Política
Eleições 2018
'De cima para baixo': Por que prévias partidárias são raras no Brasil?
Ao contrário de legendas de países como Estados Unidos e Argentina,
siglas brasileiras escolhem seus candidatos ao gosto de seus caciques
Gilberto Marques/A2img

Alckmin passou por Doria, agora Virgílio o convida para o confronto;
Embora
Alckmin seja o preferido do partido para a disputa, Virgílio Neto ainda
tem pretensões de concorrer pela legenda ao Planalto. Após nutrir o
mesmo desejo do tucano manauara, João Doria, prefeito de São Paulo, tem
pedido justamente o contrário. Recentemente, defendeu que o partido abra
mão das prévias e lance a candidatura do governador paulista, seu
padrinho político, sem a necessidade de uma disputa interna.
No
Brasil, as prévias partidárias são raras. Em outros países, são
instrumentos fortes que servem como funis para a escolha de políticos.
Nos EUA, há estados em que todos os cidadãos, mesmo os não filiados,
participam da escolha dos candidatos dos principais partidos,
Republicano e Democrata.
Na
Argentina, as prévias também servem como um termômetro eleitoral, já
que no país vizinho o voto para a escolha dos candidatos dos partidos ao
Legislativo é obrigatório.
Aqui,
as primeiras prévias após o fim da ditadura se deram no âmbito
municipal durante a redemocratização, em 1988. Nas eleições para a
Prefeitura de São Paulo, Luiza Erundina disputou a candidatura do PT com Plínio de Arruda Sampaio, e ganhou.
Interessado diretamente em um processo interno, Virgílio Neto fez uma defesa apaixonada das prévias. "Declare,
com a firmeza que o caracteriza, que elas acontecerão e serão amplas,
irrestritas, livres e lisas". E continuou: “enfrente-me em campo aberto.
Ou perderemos mais uma eleição e nos tornaremos cada vez mais
irrelevantes na cena política brasileira.”
Os
partidos deverão inscrever as chapas presidenciais até 15 de agosto de
2018. Até lá, o PSDB deverá ter definido o seu candidato, através das
prévias ou do conhecido top down ("De cima para baixo", em tradução
livre), quando os políticos mais influentes do partido definem os nomes.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso
defendeu a realização das prévias partidárias até março do ano que vem,
quando a pré-campanha eleitoral tem permissão para começar.
O
PSDB é um dos poucos partidos políticos que rastreia a possibilidade
das prévias. Mas em outras ocasiões, algumas siglas também utilizaram
esse procedimento no mesmo contexto. Em 2002, o PT fez prévias para
decidir entre Eduardo Suplicy e Lula.
- Antônio Imbassahy (à esq.), Arthur Virgílio (centro) e Aloysio Nunes (à dir.) durante a reunião da Executiva Nacional do PSDB, que avaliou o momento político e a permanência na base aliada em junho de 2017 (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Segundo o advogado Alberto Rollo, também professor de Direito Eleitoral
na Universidade Presbiteriana Mackenzie, as prévias partidárias servem
para pacificar o partido internamente e sanar qualquer dúvida antes da
convenção eleitoral, quando o partido faz a homologação da candidatura.
O
advogado explica que as prévias não têm previsão na legislação
brasileira, cuja única demanda são as convenções. “O que define as
prévias e a forma como serão feitas é o estatuto de cada partido, já
quem vota são os filiados”, afirma.
De
acordo com os dados de 2016 da Justiça Eleitoral, o PSDB tem pouco mais
de 1,4 milhão de filiados e ocupa o terceiro lugar em número de
integrantes. Na frente está o PT, com cerca de 1,5 milhão e o PMDB, com 2
milhões de inscritos.
No total, são mais de 16 milhões de brasileiros filiados a algum partido político. Nesse cenário, o tucano Alberto Goldman afirmou ser “tecnicamente inviável” executar prévias amplas.
O
estatuto do PSDB aponta que os inscritos poderão votar somente após
seis meses de filiação. Também destina aos diretórios nacionais,
estaduais e municipais a responsabilidade de aprovar, realizar e definir
as normas para a realização das prévias partidárias “sempre que houver
mais de um candidato disputando a indicação do partido”.
“O
objetivo das prévias também deve ser o de evitar as decisões da cúpula
partidária para baixo e, assim, democratizar a escolha”, afirma Rollo.
Para
o cientista político Humberto Dantas, as prévias podem ser um reflexo
de democracia interna, mas é necessário enxergar como esse instrumento
pode ser inserido, uma vez que “esconde alguns vícios da nossa política”.
“Precisamos
saber quem são os filiados aptos a votar nas prévias. É só a Executiva
Nacional? São todos os filiados? São aqueles que se filiaram há mais de
seis meses, um ano? Existe a possibilidade de filiar muitas pessoas hoje
e realizar as prévias amanhã? São perguntas para saber se isso é
efetivamente democrático”, afirma Dantas. Para ele, “muitos partidos
colocarão as candidaturas como consensuais. Mas não sabemos qual é o
preço desse consenso”.
As
prévias partidárias para a escolha de um tucano à Prefeitura de São
Paulo, em 2016, mostram a fragilidade deste consenso. Nas eleições
daquele ano, João Doria foi acusado, pelos concorrentes Ricardo Tripoli e Andrea Matarazzo, de comprar votos de filiados.
Aldo
Fornazieri, cientista político e um dos apoiadores do movimento Quero
Prévias, concebido inicialmente como um instrumento de organização dessa
pauta, acredita que as prévias fazem parte de um processo mais
complexo.
Para ele, o uso desse instrumento depende da formação de uma frente democrática e progressista reivindicadora de ferramentas como as prévias. “Mas a lógica partidária exclusivista é um obstáculo”, afirma Fornazieri.
“O
partido define seus objetivos em torno de interesses de um círculo de
pessoas. Não se leva em conta o conjunto das necessidades sociais e
políticas, não só de filiados, mas num campo mais amplo”.