Lava Jato
Cartel na Petrobras tinha regras como de "campeonato de futebol"
Delatores da Toyo Setal falaram sobre a criação do "Clube" de empresas e indicaram o caminho do dinheiro da propina para a agentes públicos
Antonio Cruz / Agência Brasil
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Em depoimentos prestados no fim de outubro, Augusto Ribeiro de Mendonça Neto e Julio Gerin de Almeida Camargo, da Toyo Setal, contaram com detalhes à Polícia Federal como as principais empreiteiras do País formaram um “Clube” para conquistar as principais licitações da Petrobras. Mendonça Neto começou seus depoimentos no dia 29 de outubro. Na presença do delegado Felipe Eduardo Hideo, o empresário detalhou como se deu a formação do cartel de empresas, quais eram os critérios para a distribuição das obras e a negociação do pagamento de propina. Segundo ele, até as doações legais feitas ao PT eram uma forma de pagamento de propina.
De acordo com Mendonça Neto, a implantação do cartel de empresas pode ser dividida em 11 fases distintas. Sendo a primeira delas a criação de um grupo de estudos juntos à estatal ainda em meados da década de 90. “Fase 1 – Criação do grupo de estudos junto à Petrobras, em meados dos anos 90; Fase 2 – Proteção entre as empresas e formação do “Clube”, final dos anos 90; Fase 3 – Atuação efetiva, no ano de 2004; Fase 4 – Ampliação do Clube para dezesseis empresas; fase 5 – Participação esporádica de outras companhias no Clube; Fase 6 – Últimas negociações do Clube; Fase 7 – Outras empresas entrantes no Clube; Fase 8 –Constatação do Clube “VIP”, Fase 9 – Contratação da RNEST; Fase 10 – Contratação do Comperj; Fase 11 – Final do Clube”.
Em um primeiro momento, os integrantes do “Clube” eram a Odebrecht, a UTC, a Camargo Correa, Techinit, Andrade Guttierrez, Mendes Júnior, Promom e MPE. Segundo Mendonça Neto, a partir de 2006 novas empresas entraram para o clube. Entraram a OAS, a Skanska, a Queiroz Galvão, a Iesa, a Engevix, a GDK e a Galvão Engenharia. Outras empresas também começaram a ganhar obras, mesmo que esporadicamente, com a ajuda do clube. São citadas a Carioca Engenharia, a Fidens, a Construcap, Jaraguá e Tomé Engenharia.
O coordenador do grupo seria Ricardo Pessoa, presidente da UTC preso na fase Juízo Final da Operação Lava Jato. “Era ele quem convocava os representantes das empresas para as reuniões, entregava as listas para o Renato Duque. Era o meio campo, o intermediário com Duque”. Sobre como se dava a distribuição das obras entre as empresas integrantes do cartel, Mendonça Neto explicou que cada uma escolhia as obras mais adequadas ao seu ramo de atuação e, no momento da licitação, as demais não atrapalhavam na conquista do certame. As regras do “clube”, diz o empresário, ao longo do tempo foram aprimoradas e chegaram a ser escritas como se fossem um regulamento de “Campeonato de Futebol”.
Sobre as reuniões, Mendonça Neto salientou que o propósito era analisar o programa de obras as Petrobras para em seguida preparar uma “tabela cronológica” para que as empresas pudessem escolher e determinar suas prioridades. Desse modo, diz o delator, respeitando a posição de cada empresa no ranking de contratos com a estatal, as obras eram distribuídas de forma a “manter um equilíbrio dos contratos entre as empresas participantes”.
Também em seu primeiro depoimento, o empresário afirmou que o interlocutor do “Clube” na estatal era o diretor Renato Duque, com quem ele teria negociado o pagamento de propina diretamente. Entre 2008 e 2011, segundo ele, foi acertado o repasse de 50 a 60 milhões de reais que foram efetuados de três formas: parcelas em dinheiro, remessas a contas no exterior e doações oficiais ao Partido dos Trabalhadores. Da parte de Duque, quem intermediava a negociação, segundo Mendonça Neto, era o gerente executivo Pedro Barusco, que também assinou um acordo de delação premiada com as autoridades da Lava Jato.
Enquanto Mendonça Neto afirmou que as doações oficiais ao PT eram fruto de propina, Julio Gerin de Almeida Camargo negou essa forma de transferência de dinheiro desviado. Em depoimento realizado em 31 de outubro, Camargo afirmou que fez muitas doações legais ao PT, o partido que mais financiou, por achar "conveniente". Segundo ele, no entanto, elas eram "espontâneas".
O caminho do dinheiro
A delação do dirigente da Toyo Setal Julio Camargo é uma das mais completas em relação ao caminho do dinheiro a ser seguido pelos investigadores. Em seus depoimentos, Camargo apontou as contas na Suíça, Nova York e Uruguai por onde, entre 2005 e 2012, movimentou cerca de 74 milhões de dólares. De acordo com o delator, as duas contas no país europeu, uma no vizinho brasileiro e outra em NY estavam em nome de suas empresas de fachada e eram utilizadas para fornecer notas fiscais frias cujo objetivo era movimentar a propina proveniente dos desvios na Petrobras. Os destinatários eram o ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato de Souza Duque (indicado pelo PT ), o lobista Fernando Antônio Soares Falcão, o Fernando Baiano (operador do PMDB), o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef.
No Uruguai, a conta estava sediada no Banco Winterbothan, em nome da Piement Ltd. Ela foi utilizada para pagar 40 milhões de dólares pela intermediação envolvendo a Diretoria Internacional da estatal. O movimentação teria sido feita “para efetivar pagamentos em contrato mantido com Fernando Soares, tendo feito transferências para diversas contas indicadas por ele, em torno de dez contas”. Ainda sobre a conta no país sul-americano, o delator afirmou que “pagou propina por meio desta conta mediante transferências para contas indicadas por Renato Duque e Pedro Barusco, aproximadamente três contas. E que também fez pagamentos de propina usando tal conta em favor de Paulo Roberto Costa, mediante transferências para contas indicadas por Alberto Youssef, sempre concentradas na Ásia”.
No país europeu, Camargo citou a conta aberta no Credit Suisse, em 2005. “Os recursos remetidos para a conta no Credit Suisse eram decorrentes de contratos de consultoria firmado por intermédio das empresas Auguri, Treviso e Piemote com consórcios e outras empresas contratos pela Petrobrás.” Nessa conta foram movimentados, segundo o delator, 18,6 milhões de dólares. No mesmo país, o delator diz ter atuado por meio de outras seis contas aberta no banco Cramer. Uma dessas contas, a Vigela, foi utilizada para “efetuar pagamentos de propinas” para Fernando Baiano via a offshore Hailey, sediada no BCP Geneve. O mesmo banco Cramer, disse o delator, serviu para repasses aos ex-diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa e Renato Duque. Nos EUA, segundo o delator, uma conta foi aberta no Merryl Lynch de Nova York para “operacionalizar o pagamento a Fernando Soares, por intermédio de Alberto Youssef”.
Confira abaixo os trechos em que Augusto Ribeiro de Mendonça Neto detalha as regras do conluio feito entre as empreiteiras:
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