A farra do jornalismo com as bets Há algo de podre no reino da Dinamarca. A famosa frase de Shakespeare me vem à cabeça quando, ao pesquisar uma reportagem no site Brasil 247, me deparo com uma série de textos que apresentam as “melhores casas de apostas brasileiras”, os “melhores apps de apostas” e as “melhores casas de apostas com cash out”. Após confirmar que sou maior de idade, chego ao conteúdo. São textos elaborados de maneira a otimizar o SEO, ou seja, para atrair mais visitantes desavisados da internet, e que guardam pouca relação com o conteúdo do site de esquerda, que costuma trazer um apanhado das principais notícias do dia. Disfarçados de texto jornalístico, esses conteúdos trazem algumas frases vagas como “aqui temos a missão de informar você sobre os diversos jogos e aspectos que envolvem a indústria do jogo de azar. Com os nossos conteúdos você irá conseguir diversas informações relevantes”. Embaixo, em vez de uma matéria jornalística, são listados várias entradas com links de propaganda para as bets mais famosas do Brasil – Betano, Bet Nacional, Bet365, Bet MGM. A pergunta se a bet X ou Y é confiável fica sem resposta concreta. Em apenas três delas, há uma sinalização de que possuem a licença do Ministério da Economia para operar. O leitor pode clicar no enorme botão para criar uma conta.
Trata-se de um novo e mais agressivo tipo de “branded content”, ou publieditorial, sem qualquer menção para o leitor de que ele está caindo em uma armadilha e não seguindo uma informação confiável. No Brasil 247, quem escreve as postagens é um profissional terceirizado, especialista em anúncios digitais e SEO que oferece o serviço de criar conteúdo para ser facilmente disponibilizado pelo Google.
Os publieditoriais em si são complicados. Este tipo de conteúdo finge se passar por jornalismo para fazer propaganda de uma empresa ou marca, fingindo trazer informação correta e checada ao leitor, quando na verdade é uma peça de publicidade. Mas a coisa é pior quando estamos falando de propaganda de casas de apostas diante de uma epidemia que tem chegado a índices alarmantes na sociedade brasileira, com estudos mostrando que 63% de quem aposta no país teve parte da renda comprometida com as bets e 17% dos beneficiários do Bolsa Família gastam milhões do programa social com apostas.
Só que o site Brasil 247 não está sozinho nisso. Uma rápida pesquisa na internet revela que sites como Terra e Metrópoles também estão se valendo de publieditoriais que levam direto aos sites de apostas. No Terra, as postagens são de autoria do “Terra Apostas” e prometem fornecer os “odds” – as chances de determinados lances de jogos. Os posts de “Terra Apostas” têm um aviso de que “a página contém conteúdo comercial e links afiliados”, mas só no pé das matérias e depois de muitos links que levam para a página da Betano. No Metrópoles, os conteúdos feitos pela “Equipe Apostas” vêm com um chapéu que explica ser um “conteúdo comercial” para maiores de 18 anos – mas o texto é ainda mais parecido aos conteúdos jornalísticos, embora inclua frases enganosas como “a Betfair está com uma supercotação para apostar na vitória do Brasil: a casa de apostas está oferecendo odds 50 para a Seleção vencer. Veja como aproveitar”. Com um link para o site, claro. |
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