sábado, 11 de abril de 2015

Entrevista - Vicentinho

'Terceirização é derrota da esquerda e do PT'

Para o deputado sindicalista, empresários estão querendo aumentar o lucro por meio da supressão de direitos trabalhistas
por Wanderley Preite Sobrinho — publicado 11/04/2015 07:23, última modificação 11/04/2015 16:03
Agência Brasil
Vicentinho
Vicentinho: Assistimos à sanha de quem descobriu que terceirizar dá lucro.
Vicentinho admite, com poucas palavras, que o PT e a esquerda saíram da votação historicamente derrotados. Ele próprio padece de dupla derrota: além de assistir à flexibilização de direitos trabalhistas, viu engavetado seu projeto que regulamentava as mesmas terceirizações. “A minha proposta não permitia que as atividades-fim fossem terceirizadas [...] Agora pode terceirizar até a alma.” O deputado comenta a entrada do vice Michel Temer na articulação política, isenta o governo e atribui a derrota de quarta ao perfil conservador do Congresso: “O fato é que a bancada de 80 parlamentares ligados a causas trabalhistas caiu para 50. Entraram no lugar empresários e fazendeiros”.
Leia a entrevista completa:
CartaCapital: Seu projeto de lei 1621/2007 também tentava regulamentar a terceirização. De que forma ele pretendia igualar os direitos de terceiros e efetivos?Vicentinho: O meu projeto foi rejeitado na quarta-feira 8 com a aprovação do texto do ex-deputado Sandro Mabel. O meu assegurava a existência da terceirização, mas com dignidade porque o texto do Mabel só se preocupa em aumentar a lucratividade do empresário. O meu projeto não permitia que as atividades-fim fossem terceirizadas. Em uma metalúrgica, por exemplo, quem é terceirizado é o restaurante, o setor de limpeza, a manutenção civil, nunca a linha de montagem. Nunca o ferramenteiro, o prensista, o funileiro. Agora todos podem ser terceirizados com salário menor. Mas, principalmente, meu projeto dava ao trabalhador proteção trabalhista compartilhada tanto pela empresa contratante quanto pela contratada.
CC: Não é assim no texto-base aprovado?V: Não. Muitas empresas terceirizadas recebem o dinheiro da contratante e desaparecem sem pagar o trabalhador. E este não pode responsabilizar a contratante. Para conseguir processá-la, a ação contra a empresa que sumiu terá de ter transcorrido todas as instâncias jurídicas. O problema é que uma causa trabalhista prescreve em cinco anos. No meu texto, as duas empresas eram mutuamente responsáveis.
CC: E como vai ficar a sindicalização para o trabalhador terceirizado?V: Em uma categoria forte, como a de metalúrgicos, o trabalhador terceirizado tem mais força também, mas, em geral, os sindicatos de terceiros são frágeis. Além de tornar fácil a troca de mão-de-obra, existe até quarteirização.
CC: O que caracteriza a quarteirização?V: É quando uma empresa terceirizada por uma montadora, por exemplo, também contrata outra terceirizada para executar o serviço. É como um bolo que é dividido em cada vez mais pedaços e o menor é entregue ao trabalhador.
CC: Em que proporção os salários podem ser afetados?V: Segundo o Dieese [Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos], o salário médio é 27% menor. Mas deve aumentar porque não vai haver mais comparação com quem é empregado direto. Isso sempre influenciou muitos os acordos coletivos. Sem isso, o empresário vai economizar muito. É a sanha de quem descobriu que terceirizar é lucrar. Não é dinheiro extra conseguido com aumento de vendas, de produção, mas pela supressão de direitos.
CC: Das seis centrais sindicais (CUT, Força, CTB, UGT, NCST e CSB), somente a CUT e a CTB foram contrárias ao texto-base.V: O Paulinho da Força [deputado Paulo Pereira - Solidariedade] vem sendo chamado de traidor da classe. Vários sindicatos ligados à Força estão entrando em contato para dizer que discordam do Paulinho.
CC: A bancada patronal é formada por 221 deputados. Não é uma disputa desproporcional?V: Venho me perguntando o que aconteceu com as manifestações de junho/2013, porque o que chegou ao Congresso é o oposto do que se imaginava. O fato é que a bancada de 80 parlamentares ligados a causas trabalhistas caiu para 50. Entraram no lugar empresários, fazendeiros. Se a gente não fizer uma reforma política e acabar com financiamento privado de campanha terá cada vez mais ricos e menos pobres no Congresso.
CC: O senhor acha que a crise política facilitou aprovação do PL 4.330?V: Não. A culpa é da nova composição do Congresso.
CC: Mas o governo acabou de conceder a articulação política ao vice Michel Temer (PMDB) e ainda assim sofreu nova derrota para o presidente da Câmara, o também peemedebista Eduardo Cunha.V: As mudanças foram agora e não dá para imputar ao governo vitória ou derrota nesse caso. Não foi uma luta do governo, mas dos empresários buscando lucratividade. Mesmo quando a base estava completamente unida, no governo Lula, os partidos votavam contra o governo em assuntos envolvendo interesses de classe. É assim com a reivindicação de 40 horas semanais. No Brasil ainda se trabalha 44 horas.
CC: Quanto tempo o Temer vai levar para conseguir domar o partido e melhorar as coisas para o governo?V: Essa dinâmica vai depender dele mesmo. Ele é respeitado, de boa conversa. Foi um erro deixar a articulação somente nas mãos do PT. Temer é o presidente do PMDB, foi presidente da Câmara. Uma ótima escolha.
CC: Essa derrota na Câmara é a maior que o PT, um partido de esquerda, já sofreu?V: É uma grande derrota para os trabalhadores. E se é para ele, é uma grande derrota para o PT e para os partidos de esquerda.
CC: As MPs 664 e 665, editadas no final de 2014, restringiam a concessão de seguro-desemprego. Isso não abriu a brecha para que a base liderada pelo PMDB investisse contra outros direitos trabalhistas?V: Não acho que as medidas provisórias tenham tido influência. O que acontece é que os partidos não votam por conteúdo, mas se estão no poder, se comandam um ministério. O problema das medidas provisórias é que o governo falhou na comunicação.

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