia 24, e no dia seguinte foi
novamente internado, porém desta vez no Hospital Neurológico, também em
Goiânia.
O
Corpo será velado na Igreja São Judas Tadeu, no Setor Coimbra, em Goiânia, até
às 10 horas do domingo, dia 4 de maio, momento em que será concelebrada a
Eucaristia, e logo em seguida será transladado para a cidade de Goiás (GO), onde
será velado na Catedral da cidade até às 9 horas da segunda-feira, 5 de maio, e
logo em seguida será sepultado na própria Catedral.
Biografia de Dom Tomás
Balduino
Dom Tomás Balduino
nasceu em Posse, Goiás, no dia 31 de dezembro de 1922. Ele é filho de José
Balduino de Sousa Décio, goiano, e de Felicidade de Sousa Ortiz, paulista. Seu
nome de batismo é Paulo, Paulo Balduino de Sousa Décio. Foi o último filho homem
de uma família de onze filhos, três homens e oito mulheres. Ao se tornar
religioso dominicano recebeu o nome de Frei Tomás, como era costume.
Até os cinco anos de
idade viveu em Posse. Depois a família
migrou para Formosa, onde seu pai se tornou promotor público, depois juiz e se
aposentou como tal.
Fez o Seminário Menor –
Escola Apostólica Dominicana – em Juiz de Fora, MG. Fez os estudos secundários
no Colégio Diocesano, dirigido pelos irmãos maristas, em Uberaba. Cursou
filosofia em São Paulo e Teologia em Saint Maximin , na França, onde também fez mestrado em
Teologia.
Em 1950, lecionou
filosofia em Uberaba. Em 1951 foi
transferido para Juiz de Fora como vice-reitor da então Escola Apostólica
Dominicana e lecionou filosofia, na Faculdade de Filosofia da cidade.
Em 1957, foi nomeado
superior da missão dos dominicanos da Prelazia de Conceição do Araguaia, estado
do Pará, onde viveu de perto a realidade indígena e sertaneja. Na época a
Pastoral da Prelazia acompanhava sete grupos indígenas. Para desenvolver um
trabalho mais eficaz junto aos índios, fez mestrado em Antropologia e
Linguística, na UNB, que concluiu em 1965. Estudou e aprendeu a língua dos
índios Xicrin, do grupo Bacajá, e Kayapó.
Para melhor atender a
enorme região da Prelazia que abrangia todo o Vale do Araguaia paraense e parte
do baixo Araguaia mato-grossense, fez o curso de piloto de aviação. Amigos
solidários da Itália o presentearam com um teco-teco com o qual prestou
inestimável serviço, sobretudo no apoio e articulação dos povos indígenas.
Também ajudou a salvar pessoas perseguidas pela Ditadura Militar.
Em 1965, ano em que
terminou o Concílio Ecumênico Vaticano II, foi nomeado Prelado de Conceição do
Araguaia. Lá viveu de maneira determinante e combativa os primeiros conflitos
com as grandes empresas agropecuárias que se estabeleciam na região com os
incentivos fiscais da então SUDAM, e que invadiam áreas indígenas, expulsavam
famílias sertanejas, os posseiros, e traziam trabalhadores braçais de outros
Estados,
sobretudo do nordeste brasileiro, que eram submetidos, muitas vezes, a regimes
análogos ao trabalho escravo.
Em 1967, foi nomeado
bispo diocesano da Cidade de Goiás. Nesse mesmo ano foi ordenado bispo e assumiu
o pastoreio da Diocese, onde permaneceu durante 31 anos, até 1999 quando, ao
completar 75 anos, apresentou sua renúncia e mudou-se para Goiânia. Seu
ministério episcopal coincidiu, a maior parte do tempo, com a Ditadura Militar
(1964-1985).
Dom Tomás, junto à
Diocese de Goiás, procurou adequar a Diocese ao novo espírito do Concílio
Ecumênico Vaticano II e de Medellín (1968). Por isso sua atuação, ao lado dos
pobres, no espírito da opção pelos pobres, marcou profundamente a Diocese e seu
povo. Lavradores se reuniam no Centro de Treinamento onde Dom Tomás morava, para
definir suas formas de organização e suas estratégias de luta. Esta atuação
provocou a ira do governo militar e dos latifundiários que perseguiram e
assassinaram algumas lideranças dos trabalhadores. Em julho de 1976, Dom Tomás
foi ao sepultamento do Padre Rodolfo Lunkenbein e do índio Simão Bororo,
assassinados pelos jagunços, na aldeia de Merure, Mato Grosso. Em sua agenda
estava programada uma outra atividade. Soube depois, por um jornalista, que
durante esta atividade programada, estava sendo preparada uma emboscada para
eliminá-lo.
Alguns movimentos
nacionais como o Movimento do Custo de Vida, a Campanha Nacional pela Reforma
Agrária, encontraram apoio e guarida de Dom Tomás e nasceram na Diocese de
Goiás.
Dom Tomás foi personagem
fundamental no processo de criação do Conselho Indigenista Missionário (CIMI),
em 1972, e da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 1975. Nas duas instituições
Dom Tomás sempre teve atuação destacada, tendo sido presidente do CIMI, de
1980 a 1984 e presidente da CPT de
1999 a 2005. A Assembleia Geral da CPT, em 2005, o nomeou
Conselheiro Permanente.
Depois de deixar a
Diocese, além de ser presidente da CPT, desenvolveu uma extensa e longa pauta de
conferências e palestras em Seminários, Simpósios e Congressos, tanto no Brasil
quanto no exterior. Por sua atuação firme e corajosa recebeu diversas
condecorações e homenagens Brasil afora. Em 2002,
a Assembleia Legislativa do Estado de Goiás lhe concedeu a
medalha do Mérito Legislativo Pedro Ludovico Teixeira. No mesmo ano recebeu o
Título de Cidadão Goianiense, outorgado pela Câmara Municipal de Goiânia.
Foi designado, em 2003,
membro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, CDES, do
Governo Federal, cargo que deixou por sentir que pouco ou nada contribuía para
as mudanças almejadas pela nação brasileira. Foi também nomeado membro do
Conselho Nacional de Educação.
No dia 8 de novembro de
2006, Dom Tomás recebeu da Universidade Católica de Goiás (UCG) o título de
Doutor Honoris Causa, devido ao comprometimento de Dom Tomás com a luta pelo
povo pobre de Deus.
No dia 18 de abril de
2008 recebeu em Oklahoma City (EUA), da
Oklahoma City National Memorial Foudation, o prêmio Reflections of Hope. A
organização considerou que as ações de Dom Tomás são exemplos de esperança na
solução das causas que levam a miséria de tantas pessoas em todo o mundo. A
premiação Reflections of Hope foi criada em 2005 para lembrar o 10º aniversário
do atentado terrorista de Oklahoma – quando um caminhão-bomba explodiu em frente
a um edifício, matando 168 pessoas – e para homenagear aqueles que representam a
esperança em meio à tragédia e dedicam suas vidas para melhorar a vida do
próximo.
De 22 até 29 de
março 2009 foi em Roma para participar das palestras em homenagem de Dom Oscar
Romero e dos 29 anos do seu assassinato.
Em 2012 a Universidade
Federal de Goiás (UFG) também lhe outorgou o título de Doutor Honoris Causa. Em
dezembro do mesmo ano, durante as comemorações dos seus 90 anos, a CPT
homenageou-o dando o seu nome ao Setor de Documentação da Secretaria Nacional,
que passou a se chamar “Centro de Documentação Dom Tomás Balduino”.
Maiores
informações:
Assessoria de
Comunicação CPT Nacional – Cristiane Passos (62) 4008-6406 / (62) 8111-2890 /
(62) 9268-6837
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