segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

 

A dignidade no poder

Janja acertou em cheio. A imagem emblemática da terceira posse de Lula como presidente do Brasil será para sempre aquela em que ele sobe a rampa de braços dados com cidadãos que representam a diversidade da população brasileira e a enorme fatia da sociedade desprezada pelo governo Bolsonaro: os indígenas, as mulheres, os negros, as crianças, as pessoas com deficiência, os trabalhadores - o metalúrgico, a cozinheira, o artesão, o professor. O ápice da cerimônia organizada por Janja, a entrega da faixa presidencial, coube a uma jovem negra, Aline Sousa, catadora de recicláveis como sua mãe e avó. A cadelinha “Resistência”, adotada na vigília de Curitiba, veio como porta-estandarte desse resgate coletivo da dignidade, aviltada por Jair Bolsonaro e seus aliados. 

Essa foi também a ênfase dos discursos - de Lula aos ministros empossados nesta semana. No mais emocionante deles, o professor e jurista Sílvio Almeida, ministro dos Direitos Humanos, trouxe o significado político desse resgate: “Nós somos a vitória dos nossos antepassados. Nós somos a vitória também daqueles que virão depois de nós. Meu maior compromisso não poderia ser outro que lutar para que o Estado brasileiro deixe de violentar seus cidadãos. Quero ser ministro de um país que ponha a vida e a dignidade humana em primeiro lugar”, disse, nomeando cada um dos grupos vítimas de injustiça e desrespeito no governo Bolsonaro, tão bem representados na rampa do Planalto e pelo próprio ministro, autor do livro “Racismo Estrutural”. 

Para uma agência de jornalismo fundada no compromisso intransigente com os direitos humanos, não poderia haver estímulo maior para exercer cada vez melhor nosso papel, trazendo informação abrangente e de qualidade para subsidiar o debate democrático, confrontando promessas e realidade, cobrando do governo, instituições e empresas a transparência e respeito às pautas da sociedade civil e dos movimentos sociais, expondo interesses políticos e econômicos em jogo, denunciando violações de direitos humanos e responsabilizando seus agentes no passado ou no presente. 

Mas não apenas. Vamos acompanhar de perto a construção das tão urgentes políticas públicas de olho na garantia de direitos, em mais democracia, mais respeito à ciência e à sabedoria ancestral na proposição de soluções para um futuro em que o pré-sal e a picanha, exaltados por Lula até recentemente, perderam o lugar. Também não vamos desistir de responsabilizar Jair Bolsonaro pelos crimes cometidos nesses quatro anos, abrindo a caixa-preta de seu governo. 

O Brasil, que jamais superou a violência da escravidão e da ditadura, reverenciada por Bolsonaro e boa parte dos militares, tem que ir além da “reconstrução e união” em um mundo em rota acelerada para a destruição, como lembrou Marina Silva ao assumir pela segunda vez o MMA, renomeado como Ministério do Meio Ambiente e da Mudança Climática. “Esse aumento nominal tem uma razão que não é retórica: a emergência climática se impõe. Queremos destacar a devida prioridade daquele que é, talvez, o maior desafio global vivido presentemente pela humanidade. Países, pessoas e ecossistemas mostram-se cada vez menos capazes de lidar com as consequências e, comprovadamente, os mais pobres são os mais afetados. O governo brasileiro, que sempre foi protagonista nessa discussão, não se furtará a exercer esse papel de liderança, nacional e internacionalmente, por meio deste ministério”, afirmou em um dos discursos mais propositivos dos novos empossados.

Que as mulheres, negros, indígenas, gays, lésbicas, trans, crianças, jovens, trabalhadores e defensores de direitos humanos permaneçam como protagonistas neste governo que se inicia de forma auspiciosa. De nossa parte, queremos tornar nosso jornalismo uma ferramenta cada vez mais relevante a serviço da democracia e da igualdade de direitos, com coragem e imaginação para inovar, mas sempre aferradas ao compromisso com a independência editorial e com o interesse público que nos trouxe até aqui. 
“Exu matou um pássaro ontem, com uma pedra que só jogou hoje”, nos ensinou Sílvio Almeida, evocando um ditado iorubá. Vamos adiante conectando passado, presente e futuro, como propôs o ministro. Sem ressentimento nem esquecimento. 

Um ano novo com dignidade e esperança para todos nós!



Marina Amaral
Diretora executiva da Agência Pública


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