
Dorivan Marinho/STF
De
um lado, a Estátua da Justiça, do escultor Alfredo Ceschiatti; do
outro, o Congresso Nacional, com seus parlamentares sob suspeita
Antes mesmo da divulgação do nome dos políticos que serão investigados com base na
delação premiada de 77 executivos da Odebrecht na Operação Lava Jato,
o Supremo Tribunal Federal (STF) já tem uma extensa lista de
parlamentares para julgar. De cada três integrantes da Câmara, um é alvo
de inquérito (investigações preliminares que podem resultar na abertura
de processos) ou ações penais (processos que podem acabar em
condenação).
Levantamento do
Congresso em Foco revela que pelo
menos 155 dos 513 deputados devem explicações não só ao eleitor, mas
também à principal corte do país, responsável pelo julgamento de
processos contra parlamentares federais e outras autoridades. Em
novembro de 2015, data da pesquisa anterior, eram 148 os investigados.
No Senado, como mostrou este
site, a situação não é diferente: ao menos
34 senadores são acusados de crimes.
Somadas as duas Casas, pelo menos 188 congressistas respondem a
acusações criminais. Ou seja, um em cada três dos 594 parlamentares. O
número de suspeitos pode ser ainda maior, já que o Supremo conserva em
absoluto segredo a existência de algumas investigações.
CONFIRA A LISTA DOS DEPUTADOS ACUSADOS DE CRIMES, POR ESTADO
A relação dos parlamentares acusados de crimes crescerá nos próximos dias, com os
83 pedidos de abertura de inquérito pela Procuradoria-Geral da República com base nas delações premiadas da
Odebrecht.
Ainda não é possível saber quantos congressistas mais serão
investigados. A autorização das apurações, bem como a divulgação dos
acusados, só será revelada em abril pelo ministro Edson Fachin, relator
da Lava Jato. Entre os novos investigados deve aparecer o atual
presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), citado por delatores.
Atualmente, 29 deputados são investigados por participação no esquema
de corrupção da Petrobras. Desses, apenas Aníbal Gomes (PMDB-CE),
Nelson Meurer (PP-PR) e Vander Loubet (PT-MS) tiveram denúncias aceitas e
viraram réus na Lava Jato.
A bancada dos pendurados no Supremo é suprapartidária e desconhece
diferenças regionais. Reúne representantes de 19 dos 26 partidos
políticos com assento na Câmara e de todas as unidades da federação. Ao
todo, eles acumulam 323 inquéritos e ações penais. As siglas com mais
deputados sob suspeita no Supremo são o PP, o PMDB, o PSDB, o PT e o PR,
que, juntas, abrigam mais da metade dos investigados da Câmara, com 92
nomes.
Bancada dos réus
As acusações contra os deputados variam de crimes eleitorais, contra o
meio ambiente, contra a fé pública, falsidade ideológica, corrupção,
tráfico de influência, formação de quadrilha e até lesão corporal. A
situação é mais delicada para 49 deles, que já são réus em 71 ações
penais no Supremo. Nesses casos, os ministros aceitaram os argumentos da
Procuradoria-Geral da República e concluíram haver indícios de que os
parlamentares cometeram os crimes que lhes são imputados. Nenhum deles,
porém, pode ser considerado culpado, pois seus processos ainda não foram
julgados.
Com 46 deputados em exercício, o PP tem a quarta maior bancada da
Câmara. Mas quando o assunto é problema na Justiça, o partido é
insuperável. Pelo menos 27 integrantes da legenda de Paulo Maluf (PP-SP)
respondem a ações penais ou inquéritos, inclusive o ex-prefeito
paulistano. Desses, 20 estão na mira da Lava Jato. A sigla é a que tem
mais políticos com acusações no Supremo relacionadas à maior operação de
combate à corrupção da história do país. Nessa situação estão o novo
líder do governo, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e o líder da bancada,
Arthur de Lira (PP-AL), já denunciado ao STF por corrupção e lavagem de
dinheiro.
Pai e filho
Arthur de Lira
é um dos líderes com maior número de processos
instaurados na corte. Ele e o pai, o senador Benedito de Lira (PP-AL),
tiveram os bens bloqueados, no valor de R$ 10 milhões. A assessoria do
deputado afirmou ao
Congresso em Foco que os inquéritos
tratam de “narrativas infundadas”. “O líder esclarece que os inquéritos
no Supremo Tribunal Federal (STF) não têm elementos que corroborem os
fatos. Trata-se de narrativas infundadas de delatores com inimizade
patente com o parlamentar. Arthur Lira está à disposição da Justiça para
esclarecer o que for necessário”, disse em nota. Outro réu na Lava
Jato, do PP, é o ex-líder Nelson Meurer (PR).
O PT, dos ex-presidentes Lula e Dilma, aparece logo na segunda
posição com 19 deputados sob investigação. Entre os investigados, está o
ex-presidente da Câmara Marco Maia (PT-RS). Relator da CPI mista da
Petrobras em 2014, ele responde a inquérito que apura sua atuação em um
esquema para impedir convocações de empreiteiros na CPI da Petrobras. As
suspeitas surgiram a partir de delação do ex-senador cassado Delcídio
do Amaral (ex-PT-MS).
Em seguida, entre as legendas com mais deputados que respondem por
ações penais ou inquéritos no STF, está o PMDB do presidente Michel
Temer, com 18 deputados investigados. Três deles se encontram
licenciados do mandato. Embora não haja investigação em andamento contra
o presidente, ele aparece entre os políticos citados como beneficiários
de doações de empreiteiras em delações da Odebrecht.
Em quarto lugar está o PR, com 15 nomes. Na sequência vêm o PSD, com
13 integrantes da Câmara sob investigação, e o PSDB, também com 13. O
PTB, PDT, PSB, SD, PRB, PSC, DEM, PTN, PTdoB, PSL, PPS e PCdoB surgem na
sequência como bancadas com mais parlamentares acusados de crimes.
Foro em xeque
Nas últimas semanas cresceu o apelo, inclusive entre ministros do
Supremo, por restrições à prerrogativa dos parlamentares e outras
autoridades de serem julgadas por determinada corte. Na Câmara, há 12
propostas nesse sentido em tramitação na Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ). Caso avance na CCJ, o texto será analisado, em seu
mérito, por uma comissão especial a ser instalada para esse fim. No
Senado, a discussão já está no plenário da Casa. A expectativa é que os
senadores votem o projeto de lei em abril.
Um dos argumentos utilizados para a revisão do foro é de que o
Supremo, corte responsável para dar a palavra final sobre questões
constitucionais, não tem estrutura nem agilidade para dar andamento a
investigações criminais envolvendo políticos. Levantamento feito pela
Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro mostra que 276 (68%) das 404
ações penais concluídas entre 2011 e março de 2016 prescreveram ou foram
repassadas para instâncias inferiores, porque a autoridade deixou o
cargo. A condenação ocorreu só em 0,74% dos casos.
A legislação brasileira prevê foro privilegiado não só para o
presidente da República, mas também para o vice-presidente, ministros,
parlamentares, prefeitos, governadores, juízes e integrantes do
Ministério Público. Deputados, senadores, o presidente da República e
ministros são julgados pelo Supremo Tribunal Federal. Já os governadores
e autoridades estaduais são julgados pelo Superior Tribunal de Justiça,
e os prefeitos, por tribunais de segunda instância.