Entrevista
Molon: "Emendas não podem servir para um presidente escapar da Justiça"
por Dimalice Nunes
—
publicado
25/07/2017 00h30,
última modificação
24/07/2017 16h43
Deputado da Rede critica a liberação de 1,9 bilhão de reais por Michel
Temer às vésperas da votação de sua denúncia na CCJ da Câmara
Câmara dos Deputados

"Houve uma explosão na liberação de emendas após a
divulgação das denúncias contra o presidente", denuncia o deputado
federal Alessandro Molon (Rede-RJ).
"Estamos vendo o poder executivo usar o dinheiro público para comprar apoio no Congresso e tentar impedir o avanço de um processo criminal... Um movimento explícito de distribuição de cargos e de dinheiro público em troca de votos para enterrar a denúncia... Não tenho dúvida de que o que ocorreu foi ilícito",
afirma o deputado federal Alessandro Molon (Rede-RJ). Foi seu partido
que levantou os dados das liberações de emendas e recorreu ao Ministério
Público para que uma investigação formal aconteça.
Em entrevista à CartaCapital, o parlamentar falou também sobre o posicionamento da Rede nas próximas eleições presidenciais - que terá Marina Silva como candidata - e os próximos capítulos da denúncia contra Michel Temer na Câmara, que será votada no Plenário da Casa no dia 2 de agosto. "Nenhum dos dois lados tem votos suficientes para derrotar o outro ainda. Então vamos continuar mobilizando a sociedade". O deputado defendeu ainda que a oposição se posicione para que a votação só aconteça com um quórum elevado, o que garantiria que o maior número possível de parlamentares exponha seu voto.
Em entrevista à CartaCapital, o parlamentar falou também sobre o posicionamento da Rede nas próximas eleições presidenciais - que terá Marina Silva como candidata - e os próximos capítulos da denúncia contra Michel Temer na Câmara, que será votada no Plenário da Casa no dia 2 de agosto. "Nenhum dos dois lados tem votos suficientes para derrotar o outro ainda. Então vamos continuar mobilizando a sociedade". O deputado defendeu ainda que a oposição se posicione para que a votação só aconteça com um quórum elevado, o que garantiria que o maior número possível de parlamentares exponha seu voto.
CartaCapital:
Como a Câmara dos Deputados, num cenário de crise econômica e num
momento tão determinante para o País, em meio ao acatamento ou não da
denúncia contra o presidente Michel Temer, deixa evidente esse jogo que
assistimos com a liberação das emendas parlamentares?
Alessandro Molon:
O que está acontecendo nesse momento no País e no Congresso Nacional,
pela atuação do poder executivo, é o que de mais grave pode acontecer em
uma democracia. Estamos vendo o poder executivo usar o dinheiro público
para comprar apoio no Congresso e tentar impedir o avanço de um
processo criminal. É gravíssimo o que está ocorrendo: o ritmo e o
momento em que os recursos foram liberados, e a quantidade, deixa
evidente que essa era a intenção. Afinal de contas, houve uma explosão
na liberação de emendas após a divulgação das denúncias contra o
presidente.
CC:
A liberação de emendas em troca de apoio em votações não é um
expediente novo. O que chamou a atenção foi justamente a velocidade e os
montantes. Que leitura é possível fazer da relação institucional entre
Executivo e Legislativo?
AM:
Foi um movimento explícito de distribuição de cargos e de dinheiro
público em troca de votos para enterrar a denúncia. Não houve um mínimo
de pudor ou de vergonha nessa operação, que é uma afronta ao país. As
emendas parlamentares não foram feitas para isso, foram criadas para que
os parlamentares, conhecendo as necessidades de suas regiões, possam
defender políticas públicas que atendam ao interesse público. E não ao
interesse particular de um presidente que quer ficar fora do alcance da
Justiça depois de ser flagrado cometendo crimes.
CC:
E como a oposição pode se colocar nesse momento? Quais são os limites
entre o moral e o legal nesse episódio da liberação das emendas,
especialmente considerando os cortes de gastos e aumento de impostos
para fechar as contas do governo?
AM: Eu
não tenho dúvida que o que ocorreu foi ilícito. Por isso que eu e o
senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) fomos ao Ministério Público
representar ao procurador-geral da República pedindo que ele abrisse
investigação para apurar a prática do presidente da República, que usou
dinheiro público para contrariar o interesse público.
Nós
deixamos claro na nossa denúncia a questão da crise econômica. Enquanto
esses recursos estão sendo liberados fartamente, serviços públicos
essenciais estão sendo interrompidos, como o socorro às vítimas de
acidentes em estradas pela Polícia Rodoviária Federal. Serviços são
paralisados enquanto as verbas públicas estão sendo distribuídas dessa
forma.
CC:
Num momento como esse, de polarização política e fragilidade da
representatividade, como o senhor vê a questão da união da esquerda?
AM:
Acho que temos que estar unidos na defesa do interesse público e na
denúncia dos crimes que estão sendo praticados pelo Palácio do Planalto.
Contra o interesse público, contra o que estabelece a Constituição,
contra a saúde, a vida da população, que está sendo assassinada porque
não há dinheiro para a segurança pública, porque está sem remédio e
hospital, enquanto o dinheiro está sendo usado com essa liberalidade
pelo presidente da República. Acho que é o momento de denunciarmos isso
juntos e cobrarmos as investigações e as providências pelo interesse
nacional.
CC: Agora pensando um pouco mais adiante: como a Rede se colocará nas eleições presidenciais de 2018?
AM:
A nossa expectativa é apresentar uma proposta que seja capaz de superar
essa grave crise e a enorme desigualdade que é uma triste marca do
Brasil, nossa maior preocupação. Queremos apresentar um modelo eficiente
para a economia, capaz de gerar empregos e distribuir renda.
CC: E Marina Silva é a candidata?
AM: Só não será candidata se não quiser.
CC:
Na última eleição, Marina Silva apoiou o senador Aécio Neves (PSDB-MG)
no segundo turno. Depois de todas as denúncias que vieram à tona contra
ele, essa vinculação de imagem preocupa a Rede de alguma forma?
AM:
Acreditamos que nossa história de luta, de todos nós, em defesa de um
país mais igual, com oportunidades, sobretudo, para as pessoas que mais
sofrem, fale mais que um episódio como esse. Acho que as pessoas irão
olhar para a próxima eleição observando o programa que será apresentado e
esse programa deve falar mais alto. Um programa que vai mostrar uma
forma eficiente de superar a desigualdade, que é a grande preocupação do
eleitorado.
CC: A
Rede é vista como terceira via, que de certa forma se opõe ao que já
foi feito por um governo mais popular e contra o que está sendo feito
agora. Quais são efetivamente as propostas do partido, o que é possível
fazer diferente?
AM: Primeiro
a gente entende que é importante que o setor produtivo nacional tenha
condições de produzir, de gerar emprego e renda, de se desenvolver. Não
imaginamos que isso [geração de emprego e renda] possa se dar sem que o
setor produtivo nacional tenha condições de cumprir o seu papel. Ou
seja, nós não imaginamos que o estado sozinho é capaz de dar conta de
tudo.
Por
outro lado, entendemos que o setor produtivo por si só não é capaz de
resolver todos os problemas do país. Porque muitas vezes ele, em vez de
diminuir, agrava a desigualdade. Daí a importância de termos um Estado
eficiente. Isso significa a capacidade de aproveitar o que a experiência
recente brasileira produziu de avanços. Seja no que diz respeito à
estabilidade da economia e combate à inflação, o que é muito importante,
seja no que diz respeito à geração de oportunidades, emprego e renda. E
os programas sociais capazes de enfrentar essa questão.
CC: Quais serão as prioridades do programa da Rede?
AM: Consideramos
que muita coisa ainda não foi feita. Por exemplo, nos último tempos, o
Brasil vem sendo marcado por uma espécie de capitalismo de compadrio.
Empresas grandes e bem relacionadas acabam tendo facilidades e isso
acaba colocando em risco um pilar da economia moderna, que é a
concorrência. Em alguns momentos do Brasil isso foi desprezado,
atropelado.
Nós
[o partido] temos apostado num empreendedorismo de micro e pequenos
empreendedores capazes de dinamizar a economia e gerar muitas
oportunidades de emprego. A gente acha que isso também não foi
devidamente feito nos últimos anos no Brasil.
A
gente acha que os avanços nas políticas sociais ficou muito aquém do
desejado. O Brasil conseguiu avançar bem em políticas focalizadas de
superação da pobreza, como por exemplo o programa Bolsa Família, mas em
políticas universais, em especial educação e saúde, o Brasil ficou
devendo muito. E essa é uma área que vai merecer muita atenção.
A
nossa visão é de aproveitar o que os governo anteriores produziram de
melhor, sem negar isso. Ao contrário, reconhecendo e registrando com
aplausos e homenageando essas conquistas, mas ao mesmo tempo
reconhecendo as limitações delas. Não somos daqueles que negam o que foi
feito de bom por quem não é do nosso partido. Ao contrário: a gente
quer aproveitar, manter isso e ir além.
CC:
Capitalismo de compadrio é um fenômeno global, mas que pode prejudicar
mais economias fragilizadas como a do Brasil. É possível quebrar essa
relação tão imbricada entre o público e o privado?
AM:
Há mecanismos de compadrio estritamente nacionais. Políticas adotadas
que, ao meu ver, foram equivocadas e acabaram gerando ineficiência. Eu
me refiro, por exemplo, à política de campeões nacionais: a escolha de
alguns vencedores que receberam recursos fartos. Será que essa foi uma
medida acertada? Será que esse dinheiro não teria sido melhor empregado
no desenvolvimento de startups, empresas em desenvolvimento, em
vez de grandes campeões nacionais que foram beneficiados por esses
recursos? Mas o nosso programa ainda está sendo discutido, debatido…
CC: O recesso parlamentar termina dia 1 de agosto e para o dia 2 está marcada a votação no plenário da Câmara para o acatamento da denúncia contra o presidente Michel Temer. Qual a expectativa?
AM: Ao
meu ver, nenhum dos dois lados tem votos suficientes para derrotar o
outro ainda. Então vamos continuar mobilizando a sociedade, pressionando
o Congresso, a Câmara, para que os parlamentares se posicionem a favor
da denúncia. Não vamos fazer o jogo do governo.
Por
exemplo: nós não conseguimos até o momento ver como positiva essa
sinalização de parte da oposição de dar quórum no dia 2 mesmo sem a
certeza e que a sessão estará cheia. Nós vemos isso com preocupação. Não
entendemos esse posicionamento, não estamos entendendo bem qual o
sentido dessa posição.
Registrar
presença para facilitar que o governo faça uma sessão com quórum baixo,
permitindo que mais de 100 parlamentares da base do governo escondam
seu apoio ao Temer e passem impunes? O que a oposição ganha com isso? Em
que medida a luta dela para tirar Temer se fortalece?
Meu
posicionamento é que a oposição esteja presente, mas não registre a
presença em Plenário até que se alcance um quórum alto para que se faça o
debate e se vote com a segurança de que os outros irão votar também.
Para forçar que o maior número de parlamentares se posicione.
Por
exemplo: se temos a favor da denúncia 200 votos, e outros 150 contra,
acabou. E onde estão os 100 deputados que se esconderam? O povo não vai
saber que eles estão com Temer, não vão pagar nenhum preço, e aí?
Nenhum comentário:
Postar um comentário