quinta-feira, 24 de julho de 2014

"A grande obra de Suassuna foi a vida dele", diz cineasta Guel Arraes

Andréia Rocha
Do UOL, em Recife
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Enterro e velório de Ariano Suassuna29 fotos

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24.jul.2014 - Guel Arraes no velório de Ariano Suassuna, que morreu vítima de parada cardíaca após sofrer um AVC hemorrágico no início da semana Sergio Bernardo/UOL
O cineasta Guel Arraes, responsável pela adaptação para a TV de "O Auto da Compadecida", uma das obras mais famosas de Ariano Suassuna, disse que o principal legado que o escritor deixa é a própria vida. "Ele viveu coerente com os seus pensamentos", disse o diretor. Suassuna, que morreu na tarde de quarta-feira (23), vítima de uma parada cardíaca após um AVC hemorrágico, é velado no Palácio do Campo das Princesas, em Recife. 
"Ele estudou e pensou todos os aspectos da cultura e da sociedade brasileira. Ele tentou entender o Brasil totalmente", disse o diretor, visivelmente emocionado, aoUOL. "Ele foi um pensador do Brasil em geral. O conhecimento que ele tinha, a cabeça que ele tinha, o talento que ele tinha, a dedicação. Foi um homem que dedicou a sua vida a isso. Ao Brasil, a entender o Brasil, a mudar o Brasil".
Para Arraes, nunca houve alguém como Suassuna no país, e nunca haverá. Ele lembra que o escritor foi um "homem de ação", chegando a ocupar o cargo de secretário de Cultura de Pernambuco na década de 1990 e ministrando aulas país afora.
"A grande obra acho que é a vida dele, porque ele viveu coerente com os seus pensamentos. Tudo que ele pensou, ele vivia na sua vida. Se ele queria uma sociedade melhor, vivia simplesmente. Ele promovia a cultura popular, vivia perto do povo, conversava. Ele via o mundo pela mente do sertão. Ele vivia as suas raízes. E assim ele ficou universal. Mas é um tipo de vida e um tipo de obra que talvez não se repita. Uma vida e uma obra tão completa é muito difícil de se encontrar", concluiu. 
Às 11h30, teve início uma missa de corpo presente de Ariano Suassuna celebrada pelo arcebispo emérito de Olinda e Recife, dom Fernando Saburido. A previsão é de que o corpo permaneça no Plácio do Campo das Princesas até as 15h. Depois, seguirá para o cemitério Morada da Paz, na cidade de Paulista, a 15 km de Recife, onde será enterrado às 16h. 
Eleito para a ABL em 1989, Suassuna escreveu mais de 15 peças teatrais e seis romances ficcionais. Ficou conhecido nacionalmente por "O Auto da Compadecida", de 1955. A história virou minissérie da TV Globo em 1999 com Matheus Nachtergaele e Selton Mello, e foi adaptada para o cinema em 2000.
A obra de Suassuna --traduzida para diversas línguas, como alemão, espanhol, inglês e polonês-- mescla características do modernismo, simbolismo e barroco com traços da cultura nordestina, como a literatura de cordel. Elementos da região, como a improvisação, são comuns em seus textos. Ele foi um dos criadores, em 1970, do Movimento Armorial, que mistura literatura, dança, teatro, música e outras manifestações artísticas para se fazer arte erudita a partir da cultura da região.
Formado em direito e em filosofia, exerceu, entre outros cargos públicos, o de secretário de Cultura de Pernambuco durante o terceiro governo de Miguel Arraes, em 1995. Atualmente, era assessor especial do governo de Pernambuco. Suassuna trabalhava havia mais de 30 anos no livro "O Jumento Sedutor", que faria parte de uma série de sete volumes que misturariam romance, poesia, teatro e gravura.
Suassuna era casado desde 1957 com Zélia de Andrade Lima, com quem teve seis filhos (Joaquim, Maria, Manoel, Isabel, Mariana e Ana). Ele era avô de 15 netos.
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Veja fotos de Ariano Suassuna17 fotos

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O escritor Ariano Suassuna em cena do documentário "Quaderna" Divulgação
Internação
Suassuna sofreu um AVC hemorrágico na última segunda-feira, quando deu entrada no hospital. Ele foi submetido a uma cirurgia neurológica às pressas para receber dois drenos que controlariam a pressão intracraniana. Na noite de terça, porém, piorou o estado de saúde do escritor, que estava em coma e respirando com a ajuda de aparelhos.
Em agosto do ano passado, Suassuna, que sofria de diabetes, teve um infarto agudo do miocárdio e, semanas depois, foi internado com aneurisma cerebral
Os problemas de saúde, no entanto, não o impediram de seguir seus trabalhos e, em março deste ano, ele participou do Galo da Madrugada de Recife, onde foi homenageado. Teatrólogo e romancista, ele também continuava ministrando suas "aulas-espetáculos" (palestras que misturavam concerto com dança). A última foi na sexta-feira passada durante o 24º Festival de Inverno de Garanhuns, e havia outra já marcada para o dia 5 de agosto, em Curitiba.
Suassuna é o terceiro integrante da Academia Brasileira de Letras a morrer em três semanas. No dia 3 de julho foi Ivan Junqueira e no dia 18, João Ubaldo Ribeiro. Apesar de não integrar o órgão, o escritor Rubem Alves morreu no dia 19.
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As principais obras de Ariano Suassuna10 fotos

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"Seleta em Prosa e Verso": Seleta e prosa e verso é uma coletânea de textos variados do escritor. Coordenada por Paulo Rónai e com textos selecionados por Silviano Santiago, o livro é também uma oportunidade de entrar em contato com a poesia de Suassuna Reprodução
Biografia
Ariano Vilar Suassuna nasceu em 16 de junho de 1927, em Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa, capital da Paraíba, mas mudou-se para Recife em 1942. Desde pequeno teve sua vida afetada pela política. Seu pai, João Suassuna, era integrante do governo da Paraíba e foi assassinado por motivos políticos no Rio de Janeiro, durante a Revolução de 30.
A família então se mudou para Taperoá, entre 1933 a 1937, onde Suassuna fez seus primeiros estudos. Foi lá que ele assistiu pela primeira vez a uma peça de mamulengos e a um desafio de viola, cujo caráter de improvisação seria uma das marcas registradas também da sua produção teatral.
Em 1942, Suassuna mudou-se para Recife. Foi lá onde conheceu Hermilo Borba Filho, e com ele fundou o Teatro do Estudante de Pernambuco. Publicou sua primeira peça teatral, "Uma Mulher Vestido de Sol", aos 20 anos.

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