segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

CARTÃO CORPORATIVO DE BOLSONARO EVENTOS COM PASTORES E GASTOS EM MARCHAS PARA JESUS.

 Cartão corporativo de Bolsonaro bancou eventos com pastores e gastos em Marchas para Jesus
27ª edição da Marcha para Jesus 2019 - Isac Nóbrega/PR
Mais de R$ 28 mil reais foram gastos em uma única lanchonete, durante evento gospel com participação de Bolsonaro, em SP

20 de janeiro de 2023
15:10
Mariama Correia
 ESPECIAL: CAIXA-PRETA DO BOLSONARO
Quase R$ 80 mil foram gastos no dia da Marcha para Jesus em SP
Padaria recebeu R$ 18 mil por 712 lanches, em dia de encontro com pastores
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O cartão corporativo de pagamentos da presidência bancou encontros do ex-presidente Jair Bolsonaro com pastores e a participação dele em eventos para o segmento evangélico, como a Marcha para Jesus. Durante os quatro anos de governo, pelo menos R$ 181 mil reais foram gastos com hospedagens, fornecimento de alimentação, combustíveis e locação de bens e equipamentos, nos mesmos locais e datas das agendas religiosas do ex-presidente. Os dados foram obtidos pela Agência Pública via Lei de Acesso à Informação (LAI).

Ao longo de seu mandato, Bolsonaro usou as Marchas para Jesus como palanque político. Em 2019, ele se tornou o primeiro presidente a participar do mega evento, que arrasta multidões pelas ruas, ao som de trios elétricos e bandas gospel. Naquele ano, Bolsonaro subiu ao palco em São Paulo ao lado dos criadores da marcha, o apóstolo Estevam e a Bispa Sônia Hernandes, da Igreja Renascer em Cristo. Ele discursou para as mais de três milhões de pessoas presentes, de acordo com a organização.

Naquele dia, o cartão corporativo registrou mais de R$ 28 mil em gastos apenas na Lanchonete Tony e Thais Ltda, no Planalto Paulista. Foram quatro compras realizadas em 20 de junho de 2019 nos valores de R$ 9 mil; R$ 8,22 mil; R$ 6 mil e R$ 4,8 mil. A reportagem não conseguiu contato com o estabelecimento para detalhar os valores. No ano passado, a mesma lanchonete recebeu R$ 62,2 mil via cartão corporativo da presidência, em dia de motociata. Ao longo do governo Bolsonaro, os pagamentos no cartão corporativo para o estabelecimento somam R$ 626 mil.

A mesma cena se repetiu em julho de 2022 quando, já em pré-campanha pela reeleição, Bolsonaro subiu ao trio elétrico dos Hernandes na volta da Marcha para Jesus às ruas de São Paulo, em 2022, depois de um hiato de dois anos por causa da pandemia. Ele aproveitou o palanque para reforçar suas bandeiras de campanha: “Nós temos uma posição: somos contra o aborto, somos contra a ideologia de gênero, a liberação das drogas, somos defensores da família brasileira. Nós somos a maioria no país. A maioria do bem. E nessa guerra do bem contra o mal, o bem vencerá mais uma vez”, disse.

Bolsonaro participou de pelo menos sete Marchas para Jesus em 2022, em vários estados brasileiros. Com participação de políticos e discursos, esses eventos funcionaram como comícios, passando ao largo das regras impostas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Há ainda outros registros de gastos no cartão corporativo da presidência que coincidem com agendas religiosas oficiais de Bolsonaro. No dia 18 de outubro de 2021 ele esteve em uma cerimônia pelo centenário da Convenção Interestadual de Ministros e Igrejas Evangélicas Assembleias de Deus no Estado do Pará (Comieadepa), em Ananindeua, região metropolitana de Belém, que reuniu pastores de todo o Brasil. A Assembleia de Deus é a maior denominação pentecostal do mundo.

Isac Nóbrega/PR
Ex-presidente Jair Bolsonaro durante discurso na 27ª edição da Marcha para Jesus de 2019
Entre 17 e 18 de outubro de 2021, há três gastos registrados no cartão corporativo, referentes a hospedagem e fornecimento de alimentação, no total de R$ 51,4 mil. A Panificadora Umarizal, no centro de Belém, recebeu R$ 18,5 mil no dia 17. Um funcionário da padaria informou que a presidência encomendou 712 kits de lanches, ao custo de R$ 26 cada. Cada kit continha dois sanduíches, refrigerante, água, barrinha de cereal e uma maçã. “Parte da encomenda foi entregue na Base Aérea de Belém, outra parte no Segundo Batalhão de Infantaria”, disse o funcionário, em condição de sigilo. 

Um dia depois do primeiro contato com a reportagem, questionado sobre quem fez a encomenda, o mesmo funcionário informou que a pessoa responsável pela compra ligou para o estabelecimento e orientou a equipe a não fornecer mais detalhes sobre a compra. “Disseram que depois que os dados do cartão corporativo foram liberados, começaram a sair informações distorcidas. Pediram para não falarmos mais com a imprensa.” O funcionário não disse o nome, nem o cargo da pessoa que teria dado essa orientação.

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No dia 27 de outubro, o ex-presidente esteve em um evento com pastores, no Centro de Convenções Vasco Vasques, Zona Oeste de Manaus (AM). Dois gastos, no total de R$ 51 mil, foram registrados nesta data: R$ 38,8 mil em hospedagem no Atlantica Hotels Internacional Brasil de Manaus e R$ 12,2 mil na Panificadora e Confeitaria Serpan. A reportagem contatou os estabelecimentos, mas eles não forneceram informações sobre os serviços prestados até a publicação.

Gastos do cartão corporativo podem ser maiores
Os dados de pagamentos do cartão corporativo da gestão de Jair Bolsonaro (PL) podem ser ainda maiores. Isso porque, apenas no ano passado, no Portal da Transparência, há registros de R$ 14 milhões em pagamentos considerados sigilosos pela Secretaria Especial de Administração da Presidência.

As informações divulgadas na semana passada, contudo, informam ao todo R$ 4,9 milhões de gastos em todo o ano de 2022. Há, portanto, valores que são informados como sigilosos no Portal da Transparência, que ainda não constam na lista de gastos divulgados pelo governo federal.

A reportagem da Pública enviou pedidos de esclarecimentos e entrou com recurso no sistema de acesso à informação. Desde o último dia 12, quando os dados foram divulgados pela presidência, solicitamos a atualização dos dados e uma explicação dos motivos pelos quais há informações incompletas, tanto para a Secretaria de Comunicação (Secom) quanto para a Presidência da República, via Lei de Acesso à informação (LAI). Ainda aguardamos respostas.

Colaboradora: Bianca Muniz
Colaborador: Bruno Fonseca
Esta reportagem pertence ao especial Caixa-Preta do Bolsonaro – viabilizado graças ao apoio de milhares de leitores – que revela os potenciais crimes e abusos cometidos pelo governo Bolsonaro que ficaram escondidos por trás de sigilos, negativas e outras táticas de sonegação de informação. A cobertura completa está no site do projeto.

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